COMO DEVERIAMOS JOGAR
Segundo as declarações de Amaury Passos em recente programa do SPORTV,o contra-ataque sempre foi a marca registrada do basquete brasileiro,tendo mencionado,inclusive,o sistema da linha de três atacantes na execução do mesmo, ação largamente utilizada pelo técnico Kanela nas seleções brasileiras que dirigiu,mas que dependia basicamente do domínio dos rebotes defensivos, setor que dominávamos como ninguém, pela velocidade e habilidade de nossos homens altos.Na impossibilidade do contra-ataque, atacavamos com dois exímios armadores,dois rápidos e certeiros alas e um pivô em permanente movimentação.Os arremêssos de três pontos ainda não tinham sido adotados, no entanto as contagens, via de regra,ultrapassavam os 70 pontos,provando que elevadas contagens podiam ocorrer normalmente sem a presença dos arremêssos de três pontos.Não se trata de negá-los, e sim reservá-los aos verdadeiros especialistas,ao contrário do que ocorre nos dias atuais, quando qualquer jogador se acha suficientemente técnico para executá-los. Trata-se de uma arte, difícil e elitista arte, que é reservada a muito poucos jogadores.E por ser uma restrita especialidade é que os sistemas ofensivos deveriam ser direcionados para os poucos e especiais momentos em que pudessem ser realizados com boas perspectivas de sucesso, e não como uma regra geral a ser adotada como vemos nos dias atuais, e com desastrosos resultados na maioria das partidas.O advento dos três pontos, e o endeusamento das enterradas propiciaram um afrouxamento na prática de fundamentos excênciais no preparo dos jóvens,assim como a adoção de um sistema que privilegiasse aqueles arremêssos, pautado quase que exclusivamente nos passes, cristalizaram e generalizaram o uso do Passing Game como a norma a ser adotada e seguida por todos. Instalou-se o modelo,que tinha na NBA o seu executor maior, divulgado e imposto subliminarmente mundo afora,aceito religiosamente por quase todos os técnicos, que viram nele a solução para o problema maior,a falta de talento,criatividade e coragem para alçar vôos sólos. Por que estudar se o modelo NBA ali estava,à mão,gratúito, e previamente aceito pelos jóvens que ostentavam nas camisetas emblemas e fótos das equipes americanas? Por que adotar comportamento generalista na execução dos fundamentos se era bem mais fácil orientar os jóvens atletas pelos caminhos da especialização na forma de Jogador 1, 2, 3,etc…Nem os EEUU seguiram essa linha, jamais o fizeram,pois o Passing Game foi estabelecido muito antes do advento dos três pontos, com a finalidade de manter o controle tático das equipes universitárias na mão dos técnicos quando da inclusão do limite de posse de bola,inicialmente em 45 segundos,posteriormente em 35 e atualmente em 30 segundos.Irônicamente, os americanos estão aplicando experimentalmente em uma liga menor dos profissionais a permissão dos arremêssos de três pontos somente nos três minutos finais dos jogos, no intuito de incentivar a pratica dos arremêssos de média e curta distâncias, com consequente diminuição do grande número de êrros que vinham ocorrendo nos últimos anos. Acreditam que somente os especialistas serão acionados nos três minutos finais, e que a diminuição das distâncias incentivarão os jogadores à busca da precisão perdida nos últimos tempos. E nós cada vez mais mergulhados,e na maioria das vezes,perdidos no caudal de êrros que vem transformando nossos jogadores em franco-atiradores,onde até os pivôs já embarcaram na aventura dos três pontos.E nossos técnicos,embevecidos ou impotentes assistem a tudo como se fosse essa a nossa verdadeira maneira de jogar.Se estão, como comandantes,coniventes com essa realidade,devem tentar urgentemente reverter o processo que está nos levando para o fracasso definitivo.Torna-se de vital importância o renascer da arte do drible,da execução e recepção dos passes de forma antecipativa, com alas e pivôs os recebendo sempre em movimento, e basicamente
desenvolvendo as ações de jogo com e sem a bola.A movimentação assíncrôna é a chave
dos bons e efetivos sistemas,pois mascara as intenções ofensivas que a sincronia torna de facil marcação pela obviedade dos movimentos.É o que vemos atualmente, pelo fato de todas as equipes jogarem de forma igual,previsivel,óbvia, e sempre voltadas à
preparação dos arremessos de três pontos.Os resultados ai estão para provar o quanto de ineficiência apresentam, e como retardam o nosso desenvolvimento técnico.Temos que voltar a adotar sistemas que permitam aos jóvens,após um intenso preparo nos fundamentos, trilharem os caminhos da experimentação, da descoberta de suas potencialidades e a de seus companheiros, fora de esquemas rigidamente coreográficos,
que os tem levado desde cêdo a uma absurda pseudo-especialização.Uma jóvem equipe bem
preparada nos fundamentos se sai melhor do que aquela atrelada a esquemas que só se
manifestam importantes perante a vaidade e despreparo de também pseudo-técnicos.Mas
aplicar corretamente os fundamentos exige de quem o faz, não só um profundo conhecimento do jogo,mas um rigoroso conhecimento da arte de ensinar.Nos países líderes do basquetebol mundial,são os técnicos de divisões de base aqueles mais bem
preparados pedagógica e técnicamente.Alguns anos atrás perguntei a um renomado técnico se ele aceitaria orientar uma divisão de base, e recebi como resposta a
afirmação de que considerava um desprestígio fazê-lo após ter atingido ao patamar de
técnico da elite.Esse posicionamento é bem mais comum do que imaginamos,e o que nos
resta é lamentar, pois um técnico de alto nível raramente cometeria os êrros comuns
aos técnicos inexperientes.Dedicar um horário no dia de trabalho aos pequenos praticantes daria um impulso sem precedentes ao nosso combalido basquetebol,e
prepararia melhor os futuros técnicos.Adaptar situações técnico-táticas às necessidades e limitações dos jóvens torna-se de fundamental importância,assim como
livrá-los das imposições e limitações contidas no sistema em vóga em nosso país.
Enfim,com a melhoria no ensino dos fundamentos,e com a diversidade em sistemas de jogo que serão desenvolvidos, teremos a médio prazo a possibilidade real de sairmos
do limbo em que nos encontramos a 20 anos no campo do basquetebol internacional.
Espero, sinceramente, que sim.