O PACTO DA MEDIOCRIDADE…

Caminho com meu filho André da estação Rio 2 até a distante entrada do Centro Olímpico, recordando as inúmeras caminhadas durante as olimpíadas, roteiro agora praticamente deserto, imenso, inóspito. Transpomos o portão com dois funcionários, e nos deparamos com aquele infindável deserto rodeado pelas imensas construções desportivas, como que adormecidas, estéreis, megalonômas, inabitadas, abandonadas. Peço ao André que faça uma foto, essa aí acima, onde aquele pontinho distante, sou eu. Chegamos ao portal da Arena 1, e oito funcionários nos esperavam para, pasmem, nos revistar, e perguntar se a câmera que trazia era profissional, brincadeira…

Entramos na arena reduzida pela metade (as arquibancadas do meio  para cima foram retiradas), procuramos a entrada da arquibancada superior (assim definida no ingresso comprado pela internet), mas fomos direcionados para a inferior, motivados pela ausência de público que a preenchesse, ou seja, o público presente lotaria o ginásio do Tijuca, sem a necessidade de uma longa viagem a Barra da Tijuca, que castigou a todos na saída com uma chuva torrencial, a ser enfrentada na longa caminhada de volta até os transportes, ou seja, aventura digna de uma final de Mundial (?), com a presença fajuta de um bando americano que perdeu o primeiro jogo por mais de 30 pontos de diferença para o Flamengo…

Chegamos a tempo de assistir o quarto final da turma da matriz contra os argentinos, quando também perderam, de bem menos que na estréia, em sua vexaminosa participação, mas era a NBA, logo…

Uma hora e meia de intervalo (ainda bem que levei um jornal), quando começou o espetáculo NBA/FIBA da ocasião, com trôpegas e descoordenadas dançarinas funqueiras, canhões lançadores de camisas, mais funk e batidão em inglês nos níveis sonoros mais altos e agressivos, feéricas luzes, histérico apresentador bilíngue, para enfim, o jogo, com as comissões técnicas das equipes ridiculamente engravatadas para um evento desportivo, onde os trajes arejados e confortáveis se fazem necessário aqui nos trópicos, dentro e fora da quadra, num espetáculo caipira de “liturgia do cargo”…

E veio o jogo decisivo, entre o grego AEK e o Flamengo, equipe planejada e montada para conquistar todos os títulos disputados, num dos dois maiores investimentos da Liga, o outro é o de Franca. A liga sul americana já tinha ido para o espaço, jogada em casa, e agora a vez do Intercontinental secundário, dourado de mundial, que também sucumbiu. Não sou torcedor, nem tiéte de ocasião, e sim professor, técnico de basquetebol, e jornalista editor deste humilde blog, logo analiso técnica, preparo de equipes, táticas e estratégias voltadas ao grande jogo, sem enfeites e penduricalhos disfarçando “incentivo e apoio” a modalidade, cada vez mais frágil exatamente pela falta de análises objetivas, diretas e apolíticas, no momento difícil em que ela se encontra perante os cenários intra e extramuros em que atua…

Conceituou-se de uns tempos para cá, que nosso futuro basquetebolístico se basearia no jogo de transição e nas bolinhas de três, onde a extrema velocidade, a força física nos rebotes e nos embates corpo a corpo teriam de ser levados aos extremos em sua preparação, mote principal e absoluto no protagonismo das ações que propicia a aquisição de tais valores na consecução do conceito proposto, secundarizando o preparo técnico individual, os fundamentos básicos do jogo, se é que o treinavam, sequer o ensinavam, dando início as vastíssimas comissões técnicas, nas quais o técnico principal cede “democraticamente” seu comando master em prol do tal conceito, equivocado, inócuo, e acima de tudo pouco ou nada inteligente, porém importantíssimo para agentes, empresários e dirigentes na formação e formulação de equipes, nas quais até um processo de “minutagem” das “peças” (alcunha modernosa dos jogadores) foi estabelecida, complicando em muito a produtividade real e autêntica das equipes no campo de jogo…

Com essa concepção padronizada e formatada, implantou-se a mesmice endêmica que, adotada por todas as franquias, desfila impávida a pactuada mediocridade que aí está, tendo como prêmios maiores jogos “equilibrados e emocionantes”, onde até os histéricos narradores clamam por prorrogações, a fim de que o prana seja alcançado infinitamente, e onde os tocos, as enterradas majestosas, e claro, as fantásticas e fabulosas bolas de três ascende ao olimpo tupiniquim, pois ao olimpo grego, ascendeu o AEK, com seu “ultrapassado” jogo cadenciado, forte defesa lateralizada e antecipativa, inclusive e basicamente sobre os pivôs, sua anteposição sempre presente às saídas de contra ataque rubro negras, seu paciente e programado até a finitude, de cada 24 segundos a que tinha direito em seus ataques, do jogo de passes curtos e precisos dentro do perímetro interno, na cozinha adversária, dobrando-o mais com finalizações de  2 pontos do que de 3 (20/35 e 10/24, contra 18/30 e 10/32 do Flamengo), forçando o jogo interno que a fez cobrar 16/18 lances livres, contra 4/4 de um adversário que foi incapaz, mesmo dominando os rebotes (foram 39 contra 24 dos gregos) de atuar no ataque interno, onde os marcadores do Marcos, claramente abriam o caminho de suas penetrações pela esquerda, sabendo da extrema deficiência do mesmo no controle e projeção da bola com a mão daquele lado, principalmente na finta, perdendo-a três vezes seguidas, a ponto de no restante da partida, ao iniciar o drible pela esquerda, rapidamente trocava de mão, facilitando demais sua marcação pela previsibilidade gestual. Some-se a essas evidências, a brutal diferença no domínio dos fundamentos por parte de uma equipe européia (tiveram 6 erros contra 20 do Flamengo), mesclada de americanos de terceira opção técnica e contratual( e não de décima quinta em diante como os que para aqui convergem) e são sofregamente disputados por estrategistas pretensamente bilíngues (?), sabedores e cúmplices omissos que são para que os mesmos joguem seu jogo particular, e até coletivo, se dois ou três deles estiverem em quadra, tornando os nacionais em apanhadores complementares de sobras, sob sua torcida incontida por bolas e bolinhas salvadoras de jogos, e de seus empregos…

