O REINADO DAS “BOLINHAS” VIII…

Todos louvam a valentia, a coragem e o brilhantismo da classificação do Pinheiros para a próxima etapa do Sul Americano, conquistada no Equador com uma cesta de três pontos no segundo final da partida contra a equipe venezuelana do Centauros, cesta essa convertida pelo cestinha do jogo com 34 pontos, Paulo Boracin.

 

Se proposital ou não, como num consenso corporativo visando o interesse comum, liga, analistas e blogs constituem uma unanimidade em torno da conquista, não importando como foi alcançada, se com técnica apurada ou sem ela, bastando o fato único de ter vencido, ponto.

 

Mas algo preocupa enormemente, algo que aos poucos vai se estabelecendo no âmago do grande jogo em nossa liga maior, e sequer mencionando a ditadura do sistema único, e sim a legitimação do reinado das bolinhas, com as quais pretendem muitas, ou a maioria, de nossas equipes de elite estabelecer o padrão técnico comportamental a ser seguido, imitado e divulgado desde sempre, como a nossa concepção básica  de jogar.

 

Inacreditável o que está sendo perpetrado em nossas quadras, com a sedimentação de uma orgia de arremessos de três, onde a nova geração de jogadores se esmera na cópia da mais canhestra das ações ofensivas, a do arremesso de fora, aquele que o isenta de dribles, fintas e penetrações arriscadas, por serem exigentes em sua técnica aprimorada, principalmente pelos mais altos, destinando aos armadores, mais técnicos pelas ações e habilidades que possuem, funções de pontuadores maiores de suas equipes, numa inversão quase absoluta de papéis exercidos dentro da lógica do grande jogo, onde a proximidade da cesta confere aos arremessos maior precisão e confiabilidade.

 

Tal tendência, que vem se estabelecendo em velocidade galopante, originou a temível convergência, onde arremessos de três tendem a se aproximar em numero de tentativas aos de dois pontos, o que tem ocorrido em inúmeras oportunidades, e até a ultrapassá-los.

 

Foi o que ocorreu neste jogo decisivo, com a equipe do Pinheiros estabelecendo 10/35 nos arremessos de três, contra 19/31 nos de dois pontos, enquanto pelo lado venezuelano os índices foram 5/14 e 21/48 respectivamente, tendo essa mesma equipe atingido o péssimo aproveitamento nos lances livres, com um contundente 24/40, errando propositalmente um segundo lance livre nos segundos finais do jogo, quando poderia ter estabelecido uma diferença no placar que a favoreceria, fato incompreensível a todos os presentes no jogo.

 

Mas Paulo, a vitoria era o que interessava naquela altura da competição, não importando como ela viria, ou não? Concordo que vencer era, e sempre será o objetivo a ser alcançado, e bastaria a equipe paulista ter trocado a metade das bolinhas perdidas (no caso 12 delas) por tentativas de dois pontos, principalmente visando seus bons pivôs, para terem vencido por uma margem confortável, a uma equipe medíocre e falha como a do Centauros, atitude negada aos mesmos, que como opção de participar ofensivamente arremessaram um 2/6 de três, agindo ao inverso de suas reais funções dentro do perímetro interno.

 

Mesmo seus dois maiores pontuadores pecaram gravemente nas tais bolinhas, com o Boracin e o Smith efetuando um 3/8 para cada um. Alas como o experiente Marcio (1/6) e o jovem Lucas (1/4), também colaboraram para que a equipe paulista alcançasse o absurdo número de 35 tentativas de três, contra 31 de dois pontos, um índice que demonstra claramente o desprezo pelo trabalho de seus pivôs como peças importantes dentro do perímetro, substituindo-os pelos armadores como finalizadores básicos, opções estas bem mais fáceis de serem defendidas por equipes bem treinadas e de qualidade, do que um forte jogo interior.

