UM CAFÉ,E DUAS HORAS DE…

Quadra encharcada, interrompendo a partida decisiva do Sul-Americano de Clubes em Brasília. Enquanto os muitos funcionários patinavam no dilúvio na tentativa de enxugá-la, me distraio um pouco na leitura de um jornal local encostado atrás de uma das tabelas. De repente sinto uma mão pesada no meu ombro, e um “como vai Paulo?” Viro-me e encontro o grego que me sorri. Devolvo o cumprimento, e antes que estabelecêssemos conversação um dirigente estrangeiro se antecipa e o afasta um pouco, tempo necessário para que eu peça ao Heleno Fonseca Lima, próximo a nós, que fizesse parte do colóquio que se avizinhava. Afinal, foram mais de 5 anos que não nos dirigíamos diretamente, sendo que nos últimos três exerci com veemência um ciclo critico neste blog, em anteposição à sua administração junto à CBB. Atendido o dirigente, nosso grego melhor que um presente inicia a tão aguardada aproximação dialética, iniciando-a com um preâmbulo devastador: “Paulo, você é um professor respeitado, e que luta pelo bem do basquete, assim como eu, e que não tem pretensões à seleção brasileira, e sim…”. Um momento, grego, interrompi-o prontamente- Quem afirmou isso a você? Não fui eu,pode ter a certeza, pois como qualquer profissional dedicado ao basquetebol em sua parte técnica, servir a uma seleção de meu país jamais poderia ser desconsiderado, por princípio e por mérito. Sei que não o serei, mas jamais abdicarei desse direito.!” Todos afirmam que o fato de não dirigir equipes no nacional o incapacita para a função”. Engano seu grego, qualidade não é medida por essa ótica, e sim pela somatória de experiências e muito estudo, que não é em absoluto condição somente minha, muitos as tem nesse país.”Então me aponte alguém aqui presente!” Só aqui na sua frente tem dois, e mais dois la na tribuna. Já são quatro. Imediatamente o Heleno reage dizendo estar aposentado como técnico. Emendo afirmando que seria um ótimo supervisor, no que ele concorda em termos. E a conversa então toma outro rumo, quando enfoco a vinda de um técnico estrangeiro para a seleção. Prontamente o grego afirma que aquele profissional, que será escolhido por ele em janeiro, terá como função prioritária complementar uma nova comissão técnica, suprindo-a com a experiência européia em grandes competições, e que logo à seguir o pré-olímpico passaria o comando a um brasileiro, e que o preço a ser pago em nada desequilibraria as finanças da CBB, pois segundo ele, até de graça alguns técnicos se ofereceram para dirigir a talentosa seleção brasileira, na opinião de muitos, externadas pessoalmente quando de sua recente estadia na Espanha. Conclui que o passo já foi dado, só não avaliando, ou imaginando a extensão e os resultados práticos do mesmo.

Continuando o papo, que aquela altura já raiava à veemência, argüi da necessidade da existência das associações regionais de técnicos, que evoluiriam mais tarde para uma nacional, com responsabilidades autônomas de aconselhamento, preparação e treinamento de novos técnicos, e influência na escolha meritória de selecionadores nacionais, a exemplo das maiores potências atuais do basquetebol, como também para uma modificação estrutural nos cursos de atualização que visassem a diversidade técnico-tática, e não a fracassada homogeneização de um sistema de jogo estendido a todas as categorias de base, e que respeitasse os aspectos regionais do país. Também o lembrei da importância de controle estatístico mais condizente com a realidade técnica, assim como uma bem elaborada divulgação de bibliografia pertinente às reais necessidades dos muitos e muitos técnicos espalhados e tão abandonados em seu labor.

Com o jogo há muito em andamento, convidou-me o grego a passar na CBB para um café e umas duas horas de papo que eu teria para convencê-lo de alguns meus pontos de vista, que seriam ou não aceitos na medida direta de minha argumentação. Antes de nos despedirmos, sugeri que trocasse o nome do pequeno auditório da CBB de James Naishmith para Togo Renan Soares, o maior e mais laureado técnico de nosso país, numa singela, porém correta homenagem a quem muito fez pelo basquete nacional. Foi nesse ponto que ficamos sabendo, eu e o Heleno ainda participante da conversa, que a arena da Barra da Tijuca não foi batizada com o nome do grande Kanela, como o vizinho Parque Aquático Maria Lenk, por exigência de futuros arrendatários da mesma, para divulgá-la com suas marcas e projetos comerciais.

Ficou o convite, ficou a dúvida, a grande dúvida do quanto poderei colaborar com o nosso basquetebol, junto a uma administração que critico fortemente, tanto na forma, como nos princípios democráticos que deveriam pautar toda e qualquer administração desportiva, como nos países que nos tem vencido, aqui mesmo na America do Sul, nos últimos 20 anos. O que poderei influir durante e após duas horas de debates, ou monólogo, com alguém que age e pensa como ele? Terei alguma chance de convencimento, ou simplesmente me exporia a um retrocesso na estratégia que venho desenvolvendo nos últimos anos, na lenta e paciente missão de despertar os grandes, porém entorpecidos nomes do grande jogo, e os jovens em sua disposição idealista e até utópica, e por isso mesmo eivada daquela heróica honestidade, sua marca indelével ? Honestamente, não sei, apesar de lá no fundo ainda pulsar um tantinho de esperança em dias melhores, em melhores idéias, em qualidade, em ética.

