CAMINHOS E DESCAMINHOS DO GRANDE JOGO…
Voltando ao batente depois de um tempo reflexivo, se deveria, ou não, tecer comentários sobre o peladobol vigente, emoldurado pelas grandiosas emoções de jogos disputados quase no tapa, com médias de 26,2 erros de fundamentos a cada jogo, e com, cada vez mais predominância dos arremessos de três sobre os de dois, e claro, com uma ou duas exceções de equipes que arriscam algo de novo taticamente, muito pouco num cenário devastador de mesmice endêmica, que remete o grande jogo à vala comum da mediocridade, comprovada com a retomada hermana na última competição internacional, e claras evidências de que dificilmente sairemos deste limbo imposto coercivamente desde as categorias de base, em torno de um sistema de jogo anacrônico e absolutamente burro de jogar, exceto para a turma do arromba que o defende ao preço que for, afinal, trata-se de um mercado de trabalho restrito, movido e imposto por um corporativismo, que se não demolido, nos enterrará definitivamente perante o concerto internacional, porém plenamente satisfeito com com o brilhareco tupiniquim, a que se apegam com o desespero dos náufragos em seus estertores…
Desculpem os poucos leitores, mesmo aqueles que ainda se dão ao trabalho de assistir jogos falhos e destituídos de técnicas individuais e coletivas nos fundamentos, e absolutamente pífios taticamente, apesar dos rompantes escatológicos de estrategistas que confiam mais nos rabiscos desconexos em suas hilariantes pranchetas, que para alguns falam e expõem soluções, do que dotar seus jogadores de ensinamentos técnicos, treinamentos plenos de criatividade e improviso, base do espírito coletivista, numa modalidade coletiva, e não portal de egolatrias e pseudo lideranças…
Desculpem mais uma vez, mas acima de tudo, de torcidas distorcidas sou um técnico, um professor de basquetebol, e como tal devo me reportar aos fatos, às reais situações de jogo, e não a rasgos ufanistas desprovidos de lógica, do bem jogar e compreender o grande jogo, realidades cada vez mais ausentes em nossas quadras, agora palco de vedetismos ao lado delas, institucionalização do palavrório mais chulo e ofensivo aos que assistem as transmissões, principalmente os mais jovens, aceito e perdoado pelos que transmitem e comentam, quando não cometem os mais primários erros de informação técnica, e o mais icônico, quando jovens entrevistadoras se dirigem aos jogadores e técnicos opinando sobre sistemas e estratégias de jogo de suas concepções, solicitando dos mesmos opiniões sobre o exposto, quando deveriam obter como respostas uma simples meia volta, envolta no mutismo definidor da fronteira que deveria separar com a mais absoluta clareza uma entrevista, de uma colocação técnico tática equivocada e desprovida de conhecimentos básicos…
E o que vimos de relevante nos jogos classificatórios às quartas do NBB 10, senão a incontida ânsia da mídia pelas prorrogações, claro, em nome das ansiadas emoções, porém um tormento pelo acréscimo exponencial dos endêmicos erros que afligem o grande jogo, onde jogos são perdidos absurdamente pela hemorragia dos três pontos, quando prorrogações bem jogadas deveriam primar pela contagem de 2 em 2, de 1 e1 pontos, otimizando cada sacrificado ataque com maiores percentagens, e não jogando ralo abaixo reservas físicas com bolinhas absurdas e irresponsáveis, de jogadores e estrategistas acima de tudo, pois cúmplices na aventura.que ainda nos custará enormes retrocessos por longos anos, pois não vislumbro qualquer tentativa de enfáticas mudanças a médio prazo, que a cada temporada que passa mais se afastam, exceto por uma ou duas tênues tentativas em franquias da LNB, que sem dúvida alguma evoluíram quanto à utilização da dupla armação, e da movimentação um pouco melhor dos homens altos, agora mais atléticos, flexíveis e velozes dentro do perímetro interno, porém de uma forma ainda muito frágil, já que todos ainda se mantêm presos e manietados pelo sistema único, artifício que garante as jogadas pretensamente marcadas pelos estrategistas, desnudadas em suas midiáticas pranchetas, que seguramente não são levadas em consideração pela maioria dos jogadores, mas que certamente garantem a exposição de vastos conhecimentos táticos pelos mesmos, mas que aos poucos não enganarão mais ninguém, pelo menos aqueles que entendem de fato os meandros e sutilezas do grande jogo…
E aqui cabe um importante ponto, pois de umas semanas para cá, não sei se por um posicionamento da liga, não se vêem mais microfones em grande parte dos pedidos de tempo, fator altamente positivo, pelo menos evitando espetáculos grotescos e ofensivos entre jogadores e estrategistas, e obrigando os analistas a comentar o que veem a luz do que sabem e dominam, e não o que testemunhavam naqueles intervalos técnicos, na concordância ou discordância do que ouviam, numa situação dúbia e oportunista…
