ONDE AS VERDADES ACONTECEM, OU DEVERIAM ACONTECER…

Mais uma oportunidade perdida…

(…) Respeito muito o trabalho do treinador, e seus esforços para dar personalidade a equipe, mas convenhamos, não seria o caso de fazer entrar uma outra pivô para, com duas próximas a cesta forçasse a quinta falta da boa e importante pivô coreana? Ainda mais que vem atuando neste quarto final com quatro faltas? (…). discursava o comentarista…

Fazendo forte coro a este raciocínio, narrador e o outro comentarista, aos brados, lançavam votos canônicos e satânicos, correntes de oração pela quinta falta daquela, que praticamente sozinha, dizimava a equipe brasileira, que, teimosamente, insistia nas bolas de três, como o outro comentarista garantia ser a solução, ainda mais plausível se determinada jogadora que mofava esquecida no banco, adentrasse a quadra, não privando a equipe de sua maestra habilidade. O tempo se escoou, a especialista chutadora entrou, não resolveu, a pivô coreana se manteve em quadra, anotou pontos, deu belos passes, pegou rebotes, e o mais importante, marcou uma, às vezes duas brasileiras com técnica defensiva aprimorada, que se cansaram de perder bandejas, passes e rebotes, para festejar a classificação de sua fraca equipe ao mundial da Austrália, e não cometendo a tão pranteada quinta e redentora falta…

Comentar as outras duas derrotas se faz desnecessário, no momento em que  o jogo decisivo foi perdido bisonhamente, pois, em tempo algum, desde o advento dessa nova direção, com sua “nova filosofia de jogo”, soube a equipe atuar como equipe, unida pela técnica e por um sistema de jogo diferenciado de um sistema praticado por todos, globalizado por uma liga asfixiante, a NBA, e por que não a WNBA também, onde o individualismo exacerbado promove duelos de 1 x 1 em toda a quadra, fazendo com que aquelas equipes dotadas dos melhores e mais fundamentados jogadores vençam jogos, muitos jogos, e seus luminares alcancem recordes e glórias midiáticas, mas nem sempre campeonatos, que é objetivo de um grupo que se predispõe a alcançá-los, numa antítese do individualismo reinante…

Ser alçado a MVP, recordista de pontos de uma liga, mais recordista ainda de doubles e triples, tocos e enterradas, e a coroação máxima, o reinado nas bolas de três, são os verdadeiros entraves aos princípios do coletivismo, pois vai diretamente ao encontro de interesses de agentes, empresários e mesmo “técnicos” ávidos pela projeção midiática, valorizando, em muito, conquistas monetárias e econômicas, para jogadores também…

           (…) Um absurdo ver a única pivô coreana, jogar 38 min da partida, tendo quatro faltas no último período, sem que utilizássemos nossas três gigantes em torno dela, para forçá-la a quinta e salvadora falta (…), discorria indignado o comentarista, que ao final do jogo não divulgou uns simples números:

– Erica               – 21,37min   – 10 pontos

– Stephanie       – 16,33min   –   2 pontos

– Kamilla           –  19,54min   – 11 pontos

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                                         57,24min     23 pontos

– Park                –  38,10min      20 pontos

A Park jogou menos minutos que nossas três pivôs e anotou somente três pontos a menos que todas elas, impactante, não?…

(…) Mas foram raros os momentos em que tivemos duas delas em quadra, e em nenhum momento vi a Stephanie e a Kamilla atuarem juntas (…), mencionou em seu argumento final…

Dois outros números reforçam os porquês de uma derrota lapidar, 10 erros de fundamentos (15 para a Coreia), e 7 erros nos lances livres, (10/17 -58,8%, contra 12/14 – 85,7%), por si só suficientes para vencer o dantesco jogo. Completando o quadro, arremessamos 20/48 – 41,6% nos 2 pontos, contra 20/38 – 52,6%, números que ressaltam a produtividade da pivô Park dentro do perímetro brasileiro, e 8/28 – 28.5% contra 8/30 – 26,6% nas bolas de três, provando definitivamente ter sido a alta eficiência da Park o fator primordial da vitória de sua equipe…

