COLETIVISMO X INDIVIDUALISMO…

Na semana recém finda, assisti pela TV algumas competições esportivas, como um jogo do europeu de futebol, onde a equipe do Barcelona foi derrotada, e varias partidas do campeonato universitário americano de basquetebol. No jogo da equipe espanhola, chamou-me a atenção um comentário do analista da emissora sobre o comportamento retraído e silencioso do técnico holandês da equipe, sentado calmamente em seu banco, sem manifestações ostensivas na beirada do campo. O comentarista criticava aquela atitude passiva, argumentando da necessidade que o mesmo teria de agir, nem que fosse gestualmente, como uma satisfação aos torcedores, ao “demonstrar” trabalho e interesse pela equipe que passava por uma situação de derrota. Ou seja, defendia a síndrome da luz-vermelha, quando um técnico ao flagrar uma câmera focada em si (quando ligada emite uma luz vermelha ao lado da lente) imediatamente se põe ao lado do campo gritando e gesticulando para passar a idéia de participação ativa no jogo, mesmo sabendo ser impossível que seus brados sejam ouvidos por quem quer que seja dentro de campo. Mas ficam os gestos agressivos e passionais, que tem garantido muitos contratos pela sua “participação ativa” perante os dirigentes, mesmo sabendo ser inócua na realidade do jogo. O testemunho do comentarista põe em evidência, não só para ele, mas para uma grande parte da imprensa esportiva, como valorizam o mís en scéne oportunista e revelador de uma corrente de técnicos, mais preocupados com sua posição no mercado de trabalho, do que a equipe que dirige. Esquecem que o trabalho de um técnico é realizado nos treinamentos, intensamente, e em uma ou outra substituição que se faça necessária, além dos ajustes que poderá fazer nos intervalos dos jogos. Pererecar, dançar, saltitar, em atitudes de péssima coreografia ao lado de campos e quadras, além do ridículo a que se expõem , nada acrescentam às suas equipes, a não ser a demonstração da pouca qualidade técnica de seus treinamentos, onde deveria preparar a equipe, sem gestos, discursos ou câmeras focando seus inflados egos.

Outra intervenção abalizada criticava a tendência de alguns técnicos defenderem a preparação das equipes de basquetebol focadas basicamente na pratica dos fundamentos, privilegiando as individualidades, em vez do coletivo, que segundo sua opinião, levada pelo poder da mídia televisiva a uma quantidade enorme de cabeças jovens país afora, é a que deve prevalecer, no que é acompanhado por boa parte da critica basquetebolística nacional, num lamentável equívoco, pois omitem pela ignorância o fato inconteste de que a base coletiva de uma equipe é fornecida pelo preparo e pleno domínio por parte dos jogadores, dos fundamentos do jogo, sem os quais nenhum movimento técnico-tático obtém sucesso.

Dois enfoques equivocados, plena e estruturalmente equivocados, mas que preenchem rotineiramente muitos dos comentários feitos e emitidos por uma parcela da imprensa descomprometida com as bases autênticas do desporto, porém extensamente comprometida com as modas e os conceitos globalizados que privilegiam o espetáculo em função da educação e dos princípios sociais dos mesmos.

Nesta segunda-feira, assistiremos ao jogo final do campeonato universitário americano, na presença de 50 mil torcedores e alguns milhões espalhados pelo mundo, num espetáculo onde os princípios e as tradições universitárias americanas atingem o mais alto grau, quanto a importância do desporto na formação integral dos jovens daquele país, e onde não testemunharemos coreografias ao lado da quadra por parte dos técnicos envolvidos, e muito menos a negação da qualidade individual dos jogadores, que estarão inseridos no coletivismo de suas equipes, coletivismo esse garantido e lastreado pela competência e segurança de seus jogadores pelo pleno domínio dos fundamentos do grande jogo.

De um lado a Universidade de Kansas, sólida em seu preceito de jogo coletivo, pausado e altamente seletivo nos arremessos. Por outro, a Universidade de Memphis, com sua exuberante individualidade levada á excelência nos fundamentos de todos os seus jogadores, onde o coletivo massivo cede vez à improvisação, somente factível através o mais qualificado e sedimentado domínio dos mesmos, prenunciando uma batalha entre o determinante coletivo, contra o instigante individualismo responsável . Quem sabe nossos sábios comentaristas possam justificar alguns de seus equivocados pareceres, perante as duas realidades que comentarão, ambas tendo um condutor comum, seja no coletivismo, seja no individualismo, o domínio dos fundamentos.

