Grande parte de nossos analistas, perante números como os mostrados a seguir, fatalmente concluiriam que a derrota do Pinheiros ante a equipe argentina do Obras Sanitárias se deu pelo baixo índice nos arremessos de três pontos, quando arremessou 10 bolas a mais nessa especialidade, que aliás, faz a cabeça da maioria esmagadora de nossos jogadores (de armadores a pivôs), muitos dos técnicos, e a esmagadora maioria da midia televisiva, como a meta a ser atingida, seja no jogo que for, e valendo como exemplo para os mais jovens.
Vamos aos números:
Pinheiros – 24/47 nos dois pontos com percentual de 51%.
4/22 nos três pontos com percentual de 18%
17/23 nos lances livres, percentual de 73.9%
O.Sanitárias-24/40 nos dois pontos com percentual de 60%
5/12 nos três pontos com percentual de 41.6%
17/22 nos lance livres, percentual de 77.2%
Pela similitude dos números nos arremessos aproveitados de dois pontos e lances livres, 24 e 17 para ambos, explicariam a derrota pela mínima diferença de 4 para 5 arremessos de três, a favor dos argentinos. E pronto, estariam esclarecidos os três pontos na diferença final, relevando a diferença percentual de 18 a 41.6%, como uma noite pouco inspirada para nossos qualificados especialistas nos longos tiros.
Mas a verdade verdadeira não condiz com a conveniente frieza de tais números, quando evidências mais profundas vão muito além dos mesmos, convenientes, ou não…
Vejamos outros números, aqueles que realmente explicariam a realidade deste jogo decisivo, a realidade de todos os jogos realizados, e que se realizarão no NBB3, quiça, em todos os jogos, de todas as categorias e faixas etárias em nossos campeonatos municipais, estaduais e nacionais.
Os três pivôs do Obras converteram 47 pontos, contra 28 dos pivôs do Pinheiros( frize-se que estavam numa excelente noite, nos rebotes e nas conclusões…), assim como os demais jogadores, armadores e alas do Obras converteram 33 pontos, contra 49 dos do Pinheiros, num cruzamento de tendências que decidiram o jogo, onde o aproveitamento nos lances livres, 17 para cada, não determinava supremacias. Logo, o jogo de 2 em 2 pontos da equipe do Obras, centrando sua estratégia coletivista no jogo interior, superou o evidente jogo exterior do Pinheiros calcado nos arremessos de três para deterninados e conhecidos jogadores, acrescido de um outro fator de estratégia individual, a tentativa bem sucedida de diminuição na eficiência pontuadora dos jogadores Shamell e Marquinhos, de 20 ou mais pontos por partida(Shamell foi o maior pontuador da competição), em 5 pontos para menos de ambos(fizeram 15 pontos cada), dando ao Obras um significativo handicap que os levariam a vitoria.
Somemos a todos esses fatores, a evidência mais cabal de nossa forma de jogar teimosa e preferencialmente no perímetro externo, forma esta incentivada desde as categorias de base, pela frouxidão endêmica de nossas defesas no mesmo, originando um conseqüente, e até proposital desinteresse pelos fundamentos de dribles e fintas, que são os pontos primordiais para o ingresso consciente no perímetro mais próximo a cesta, desencadeando um processo de abandono dos pivôs, numa quase marca registrada no atual panorama do nosso basquetebol como um todo.
Todos estes fatores deram origem a um certo tipo de comportamento de conivência entre muitos técnicos e jogadores, onde os primeiros fingem instruir, e os segundos fingem aprender, e onde ambos se locupletam ao seguirem a mesma regra, num terreno minado de interesses e pouquíssimas, ou nulas cobranças de verdade.
A derrocada de todas as quatro equipes brasileiras nesse Torneio Interligas, onde cumpriram o mesmo ritual de jogo externo, e negação do interno, obrigaram, ou incentivaram os pivôs a abandonarem seu perímetro, para virem tentar a sorte num espaço onde se transformaram em figuras patéticas de jogador, já que destituídos dos fundamentos necessários e obrigatórios a essas novas funções, sempre negados e jamais ensinados a esses jogadores.
E num jogo decisivo como o de hoje, todos esses fatores acima apontados vieram escancaradamente à tona, principalmente nos minutos finais, onde uma equipe muito bem treinada atuou e perseverou no jogo seguro e mais eficiente dos dois pontos de cada vez, ao passo que nossa valente equipe optou por dois arremessos de três quando a diferença no placar não excediam os dois pontos, às vezes um, como num recado vindo dos dois jogadores mais marcados pelos argentinos, pressionados e nervosos que se encontravam, exatamente por estarem sendo levados ao estado de imprecisão pretendido pelos dois eficientes argentinos, num solene “agora eu decido, sou mais eu”, esquecendo o coletivismo, marca indelével do grande jogo, esse mesmo jogo que contumazmente pune aqueles que negam seus princípios e tradições.
Quanto aos técnicos, parabéns ao hermano, que soube optar por estratégias (não confundir com táticas, sistemas ou jogadas…) excelentemente desenvolvidas e aplicadas por seus jogadores, principalmente seus dois armadores puros e três homens altos que se movimentaram incessantemente no perímetro interno, com bons reservas e controle mental elogiável, demonstrando a maturidade alcançada pelo seu eficiente basquete. O técnico do Pinheiros aos poucos vai se aprimorando, e um dos aspectos mais favoráveis é a sua nova postura de diálogo aberto e direto com os jogadores nos tempos pedidos, onde a prancheta perdeu seu foco estelar, apesar de ainda ocupar seu espaço. Somente um fator ainda o prejudica, o ainda não resolvido domínio por sobre determinados vícios que se instalaram em alguns jogadores, principalmente o mais serio de todos, o de acharem que ter ou não um técnico no banco se torna de menor importância, já que decidem eles mesmos o que fazer e como se comportar. Um bom chuveiro de vez em quando não faria mal nenhum, até que aprendessem a ganhar um jogo despindo-se daqueles injustificáveis e inconvenientes individualismos nos momentos onde um sentido de equipe se faz presente e altamente necessário. Essa é a função maior de um técnico numa equipe de alta competição. Mas ele chega lá, com certeza.
Amém.