ECOS DE PEQUIM…

Gostaria de convidar a imprensa jovem, em jornais, na internet, e na TV, a prestar com bastante atenção certas características editoriais destes mesmos meios , porém na imprensa estrangeira. Difícil e quase impossivelmente verão realçadas conquistas esportivas que não sejam a de seus atletas, ganhando ou perdendo, ao contrário da nossa, que enaltece e glorifica, até bem mais do que nossos adversários, feitos e conquistas dos mesmos, numa posição colonizada e subserviente, disfarçada de “conceito globalizado”.

O NYT, com sua poderosa redação esportiva, publica uma matéria sobre a vitoria do nosso voleibol feminino estampando uma única foto de suas derrotadas jogadoras, e um texto que pouco ou nada fala de nossas jogadoras.E se percorrermos as matérias das demais modalidades, o mesmo tratamento é dispensado aos adversários, vitoriosos ou derrotados, ou seja, o mínimo de publicidade possível. E o mais incrível, subvertem a contagem das medalhas olímpicas, que, por iniciativa deles próprios, eram quantificadas e pontuadas por seus valores em ouro, prata e bronze, para uma simples somatória das mesmas, critério que os mantém na liderança olímpica. E todos os jornais americanos seguem estas regras, quando o reconhecimento de vitorias só recebem espaço em suas páginas se forem deles próprios. Mas, não podemos ser injustos quanto à publicidade que nos destinam, quando retratam nossas mazelas, nossos crimes e nossa inferioridade cultural.

Aqui, abaixo do equador, odes e admiração explícita aos deuses americanos são publicadas aos magotes por nossos jovens jornalistas, numa adoração que chega às raias do mais profundo ridículo e comprometedora dependência colonial, tornando-os cegos e imunes a certas verdades omitidas aos seus parcos conhecimentos sobre intenções e ações bem planejadas para mantê-los exatamente como estão. Por isso, devem ter em mente que a imprensa sempre deteve o poder de influenciar nos comportamentos e na opinião pública, construindo ou desconstruindo ações de interesse da sociedade, numa trajetória que tanto pode projetar a glória, como a derrota de um povo, inclusive no campo desportivo.

Quando no artigo anterior publiquei a reformulação da equipe americana, que nos últimos três anos se submeteu a uma engenharia reversa, levando-a de encontro ao basquetebol que não praticavam, e que para tanto, se curvou à uma liderança universitária, num trabalho preciso e minucioso, onde foram quebrados e enterrados certos dogmas do basquete profissional, este mesmo adorado e incensado pela claque tupiniquim, como os pivôs colossais, com suas perigosas e secretas dietas de engorda, seus quatro armadores de alta qualidade em vez dos dois tradicionas nas formações das equipes da NBA, e seus alas-pivôs extremamente rápidos, ágeis e pontuadores, assim como reboteadores poderosos.

Houve um momento em que o nosso Pacheco, juiz internacional, os orientou nas regras da FIBA, principalmente nos embates físicos. E nessa Olimpíada, já não vimos o desfilar de desqualificados com as cinco faltas pessoais dos campeonatos anteriores, mas mesmo assim, ainda mantiveram a agressividade incutida no dia a dia de suas participações profissionais, principalmente no jogo final contra os espanhóis, que não se sabe bem por que critérios (O David Stern estava no local..), foram estes violentos contatos físicos liberados à margem das limitações impostas pelas regras da FIBA, beneficiando nitidamente o estilo defensivo dos americanos.

Ofensivamente, para enfrentarem as defesas zonais das equipes européias, exceto a espanhola que empregou sistematicamente a defesa linha da bola com marcação frontal dos pivôs, e que para a maioria de nossos analistas se caracterizava como defesa por zona (Revejam os tapes e constatem que os espanhóis esperavam os americanos na formação 2-3, logo desfeita para individual com flutuação lateralizada), foram obrigandos aos arremessos longos, no que foram razoavelmente felizes aliás. As penetrações foram bastante atenuadas, e quando concretizadas a força física se fazia presente pelos altos dotes atléticos dos mesmos.

