REFLEXOS DO TREINO…

 

Diego Felipe  

Professor, o que dizer do feminino? Fico com uma sensação de déjà vu: pouca defesa exterior, nada de rebotes, ‘gatilhaços’ pouco efetivos de 3, nenhuma movimentação de bola, somente uma jogadora (Chuca) tentando trazer o jogo para o interior, uma Érika efetiva, porém tolhida pelo resto do time… seria a repetição da seleção masculina de até 3 anos atrás?(…)

Recebi esse comentário hoje junto ao artigo de ontem Os Inseparáveis Dilemas, justo quando terminei de assistir o jogo com a Rússia, quando mais robusteceu em mim a vontade de não comentar mais nada sobre esse pastiche em que transformaram o grande basquete feminino do país, basquete esse em que me tornei campeão nacional como técnico no brasileiro de 1966.

Assisti os últimos jogos da seleção, da preparação às rodadas iniciais dessa olimpíada, e o que testemunhei gerou em mim um tal estado de angústia que decidi nada mais escrever ou externar para não me magoar mais do que já me magoei. Então, prezado Diego, foi esse sentimento de tristeza e decepção o responsável pelo mutismo, pela ausência de maiores comentários sobre o assunto.

Mas, não posso negar algumas considerações ao seu questionamento, pois nunca nesses anos todos de Basquete Brasil deixei qualquer pergunta sem resposta, inteligentes ou despropositadas, negando somente as desaforadas e ofensivas, e claro, as anônimas.

O que dizer objetiva e francamente? Talvez algumas poucas verdades, não as de caráter pessoal, mas sim as de foro profissional e técnico, fatores ausentes nesta seleção tão mal administrada e pior dirigida e orientada. Aliás, não compreendo como algum técnico sério e responsável poderia aceitar um cargo tão obliterado por uma coordenação, por uma supervisão tão equivocada, tão primária, tão amadora e medíocre.

Que mais dizer sobre uma seleção que se preparou por um longo tempo e não consegue apresentar sequer um resquício de sistema de jogo, de apresentar alguns dos fundamentos básicos do grande jogo, de sequer saber aproveitar sua melhor qualidade, a honesta e sensível disposição de suas componentes em fazer o melhor possível dentro de suas limitadas possibilidades técnicas, não menciono sequer as táticas, estando receptivas a um preparo realmente técnico, e não interessado em currículos, tão mais falsos quanto as premissas de ensino e aprendizagem negadas às mesmas da forma mais pusilânime possível, pois uma seleção nacional não tem o direito de se apresentar dessa forma tão carente, tão ignorante, tão equivocada.

Se nesses três meses de pseudo trabalho, viagens desnecessárias, jogos mais desnecessários ainda fossem substituídos por um programa realmente competente de preparo fundamental, não veríamos talentos como uma Damiris se perder na mediocridade de seu jogo jamais dirigido e orientado, ensinado enfim, assim como uma pivô da qualidade de uma Erika, de uma promissora Clarissa, abandonadas em suas solitárias lutas nas tabelas, onde arremessos são perdidos por não saberem como direcionar corretamente a bola na cesta, assim como alas e armadoras que mal sabem driblar, fintar, passar, sequer arremessar com um mínimo de qualidade. O que vemos são técnicos defendendo seus sistemas de jogo (que no fundo é um só, o que sabem e pensam dominar, como um molde a ser implantado nas equipes que dirigem, ou pensam dirigir…), suas pranchetas coreográficas, exigindo de jogadoras mal e pouco fundamentadas comportamentos de alta técnica e conhecimento de jogo, que são os fatores necessários para que vinguem, ou seja, os fundamentos do jogo. Se nesses meses todos tivessem treinado somente os fundamentos individuais e coletivos, somente os fundamentos, garanto que se apresentariam num nível bem superior ao que vem apresentando de forma tão melancólica, ou acham que as americanas desenvolveriam seus sistemas sem a rigorosa fundamentação que possuem?

É o que tenho a dizer, prezado Diego, e nada mais falarei a respeito, e se o faço agora, repito, é em respeito ao seu questionamento, já que me cansei de tanta… Deixa pra lá.