Mas um fato, importantíssimo para mim, vem à lembrança, o café. Não mais aquele servido pelo inesquecível Seu Chico, o mesmo Chico mordomo das seleções, e funcionário prestimoso na nossa EEFD/UFRJ, que envergonhado e constrangido me comunicou que eu havia sido preterido para a seleção brasileira feminina que se apresentaria na França em jogos contra a Tchecoslováquia para o COB avaliar a presença ou não do basquete feminino nas Olimpíadas, com a argumentação do diretor técnico na ocasião de que eu era inadequado por ser baixo e feio, história que contei em artigo anterior. Acredito que o café de agora possa ter outro sabor, talvez bem mais amargo. Na dúvida…

Amém.



5 comentários

  1. Fabio /SP 09.12.2007

    Caro Professor,

    Entendo a dúvida que paira em sua cabeça a respeito dessa situação, muitas vezes acontece de pessoas que estão ocupando o “poder” se colocarem à nossa frente e termos a possibilidade de expor uma opinião ali, frontalmente. Acredito ser de suma importância se posicionar sim, professor Paulo, não importa o que será feito da sua opinião. Uma história diz que não importa o que o mendigo fará com a esmola que vc deu a ele, a força está no seu ato. Se está sendo oferecido uma hora, duas ou 10 minutos, ocupe. Caso o senhor não ocupe, virá algum “zé mané” e ocupará. Esta é a minha opinião, abraços

  2. Idevan G. 10.12.2007

    Caro professor, se ele o convidou é porque o considera, gostando ou não das suas opiniões. Não perca a oportunidade de expor o seu ponto de vista, mesmo achando que as chances de ser ouvido sejam pouquíssimas.

  3. Anonymous 11.12.2007

    Caro Prof.Paulo Murilo, estou ha alguns anos no basquete do Rio de Janeiro, certamente o grego lhe convidou na frente de outras pessoas certo ou errado? se certo como sempre pra fazer jogo de cena que quer agregar e respeita os profissionais quando por dentro a historia ? outra ? um autoritarista, se tivesse pessoas na CBB que tivessem peito de vir a publico dizer alguma coisa iamos ver que essa democracia do grego ? uma farsa e o que prevalece na CBB ? o que ele acha, at? pq pouco confia na capacidade das pessoas que est?o a sua volta.
    Quanto a tudo que disse tenho a certeza que o grego ouviu, mas ter entendido o conteudo do que falou acho dificil, como sempre faz muito solicito aceita tudo que ? sugest?o em publico e quando se encastela esquece de tudo. quanto a pergunta “Todos afirmam que o fato de n?o dirigir equipes no nacional o incapacita para a fun?o? o que realmente ? a capacidade dos incompetentes que estavam na comiss?o tecnica que dirigiam clubes e foram responsaveis pela a gera?o perdedora do basquete brasileiro.Prof. Paulo Murilo, para esta junto na CBB a condi?o mais importante ? ser imcompetente pq fica facil do grego manobrar, pessoas inteligentes e autenticas dificilmente v?o ser convidadas para CBB, isto ? historico, ainda mais pessoas como o senhor que tem opini?o propria e n?o ? do grupo dos burros de presepio.
    Prof.Paulo, fica minha opini?o e minha sugest?o se realmente for recebido pelo grego leve algo escrito pq certamente ele pode aproveitar no futuro e ainda dizer que foi ideia dele como sempre faz com as sugest?es que varias pessoas enviaram para ele.Quer mais sugest?es que o CLIPPING DO BASQUETE do seu amigo Alcir deu, tive a grande oportunidade de ler varios artigos dele no Sportmania e atrav?s de um CD que um amigo gravou os varios artigos, o que foi utilizado ? nada.Segundo soube por pessoas que acompanharam o clipping de perto e tinham contato com o Sr.Alcir, que ele se afastou decepcionado com basquete brasileiro e com o nivel da maioria das pessoas que fazem o basquete do pa?s.
    Um grande abra?o professor continue assim com seus pontos de vista, pelo menos vemos profissionais competentes lutando por um basquete melhor
    Gustavo

  4. Basquete Brasil 12.12.2007

    Prezados Fabio e Idevan,resolvi aceitar o convite,e após muito pesar prós e contras me convenci de que minha maior função é a de jamais fugir ao debate e à troca de idéias, aceitas ou não.Vocês têm razão em seus posicionamentos,agradecendo a ambos pelos mesmos.Um abraço,
    Paulo Murilo.

  5. Basquete Brasil 12.12.2007

    Prezado Gustavo,tirarei as dúvidas após o encontro,claro,se o mesmo vier a se concretizar.Até lá mantenho toda a discreção que me for possivel.Um abraço, Paulo Murilo.

Deixe seu comentário