JUSTO E OBJETIVO (From Dublin)…

No artigo de ontem, veiculei um video de um jogo de dez anos atrás, no NBB2, Joinville x Saldanha da Gama, tendo como resposta imediata um email do amigo fiel e inquisidor perguntando – Qual é Paulo, saudosista de algo que ninguém se lembra mais? Que tal virar o disco?…

Uau, essa foi na veia cara, mas, se você não percebeu bem, tinha endereço direto, justo e objetivo, num lembrete que, refutando sua pergunta, faço a mais absoluta questão de responder aos porques da vetusta partida de um jogo singular. Vamos a eles:

– Porque daquela data aos dias de hoje, repleta de “jogos emocionantes”, como nunca se viu, com transmissões em 100% das partidas, narradores ensandecidos pelos maravilhosos espetáculos que tronitruam em seus microfones, comentados por experts tão ou mais empolgados com a “redenção do basquetebol nacional”, através confrontos da mais alta qualidade, onde enterradas, tocos e  bolas de três reinam absolutas, emocionando plateias (um tanto ausentes das quadras, mero detalhe…), bem vindas e ansiadas prorrogações prolongando o prana generalizado, num NBB apoteótico…

– Porque durante todos estes anos nada de inovador e criativo foi visto por quem entende, por pouco que seja, do grande jogo, inclusive em seleções de todas as categorias, a não ser enxertos copiados daquela esquecida equipe capixaba, como a dupla armação e os alas pivôs em constante movimentação dentro do perímetro (pelo menos cinco anos antes da era Warriors e Curry), cópias canhestras adaptadas ao monocórdio e estratificado sistema único de jogo, promovendo suas estrelas doble triple a cada rodada, não importando se vencedoras ou não suas equipes, afinal seguem o modelo NBA, onde a cada temporada o coletivo cede espaco vital ao individualismo rapinador, na querência máxima de transformar um jogo coletivo em individual, ao preço que for, desde que as cifras cheguem a estratosfera…

– Porque a reboque dessa tragédia, flui a esmagadora maioria das franquias a partir de interesses mercadológicos, em contra ponto as nossas reais e emergentes necessidades, a fim de nos reentroduzirmos no cenário internacional de verdade…

– Porque, se realmente quizermos avaliar o peso dos porques anteriores, e dispendermos um tempinho revendo este vetusto video, poderemos ter uma grata, apesar de perdida no tempo, surpresa ao vermos e constatarmos o quão  injustos fomos com aquela surpreendente equipe, atuando sem os rompantes vocais de narradores que veem e imaginam um outro jogo, avalizados por comentaristas que o imaginam surreais, porém atuando como equipe, una e indivisível, atacando em bloco, lá dentro, bem dentro da cozinha adversária, e defendendo numa irrepreensível linha da bola, flutuando lateralmente, jamais longitudinalmente, a ponto de raramente ter um jogador excluido pelo limite de faltas, dominando os rebotes com maestria e se antepondo aos longos arremessou com decisão e competência. Uma equipe que não deveria ter sido aniquilada como foi, em duas etapas, uma logo ao início do trabalho no segundo turno, quando teve afastados três de seus melhores jogadores, depois ao não ser mantida para o NBB3, trocada pela mediocridade, séria e perigosamente  ameaçada pela mesma se continuada, voltando a ser o saco de pancadas de quando a encontrei, treinei e competi no mais alto nível, Realmente lamentável e inglório o seu fim…

Revendo-a jogar, última classificada na competição, mas vinda de duas vitórias exuberantes, contra a líder do campeonato, Brasilia, e Vila Velha, enfrentando a quinta colocada, Joinville, num grande e repleto ginásio, que a aplaudiu no final, com uma comissão técnica aquietada e tranquila em seu banco, em oposição a uma frenética e agressiva do outro lado, pedindo somente um tempo num jogo difícil, delegando iniciativas previamente treinadas com seus experientes jogadores, sérios e dedicados uns para com os outros, ajudando-se permanentemente, errando minimamente nos fundamentos, e principalmente, jogando em harmonia, como deve ser jogado o grande jogo, coletivamente…

Atuar coletivamente, objetivo inalcançável por nossas equipes, da base a elite, por uma única razão, não são ensinadas, treinadas e orientadas para alcança-lo, porque primeiro não existe interesse, segundo porque não sabem, os estrategistas, como faze-lo, sendo mais fácil e palatável trocar “peças” a cada temporada, dá menos trabalho, e como todos os corporativados seguem a mesma cartilha, que vença o mais equipado com pecas importadas e uma ou outra nacional, chutando de três, dando tocos monumentais, e monstruosas enterradas, para o encantamento de todos…

Que bom teria sido ver aquela humilde equipe jogar uma temporada completa, mas vale a pena assistir seu basquete enxuto, técnico, correto, equilibrado, e acima de tudo, proprietária, por pouco tempo, bem sei, do coletivismo até hoje inalcançável pelas demais franquias e mesmo seleções, passados dez anos de estrada…

Assistam, deleitem-se com o grande jogo bem jogado, sem histerias vocais e comentários ufanistas, claro, se houver interesse no que venha a ser basquetebol coletivo. Um abração a todos, feliz Natal e um 2020 repletos de esperanças, principalmente para o grande, grandíssimo jogo.

Amém.

Foto – Arquivo pessoal.
Um oportuno adendo clicando aquihttp://www.coracaoemquadra.blog.br/2010/04/02/joinville-63-x-71-saldanha-da-gama/.



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