CONTEXTUALIZANDO O “ZERO”…

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São poucos os blogs de basquetebol que abordam com competência o aspecto técnico e tático do grande jogo, e uma das necessárias rotinas para estarmos a par do que realmente se produz e comenta na modalidade é volta e meia dar uma navegada nessas mídias, onde florescem discussões, criticas e às vezes uma ou outra boa ideia voltada aos problemas inerentes a mesma. Mas algo entrava, e até prejudica todo e qualquer posicionamento mais sério, responsável, o fator anonimato, quase regra geral nos comentários aos artigos inseridos pelos autores e editores.

Então, percorrendo os blogs, encontrei um comentário, que pelo conteúdo e forma de escrever, deve ter sido postado por alguém do meio, técnico ou assistente novato, ou mesmo um preparador físico, todos pertencentes a uma geração, que com algumas, bem poucas, exceções, considera ter nascido o basquetebol concomitantemente ao seu próprio nascimento, fator excludente do que o antecedeu em formulação, estudo, pesquisa, resultados, tradições, e acima de tudo, história, pois para essa turma, somente o novo importa, somente o novo propiciará progresso e vitórias, resultados enfim, negando de saída o fator mais fundamental em qualquer atividade desportiva, o conhecimento, a experiência válida por ter sido vivida, a maturidade e o domínio da atividade longamente exercida e solidificada, onde o erro ocorre em muito menor número do que os cometidos pelos que se iniciam, exatamente por serem novos na lide, nas quadras.

Leiamos então o comentário em questão:

Fulano06

O basquete precisa de gente nova como o Gustavo do Paulistano… Chega de dinossauros dirigindo os times!!!! Tem muito conceito antigo em prática, pouca metodologia e controle nos treinamentos. As análises de jogos são todas, sempre, quantitativas… Não se vê uma análise contextualizada dos dados das partidas… Só se fala em aproveitamento de 3 pontos, passes errados, mas em que contexto se obteve esse aproveitamento? Foi chutando livre? Foi chutando pressionado atacando contra zona 3-2 pura ou 3-2 match-up, individual flutuada ou marcando linha de passe? E o controle das variáveis de carga em treino ou jogo? O basquete precisa de gente nova no banco, no escritório, na assessoria de imprensa, etc… Tem muita gente da época que não existia linha de 3 e a marcação sempre dava 2m de distância por aí…

Agora, contextualizemos para o jogo entre o Flamengo e o Brasília neste sábado na capital federal, onde, sem dúvida alguma pudemos testemunhar ao vivo e a cores alguns, senão todos, os fatores apontados pelo comentarista, quanto à liberdade, ou melhor, liberalização defensiva frente a enxurrada de bolinhas (22/53 para ser mais preciso), fossem ante defesas individuais ou zonais, mas que foram minimamente atenuadas pelo jogo interior da equipe carioca (20/46 de dois pontos, contra 17/39 dos candangos), que determinaram sua vitória, reforçada pelos 14/21 lances livres cobrados, contra somente 6/8 por parte de seu adversário, confirmando a força de seu jogo interior, que nem mesmo a grande exibição do armador Laprovittola, com seus 33 pontos pode relevar.

Contextualizando um pouco mais, vimos o quanto de precária se encontra a nossa condição nos fundamentos do jogo, fator básico para que “soluções táticas de prancheta” sejam realizadas com sucesso (?), vide os três erros sucessivos de passe, domínio do drible e da finta no minuto final da partida, por parte dos candangos, quando uma nova tática especial denominada “zero” foi para o espaço pelo simples fato do Guilherme ter perdido o domínio da bola ao tentar driblar a frente do armador argentino.

Todas as aferições acima apontadas foram vistas sob o ângulo quantitativo, onde a somatória de tantos erros leva a derrota, assim como, o desmedido e mal planejado exagero nas tais cargas em treino e jogos (afinal a turma tem de mostrar serviço…), tem desmantelado muitos jogadores e equipes, provando quão variáveis são aqueles “critérios científicos” utilizados sem o devido conhecimento de causa e basicamente, efeito.

Sem dúvida alguma o basquetebol, e todas as modalidades desportivas necessitam do jovem técnico, mas sob a gerência didática pedagógica, técnica, tática, física, mental e administrativa daqueles bons e calejados dinossauros (de preferência os Rex), para ensiná-los a trilhar os caminhos das pedras, lenta e paulatinamente, fazendo-os percorrer desde a base até a possível elite, estudando, pesquisando e trabalhando muito e muito, para um dia, através o principio do mérito, galgar as posições chaves, hoje ocupadas por muitos jovens com Q.I. político elevado, e que em alguns casos as utilizam na formação de suas equipes em clubes, dando continuidade a uma ação corriqueira nas duas últimas décadas, inchando currículos com títulos estéreis, mas contextualizados na triste realidade de nosso basquetebol.

