BEM DO FUNDO…

-“Não considero o basquete brasileiro no fundo do poço como muitos dizem, e os técnicos brasileiros mostrarão nesse campeonato novas táticas e sistemas”-
Depois dessas afirmações do técnico de Joinville, preparei-me para assistir algo inusitado, novo, revolucionário, apresentado pelas duas equipes, já que havia levantado a bandeira dos técnicos em suas caminhadas no rumo da evolução técnico-tática tão ansiada por todos aqueles que, propugnando estarmos no fundo de um obscuro poço, torcem pelo soerguimento do grande jogo. Acomodei-me na poltrona e vi a bola subir no acanhado ginásio do América FC, onde nas arquibancadas tinham mais bandeiras estendidas que assistentes, o que para uma tarde de domingo, em um bairro tradicionalmente basqueteiro, já era sinal do que assistiríamos à seguir.
De saída algo animador, as duas equipes atuavam com dois armadores, seguindo o exemplo da equipe de Franca. Mas a revolução técnico-tática parou por aí. O que se viu a seguir foi de arrepiar, com a repetição do “sistema padrão” a que nos acostumamos a ver nos últimos anos, o brutal acumulo de erros nos fundamentos, uma orgia desvairada de arremessos de três pontos, e uma improvisação de jogadas traçadas nas pranchetas, que nem de longe eram desenvolvidas, quiçá entendidas, pelos jogadores na hora de realizá-las, num claro testemunho,de que jamais foram treinadas da forma em que foram apresentadas nas pranchetas.-“Pessoal nesse ataque basta o chute de dois, mas se vier o de três também está bom, tanto faz”- Como são dois arremessos que diferem na forma tática em que serão concebidos, se de curta ou média distâncias, ou de longa distância, uma instrução deste teor, só dúvidas causarão aos jogadores, pois são finalizações díspares entre si. E o jogo ganhou contornos tão confusos e até certo ponto absurdos, que o quase sempre condescendente comentarista da TV tachou o que via como uma autêntica “pelada”, fato inédito em seus comentários.
Pelo que nos foi observado, a grande novidade foi o total envolvimento dos pivôs, com exceção de um, nos arremessos de três pontos de todos os setores da quadra, como disse acima, numa orgia da mais absoluta falta de lógica que testemunhei nos últimos tempos. Pressinto que estamos entrando em uma nova era do jogo, a dos pivôs-armadores, com toda a técnica nos domínios dos fundamentos de que são possuidores, principalmente no drible e nas fintas, e claro, contando com o beneplácito de seus técnicos, inertes e cúmplices de tal desmando, pois não os vejo coibirem tal comportamento.
Enfim, foi um caos travestido de jogo de basquetebol, mas que ao final, perguntado pelo repórter de campo como tinha visto a partida, o técnico de Joinville foi honesto e realista em afirmar que “tinha sido uma lástima”, mas sem antes deixar no ar “a existência de alguns fatores que não poderiam existir e acontecer num campeonato nacional, mas que não os comentaria”, mas que “reestruturaria o trabalho daí para diante”, o que deveria ser prioritário antes de tecer as afirmativas com que iniciei este artigo, assim como não deveria mencionar fatores que não desejasse comentar. Se não é para comentar, porque mencionar a existência dos mesmos, deixando dúvidas no ar?
A equipe do Flamengo, vencedora por que errou um pouco menos, conquistou a primeira vitória de uma equipe carioca no campeonato, performance preocupante para o futuro das mesmas dentro da competição, a não ser que desencadeiem a propalada revolução prevista e defendida pelo técnico adversário, o que duvido profundamente que venha a ocorrer, haja vista a triste realidade exposta no jogo de hoje. Sim, estamos no fundo do poço, e de lá só sairemos no momento em que os técnicos aceitarem essa evidência, pois só desta forma propugnarão por mudanças que realmente nos tirarão de tal situação. Enquanto negarem, jamais sairemos de lá, bem do fundo…



8 comentários

  1. Idevan Gonçalves (idevan@gmail.com) 11.12.2006

    Tem sido cansativo ver os jogos do brasileiro, muito pelo que vc sempre cita: dois times com o mesmo padrão de jogo. Porém, o que cansa mesmo é a carência de fundamentos dos jogadores e a aparente falta de treino dos times, um horror. Ultimamente, tenho me divertido mais vendo a Euroliga…

  2. Reny Simão 11.12.2006

    Caro Professor

    Fiquei curioso a respeito da insinuação do técnico Bial na entrevista, sobre “a existência de alguns fatores que não poderiam existir e acontecer num campeonato nacional, mas que não os comentaria”.

    A respeito da reestruturação que afirmou fazer, não sei por que, naquele momento, entendi como sendo algum problema comportamental de seus atletas antes do jogo.

    Concordo ainda com a opinião externada acima “Tem sido cansativo ver os jogos do brasileiro…”. No jogo Londrina XUNITRI, no sábado, o armador Valtinho, que esteve recentemente afastado por contusão, ainda entrando em forma, estava literalmente andando em quadra e, mesmo assim, pelas suas qualidades (ou pelo baixo nível dos participantes) quase fez um triploxduplo.

    Mas, como o futebol (argh!) está em recesso, vamos ter que nos contentar com este basquete mesmo.