Amém.

Foto – A grande diva do basquete nacional…



18 comentários

  1. Diego Felipe 30.07.2012

    Obrigado por dignar-se a responder, professor, e entendo a desilusão-mágoa gerada. Imagino que futuro ‘promissor'(ironias…) espera a Damiris e, porque não, o basquete feminino como um todo… É triste para mim, que jogo e amo o grande jogo, que dirá para o senhor que tanto tempo trabalhou, estudou e dirigiu-o. Minhas sinceras condolências, professor, porque não acho que exista, nesse momento, outra palavra melhor.

  2. Basquete Brasil 31.07.2012

    Sempre responderei, prezado Diego, com o máximo prazer. Agora, condolências por que? Ninguém deixou de existir…
    Um abraço, Paulo Murilo.

  3. Marcelo 31.07.2012

    Professor,

    acho que na armação o Magnano poderia tentar usar o Raul, quando for descansar o Huertas, visto que aquele é um armador puro como o Huertas. O Larry não é muito bom em passes(assistências), tomara que mude. Na minha opinião o time seria perfeito se o Valtinho estivesse revezando na armação com o Huertas, mas agora não adianta, é torcer para o Larry se superar e o Raul também.

    Abçs

    Marcelo

  4. Henrique Lima 31.07.2012

    Professor Paulo, como vai o senhor?

    O feminino é tão desgostoso de ver, que eu parei.

    Desisti de assistir, Professor.

    Assassinaram a modalidade. Dá pena de ver as meninas correndo e dedicando sem a mínima capacidade técnica e tática para tal.

    Uma pena,

    mas é um desgosto enorme assistir o feminino.

    Parabéns para Hortência ! A Rainha que tudo sabe com suas respostas prontas.

    Um abraço

    Henrique Lima

  5. Claudio Carvalhaes 31.07.2012

    Prezado Paulo Murilo,

    Realmente a situação do basquete feminino, seja ela a da seleção ou na propria Liga Nacional é preocupante e desmotivadora.
    Quem acompanhou o Campeonato Nacional se deparou com partidas fracas, verdadeiros rachões com muitos, mas muitos erros de fundamentos, vê agora esse cenário se refletir no selecionado.
    Pra mim, o maior motivo desse circo de horrores que se transformou o basquete feminino é o abandono das categorias de base por parte de clubes, federações e confederação. Sou um grande defensor de um trabalho sério na base para sucesso em qualquer modalidade. Não há mistério, não há de se inventar. Tanto no masculino quanto no feminino.
    E o que mais me causa espanto é que, justamente o feminino, que obteve melhor sucesso no basquete no Brasil nas ultimas duas décadas, campeão mundial, medalhas em Olímpiadas, foi abandonada por parte daquela trinca que mencionei antes, trinca essa responsável pelo trabalho forte na base.
    Será que o basquete feminino precisará passar pelo ostracismo que passou o masculino, longe 16 anos de uma olimpiada, campanhas pífias em mundiais, para que volte ser levado a sério? Será que as palavras de Nelson Rodrigues, que afirmava que brasileiro tem “sindrome de vira-lata” são a mais pura realidade? Precisa-se agir e já.
    Quanto ao comentário do Marcelo, defendendo seu posicionamento em que peças Magnano podia usar na armação, quando o guerreiro Huertas fosse descansar, mostra que realmente o cenário é preocupante. Vemos aqui, mais uma vez, a falta que o trabalho de base faz, em que não tinhamos ninguém para levar para a armação junto ao Huertas, tendo que “naturalizar” as pressas (visto que um processo de naturalização demanda mais tempos e exige mais alguns requisitos não preenchidos no caso) um americano de gosto um pouco duvidoso e levar um menino visivelmente “verde” para tal competição.

