UMA QUESTÃO DE FUNDAMENTOS…

(…) O AIS é uma instituição importante para os jovens do esporte do país (e não só no basquete, mas também na natação, no atletismo, no vôlei etc.). Falando da nossa modalidade, posso te garantir que é o melhor lugar da Austrália para quem quer se desenvolver no basquete, pois os treinos são com os melhores técnicos possíveis e com uma estrutura que assusta de tão boa que é. Para ser sincero, é praticamente impossível você não melhorar por lá como pessoa e como atleta, e é um orgulho imenso para mim representar o trabalho do AIS em competições internacionais. E, sim, como você mencionou, ele é responsável por “produzir” talentos aos montes. A Elizabeth Cambage (que hoje joga na WNBA pelo Tulsa Shock) foi a última da fornada deles.(…)

( Trecho da matéria publicada pelo jornalista Fabio Balassiano no blog Bala na Cesta, em 5/6/11, com o jogador Anthony Drmic da seleção australiana sub-19).

Eis uma robusta pista dos “porquês” de uma equipe solidamente preparada na base, cometer 8 violações num jogo duríssimo de mundial, e nossa equipe o fazer em 20 oportunidades, sendo que nossos armadores foram responsáveis por 9 das perdas de bola, números incompatíveis na posição que ocupam, pois os australianos nos roubaram 15 bolas, perdendo 3 para os nossos, numa desproporção até certo ponto assustadora, e anulando a supremacia que obtivemos através 44 rebotes, contra 37 dos mesmos.

Claro ser impossível uma análise técnico tática do jogo pelo não televisionamento, mas o placar baixo pela média do campeonato até aqui ( 63 x 57), deixa claro ter sido um jogo de fortíssima pegada defensiva, fator determinante na importância vital do pleno domínio dos fundamentos, principalmente o drible, as fintas e os passes, básicos nas progressões e nas articulações de jogadas sob intensas pressões.

Falar dos arremessos então, se torna repetitivo, monocórdio, pois teimar na aventura dos “gatilhaços” de três (2/17), quando bastariam trocar 4 dos 15 perdidos por tentativas de dois pontos para vencer a partida, soa como um solitário grito num deserto de idéias, de bom senso, de liderança enfim.

(…) posso te garantir que é o melhor lugar da Austrália para quem quer se desenvolver no basquete, pois os treinos são com os melhores técnicos possíveis (…), ou seja, lá encontram os melhores formadores, as melhores didáticas de ensino, o melhor acompanhamento técnico prático, aprendem a conviver, dominar e se relacionar com a bola e sua instabilidade esférica, tornando-a extensão de seu corpo, garantindo uma melhor submissão e domínio da mesma em situações extremas, daí resultarem perdas menores, além, muito além de aprenderem a amar o jogo, ao contrário de nossos jogadores, jamais submetidos nos últimos 20 anos aos ensinamentos ( sim senhores, e-n-s-i-n-a-m-e-n-t-o-s…) de nossos melhores mestres na arte dos fundamentos, mas atulhados de sistemas, jogadas marcadas, sinalizadas e coreografadas em minúcias ( vide foto acima do Raul no jogo de hoje…), por uma turma de “estrategistas”, como se comandassem bonecos e seus cordéis, num arremedo de basquete, e não do grande jogo.

Sei que errar faz parte do jogo, mas não em tal quantidade perante defesas mais fortes, que se avolumarão mais adiante quando do afunilamento da competição, quando terá de se fazer presente o domínio dos fundamentos, sem os quais, chifres, punhos, polegares, cabeças, camisas, e todo um corolário de “estratégias” e coreografias se esfacelarão por não driblarmos, fintarmos, passarmos, defendermos e arremessarmos com a mesma eficiência de nossos bem fundamentados adversários. Talvez, quem sabe, possamos até nos medalharmos na competição, afinal de contas ainda nos restam resquícios de nossa tradicional combatividade e capacidade de improvisação, de talento, apesar das limitações básicas, e também porque ainda existe quem acredite que alguns dos deuses torcem por nós, e assim, quem sabe…

Prefiro, como professor e técnico, acreditar e torcer para que os grandes e verdadeiros formadores de jogadores existentes no país sejam resgatados, para que num grande mutirão ajudem eficientemente a soerguer o grande jogo entre nós, pois se assim não agirmos, dificilmente teremos convenientemente preparada uma geração para 2016, que jogue, entenda e ame basquetebol, e não se deixe levar por rabiscos desconexos nas pranchetas da vida.

Amém.



2 comentários

  1. Henrique Lima 06.07.2011

    Triste viu, Professor.

    No primeiro problema sério que encontramos no Mundial, cometemos os mesmos velhos erros.

    Será que nunca estaremos preparados ?

    Reconheço minha empolgação após o jogo contra Letonia, que mesmo com erros, conseguimos atuar de uma forma boa e mais inteligente. Enfim, deve ser que faz tanto tempo que assisto o time adulto jogar de uma maneira tão irresponsável que qualquer time brasileiro que comece a jogar pelo menos um ataque mais sereno, me cative mesmo.

    Hoje foi triste ver que a idéia de que poderíamos estar no caminho certo, bem, foi cortada de forma cruel para um: não estamos. No primeiro desafio, contra uma escola mais do que conhecida por nós, com soberania nos rebotes ofensivos e no garrafão, com total possibilidade de fazer o jogo correto, voltamos à estaca zero dos chutes de três pontos sem sentido, dos ataques sem movimentação, da defesa frouxa contra bloqueio direto, da perda de rebotes decisivos, da falta de organização ofensiva e defensiva.

    Enfim, um sem número de erros que estamos acostumados a ver (infelizmente acostumados) sempre que o desafio é um pouco mais complicado.

    A velha bola de três. Acho que a única vez que caiu para nós foi mesmo na final do Pan-87. A partir dali, a tática do desespero, a exceção milagrosa que deu certo uma vez, parece que virou regra para o Brasil. O MÃO SANTA individualista, sem jogo coletivo, o cara do EU em primeiro, segundo e terceiro lugar, parece que sempre guiou o pensamento de todas as outras gerações posteriores, parece ter sido o exemplo que sobressaiu nestes últimos vinte, vinte e cinco anos. Eu não entendo como utilizar a exceção como regra. Só aqui mesmo.

    É Professor, mais uma vez, mais uma tarde que o basquetebol brasileiro afunda um pouco mais. Como é possível cair mais já estando no fundo do poço ?

    Desanimador Professor, mas não podemos desistir.

    Hoje foi duro ver o final do jogo sem ficar chateado.

    Um abração!

  2. Basquete Brasil 06.07.2011

    Nada do que ocorreu nesse mundial escapou do que previamos de longa, longuissima data, Henrique. Concordo com sua explanação, inteiramente, mas confesso que a mesma não me surpreende, a não ser a constatação de que nada mudará tão cedo em nossas seleções, em nossas equipes da LNB, em nossos sistemas de jogo, nas mentes de nossos técnicos, pois um nicho salarial tem de ser mantido e defendido a todo prêço, onde novidades e ousadias o poria em serios riscos, pois investimentos em cultura basquetebolistica teriam de ser feitos, a um prêço que se negaram, negam e negarão investir desde sempre. Lamentável Henrique, dolorosa realidade.
    Um abraço, Paulo.

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