Ora muito bem, concluamos sem maiores delongas, ter sido o fato de atuarmos enclausurados na camisa de força de um sistema que se conclama universal, que remete o grande jogo ao campo provocado e infindável do 1 x 1 (daí o desespero dos estrategistas pelo jogo com os cinco “abertos”), realidade que desencadeia uma infinidade de “retóricas e invenções” rabiscadas em pranchetas, alcunhadas de geniais, criativas e decisivas, quando na verdade crua, não passam de um biombo situado entre técnicos e jogadores, onde de um lado enlevam sonhos inatingíveis, e por outro blindam jogadores que pouco ou nada assimilam ante tantos rabiscos ininteligíveis, num momento em que a existência coercitiva de tal biombo, afasta a real necessidade de um encontro tranquilizador, incentivador e técnico, olho no olho, onde pequenas, porém poderosas verdades táticas devem ser observadas pontualmente, individualmente, coletivamente, que é o verdadeiro papel de um líder, um professor, que os ensinou, treinou e vem orientá-los naqueles momentos em que mais precisam de uma palavra conciliadora, e não os “quero isso”, “quero aquilo”, “exijo dessa forma”, etc, que pululam a granel nos quase sempre desnecessários pedidos de tempo (uma equipe bem treinada sabe muito bem como se comportar em quadra…), noves fora os palavrões de praxe…

Sistema único, cinco abertas, chega e chuta, tem de ser mudado, radicalmente.

“Nova filosofia de jogo” uma ova, já que o sistema único continua a todo vapor, intocável, rígido como o concreto, com jogadores encordoados desde fora da quadra, e enquadrados em quimeras pranchetadas. Se numa determinada rodada de uma liga, qualquer uma, fosse proibido o uso de pranchetas, teríamos muitos estrategistas mudando de profissão, o que seria bom para o grande jogo, mas péssimo para o marketing auto promocional que eles tanto professam…

Temos de mudar o enfoque técnico tático do grande jogo entre nós, desde a formação de base, e já lá se vão mais de mil artigos publicados neste humilde blog, onde conclamo tal objetivo, explicando-o, definindo-o, e mesmo ensinando-o como fazer, como sempre o fiz, priorizando o treino, o desglamourizado treino, onde princípios, sistemas e comportamentos são definidos, após ensinados, treinados e discutidos profunda e detalhadamente dissecados, como deve ser todo aquele trabalho que se considera sério e profundamente responsável. O jogo, a competição em si, pertence exclusivamente aos jogadores, aqueles que se propuseram ao sacrifício diário para praticá-lo com destreza e competência, e não a uma turma enfatiada e vaidosa de que, no frigir dos ovos, julgam ser suas estrelas maiores, o que, absolutamente, não são…

Da base a elite, metodologias de ensino, treinamento e preparo visando os fundamentos e sistemas diferenciados, tem de ser desenvolvidos por quem realmente estuda, pesquisa e desenvolve o grande jogo. Esta é uma função básica da CBB.

Se não mudarmos, drástica e contundentemente nosso modo de ensinar, treinar, preparar nossos jovens em sistemas e princípios diferenciados dos demais países (já o fizemos não tanto tempo atrás) , continuaremos a perder nas competições que realmente importam, aqui dentro ou lá fora, aquelas que para serem vencidas, necessitam de criatividade, coragem em mudar e acima, muito acima de tudo, conhecimento profundo e integral do grande, grandíssimo jogo, não só teórico, como na quadra, onde as verdades verdadeiras acontecem, as quais tanto teimamos em esquecer…

Que os compreensivos e pacientes deuses nos ajudem.

Amém.

Fotos – Reproduções da TV. Clique duplamente nas mesmas para ampliá-las. 

