GRITOS NA ARIDEZ…
Na imensa aridez do deserto de idéias realmente válidas para o basquetebol nacional, eis que uma, duas, três vozes se levantam para um protesto atrasado em vinte anos, durante os quais tudo de retrógado, ineficaz política e tecnicamente nos lançou num fosso do tamanho da omissão cometida.
Juntou-se à minha solitária peregrinação junto as consciências adormecidas de meus pares, exceto uns e efêmeros apoios, tímidos e fugidios, os gritos indignados do Ferreto e do Ângelo, técnicos experientes e competentes, que se revoltam contra a vinda de um técnico estrangeiro para o feminino, após serem todos os profissionais que militam nesta categoria taxados de incompetentes, atrasados e desatualizados pela direção técnica da CBB, incluso o Bassul, para o qual está reservado, quando muito, o cargo em uma seleção de novos, e tudo isso sob a garantia da convocação de uma jogadora que se negou publicamente e de livre vontade a defender a seleção durante um jogo de uma competição olímpica.
Seus depoimentos vem levantando muitas discussões no seio da mídia virtual, e também na tradicional, pois reacende situações a muito marginalizadas e dolorosamente esquecidas, como os movimentos associativos dos técnicos e da organização de uma escola de treinadores como continuidade ao trabalho e união dos mesmos.
Suas vozes nos chamam a atenção de que já se fazem tardios movimentos de integração e união de interesses que visem soerguer o grande jogo, assim como, valorizar e referendar a importância dos técnicos nacionais em todo o processo de ensino e aprendizagem dos jovens, além, é claro, da orientação técnico tática das equipes e seleções do país e de uma escola que representasse a vontade e orientação de todos.
Diagnosticar o pretenso atraso com afirmações de que os técnicos não viajam ao exterior para se reciclarem, e não estudam idiomas para compreende-las raia ao absurdo, pois o monte de recursos públicos que desde sempre foram, e continuam a serem gastos em viagens e prêmios corporativistas, numa cornucópia de favores e benesses poderia, com sobras, financiar tais reciclagens após pequenos concursos classificatórios entre os técnicos, onde o mérito os premiariam por seus estudos e trabalhos apresentados, como fui premiado nos anos sessenta após ser classificado num concurso nacional para estágio em universidades americanas por sessenta dias.
Mas o silencio e a omissão comprada pelo favorecimento político dos técnicos fez prosperar a ascendência de elementos mais voltados a política de domínio federativo e confederativo, propiciando um prolongado e estéril período de vinte anos, quando todas as conquistas arduamente trabalhadas por gerações de grandes técnicos ( que gritavam muito…) se perderam no mar de mediocridade que nos assaltou, humilhou e minimizou no concerto internacional, com mínimas exceções, a começar pelo valente e teimoso basquete feminino, com seus princípios éticos e de tradições peculiares, mantido pelos técnicos e técnicas que hoje são taxados de incompetentes por uma direção que tudo amealhou técnica e profissionalmente, sob a orientação e comando dos mesmos.
Mas a força ainda incontrolável ( dia virá que a controlaremos, e os técnicos podem iniciar esse tempo…) pela busca dos resultados que mantêm e garantem políticos e apaniguados em seus “cargos de sacrifício”, leva de roldão o reconhecimento deste segmento técnico que se nega ao desaparecimento puro e simples, para dar lugar a estrangeiros que nada conhecem de nós, inclusive o idioma, e que por força de muitos dólares, ou euros, aqui aportam e aportarão com “obrigações” classificatórias, que para eles se tornam de somenos importância desde que a grana seja paga, grana esta que poderia ser destinada aos nossos técnicos, para se aperfeiçoarem e reciclarem, como trombeteia a CBB.
E o pernicioso silêncio de duas décadas parece que chegou ao bordo de uma zona onde o eco se faz possível, pois o silencio eterno gera a frieza glacial da insensibilidade, da morte em vida, do caminho sem volta.
A revolta destes técnicos, justa, presente e necessária, apesar de algo tardia, poderá de alguma forma reverter um quadro apavorante, o de perdermos definitivamente a fé em nos mesmos, a segurança e o respeito deste mundo de jovens que alimentam serem ensinados e liderados por um segmento que ainda, mesmo que de forma tênue, teima pela indignação, última manifestação de vida neste deserto de idéias, nesta imensa aridez que nos condenaram.
Que outros gritos se manifestem, corajosamente, em todos os seguimentos, do masculino ao feminino, da formação de base ao adulto, das seleções regionais às nacionais, e que do fundo de suas almas renasça a certeza de dias melhores, com muito trabalho e dedicação, respeito e estudo, muito estudo, desmentindo os arautos da desunião endêmica de que todos somos taxados, além, é claro, de desatualizados e incompetentes.
De minha humilde trincheira continuarei externando o urro de indignação que emito desde 1956, quando conheci e amei o grande jogo, e pelo qual jamais me neguei a lutar, mesmo que o preço da independência tenha sido brutal e muitas vezes injusto. Mas tem sido uma boa luta, a qual me honra participar.
Que os deuses inspirem os técnicos brasileiros, nesta hora de decisão, neste momento de gritar com as forças do coração e do bom senso.
Amém.
PS- Dedico esta coluna ao Montenegro, que ontem nos deixou, cujo exemplo de luta e personalidade única inspirou a muitos técnicos numa época em que eram mais unidos. Saudades e muito respeito. PM
Paulo estou triste em ler a noticia sobre o monete negro – felizmente como infanto-juvenil e juvenil tive a felicidade de ve-lo jogar e treinar – ele nao so era uma excelent pessoa como tambem deixou a sua marcana historia do basquetebol do flamengo.
Em relacao a sua coluna. Alguns dias atras estava assistindo a tv globo internacional e vi a entrevista da Hortencia – e realmente triste – espero que isto venha unir os nossos tecnicos de uma forma que possa o respeito ao profissional ser resgatado.
Infelizmente a CBB nao considera nos tecnicos brasileiros que estamos militando no exterior pois nunca fizemos parte de panelinhas – ou de grupos que controlam o basquetebol brasileiro. acho que a Hortencia deveri sim dar uma olhadinha no exterior e observar o nosso trabalho pois aqui fora nao ha como enganar pois se perdemos e por sermos estranegrios na semana seguinte estamos fora!
Sera que os meus 20 anos militando no exterior e 8 livros publicados nao contam? – Aqui nao ha como ser enganador e nao sou sobrinho ou filho de ninguem — hahahahahah
Ate breve – professor
Mas como você pode atestar, um único comentário após a publicação do artigo veio de fora do país, o seu Walter, que ao não ter vinculação politico esportiva com os mandatários da terra mantém incólume sua independência de agir e pensar.
A pior das situações que incide sobre uma comunidade profissional é a do medo de se expressar, a de ver reduzida sua participação no mercado de trabalho, na direção de bons clubes, medo este restritor ao livre arbitrio, ao livre pensar. E a situação dominante, sabedora e controladora desta realidade jamais abrirá mão do dominio coercitivo. Cabe à comunidade reagir e se rebelar ante grilhões que somente beneficiam os oportunistas e os beneficiários do poder. Mas para tanto, a coragem cívica da maioria deve superar a coragem de uns poucos idealistas voltados ao bem comum.
Ainda teremos de amadurecer muito antes de vermos idéias e ideais superarem os indignos. Um abração Walter, e lembremo-nos com carinho em nossas orações o grande Montenegro. Paulo.