Numa coisa ele tem razão, a não existência da linha dos três, mas vigorava o respeito aos mais velhos, ao conhecimento, a experiência, a vivência de luta e trabalho, e a fé na juventude respeitosa e ansiosa por saberes, ao contrario dessa que ai está, e da qual parece fazer parte, onde alguns tentam impor regras e comportamentos que sequer dominam, quanto mais vivenciaram.

Mas, o certo é que dias melhores hão de vir, para os jovens, e por que não, para os dinossauros também…

Amém.

Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.



8 comentários

  1. Carlos Alex Soares 26.01.2014

    DOUTOR Paulo Murilo, baita postagem. Destaco dois trechos de tua escrita por ser o básico que falta nessa juventude (humildade e respeito):

    “para ensiná-los a trilhar os caminhos das pedras, lenta e paulatinamente, fazendo-os percorrer desde a base até a possível elite, estudando, pesquisando e trabalhando muito e muito, para um dia, através o principio do mérito, galgar as posições chaves, hoje ocupadas por muitos jovens com Q.I. político elevado” e “vigorava o respeito aos mais velhos, ao conhecimento, a experiência, a vivência de luta e trabalho, e a fé na juventude respeitosa e ansiosa por saberes, ao contrario dessa que ai está”.

    Professor, o erro do Giovannoni foi consequência da falta de fundamentos dos jogadores de Brasília. A bola era de dois pontos. Lá dentro. Era uma linha de passe. Simples. Nada de drible. Mas aí, na tal circulação (zero) para desmarcarem-se os jogadores esqueceram que CORTA-LUZ (ou BLOQUEIO LEGAL) é uma movimentação que depende de quem espera e de quem está em movimento que deve induzir e levar o marcador para ter o segundo de liberdade que busca. Tudo isso falhou… Detalhe: só vi esses 4 segundos de jogo, liguei a tv no momento que o técnico circulava a caneta (zero) no garrafão e dizia para a bola vir embaixo – óbvio! – para 2 pontos e prorrogação. Não deu.

    Ah, quanto aos jovens, eles deveriam agir com respeito pelos dinossauros, com entusiasmo pelo aprendizado e com dedicação pelo nosso jogo. Com paciência, chega-se longe. Não é colocando a carroça na frente dos bois que vamos chegar mais rápido… Faltou ao jovem comentarista compreender que tudo esta relacionado ao QI mencionado em sua postagem, o que inibe e tolhe a liberdade de decisão dos técnicos.

  2. Basquete Brasil 26.01.2014

    Eita Carlos Alex, que bom que tenha gostado, já que nós dinossauros teremos de ser reextintos por essa gurizada assanhada e pouco afeita (ou educada)aos princípios da disciplina profissional e da ética, fatores indissociáveis do longo e penoso processo da aprendizagem e do comando. Até lá, sobrevivamos com muito estudo, trabalho e imensa paciência frente ao burburinho adolescente dessa turma.
    Um abração, Paulo.

  3. Jose 26.01.2014

    Belo texto professor, pena que a maioria dos jovens sequer entendam o que o senhor escreveu.
    A grande maioria não tem sequer conhecimento básico nas escolas para entender ou se fazer entender por escrito. A não ser aquelas palavras que só eles entendem, padrão bate-papo de internet.

  4. Basquete Brasil 27.01.2014

    Se não entenderem José, jamais servirão ao magistério, à técnica, ao comando, pois são principios inalienáveis da profissão. Mérito é alcançado com estudo, pesquisa e muito trabalho. Q.I’s pela política servil, pelo corporativismo, tendo como resultado as derrotas e o desperdício de verbas oficiais e privadas. Aos poucos esse sinistro véu será descoberto, através os cada vez mais pífios resultados alcançados.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  5. Henrique Lima 31.01.2014

    Professor,

    um problema grave que eu vejo é que os técnicos mais experientes que estão no NBB, como Cláudio Mortari, pararam no tempo. Então dá a impressão que todos os mais experientes pararam junto com ele, o que não é verdade, claro.

    E profissionais que tem gabarito e estão antenados ao mundo atual, como o senhor, Wlamir Marques, Amaury Passos (para citar três que tenho conhecimento) continuam sendo sabotados por aqueles que enfiaram o nosso basquetebol no lixo nas últimas duas décadas.

    Aí não adianta. Tem que ser amiguinho de A, B ou C para conseguir emprego. Tem que dar tapinha nas costas e sorrisinhos de canto de boca para aplaudir certos caras que não tem menor nível nem para conversar, o que dirá para treinar um time profissional ou jovens.
    Tem que se submeter a métodos e posturas que vão contra qualquer coisa lógica e inteligente.

    Em um país sério, não aqui, todos os citados por mim estariam nos grandes clubes, nas federações e confederações participando e ajudando, principalmente nós, treinadores mais jovens e com tantas questões e claro, inexperientes no jogo e na vida.

    Afinal, para os treinadores que estão hoje no meio, os cursos de 36 horas do nível I, II e III (custo de uns 300 reais) são o máximo que podemos esperar de troca de conhecimento com os que estão na elite !! 36 horas !!!!!!!! Só alguém muito genial para achar que isso responde qualquer coisa.

