O GRANDE E VERDADEIRO IMPASSE…

Estamos em plena temporada, com as ligas masculina e feminina a todo vapor, assim como as divisões de base em suas federações, e mais do que nunca uma discussão tem estado presente em todas as mídias especializadas, o  futuro técnico da modalidade, a sobrevivência do grande jogo entre nós.

Aos poucos, os campeonatos vão encontrando suas formulações dentro da nossa realidade e de nossas limitações econômicas, com a predominância daqueles estados mais tradicionais no basquetebol, mas também em outros que se apegam na tradição e no amor de alguns abnegados, que não deixam morrer o jogo de suas vidas. Tenho recebido muitos relatos e notícias vindas das mais longínquas fronteiras de nosso imenso país, todas voltadas ao soerguimento e a manutenção do outrora segundo esporte no coração e na mente do povo brasileiro, e isso, por si só, nos enche de esperanças em dias melhores.

No entanto, vejo como entrave gigantesco a essa perspectiva renovadora, o maior de todos os nossos problemas, a mesmice coloidal que nos escravizou e colonizou técnico taticamente a um sistema único de jogo, calcado numa forma também única de jogar, com regras especificas e contrarias às estabelecidas pelo restante das nações sob a égide da FIBA, o sistema NBA.

Essa é a grande encruzilhada em que nos encontramos depois de décadas de subserviência técnico tática, quando a grande maioria de nossos técnicos abraçou o modelo prét a pôrter de consumo imediato e sem maiores elucubrações mentais, padronizando e formatando um sistema único de jogar, sem maiores implicações técnicas, mas esquecendo o básico, o primordial, o fato de que tal maneira de jogar e que privilegia as ações individuais, o 1 x 1 sistemático e contínuo, tem como suporte estratégico, toda uma estrutura de base, das escolas às universidades americanas, no fornecimento contínuo de matéria prima para o consumo, e a ser consumida, fator inexistente à nossa realidade desportiva.

Recentemente o técnico Magnano declarou que urge deixarmos de jogar pela formula NBA, tendo sido levado um pouco mais a sério do que se tal citação partisse de um técnico tupiniquim, mas que mesmo assim soa como um alerta na busca de outras perspectivas técnico táticas, de outras soluções mais caseiras.

E uma boa reflexão poderá ser estabelecida numa simples troca de comentários aqui no blog, quando do artigo Outras Notas,  entre mim e o leitor Ricardo, onde tão importante colocação pode ser avaliada:

  • Ricardo 13.10.2010 ·

Caro Prof. Paulo Murilo,

Tenho muito apreço por sua forma de pensar o basquete, servindo como contraponto ao que é amplamente difundido. Contudo, apesar de eu não ser um letrado nas minúcias do esporte, dou-me o direito de discordar do senhor em alguns aspectos no que tange a atual situação do basquete nacional.
Apesar da prevalência do modelo usual de jogo entra as equipes, vejo alterações sensíveis na forma de jogar de várias delas no cenário nacional, as quais tentarei expor sob meu ponto de vista:
– equipe de Brasília: atual campeã nacional, conquistou o título principalmente pela polivalência de alguns atletas, como Giovanoni e Alex, capazes de atuar em várias “posições”, conseguem quebrar os esquemas defensivos de seus oponentes;
– equipe do Flamengo: nos últimos anos tem apostado em 4 atletas altos e leves alternando posições, com o quinteto sendo completado por um homem forte na posição 5.
– equipe de São José: atual campeã paulista, tem na versatilidade dos jogadores uma grande arma, jogando com 2 armadores o jogo todo, e contando com alas altos jogando tanto dentro quanto fora do garrafão, completando um quinteto com um pivô leve.

Apesar de ainda ser evidente em vários casos a limitação técnica dos quintetos, vejo neles uma forma de jogar mais parecida ao que o senhor prega do que com o esquema usual de jogo.
Todas essas formações se baseiam, e neste ponto concordo com seu ponto de vista, no bom domínio dos fundamentos do jogo por praticamente todo o time, ou ao menos vários dos seus integrantes, chegando ao ponto de em várias situações a armação estar a cargo de um jogador de 2,0 m de altura.

Obviamente, este é meu ponto de vista. Aguardo ansiosamente sua resposta, contribuindo para o debate.