Porém algo de muito mais sério tem de ser enfocado, discutido, às claras, olho no olho, o enorme desperdício que vem se acumulando nas duas ou mais décadas no preparo de nossos jovens, incentivados e orientados ao “chega e chuta” agora institucionalizado (a equipe grega não arriscou nenhum arremesso dessa forma, nenhum…), as enterradas mirabolantes ( se não me engano foi somente uma dos nossos e duas deles…), ao descaso defensivo, dentro e fora do perímetro, em flagrante contraste com a turma grega que fechou, blindou seu garrafão, onde somente o Varejão com sua grande experiência se sobressaiu, nunca tendo o apoio do Olivinha, do Mineiro, do Marcos e do Nesbitt, todos  atuando fora do perímetro e sendo contestados em suas bolinhas, pois driblar para dentro, nem pensar.  Aliás, contestados foram a maioria dos arremessos longos dos rubros negros, tendo alteradas suas trajetórias e direcionamentos pelas contestações sempre presentes (que é o correto, e não tentar o bloqueio dos mesmos), atitude inversa pela ausência defensiva, quanto aos arremessos gregos, erráticos, mesmo livres, nos dois primeiros quartos, certeiros a partir do terceiro, como que adaptados aos espaços e referências da enorme arena a que não estavam habituados, mas compensados por sua postura superior defensiva, domínio irrepreensível dos dribles, das fintas e dos passes, do bloqueio intencional e programado sobre o passe inicial dos contra ataques brasileiros (sistema de jogar aqui tido como ultrapassado e antiquado pelos estrategistas e mídia “altamente especializada”…), anulando sua maior arma, o chega e chuta mais intencional ainda, liderados por uma dupla armação que jamais funcionaria da forma fragmentada como atuou (ela precisa ser una, participativa e solidária), onde o senso coletivista do excelente Balbi, não encontrou apoio dos outros três armadores, todos compromissados com as finalizações, ante a impossibilidade do jogo interior, mais pela inexistência de um sistema de jogo que o privilegiasse competentemente, do que a efetiva presença blocante grega, ao defender flutuando lateralmente, todos, em bloco, forçando passes em elipse ou retroativos, e não longitudinalmente como os estrategistas estão acostumados, afinal por aqui, na grande Liga, todos atacam igualmente, exatamente por defenderem (?), ou não, igualmente também, selando com sobras e galhardia o pacto da mediocridade em que lançaram o grande jogo, e desnudando uma triste realidade, não sabem e sequer desconfiam como preparar, treinar, ou mesmo ensinar uma equipe para o jogo interior, porque simplesmente não sabem fazê-lo…

Fosse qual fosse o adversário brasileiro do AEK nessa final, venceriam, por um simples e singelo princípio (conceito?…) – Seja qual for o  sistema, princípio ou estratégia de jogo, entre equipes tidas de alto nível, sempre terá como vencedora aquela que ostentar o maior domínio e conhecimento dos fundamentos básicos, instrumental decisivo na consecução de seu sistema, por mais simples que for, ou mesmo inexistente…

Quanto ao fato do “desrespeito” do técnico italiano do AEK ao pedir um tempo a 4seg do final, e convidar o diretor de sua agremiação para ir até o banco vencedor, trata-se de um direito dele, falar com sua equipe ou um diretor, não é da conta de seu adversário, parecendo muito mais uma “revolta oportuna” ante uma derrota inesperada e maiúscula (86 x 70), esquecendo o engravatado estrategista que no recente jogo das estrelas pediu um tempo a 14 seg do final da partida estando vencendo por mais de 30 pontos, para elaborar uma jogada em sua prancheta, fora as inúmeras expulsões de quadra nos NBB’s, campeonatos regionais que tem participado, palavreado indevido e agressivo nos tempos pedidos (felizmente agora vetadas as transmissões pela Liga), num autêntico e lamentável desrespeito ao público, adversários e sua própria equipe. Apelações e comportamentos indevidos não são boas políticas para um aspirante a líder e mestre desportivo…

Ainda temos um longo caminho a percorrer.

Amém.

Fotos – Arquivo pessoal e reprodução da divulgação CBB. Clique duplamente nas mesmas para ampliá-las.



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