    Sobre o nosso jogo:

    Eu nunca vi times marcando tão mal como vejo no Nacional aqui.

    O NBB tem todos os maiores exemplos do que não se deve fazer dentro de quadra e são exemplos que sempre anoto e faço questão de lembrar para evitar repetir em treinos e conversas sobre basquetebol !

    Defesas frouxas, passivas, rotações horríveis, buracos escandalosos, chutes sem o defensor ao menos tentar contestar, postura defensiva inexistente, caras marcam parados e em pé o tempo inteiro. Pouco se fala na quadra, se orienta, etc.

    Não existe ataque que tenha movimento fora da bola, fintas de corpo não existem, corta-luz idem. Somente se joga com a bola, driblando em demasia, perdendo tempo e chamando bloqueios diretos na cabeça do garrafão para um chute de três irresponsável que é aplaudido por muitos por aí, como “modernidade”. (mesmo que o cara chutando dos confins da quadra faça apenas 37% das tentativas quando o jogo interno responde por uns 55, 60% de aproveitamento).

    Domínio da mão não-dominante ? Inexiste.

    Dribles com maior grau de dificuldade ? Inexistem.

    Porém, o senhor e alguns outros que tanto poderiam nos ajudar se bem utilizados por qualquer administrador pensante, estão fora do mercado. Inexplicavelmente uma geração de técnicos que viveram o nosso melhor momento como modalidade, estão vivo, aptos, lúcidos, ansiando ajudar, ESTÃO FORA DO ESPORTE QUE FIZERAM A VIDA INTEIRA!!!
    É um absurdo completo.

    Ficam claro, os que dão tapinhas nos ombos, sorrisinhos, etc.

    Quando treinei a Universidade Federal de Viçosa e o time da Prefeitura Municipal de Viçosa, o que eu queria, era poder ter um treinador mais experiente ao lado, para eu como auxiliar aprender ao máximo. Porém, como aqui não se dá valor para isso, com 23 anos tinha que criar do nada alguma coisa. Claro que as chances das coisas serem infinitamente mais difíceis e dos erros acontecerem em proporção gigante é maior. E claro, isso foi ocorrendo ao longo da gestão.

    Tenho muita pena do nosso basquetebol. Ainda mais da ENTB,que tenta responder questões porém fazendo as questões erradas, tendo o suporte de profissionais que nos últimos 20-25 anos empurraram pro limbo o nosso basquetebol mas não aceitam esta realidade.

    Estamos tão mal que já perdemos de Chile e Uruguai na base!!!!!
    Onde vamos parar ?! Perdendo da Bolívia e Paraguai ?!?!

    Quem sabe, Professor, quem sabe um dia a gente possa viver momentos mais felizes no nosso basquetebol do que os atuais. Quem sabe !

    E isso porque estamos falando só do basquetebol masculino e ênfase no adulto.

    Se formos começar a falar algo do feminino (enterrado pela Rainha), simplesmente veremos que estamos muito pior do que imaginamos.

    E se pensarmos na base, onde deveríamos ajudar a formar pessoas
    (e claro, atletas para aquela parcela mínima que tem o talento/dedicação/aptidão), veremos que estamos num beco sem saída sendo comandando pelos que estão aí no poder faz tempo.

    Vamos tocando das nossas humildes trincheiras por dias melhores !
    Não podemos desistir embora, algumas vezes, o sentimento seja este.

    Um forte abraço !

  6. Basquete Brasil 31.01.2014

    Henrique, você foi fundo na ferida que a maioria quase absoluta da mídia e da turma que opina e comenta anonimamente nos blogs sequer enxerga, quanto mais entende. Recentemente o Edvar Simões bem definiu o “momentum” do basquete brasileiro com uma frase lapidar – Estão futebolizando o basquetebol no país – acertando em número e grau na grave crise de identidade por que passa o grande jogo, comandado por nulidades, e cercado de torcedores, que já já levarão o descalabro e as agressões para dentro dos ginásios, basta observar a crescente influência das “organizadas” no NBB. Mas merecemos tudo isso, Henrique, pela omissão e pelo comportamento pusilânime dos muitos que ostentam o comando do faz de conta. Porém, acredito que sairemos dessa camisa sufocante de força, pois caso contrário, nada restará do grande jogo no país.
    Um abraço, Paulo.

  7. David Barros 02.02.2014

    Muito bom texto, parabéns, fiquei chocado com o convite para Finlândia, eu achava que seria três europeus também, porque sempre que houve esses 4 convites chamaram de lá 3, achava que o Brasil brigaria com a China, confiando no Brasil, mas deixar a Rússia de fora, Rússia que foi Bronze em Londres ao ganhar da Argentina que tinha eliminado o Brasil, para mim foi um choque,

    abraço, Paulo.

  8. Basquete Brasil 02.02.2014

    Obrigado, prezado David, mas considere o choque bem menor em se tratando de uma transação puramente financeira, fato que afastou países que ainda se consideram desportistas, como China, Russia, Itália e Alemanha, que se negaram a participar desse triste comércio.
    Um abraço, Paulo Murilo.

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