  • Basquete Brasil 13.10.2010 ·

Prezado Ricardo, se você tem acompanhado artigos anteriores em que discuto e critico o sistema único de jogo, não pode deixar de considerar que:
– Desde muito tempo venho defendendo a utilização de dois armadores em nossas equipes de elite, e claro, nas de base também.
– Que de dois anos para cá algumas equipes tem se utilizado dos dois armadores, mas em nenhum momento modificaram suas formas táticas de atuar, continuando no sistema único, acrescido de maior qualidade técnica pela presença de jogadores com melhores fundamentos, no caso, os armadores, só que um deles adaptado à função de um 2 ou 3(na nomenclatura vigente e genérica), mas dentro do formato e das jogadas do sistema, vide os “punhos”, “polegar”, “hi-lo”,”pick and roll”, etc, utilizados por todas as equipes.
– Sempre afirmei que numa mesmice granítica desse porte, onde todos atuam taticamente iguais, venceriam as equipes que possuíssem em cada posição de 1 a 5, os melhores jogadores, os mais caros, os mais habilidosos, e por conseguinte,formando as melhores equipes, dando uma falsa idéia de conjunto afinado e uníssono, quando na realidade se tratam de uma constelação de solistas, um em cada posição.
– E a grande maldade desse sistema, todo ele produzido para os solos estelares das competições da NBA, é a quase absoluta ausência, no nosso caso em particular, do jogo no perímetro interno, já que as “estrelas” dos três pontos não permitem que as bolas que avidamente disputam, cheguem naquela zona de jogo, daí nossa crescente fraqueza de homens altos de qualidade.
– Quando propus algo diferente na direção do Saldanha, consegui provar, ganhando inclusive de grandes equipes, que poderíamos jogar de uma outra forma além do sistema único, sem jogadas marcadas e previsíveis, sem concentração no jogo externo, e sim dividindo-o igualmente em ambos os setores, propiciando maiores oportunidades a todos os jogadores, altos e baixos, de fora e de dentro dos perímetros, e principalmente, interessados em suas performances através o treinamento e a pratica indistinta dos fundamentos do grande jogo.
Enfim Ricardo, creio ter podido provar num breve espaço de tempo que podemos alçar vôos maiores do que o estratificado e altamente previsível sistema único de jogo.
Um abraço, Paulo Murilo.

Quando reitero continuamente da necessidade de mudarmos nossa forma de jogar, indo, inclusive às quadras, para exemplificá-la, tento lançar um repto, um desafio aos nossos bons técnicos, para que abandonem o modelo que nos lançou ladeira abaixo no cenário internacional, e mais propriamente aos da base, da formação, que ousem criar, que ousem tentar algo além do que nos é imposto a mais de vinte anos, que invistam maciçamente nos fundamentos, e que, ao inicio de mais um curso de 4 dias presenciais e demais virtuais, promovido pela ENTB, e voltado aos jovens técnicos, onde serão orientados à continuidade de uma padronização e formatação do modelo atual, certamente o único que o corpo docente aceita, haja vista os cursos de atualização da CBB, onde coerentemente vêm estabelecendo a continuidade deste coercitivo  modelo, pelo país em seu todo, exijam maior diversidade, acesso democrático às diferentes formas de treinar, dos fundamentos às formulações técnico táticas, e não se deixem seduzir a aceitar padrões e formatações voltadas aos interesses do que ai está determinado,  plenamente estabelecido, lembrando desde sempre, que dependeremos destas mudanças para alcançarmos padrões aceitaveis na formação de uma geração apta à participação olímpica em 2016, e tendo como apreciavel reforço a plena discordância do bom argentino frente ao atual modelo. Espero que o ouçam.

Amém.



4 comentários

  1. Diego Felipe 14.01.2011

    Professor, mais uma vez corro para cá para aprender mais sobre tática e técnica, relativas ao basquetebol. Mas o que me traz, essa vez, é a vergonhosa série do tão aclamado Campeonato Paulista, onde estávamos reduzidos a um jogo tal qual costuma jogar com meus amigos, quando abaixávamos a tabela e passavamos a contar somente os pontos provenientes dos arremessos de três pontos e as enterradas, com o intuito de satisfazer a ‘sede’ por essas jogadas, já que em jogo não tínhamos capacidade para alcançar o aro, e evitávamos os arremessos de três, por sua ineficiência. Mas o que venho aqui mostrar é como o último jogo foi decidido: com uma simples bandeja, proveniente de um passe rápido para a zona próxima ao aro, onde o jogador, em vez de tentar a ‘enterrada’, fez uma simples, porém eficiente bandeja, que decidiu o jogo. Quem sabe se o jogo executado assim desde o começo não tivesse resultado em um embate mais empolgante do que o espetáculo(?) de três pontos. É uma pena, professor, ver conhecidos meus, mais novos (tenho 19 anos), na faixa de seus 12, 13, 14 anos, que iniciam agora, em um desespero para aprender a arremessar de três e enterrar, enquanto mal sabem driblar uma bola, ou correr pela quadra com a mesma, erram passadas em bandejas e perdem bolas fáceis. Onde iremos parar, professor?

  2. Basquete Brasil 14.01.2011

    Vislumbro dias melhores prezado Diego, disso não tenho dúvidas.Se jovens como você já vislumbram outros tempos, outras situações, melhores e mais eficientes técnicas, nada nos impedirá de avançarmos para um futuro promissor e mais justo.
    Estou na grande(pequena?..)reta de minha vida, lá se foram 71 anos de aprendizagem e de lutas, mas quando vejo jovens como você propugnando mais e melhores condições de técnicas, de vida, de educação, me sinto recompensado pelo que tento, na medida de minhas possibilidades, transmitir o pouco que sei.
    O país assim representado, tem enormes possibilidades de evolução, seja no campo que for, e o grande jogo esta incuido nesta certeza.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  3. Ariádine 17.08.2012

    Espero que tudo seja como vcs sonharam.

  4. Basquete Brasil 18.08.2012

    Amém, prezada Ariádine, amém.
    Um abraço, Paulo Murilo.

Deixe seu comentário