A CHAVE DO GRANDE JOGO, A MESMA QUE JOGAMOS PELA JANELA DA HISTÓRIA…

O Mundial chegou ao fim, iniciando um novo tempo, o do basquetebol solidário, bem jogado, melhor esquematizado, num equilíbrio bem distribuído entre ações defensivas e ofensivas, vencendo aquele que melhor o manteve, sem oscilações unilaterais, caso da Espanha na maior parte da partida, em contraponto com a Argentina, que se deixou jogar mais pela emoção, do que com o cérebro, preponderante fator na quase surra que levou da objetiva e aparentemente gelada Espanha…

E porque um novo tempo? Pela solidificação do jogo eminentemente coletivo, onde a maior estrela, o MVP Rúbio, que apesar de seus 20 pontos, atuava e regia uma equipe junto a Lull, numa dupla armação coordenada e presente em todos os pontos do perímetro externo, fazendo jogar seus três alas pivôs, entrando e saindo do interno, de acordo com as situações que se apresentavam a cada momento da partida, numa leitura primorosa de jogo, cerne e âmago de um coletivismo exemplar, e não à toa, a FIBA escalou a seleção deste mundial com três armadores e dois alas pivôs, atestando a importância da dupla/tripla armação, aumentando exponencialmente a qualidade do grande jogo. Com uma defesa alçapão, provocando e veladamente permitindo as penetrações dos excelentes armadores argentinos, para estando lá dentro, serem abafados pelos gigantes e móveis espanhóis, no momento em que os passes seriam severamente prejudicados pelo cerco imposto, obrigando arremessos descalibrados, imprecisos e afobados, fatores facilitadores a contestações, gerando a oportunidade dos infindáveis rebotes conquistados (foram 20 a mais, muita coisa para uma decisão), um dos fatores da derrota portenha…

Os espanhóis arremessaram 25/45 de 2 pontos, 6/20 de 3, e 27/33 nos lances livres, pegando 47 rebotes, enquanto os argentinos lançaram 15/34, 7/27 respectivamente, 24/28 lances livres e 27 rebotes, confirmando nos números o equilíbrio na distribuição dos arremessos de quadra, superior ao da equipe argentina, e o enorme diferencial nos rebotes. No entanto, um outro e quase imperceptível fator estratégico, foi pouco notado e analisado pelos comentaristas, o fato da Espanha ter começado com sua armação máxima, enquanto os argentinos somente se utilizaram da infernal dupla Laprovittola e   Campazzo mais adiante, quando o placar já era bem mais desfavorável. Quem sabe a equalização nas estaturas dos armadores tenha sido o argumento para tal adiamento, que custou caro a turma portenha…

Tudo bem claro Paulo, mas explique melhor a defesa alçapão. Tenho na memória a primeira vez que a vi num campeonato mundial, o daqui no Rio de Janeiro em 1963, num jogo decisivo entre Estados Unidos e União Soviética, quando no último ataque americano, que perdia por um ponto, abriram os soviéticos a lateral rente a linha final de sua defesa para a penetração do armador americano de baixa estatura Vinie Ernest, que vendo a avenida a sua frente avançou com determinação, sendo bloqueado limpamente pelos três gigantes soviéticos, perdendo a bola e a partida. É uma opção defensiva, que deve ser muito bem feita, teatralizada, tornando real algo que na realidade não é, e de aplicação muito seletiva, combinada e para um momento decisivo no jogo, podendo funcionar ou não. No caso soviético funcionou naquele decisivo momento, no caso espanhol, funcionou por todo o tempo, pelo fator que mencionei no início deste artigo,  dos argentinos atuarem regidos muito mais pela emoção (principalmente quando se viram diante da nula pontuação de seu melhor jogador, o Scola), do que com o raciocínio objetivo, equilibrado e frio de seus oponentes, e com um detalhe a mais, suas bolas de três, competentemente contestadas não caiam …

Mas num pormenor fundamental se igualaram, a similitude de suas formações de base, num trabalho sério e responsável junto aos mais jovens, principalmente na larga difusão do Mini-Basquete original em seus países, difundido e administrado por professores e técnicos bem formados, supervisionados por associações de técnicos e suas federações, numa cruzada iniciada a 40 anos, e que vem colhendo excelentes resultados de 15 anos para cá, bem ao contrário de nós, vizinhos que preferiram a colonização da matriz, do que o exemplo mais técnico e educativo, trocando-o pelo midiático apelo de um produto econômico financeiro e político, fora de nossa realidade de país culturalmente pobre, carente de educação, e acima de tudo, injusto e cruel para com seus jovens…

