PRANCHETOBOL…
Não tinha presenciado nada igual anteriormente, mas sempre temos uma primeira vez, sempre. Quatro técnicos em torno de suas pranchetas, que bem poderia ser uma para todos, tamanho família, fornida e como sempre, ininteligível a olhares terrenos, com seus rabiscos aleatórios transcrevendo táticas e jogadas jamais repetidas dentro da quadra, apesar de todo esforço despendido por jogadores tensos, exaustos e ansiosos em conscientizar informações tão contraditórias e impessoais.
Ora, se as equipes são realmente treinadas nos sistemas a serem utilizados nas partidas, porque pranchetas insistem em demonstrar e projetar ações que declaradamente são produto de improvisações saídas das cabeças que as manipulam? Nessas finais da Liga das Américas, como numa conjunção de coincidências, as quatro equipes atuam rigorosamente iguais no sentido tático, e seus técnicos agem igualmente em suas direções, principalmente quando nos pedidos de tempo concentram-se única e exclusivamente nas projeções advindas do uso e manejo de suas indescritíveis e herméticas pranchetas.
Como resultado previsível de tão tosca liderança técnica, já se notam comportamentos similares entre jogadores de todas as equipes, os quais tendem a se retirar do banco antes que as canetas hidrocor terminem seus rabiscos nas pequenas, porém mágicas(?) superfícies. E nesse momento, gritos de hei, hei, momento, momento, ou just a moment, just a moment, ecoam em três idiomas na vã tentativa de recuperar uma atenção que no fundo, no fundo, jamais obtiveram seriamente, já que produto de devaneios e oportunismos descabidos.
Tornou-se moda a cena, que de tanto ensaiada se tornou uma triste realidade, de uma prancheta manipulada por mãos nervosas e desconexas, cercada de jogadores, assistentes e diretores, espetada de microfones e centradas em primeiro plano por ávidas câmeras, como se ali, naqueles momentos que valem muito dinheiro dentro de uma programação televisiva, se encontrasse a divina dama, a estrela maior, o ícone do basquetebol, abiscoitando seus minutos ( e são muitos, é só contar…) de fama que aumentam na medida da nulidade de quem as manejam, já que donas de uma personalidade própria e profundamente constrangedora do quanto ainda teremos de caminhar ao encontro do verdadeiro sentido técnico tático do jogo.
Que não estão contidos nos rabiscos e hieróglifos apontados, mas sim em torno dos mesmos, com suas exclusivas personalidades, com seus hábitos e gostos pessoais, com suas limitações e talentos, com seus desejos incontidos de orientações que calem fundo no âmago de seus seres, todos afastados e bloqueados daqueles que por obrigação tem o poder de atingi-los e liderá-los, mas que não o fazem escondidos que estão atrás de uma enganosa e trágica prancheta.
Inabilidade, despreparo, incerteza, duvidas, ou simplesmente cumplicidade com uma realidade até aqui compartilhada por todos, jogadores inclusive, na aceitação integral de um sistema único de jogo, aquele que garante seus empregos e colocações, globalizado e compartilhado em todas as categorias, da base às seleções, na qual a presença, estelar e centralizadora da prancheta colima a aceitação unânime e absoluta do que estamos vivenciando nos últimos vinte anos de limbo e derrotas.
Mas, sempre o bendito mas, algo sutil, embrionário, porém progressivo, na forma de um gesto de desagrado, como o de se retirar antes do termino das instruções, que é uma ação indisciplinada, deveria alertar os técnicos de que algo deva ser mudado, não a substituição de uma estrela por outra, e sim a volta da orientação dentro da lógica do jogo, de seus detalhes de fundamentos, dos comportamentos defensivos e ofensivos individuais e coletivos, que somados representam a produção do grupo, da equipe, de seus esforços na atuação conjunta e coesa, no incentivo e apoio psicológico, e não na exposição fria e ilusória de uma performance romanceada em traços coloridos numa prosaica, mesmo que estrela, prancheta.
Logo mais, na rodada final teremos mais uma sessão de estrelismo explicito, mas que pelo menos saibamos vencer o jogo real, e não o do pranchetobol.
Amém.
Achei um pouco exagerado seu comentário negativo sobre o uso das pranchetas, creio que o seu uso se faz necessário, nem sempre como a vemos, mas é um mecanismo que auxilia e muito nos tempos técnicos, o fato dos atletas não prestarem muita atenção é uma questão de pré-disposição dos mesmos, como interesse mútuo para decidir uma jogada vitoriosa deveria ser vista com mais atenção.
Como técnico de basquetebol que sou, as jogadas que desenho na prancheta são jogadas previamente existentes e nada do além, claro que necessitamos improvisar alguma coisa, porque não podemos prever 100% do jogo, mas daí criar um ambiente de despreparo é demais, nunca tinha lido nada do senhor e certamente será a última vez.
Sinto muito se não o terei mais como leitor, ainda mais se tratando de um técnico e professor como eu.Infelizmente não comungo o amor que você transparece pela prancheta, pois prefiro olhar dentro dos olhos de meus jogadores quando dialogo com os mesmos, em vez do monólogo criptografado em rabiscos desconexos e impessoais.Desejo sucesso a você,torcendo para que evolua a um patamar muito superior ao meu, que é o legítimo sonho dos mais experientes. Um abraço, Paulo Murilo.
Bom ! Não sou treinador ainda , tenho esse objetivo para meu futuro, e tenho buscado de todas as formas conhecimento para desenvolver tal função, mas comungo totalmente de sua ideia sobre as pranchetas. Pois entendo que uma jogada ou um sistema de jogo que tenha sido treinado na semana nao necessita de uma prancheta para explicar.
Um Abraço Luciano Ramos
Que bom ter seu apoio e compreensão em um assunto tão sutil como o uso de pranchetas, prezado Luciano.Se você se reportar ao comentário que antecede ao seu, atestará quão sensivel é a discussão sobre o mesmo,fato que o enriquece e o desenvolve através debate franco, aberto e honesto. Obrigado pela audiência e participação, e desejo sucesso em seu plano futuro ao lado das quadras.Um abraço,
Paulo Murilo.