 

Os minutos finais do jogo bem demonstraram que a opção do jogo externo para os longos arremessos, e as esporádicas penetrações, teriam como solistas os armadores, sobrando para os alas e pivôs as funções de rebotes e defesa, opção esta que retirou da equipe, pelo menos para esse jogo, seu forte jogo interior, provocando um falso equilíbrio ante a mediocridade da equipe venezuelana, ela mesmo que forçou bem mais o jogo interno (24/40 nos lances livres, bastando ter convertido a metade dos perdidos para ter vencido) e menos o externo (5/14 nos de três pontos).

 

Falta a equipe paulista o que sobra no outro classificado da chave, o Obras Sanitárias da Argentina, o saber qual momento de arremessar, e qual tipo de arremesso, principalmente os mais seguros e confiáveis, os de dois pontos, além, é claro, de contestarem os arremessos contrários, fator defensivo que decide partidas, e que é tão excludente nas equipes brasileiras. Mas isso é outra história.

 

Enfim, e apesar das falhas e carências gritantes, se classificaram, mas terão de aprimorar o jogo coletivo, se quiserem chegar ao titulo continental.

 

Amém.

 

 

 

Fotos – Observem que nos minutos e segundos finais, bastariam cestas de dois pontos para fecharem a partida com segurança, mas mesmo assim a hemorragia dos três sequer foi estancada, com a plena condescendência da direção da equipe, num equivoco salvo por uma perda proposital e incompreensível de lance livre por parte da equipe venezuelana (foto final), e uma bola jogada para o alto no segundo final do jogo pelo Boracin… de três!

 

Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.



6 comentários

  1. Alexandre 13.10.2012

    Nossa professor realmente foi um jogo tecnicamente tenebroso por parte do Pinheiros, torci é claro para que saísse vencedor e com a diferença de 5 pontos que precisava para a classificação, por que como de costume sempre torço para a equipe que estiver representando o Brasil, mais confesso que fiquei com a sensação que mesmo se perdesse eu não ficaria chateado nem nada do tipo (e convenhamos era mais do que justo pelo basquete que estava apresentando), a insistência em bolas de 3 pontos e a falta de inteligência em algumas jogadas chega a ser constrangedor para quem esta assistindo, estou muito preocupado pois o Pinheiros esta em 1º no campeonato paulista que indiscutivelmente é o campeonato regional mais forte do País, e se esta em 1º apresentando essa mentalidade e esse basquete que foi jogado la no Equador é sinal que não estamos evoluindo em nada nos últimos anos talvez ate regredindo, e esse foi o ponto principal quando foi criado o NBB tentar evoluir e fazer o Basquete voltar realmente forte no Brasil, mais infelizmente estamos longe, estamos andando em círculos e o que é pior não pela falta de talento dos jogadores por que isso temos de sobra por aqui, e sim pela falta de comando fora das quadras (por isso repito o que já escrevi em comentários anteriores, acompanhei o ótimo Trabalho do Senhor no Saldanha da Gama e ainda espero ve-lo de volta comandando uma equipe aqui no NBB precisamos de profissionais com a qualidade do senhor, tanto profissional quanto cultural), só para encerrar acompanhei os jogos da Euro hoje e a diferença é gritante e temos que correr atras desse “prejuízo” o quanto antes.
    Um grande abraço professor, e me desculpe por esse texto tão extenso viu…ate mais

  2. Rubens 13.10.2012

    Paulo,

    Sendo muito otimista, não consigo crer que os técnicos treinem esse tipo de jogada a exaustão, seria muita falta de visão por parte deles (provavelmente devo estar errado). Parece mais uma falta de padrão de jogo e vício de formação dos jogadores brasileiros. Onde você acha que essa maluquice se origina?