LENDO NAS ENTRELINHAS…

Precisão e sintonia fina

Muitos são os artigos lidos aqui nesse humilde blog, principalmente os técnicos, os sobre os fundamentos, com alguns deles se destacando desde o início das publicações 17 anos atrás, como os da série O que todo jogador deveria saber (são 10 artigos), destacando-se de longe O que todo pivô deveria saber I e II, e a série recordista absoluta Anatomia de um arremesso de I a VI

Tenho a plena certeza que, a enorme quantidade de acessos aos mesmos, tenha influenciado bastante nas grandes e oportunas mudanças de nossos jogadores numa maior compreensão sobre aqueles fundamentos, não só em sua formação, assim como na prática constante dos mesmos, dando atenção às suas sutis particularidades, e acima de tudo, à importância para suas equipes como um todo…

Outros fundamentos como o drible, as fintas, os rebotes, os passes, a defesa, os deslocamentos, o equilíbrio, também são extensamente procurados, mas sem rivalizar com os sobre pivôs e arremessos, que foram os fundamentos que mais se modificaram no seio das equipes nos últimos 15 anos, principalmente na evolução dos homens altos, que se tornaram mais ágeis, velozes flexíveis e atuantes dentro e fora do perímetro, assim como nos fundamentos e arremessos, na permanente busca da maior precisão possível, abandonando o fator estético e de mecânica perfeita, pelos princípios físicos e matemáticos que compõem sua execução, onde os finos ajustes nas pegas sobre a bola, definem o maior ou menor sucesso dos mesmos, tanto nas longas, ou curtas e médias tentativas, numa mudança radical no conceito de precisão que envolve esse fundamento definidor do grande jogo…

No entanto, cabe aqui lembrar que muito dos aspectos básicos contidos  nesses mais de 1600 artigos publicados, se encontram nas entrelinhas, onde pequenos, porém decisivos fatores se entrelaçam num todo, nos fundamentos em si, quando pequenos e sutis detalhes, como os do equilíbrio, regem os demais, dando aos mesmos a solidez necessária à sua perfeita compreensão, sem a qual se tornam estanques e até mesmo, estéreis…

Um bom exemplo interpretativo pode ser observado nesse artigo publicado no O Globo de  3/2/22, sobre o jogador Curry da NBA, cuja perda de eficiência notada nessa temporada de seus mortais arremessos de três pontos, vem despertando interesse mundial, pois suas qualificações sobre a arte dos longos arremessos, vem sofrendo uma queda acentuada, preocupando aos fãs, técnicos e dirigentes de sua franquia milionária…

Lendo com mais atenção o referido artigo, um fator nas entrelinhas deveria chamar bastante a atenção, aquele que menciona o ganho de massa muscular que o mesmo apresentou nesta temporada, que por si só seria perfeitamente o responsável pela alteração de sua reconhecida precisão nos arremessos, pois o ganho muscular tem tudo, e por tudo, influência sobre as nuances e sintonia fina nas sutis alavancas de toque na bola, mais do que suficientes para alterar um gesto que não tolera mais do que 1,5 graus de tolerância a desvios de direção em sua origem, que diminui a cada vez que as distâncias aumentam. Curry alcançou altíssimo grau de precisão quando o adequou ao seu todo articular e muscular, treinando sempre com a bola, e que segundo o artigo, foi trocado por exercícios sem bola, fato bem demonstrado nos aquecimentos transmitidos em seus jogos, numa direta intervenção de um preparador técnico (ocasionalmente um brasileiro), com uso inclusive de elásticos de força. Se no aquecimento são usados, imagino nos treinos. Pois bem, uma franquia que se diz séria e avançada, torpedeia seu melhor jogador alterando o que ele tinha de melhor, sua incrível habilidade de arremessar, perfeitamente alinhada ao seu esguio perfil físico, numa sintonia fina dificílima de ser alcançada, e que de repente se vê substituída por um fator que privilegia o fator estético, disfarçado em potência, desarmando, anulando mesmo a simbiose vencedora…

Ao lermos artigos técnicos, temos de dar muita atenção ao que contém as entrelinhas, onde quase sempre se encontra o pulo do gato, assunto prioritário daqueles que não só amam, mas entendem o grande, grandíssimo jogo…

Amém.

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