    Abraços,

    Claudio

  6. Jalber 31.07.2012

    Reporto o artigo 900 do professor, veja no link : http://blog.paulomurilo.com/2012/01/08/artigo-900-o-retrato-de-uma-triste-realidade/#comments .Neste artigo vem uma discussão sobre o feminino. Indico a leitura de uma postagem no Blog PBF, veja no link a seguir http://pbf.blogspot.com.br/2012/07/minas-gerais-investe-em-seus-torneios.html que fala do trabalho em Minas. Criticar as meninas, jogar pedras, em uma posição de camarote não é muito difícil. Tem muitos erros, muito o que se fazer. Quantos jogos as meninas fazem por ano? Quantas horas um profissional de alto nível em qualquer profissão deve dedicar aos seus deveres profissionais? Como exigir alto nível das meninas se elas não podem ser profissionais na base? Qual a vantagem de concentrar todas as meninas em São Paulo? Penso que além de rebaixar o feminino, que esta sim com o nível baixo, é importante darmos força, visibilidade, e mais que tudo trabalhar para que o feminino volte a ter seu lugar de destaque. Vamos sair das trincheiras, do posto de críticos de carteirinha e vamos fazer um pouco por nossas meninas! Se não puder fazer muito pelo menos cobre das entidades, divulguem o pouco que é feito, mas não abandonem… não parem com o feminino. abandonar é sempre a solução mais fácil! Querem um feminino com maior qualidade? Querem um país verdadeiramente olímpico? mesmo que seja amanhã ou daqui a 20 anos, trabalhemos!!!

  7. fabiano maltempi 31.07.2012

    um abraço professor.

    concordo plenamente com suas observações, eu assisti na integra o jogo entre brasil e frança. no primeiro tempo, apesar de todas as limitações de nossa equipe, tecnicas, taticas e emocionais, a equipe até que se portou bem, mas no ultimo quarto, foi bisarro, precipatações de jogadas, arremessos errados, muitos erros individuais, a parte tatica nao existiu, e acho que por um bom tempo teremos esse cenário no basquete feminino. Apesar da belissima campanha no mundial sub 19 feminino, realizado ano passado no Chile, onde foi obtido o 3o. Lugar, onde um dos destaques da equipe foi DAMARIS, a unica jogadora que faz parte da seleção, nao espero melhores resultados, embora ache que mais jogadoras poderiam estar nesse elenco, para ganhar experiencia. O que falta e investimento nesse esporte, principalmente CAPACITAÇÃO DOS TECNICOS DE BASQUETE. Concordo que os jogos da liga nacional feminina, são um horror, nivel tecnico baixissimo, consegui ver alguns esse ano, mas consegui terminar de ve-los. um abraço

  8. Rodolpho 01.08.2012

    Gostei da foto “A grande diva do basquete nacional”.

  9. Basquete Brasil 01.08.2012

    Prezado Marcelo, penso ser o Larry mais confiável, por sua robustez e maior rodagem, mas jogando ao lado do Huertas, ampliando a latitude de opções ao jogo interior. Nesse caso, o Raul poderia ser útil na rotação de um dos armadores para o devido descanso.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  10. Basquete Brasil 01.08.2012

    Henrique, por conta disso tudo nada mais comentarei sobre o basquete feminino nessa competição.
    Estou bem de saúde e de cuca também, obrigado.
    Paulo.

  11. Basquete Brasil 01.08.2012

    Prezado Claudio, concordo com seus comentários, objetivos e honestos. Aliás, os debates aqui travados estão constituindo um patamar de consulta e conhecimento admirável. Parabéns a todos.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  12. Basquete Brasil 01.08.2012

    Prezado Jalber, infelizmente não me deixam levantar da cadeira para exercer o trabalho de quadra que ainda poderia realizar, apesar da idade. Por isso, dessa humilde trincheira continuo o combate franco e honesto no meu dia a dia, até quando os deuses permitirem. Sei que dessa forma cumpro meu dever desde sempre.
    Um abraço, Paulo.

  13. Basquete Brasil 01.08.2012

    Concordo Fabiano, integralmente. E nesse ponto uma pergunta se impõe, por onde anda, o que faz e constroe de verdade a EBTN/CBB?
    Um abraço, Paulo Murilo.