Quando acima menciono o Mini Basquete original, o fiz por constatar que bem no início de sua implantação no país, idealizado pela ABRASTEBA, entidade associativa de técnicos de basquetebol, por mim idealizada, aceita e fundada durante o Campeonato Mundial Feminino em São Paulo em 1971, sendo a segunda associação no mundo, somente abaixo da americana fundada em 1927 (a espanhola somente se organizou nos ano 80), já era plano básico a introdução do MIni Basquete entre nós, idealizado pelo presidente da mesma, Antenor Horta e o professor e técnico Heleno Lima, e que dois anos mais tarde serviu de estopim para que a CBB retirasse o apoio logístico da associação, a fim de assumir o Mini como ação de sua alçada, tendo o Hekel Raposo em sua direção, determinando em mais algum tempo o encerramento das atividades da associação. Daí para diante muitas das regras básicas que geriam a administração do Mini Basquete no mundo (espanhóis e argentinos entraram de cabeça em seu desenvolvimento, assim como a França) foram sendo alteradas por aqui através interesses bem conhecidos de técnicos ávidos por títulos, e não por formação de jogadores, como a regra do empate possível ao término dos jogos, a obrigatoriedade de todo jogador só poder atuar em não mais do que dois quartos consecutivos, e pelo menos num quarto em cada partida, eliminando o estrelismo e a figura do banco sem atuar, que dentre outras regras adaptadas, como altura da cesta e tamanho e peso da bola, davam a atividade mais um caráter recreativo do que competitivo, ensinando os movimentos básicos e estimulando o amor pelo esporte…

Enquanto isso mudávamos as regras, aplicávamos as defesas zonais numa idade inadequada, preteríamos jovens coordenados por outros pelo critério da altura, tentávamos especializar a garotada de 1 a 5, incentivávamos a chutação de três, numa idade onde a força motriz ainda é insuficiente, ampliávamos as peneiras, entregavamos o ensino a pessoal inadequado e pouco formado nos ditames didático pedagógicos exigidos para uma boa e eficiente educação de movimentos e atitudes, e iniciavamos um pré processo profissionalizante, onde mentores e agentes se encarregavam do futuro dos jovens craques, onde o fator estudo era de somenos importância. Enquanto Canadá, Argentina, Espanha, Austrália, Nova Zelândia, França, Alemanha e muitos outros países centravam esforços pelo esporte educação, nossos esforços se voltavam ao fulguroso futuro de nossos infelizes prospectos na NBA, panacéia com princípio, meio e fim de um desastre de proporções esperadas e concretizadas, porém, todo esse cenário de terror, alimentou currículos vencedores e premiados de muitos técnicos, alguns dos quais agraciados com seleções nacionais, para darem continuidade ao desastre em que nos encontramos…

Enfim, vai nos custar muito redescobrir o fio da meada perdido, muito mesmo, pois não vejo no âmbito federativo e confederativo qualquer providência que possa vir a enfrentar e contornar um quadro tão assustador, pois ainda estão indelevelmente atados a política do compadrio e do Q.I. institucionalizado, germes pútridos de tudo de errado que aí está, visceralmente escancarado no seio do grande jogo, empobrecendo e aviltando-o da forma mais injusta possível…

No entanto, gostaria de encerrar este artigo com uma foto (O Globo de hoje, 16/9), que retrata com precisão uma de minhas lutas aqui neste humilde blog, e que espelha em tudo e por tudo o quanto de desconhecimento e ignorância ainda nos assalta quando o ponto em questão são os fundamentos, o de arremesso em particular, como esse do MVP do Mundial Rúbio, que para muitos é a antítese do que consideram o equilíbrio perfeito do corpo na vertical, posicionamento estético e estiloso (muitos definem como “mecânica perfeita de arremesso”), mas que ao contrastar em tudo e por tudo com tal e perfeito modelo, define de uma vez por todas o que venha a ser o arremesso técnica e mecanicamente preciso e confiável. E para tanto, e se houver interesse na matéria em questão, acessem um artigo que bem define o que venha a ser controle do centro de gravidade corporal no ar, e o concomitante correto e confiável direcionamento da bola no sentido da cesta que determina o sucesso do mesmo, complementando com o outro artigo da série Anatomia de um Arremesso (acesso no espaço Procurar Conteúdo no blog), onde o detalhe ínfimo da retração do dedo médio na bola, alinhando-o ao anelar e indicador, otimizando a aplicação tripla de força a bola, é parte de um estudo de minha tese de doutorado sobre o assunto (Um estudo sobre um efetivo controle de direcionamento da bola no arremesso com uma das mãos no basquetebol – FMH/UTL 1992).

Claro que muitos vão contestar esse estudo, pois onde já se viu um brasileiro estudar, pesquisar e provar conceitos científicos sobre arremessos, sem pertencer ao mundo acadêmico americano e o globalizado da NBA, como?…

Pois é minha gente tupiniquim, sejam um pouquinho curiosos e pesquisem nesta infindável internet assuntos a respeito, e garanto que não encontrarão um estudo contestatório sequer, e mesmo análogo ao mesmo, e sabem por que? Isso mesmo, acertaram, ele mata a questão, e por isso é lido e consultado lá fora, e mesmo aqui dentro nos artigos que fracionei na série acima mencionada, e que são seguidos e aplicados a granél, porém com uma negação de autoria. Por mim tudo bem, já me acostumei de muito a situações mais restritoras do que essa, pois quando muito desejo do fundo do coração que simplesmente aprendam a arremessar com mais precisão e menos estilo, o que já seria suficiente para melhorarmos bastante…

No mais, que os deuses nos ajudem, um pouco mais do que já o fazem.

Amém.



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