RESPONDENDO AO ALEX NETTO…

Um comentário sobre o último artigo aqui publicado, merece, sem dúvida, uma resposta a altura de sua importância:

Alex – Ontem

Por uma incrível coincidência ouço a duas décadas que “foi nos detalhes” ou “faltou sorte na hora H” sempre que somos derrotados para uma seleção de ponta da América do Norte, do Caribe ou da Europa (as européias, em especial as eslavas, que jogam “batendo na defesa”).

Poderia ajudar a desvendar esse mistério professor (o porque essa ‘coincidência’ persiste a duas décadas) ?

 

Vamos lá então, prezado Alex – Comecemos com uma pequena equação de primeiríssimo grau – A qualidade e força de uma equipe está diretamente proporcional ao maior ou menor conhecimento e domínio dos fundamentos do jogo, por parte de todos os seus integrantes, dentro e fora da quadra – verdade indiscutível na prática do grande jogo, e que não apresenta a relevância de sua básica importância na formação de base dos nossos jovens que se iniciam no mesmo. Não se trata de um mistério, e sim de uma brutal realidade no processo de ensino e aprendizagem do basquetebol em nosso país, onde os sistemas táticos antecedem em tempo e importância o ensino dos fundamentos, numa inversão de prioridades que nos tem causado enormes, e até agora, intransponíveis reveses…

Toda essa carência de conhecimentos tem origem a partir do início dos anos 70 com a ida dos cursos de educação física para os centros de ciências da saúde, saindo de sua base educacional dos centros de filosofia e ciências humanas, ocasionando uma radical mudança curricular, onde os seis semestres dedicados ao ensino dos desportos, foram reduzidos a dois, ás vezes um só semestre, trocados por disciplinas da área biomédica, dando início ao ciclo do culto ao corpo, mantido até os dias de hoje, que somado a criação dos bacharelados de educação física, desencadeou e sedimentou a uma indústria do corpo que movimenta mais de 12 bilhôes de reais ao ano, sacramentada pelo sistema Confef/Crefs, avalizador e agenciador da mesma com suas holdings monumentais, onde a educação física e o desporto voltado aos jovens nas escolas e clubes se torna indesejável ante a lucratividade ensejada pela ausência de políticas nacionais voltadas aos mesmos…

Com professores e técnicos mai formados, o aproveitamento de ex jogadores e antigos leigos referendados como “provisionados” pelo sistema Confef/Cref passou a vigorar no país, com a diminuição da qualidade, e mesmo do total desconhecimento didático pedagógico necessário ao ensino qualificado, dando origem ao descalabro que atestamos nos dias de hoje, onde as parcas verbas governamentais se destinam ao topo de uma injusta e absurdamente invertida pirâmide de ponta cabeça, e cujos resultados finais retratam nossas colocações no cenário internacional…

Somemos a tudo isso, no caso do basquetebol, a política e criminosa fusão do estado da Guanabara com o estado do Rio de Janeiro, que até aquela época rivalizava com São Paulo, por ser uma ex capital da república, e ser a segunda economia do país, que a partir daquele trágico momento  foi transformado num violentado e hoje miserável município, espoliado e humilhado no cenário nacional. E o mais trágico é sabermos que mesmo constando um plebiscito na constituição para aprovação da fusão por parte das duas populações envolvidas, nada foi levado em consideração pelo governo militar, que via na mesma a dissolução da eterna e histórica resistência carioca aos governos absolutistas…

Claro que os desportos foram atingidos em cheio, destinando a São Paulo a dominância político educacional dos mesmos, inclusive o nosso amado basquetebol. O resultado aí está, escancarado a todos, com o afastamento radical da influência carioca, que gerava o equilíbrio entre os dois mais importantes pólos de desenvolvimento do grande jogo entre nós, e não vejo a médio e mesmo longo prazo, o reequilíbrio da balança…

Todo esse processo fez nascer o domínio unilateral, por parte de uma geração de técnicos, voltados aos exemplos advindos do hemisfério norte, principalmente dos Estados Unidos e mais recentemente de uma Europa mais organizada e técnica, no intuito de os fomentarmos,  esquecendo porém, que tais e poderosas influências sempre foram fundamentadas numa formação de base colegial e universitária poderosa e massificada, fator este ausente em nosso país, gerando os abissais equívocos com que nos deparamos desde sempre…

Finalmente, o ápice dessa tragédia, foi a decisão absurda e suicida, pela adoção de um sistema único de jogar e ensinar (?) o grande jogo, copiada, formatada e padronizada  ipsi literis da NBA, sem se darem conta, por indesculpável ignorância, flacidez mental e oportunismo preguiçoso, de ao menos, adequá-lo (se isso fosse possível…) a nossa realidade, exposta no texto acima, seguindo a norma arrivista e aventureira do que “se lá dá certo, por que não aqui?”, num lamentável processo colonizado e excuso…

Então, como explicar, ou mesmo justificar as coincidências mencionadas por você Alex? Creio que o exposto dirime suas dúvidas, que poderemos sintetizar afirmando que – Perante um quadro formativo, técnico e tático, onde a ausência quase total de alternativas didático pedagógicas possam ser estudadas, confrontadas e utilizadas, sob o democrático princípio da diversidade e do contraditório, fontes inesgotáveis da criatividade e do consciente improviso, como pretender formar técnicos, professores e jogadores diferenciados e tecnicamente evoluídos, capazes de confrontar as clássicas “coincidências” tão bem formuladas por você Alex, como? Creio que você agora sabe as respostas, logo…

Amém.

Foto – Arquivo pessoal. Clique duas vezes na mesma para ampliá-la.



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