    Um abraço

    Reny Simão

  3. Basquete Brasil 11.12.2006

    Prezado Idevan,creio que ainda teremos de aturar essa calamitosa situação por um longo tempo, pois dificimente a maioria de nossos técnicos, principalmente aqueles que deixaram as quadras recentemente como jogadores,e que estão impregnados pelo “sistema padrão”,terão preparo, estudo e disposição para mudar,o que para eles representam princípio,meio e fim de um processo.Nunca foi tão fácil e oportuno ser técnico de”elite”em nosso país.Os resultados? Estão aí,escancarados,á vista de todos.Lamentável.Um abraço,
    Paulo Murilo.

  4. Basquete Brasil 11.12.2006

    Prezado Reny,nada mais constrangedor do que a utilização de um meio jornalistico como a TV, para lançar aos ventos suposições, ou desconfianças veladas e pouco claras.O ouvinte telespectador não merece tal desconsideração, pois sente que algo nebuloso e condenável lhe é negado a conhecer.Se é para manter sigilos que se cale perante holofotes e microfones, vindo à público somente com evidências e verdades.É obrigação de quem fala, e direito de quem escuta.Deveria ser assim, mas… Um abraço,Paulo Murilo

  5. Leandro Machado 13.12.2006

    Bom acho que mais ninguem consegue assistir um jogo inteiro do nacional,pelo menos eu não,quase nenhuma jogada bem trabalhada, chutes e mais chutes de 3, e como você disse, a presença do pivos-armadores( que vem acontecendo ateh na categoria de base ),e claro ginasios vazios, e vem o Bial dizer q esta tudo otimo, tem q ouvir cada uma…

  6. Basquete Brasil 15.12.2006

    Prezado Leandro, então somos dois.Como venho”pregando” por todo esse tempo, o lastimável é constatar como são prejudicadas as equipes de base,as quais,infelizmente,darão seguimento ao atual modelo.Urgem modificações,sem as quais não chegaremos a lugar algum.Um abraço, Paulo Murilo.

  7. SOU TECNICO , PENSO DA MESMA MANEIRA QUE O SR , GOSTARIA SIM DE TROCAR MAIS ESPERIENCIAS PARA QUE POSSAMOS FAZER UM NOVO MODELO DE BASQUETE EM VIDEIRA SC .
    PENSO QUE O NOSSO BASQUETE ESTA NO FUNDO DO POCO TAMBEM, AONDE O CAOS DE NOSSA ESTRUTURA COMECA EM ALGUMAS FEDERACOES , AS QUAIS TEM INTERESSE PROPRIO, MENOS O DE FAZER O BASQUETE CRESCER…..QUER SABER MAIS ,FOMOS EM UM CURSO EM CURITIBA AONDE ESCUTEI DE UM TECNICO DE SELECAO BRASILEIRA AS SEGUINTES PALAVRAS:
    “NAS ESCOLAS , QUEM NAO TEM MATERIAL DEVE TRABALHAR COM BOLAS DE MEIA E AROS DE BICICLETA”
    ACHEI ISSO O CUMULO, POIS DEVEMOS TER NO MINIMO ESTRUTURA NAS CATEGORIAS DE BASE, AONDE SE FORMAM CIDADOES E ATLETAS.
    PENSO ENTAO QUE DEVERIAMOS ENSINAR DIRETORIAS DE CLUBES E ENTIDADES RELACIONADAS AO BASQUETE BUSCAR RECURSOS NACIONAIS E INTERNACIONAIS.
    DESENVOLVER A BASE COM TODO AMOR POSSIVEL.
    ESTAMOS COM A EQUIPE A 1 ANO E NAO E FACIL , MAIS TENTAMOS MOSTRAR UM NOVO BASQUETE, ESTOU APRENDENDO COM PESSOAS DEPOIMENTOS A CADA DIA, TALVES COM SUA AJUDA E SUGESTOES POSSA FAZER DE MINHA EQUIPE UM NOVO MODELO DE BASQUETE.
    FABIO DE OLIVEIRA WONZOSKI FONE 49-88019911 , 49-35662258

  8. Basquete Brasil 29.07.2009

    Prezado Fabio,seus relatos devem ser os mesmos dos muitos técnicos e professores que ainda teimam em desenvolver e ensinar o grande jogo por este país afora, mesmo incentivados a fazê-lo com bolas de meia e aros de bicicleta.Mas insistimos, perceveramos e fazemos a caravana da grande esperança seguir em frente.Como mudar tal situação? Como lutar contra tantas adversidades? Só vejo um caminho,o associativo entre técnicos e professores, onde a troca de informações e o comprometimento técnico profissional se faça presente, mesmo timidamente no começo, para depois crescer com segurança e convicções.No domingo agora dez jovens técnicos se reunirão comigo para estabelecermos um grupo de estudos, entre os quais um modelo associativo visando a pesquisa, e estudos abrangentes sobre a modalidade. Se muitos outros grupos se organizarem teremos dado os primeiros e decisivos passos para o soerguimento do basquetebol entre nós, e vejo nestas iniciativas a única e plausível solução para tão trágica realidade que nos pune a tanto tempo. Tente em sua região algo semelhante, mesmo que tenha de deglutir alguns sapos e congêneres. Vale à pena tentar,pois a atitude omissa é a chama alimentadora dos males que nos afligem. E aos poucos vamos evoluindo, trocando ideias e ideais, visando um futuro melhor e mais pródigo em trabalho, e como você mesmo diz, amor. Todo o meu amor pelo basquete aqui está publicado na forma de mais de 860 artigos, divididos e expandidos para com toda a comunidade basqueteira do nosso querido e infeliz país. Aceite um abraço do Paulo Murilo.

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