    PS: Dei uma olhada nos números do segundo jogo entre Limeira e Paulistano pelo Campeonato Paulista, milagrosamente, o Limeira arremessou apenas 12 bolas de três durante o jogo inteiro, com aproveitamento de 67%. Teve uma vitória de mais de 20 pontos de diferença. Contrariamente ao primeiro jogo, em que o time do interior perdeu o jogo e tentou 25 bolas. O Limeira deve ter média de mais de 20 tentativas do perímetro no Paulista. Estou orando com todas as minhas forças para que o Demétrius tenha influência nisso e que seja o começo de algo. Vamos ver na semana que vem.

    Abs

  3. Basquete Brasil 13.10.2012

    Na realidade, prezado Alexandre, o nosso basquete não está regredindo, e sim estagnado e doente, e caminhará para a regressão se não acontecer algo de novo táticamente, o que provocaria uma evolução técnica, e quem sabe, uma retomada por parte do grande público, que se afastou pela mesmice endêmica que o mediocrizou. Concordo plenamente com você quando afirma que as grandes mudanças deveriam partir de fora das quadras, mas nesse ponto duvido que as mesmas ocorram com brevidade, pois o corporativismo é muito grande e poderoso. Trabalhos como o que produzi em Vitoria não são bem vistos pela irmandade, já que ameaçaria o status quo vigente, e neste caso, de nada valem o preparo profissional e cultural, e sim o Q.I. dos mandatários encastelados no poder decisório do desporto nacional, do basquetebol em particular.
    Mas daqui dessa humilde trincheira, continuarei a exercer o direito democrático de divergir, e a obrigação cívica de me indignar sempre que necessário. Aqui não podem me atingir.
    Comente sempre que desejar Alexandre, não importando a extensão de seu texto, que sempre será bem vindo. Um abraço, Paulo Murilo.

  4. Basquete Brasil 13.10.2012

    Prezado Rubens, basta bem observar as movimentações inerentes ao sistema único de jogo, para concluirmos que na maioria das vezes as intenções de arremessos visam os três pontos, logo, são de pleno conhecimento e aprovação dos técnicos da maioria das equipes da LNB. Como todos pensam e agem da mesma forma padronizada e formatada quanto ao sistema de jogo, o padrão de arremessos tende inexoravelmente à linearidade comportamental, onde viceja desde sempre a absurda hemorragia dos três pontos, vinda criminosamente da formação de base até à elite. Jogadores que fossem bem formados e treinados jamais abraçariam tal comportamento, e se o adotam é porque encontram guarida dos técnicos, simples assim.
    Se a equipe de Limeira alcançou um bom resultado privilegiando arremessos mais seguros e eficientes através lançamentos de dois pontos, parabéns, pois estaria no caminho mais correto em direção a um basquete eficiente e vencedor.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  5. Márcia 16.10.2012

    Boa noite, professor.

    Sou uma amante do basquete e adoro trabalhar com a base. Só que infelizmente tive que abandonar as quadras nesse momento, mas espero voltar em breve.
    Neste momento eu queria sua opinião no seguinte caso.
    “Uma técnica que faz parte da cúpula feminina, fez o seguinte:
    Seu time sub-17 perdeu uma partida fora de casa e ela ficou muito brava com situação, pois o time jogou muito mal. Ela simplesmente proibiu as meninas que moram na república de atletas de irem para casa, pois teriam o feriado do dia 15/10 para visitarem seus parentes. Só 4 garotas foram punidas pela equipe toda.” Eu pergunto o que está acontecendo com nosso basquete? Qual a sua opinião para esses casos.

    Abraços

    Márcia

  6. Basquete Brasil 17.10.2012

    Olha, prezada Marcia, é de lamentar ocorrências como essa relatada por você, pois representam um perigoso retrocesso no processo educacional de um país, já tão carente e deficitário na formação de base realmente qualificada e responsável. A graduação de professores e técnicos necessita urgentemente de uma séria reavaliação e uma busca mais efetiva de objetivos a serem alcançados na formação dos mesmos. Fico triste com relatos como esse.
    Um abraço, Paulo Murilo.

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