Então, o que pude observar nesta última semana, para efetuar comentários pertinentes? Bem, na refrega das três prorrogações entre Vitória e Minas, noves fora as toneladas de emoções, tivemos 44/81 de bolas de 2 e 29/80 de 3, ou seja, 51 tentativas (em 153 pontos possíveis) falhas no mais difícil dos arremessos, num desperdício de esforço físico brutal, talvez o responsável direto pelas três prorrogações, vide os 35 erros nos fundamentos básicos do jogo, cometidos por exauridos e pouco técnicos jogadores, assim como os 27/52 arremessos de 2 e 16/59 de três perpetrados por Caxias e Mogi para um placar de 63 x 60 para os paulistas, quando a poucos segundos do fim da partida com um ponto de vantagem para Mogi, o atacante Alex do Caxias teve a possibilidade de um arremesso de curtíssima distância preterido por um passe para a lateral visando um arremesso de três do Caferatta, que errou, quando bastaria uma simplória cesta de dois pontos para vencer a partida. Mas não, estão as equipes do “moderno basquete brasileiro” tão aferradas ao autofágico chute de três, que uma vitória só se valoriza se produto do mesmo, com a complacência de seus estrategistas, contorcendo-se nas laterais das quadras para que eles entrem, o que é sinal de alerta para o fosso em que estão lançando o grande jogo, em nome de um modismo irreal e perverso, ao agirem sistematicamente mais como torcedores do que técnicos…
Mas algo de alentador se descortina nessa dolorosa paisagem, a equipe do Flamengo, que deve vencer este campeonato na medida em que mantenha seu atual sistema de jogo com dois excelentes armadores e três alas pivôs ágeis e velozes trafegando em velocidade pelo perímetro interno, complementado por uma bem postada defesa garantidora dos importantes e estratégicos rebotes, faltando, no entanto, que se utilize bem mais do improviso e criatividade no jogo interno, liberando espaço para arremessos mais precisos e equilibrados, inclusive os de três, quando executados pelos seus dois especialistas, o Marcos e o Marcelo, e não ficando presa a esquemas e coreografias em nada condizentes com a qualidade individual de alguns bons jogadores que possui. Aliás, ao faltarem 3.8 seg para o final do segundo quarto, foi esquematizada em rabiscados detalhes uma jogada para uma importante cesta, o que realmente aconteceu, e de três pontos. Perguntado pelo repórter sobre o esquema ter dado tão certo, o jogador JP Batista esclareceu que o que ocorreu foi puro improviso dos jogadores, efetivado com sucesso, derrubando a tese da “prancheta que fala”, e mais uma vez desnudando a falibilidade do que vem sendo cansativa e permanentemente apregoado de que “elas realmente falam”, será?…
Sérias dúvidas existem, persistem, e as tenho em profusão, entre as quais uma se sobressai, a de que será esse o verdadeiro caminho a ser trilhado pelo grande jogo entre nós, onde as tentativas de um rígido controle tático por parte da maioria dos estrategistas, se sobrepõe a libertária e criativa improvisação, adquirida na suprema arte do treino, definindo a máxima de que “só improvisa quem sabe e domina os fundamentos individuais e coletivos do grande jogo”? Honestamente tenho uma certeza, a de que não seja esse o caminho a ser seguido, e já provei isso a algum tempo atrás, inclusive propondo um desafio aos técnicos nacionais, que continua de pé, (e lá se vão 8 anos…) pouco ou nada técnico tático mudou, apesar da boa organização, dos apoios e patrocínios, e do emergente interesse redescoberto pelos aficionados pelo grande jogo, que seria muito maior se evoluíssemos técnica e taticamente, que foi a grande arma do voleibol para se impor internacionalmente. Chegaremos lá? Torço para que sim, mas não com a turma que aí está coreografando gestualmente o grande, grandíssimo jogo.
Amém.
Em tempo, infelizmente – Testemunhei ontem um verdadeiro assassinato praticado contra o nosso indigitado basquetebol, um pastiche de jogo entre o Ceará e o Paulistano (72 x 67 para o Ceará), onde ambos perpetraram os seguintes números – 15/40 arremessos de 2 pontos e 11/30 de 3 para o Ceará, e 16/25 e 8/44 respectivamente para o Paulistano (inadmissível arremessar 19 bolas de 3 a mais do que as de 2 pontos), ou seja, somaram ambos 31/65 nos 2 pontos 19/74 nos 3, errando nestes últimos 55 bolinhas (ou 165 pontos pulverizados na mais absoluta mediocridade…), além dos 25 erros de fundamentos (14/11), tudo isso em nome do “moderno basquetebol”, tendência modal absurda e suicida que nossos estrategistas sonham manter e até ampliar no âmbito de nossas seleções de base e da elite, quando na realidade se trata da mais absoluta ignorância e aberração do que venha a ser um basquetebol jogado com correção, lucidez, equilíbrio, bom senso, e sólidos conhecimentos sobre o grande jogo, minimizado até o rés do chão por essa mistificação institucionalizada, gestada, produzida e administrada por uma mídia mais ignorante e ufanista ainda, salvas raríssimas e honrosas exceções, porém insuficientes para estancar essa gigantesca e quase irreversível hemorragia técnico tática, e de preparo convincente e profissional de jogadores, de equipes enfim, e que em tudo e por tudo continuará a facilitar o planejamento de nossos adversários nas competições internacionais, que agradecem penhorados a tanta e imperdoável ignorância desportiva. O fundo do poço ainda está muito longe de ser atingido, essa é a mais triste e lamentável realidade, que convenios com a NBA e os mil penduricalhos mediáticos e comerciais adicionados não evitarão seu desfecho, pois o real e verdadeiro óbice do nosso sofrido basquetebol é técnico, em sua acepção do termo, nada mais do que simplesmente técnico. PM.
Fotos – Reproduções da TV. Clique duplamente nas mesmas para ampliá-las.