  14. Basquete Brasil 01.08.2012

    Prezado Rodolpho, só falta agora ela desandar a dar autógrafos…
    Um abraço, Paulo Murilo.

  15. fabiano maltempi 01.08.2012

    Caro professor: eu vi alguem comentando dias desse no canal sportv sobre a EBTN, mas de fato, nao tenho conhecimento de sua efetividade. Esse é um trabalho de longo prazo, que começa na escola, pois foi nela, que o basquete foi meu primeiro esporte praticado, embora, tinhamos o mérito de ter um excelente prof. de educação fisica, que nos ensinou o basquete e o handebol, mas foi somente por um ano. Nessa epoca ainda, o grande jogo era muito popular, quem nao se lembra de ter passado em alguma rua e visto uma cesta de basquete, improvisada, em algum poste de iluminação. Mas aqui no brasil, diferente dos americanos, onde nas escolas e nas universidades esse esporte é muito forte, os clubes deveriam ser mais incentivados a investir nesse esporte. Veja A SOCIEDADE ESP. PALMEIRAS no estado de São Paulo, eu adoraria ver meu CORINTIHANS fazendo o mesmo e outros clubes tambem. Infelizmente o brasil é um pais onde o futebol ganha muito destaque da midia esportiva, ve-se os programas de esporte, exibidos durante a semana e final de semana, o destaque dado aos outros esportes é INFIMO. Deveriamos ter mais espaço para outros esportes, visando sua masificação. UM ABRAÇO..

  16. Jalber 02.08.2012

    Professor, desde sempre reconheço sua luta nesse espaço tão democrático! Aproveitei e me posicionei aqui porque sei da qualidade das discussões travadas nesse espaço. Agora a mídia está contra as meninas, que são somente o reflexo de um trabalho mal organizado, por isso me posiciono a favor delas. Criticá las acaba sendo fácil, a alguns anos me apaixonei pelo trabalho com o feminino, e hoje faço o “impossível” para vê las crescendo, por isso faço um esforço que é mínimo dentro de um país de proporções continentais para que elas voltem a ter seu lugar. O Professor Paulo faz duras críticas tanto no feminino quanto no masculino, mas apresenta sua contribuição em soluções possíveis. Agora só dizer que o nível é péssimo, que elas são horríveis, acaba sendo muito comodo… me lembro bem que ate pouco tempo quem salvava o basquete nacional era o feminino, o que aconteceu para que retrocederem tanto? A culpa foi delas? Eu particularmente penso que a pergunta a ser feita é: – Como voltar a ser campeão mundial?
    Bom eu penso assim: Critiquem briguem, falem mal, de soluções, mas principalmente dobre as mangas e ponha a mão na massa.
    Professor, esse espaço que o sr. chama de humilde trincheira, na verdade é sua maior contribuição para o basquete, competente séria e verdadeira, já que não te deixam “por a mão na massa”. Por isso repito: – nesse espaço tão democrático, reverencio o Doutor Paulo Murilo e agradeço a oportunidade de estar sempre aprendendo! grande abraço!

  17. Basquete Brasil 03.08.2012

    Prezado Fabiano, sua experiência não é diferente de muitos que se iniciaram no grande jogo, guardando e mantendo seus valores no passar dos anos, e em muitos casos legando-os a seus filhos. No entanto, muitos dos que se beneficiaram e que ocupam cargos e posições de relevo no país, que muito poderiam ajudá-lo e alavancá-lo nada fazem, esquecendo-o numa omissão imperdoável.Perante esse quadro, a não qualificação diretiva se impõe nas federações, nos clubes, no âmbito escolar, nos governos, evitando que uma politica desportiva nacional se concretize, numa espiral de incompetência e desprezo por nossos jovens e sua educação plena e de boa qualidade.Quem sabe um dia esse quadro se reverta?
    Um abraço, Paulo Murilo.

  18. Basquete Brasil 03.08.2012

    Obrigado Jalber, e por tudo isso a luta deve continuar, sem tréguas, sem concessões, até quando pudermos. É o nosso, seu, dever.
    Um abraço, Paulo.

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