O TRIGÉSIMO OITAVO DIA – A VITÓRIA…
Chego ao ginásio que ainda vazio brilha de tão limpo, refletindo a luz solar no piso uniforme e lindo. Vou até o banco e me sento já visualizando o jogo, bem ali na minha frente. De repente retiro de minha pasta um CD com músicas inéditas de meu filho caçula e peço para que o técnico que revisava o som o toque. E então, no ginásio vazio e brilhante, ao som das belas canções do João David pressinto que algo de muito especial ali ocorreria, que finalmente minha equipe, meu time, se reencontraria com seu destino, com a tão sonhada vitória, contra o líder da competição e seu plantel de grandes jogadores, jamais por um golpe de sorte, mas arrancada pela luta, e acima de tudo pela coragem de um grupo que tenho um imenso orgulho de liderar.
Na preleção que antecede o jogo traço com a equipe as estratégias longamente estudadas, fundamentadas num duro treinamento, na insistência dos que acreditam num sistema diferenciado, num sistema de sua exclusiva propriedade, mas que se escuda e ampara na coragem de desenvolvê-lo contra todas as perspectivas de um basquete engessado, padronizado e formatado como o nosso. Também estabelecemos a estratégia defensiva, optando pela utilização também corajosa da defesa linha da bola, aquela que nos propicia marcar os pivôs pela frente, que na impossibilidade de conter o poderio de atacantes de grande categoria cede aos mesmos e sob grande pressão somente a possibilidade de arremessos de 2 pontos, jamais 3, e que se utiliza da zona como recurso de quebra de ritmo, nunca como base defensiva. Enfim, em uníssono, comprometidos com o que treinamos e aceitamos integralmente fomos para a luta, dura e exaustiva luta, enfrentando a melhor equipe brasileira, a líder do campeonato.
Os dois quartos iniciais foram parelhos, 19×21 e 22×24 terminando em 41×45 para Brasília. Foram quartos de puro duelo, entre defesas e ataques, onde a equipe de Brasília não conseguiu uma cesta sequer de três pontos, qualificando sobremaneira nossa opção defensiva, contrabalançada pela eficiência ofensiva que aproveitou todas as possibilidades nos arremessos de curta distância, pois dos 11 arremessos nossos de 3 pontos, somente efetuamos 2 nesta primeira fase.
O terceiro quarto foi difícil, pois nosso pivô de ofício, André cometeu três faltas, e a equipe de Brasília insistiu o mais que pode no jogo interior com o Mineiro, além de começar a se tornar eficiente nas poucas oportunidades que dávamos para seus arremessos de 3, que foram somente 15 ao final do jogo. Venceram o quarto em 12×20.
Ao inicio do quarto final estabeleceram 13 pontos de vantagem, mas o desgaste de sua equipe já era evidente, fator que chamava uma troca de estratégia, inclusive sugerida pelo meu assistente Washington, a utilização de uma zona forte e agressiva com a finalidade de quebrar o ritmo final da equipe candanga.
Exatamente aos 5 minutos para o fim do jogo determinei a troca defensiva, e descontamos os pontos em quatro ataques desperdiçados pelo nosso adversário. Com 8.5 segundos para o término vencíamos por um ponto e ainda teríamos duas faltas de lateral para serem utilizadas. Por principio não gosto deste tipo de jogo, e uma falta proposital àquela altura poderia ser interpretada como ante desportiva, e o jogo iria para as calendas gregas. Optei pela defesa pura e simples, porém pressionada, mas o Guilherme em 3 segundos concluiu uma cesta que daria a vitoria a sua equipe. Tínhamos 5 segundos e fomos para dentro do garrafão de Brasília, como fizemos o jogo inteiro, jogando de dois em dois pontos, com segurança e minimizando erros pela proximidade dos arremessos. E o Roberto, num rebote, dominou a bola, levou falta clara, mas colocou a bola na cesta. Fim. Vitoria merecida, suada e arrancada do fundo daqueles corações corajosos e sacrificados.
Foi um belo e instigante jogo, que deveria ser veiculado para todos os amantes do grande jogo, principalmente os jovens técnicos. Mesmo os veteranos, e os velhos como eu, que tanto necessitam desenvolver alternativas técnico táticas dirigidas a um basquete caquético e viciado, atado a influências que freiam e limitam nossos jogadores com táticas e pranchetas mais caquéticas ainda. Precisamos ir de encontro a soluções inovadoras, e minha humilde, corajosa e valente equipe se posta na vanguarda desta inadiável e fundamental mudança de rumos, que se os deuses ajudarem, transformará e reintroduzirá nosso basquete em seu lugar de direito no concerto internacional, não que o que propomos e executamos seja a solução ideal, mas que sirva como sinalizadora de novos e arejados tempos, pois creio firmemente que merecemos dias melhores.
Na preleção final no vestiário, olhei fundo nos olhos de cada um e agradeci a oportunidade que nos deram, a todos, de demonstrar o valor de um trabalho honesto e inovador. Ao deixá-los sozinhos como sempre faço, ainda ouvi pela porta entreaberta a oração que todos faziam, em uníssono, agradecendo de mãos dadas a corrente de esperanças dentro de cada um.
Parabéns rapazes, vocês foram brilhantes, humildes e generosos. Estou feliz.
Amém.
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