No jogo de meia quadra, a similitude tática era evidente, com a movimentação permanente de todos os jogadores, muito diferente das ações setorizadas a que estavam acostumados no basquete NBA, em mais um ponto a favor do coach K.

E foram necessários três anos de trabalho para forjarem tal equipe, e principalmente, e ai está o pulo do gato, a constituírem com jogadores que se adequassem ao novo estilo, ao modo europeu e argentino de jogar, às regras internacionais. Muitas opiniões, recados, escalações e pitacos foram dados por aqui sobre o quem é quem da equipe americana, nas escalações e na ausência de seus preferidos, quando na realidade coach K. corria em busca de uma equipe que se mimetizasse em basquete FIBA, técnica, tática e em comportamentos. Somente pecou num porém, perfeitamente explicado pelas peculiaridades de seu país, principalmente quando o assunto é basquetebol, a questão racial. Creio que agora, depois do fantástico embate final olímpico, caia por terra esse tipo de discriminação ao jogador branco, pois ambos, negros e brancos provaram com sobras que jogar bem o grande jogo independe de raça, depende de técnica e talento.

A grande final em Pequim, capital de um país de mais de 1 bilhão de habitantes, de economia em expansão e grandes possibilidades de negócios, é visto como um mercado altamente promissor para o basquete NBA, mas este, frente à realidade incontestável da FIBA, fatalmente terá de se adequar às suas regras, ou uma adaptação que atenda as duas entidades, e pelo que vimos e constatamos com o projeto olímpico americano ora terminado com sucesso, e com a “liberalização consentida” dos contatos físicos somente embaixo das tabelas( muitas faltas foram marcadas nas cargas contra os armadores) testemunhados por todo o mundo que assistiu a final, creio ter sido dada a partida para uma unificação das regras, com dois sinais práticos já anunciados e referendados pela FIBA, o aumento na distância da linha dos três pontos em 50cm., e a formato retangular do garrafão nas medidas do basquete universitário americano.

Tenho a mais absoluta certeza de que dois fatores concorreram para a vitoria da grande equipe americana na final olímpica. Primeiro, a sua longa reformulação aos padrões do basquete europeu e argentino, e segundo, ao ensaio liberatório dos embates físicos embaixo das cestas que nitidamente os beneficiaram. E então fica a pergunta- Se estes dois pontos inexistissem, essa equipe, como as que a antecederam nos últimos quatro anos teria vencido a competição? Talvez sim, mas não com a facilidade encontrada até a espetacular final.

Agora mesmo muitos dos analistas se regozijam pela promessa de na próxima Olimpíada serem 16 os concorrentes, abrindo novas perspectivas a seleções como a nossa, quando deveriam concentrar seus esforços na busca do soerguimento do basquete entre nós. Se o coach K. pode com seu trabalho mudar uma estrutura comportamental e técnica de jogadores profissionais, porque nós não podemos ir um pouco mais além na procura de uma reformulação, não só técnica, mas, prioritariamente administrativa do nosso basquetebol? Que tal uma busca minuciosa pelos meandros das federações estaduais, questinando-as, criticando-as, cobrando-as, para que no próximo ano, nas eleições da CBB tenhamos a básica oportunidade de vermos em sua liderança pessoas comprometidas com o basquetebol, e não com suas finanças pessoais? Que tal questionarmos como foram empregues os mais de 30 milhões de reais de dinheiro público canalizados para lá por um COB que movimentou nos últimos anos mais de 600 milhões?

Fiquei feliz em ter assistido a grande final de Pequim, mas também entristecido pela ausência proposital e criminosa do nosso basquete no cenário mundial, mesmo reconhecendo que antes de para lá voltarmos, um longo e necessário caminho terá de ser traçado e percorrido, para que nossos jovens, nas escolas e nos clubes, tenham a oportunidade de terem como espelho valores brasileiros, e não ícones que sequer sabem que existimos.

Amém.



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