E que esse exemplo seja seguido em nosso país pelos lideres técnicos das gerações que se iniciam na pratica do basquete, sem serem sugestionadas e estigmatizadas por conceitos técnico-táticos preestabelecidos, e sim orientadas a um preparo sensível, prolongado e qualificado das bases do jogo, os fundamentos, que consolidados serão a base futura de sistemas, tanto ofensivos, como defensivos. A negação dessa evidência somente corrobora a nossa proverbial tendência à minimização do competente ensino dos fundamentos, em beneficio de um coletivismo mantenedor do sistema único, no qual a prancheta representa e reflete o narcisismo de seu mentor.

Amém.

FUNDAMENTOS (SEMPRE ELES…)…

Foi um final emblemático. A equipe de Brasília, após uma reação eficiente e brilhante, tirando uma vantagem apreciável da equipe argentina do Regatas Corrientes no placar, e que mesmo desfalcada de seus dois jogadores americanos conseguia manter o controle do jogo, conseguiu o impossível, perder um jogo ganho por retirar dos dois armadores que sempre foram mantidos em quadra a tarefa de comandar a equipe nos momentos decisivos. Foram duas ações ofensivas, a segundos do final, que desmontaram todo o esforço despendido pela equipe até aquele momento, jogando fora uma vitoria importantíssima, ainda mais em um jogo em seus próprios domínios,

A primeira jogada, que deveria ter como condutor mestre um dos dois armadores em quadra, teve um desenrolar lastimável, pois o pivosão de Brasilia, que adora arremessar de três pontos, vem até fora do perímetro, para um possível corta-luz, abandonando o posicionamento próximo à cesta, crucial naquele momento do jogo, mas recebe um passe, e de costas para a cesta, toma uma atitude de quem se preparava para um passe ou um drible, mas mantendo a bola dominada na altura do peito, com as mãos paralelas ao solo, e os cotovelos afastado do corpo, num posicionamento totalmente errado à luz dos mais comezinhos princípios dos fundamentos (sempre eles…) do jogo. Ato continuo, pela brecha escancarada entre o braço e o corpo, esgueirou-se a mão do marcador argentino, que num sutil toque de baixo para cima tira a bola do controle do fortíssimo e pesado pivô, originando um contra ataque que deixa sua equipe a um ponto da equipe da casa.

A segunda jogada, logo a seguir, coloca o bom ala de Brasília do lado direito da quadra, e que de posse da bola inicia uma penetração por dentro do garrafão driblando com sua insegura mão esquerda, fluindo para uma armadilha tripla montada pelos argentinos, que somente ampararam a bola perdida pela incúria de quem não tem fundamentos ( sempre eles…) sólidos no drible. Outro contra-ataque argentino e fim de jogo.

E em nenhuma das duas jogadas finais que decidiram a partida, quaisquer dos dois ótimos armadores em quadra tiveram a bola em suas mãos, para exercerem o mais solido de seus fundamentos, o drible, a posse de bola que poderia decidir o destino do jogo.

Ironicamente, seu técnico, que sempre propugnou a utilização de um único armador, inclusive em sua longa passagem pela seleção brasileira, tem mantido a formação com dois armadores nessa sua nova equipe, com resultados animadores e eficientes, mas que assistiu a derrota da equipe protagonizada pela ausência de ambos no momento decisivo, cassados que foram por dois jogadores que falharam na execução básica dos fundamentos (sempre, e sempre eles…), anulando seus esforços e sacrifícios no desenrolar de um jogo em que tiveram a enorme oportunidade de vencerem em casa uma semi-final sul-americana.

Fica então a grande pergunta, aquela que a maioria dos técnicos, jornalistas e entendedores do grande jogo, se negam a fazer – devem os jogadores adultos, mesmo em idade mais avançada, treinarem, e por que não, aprenderem princípios e formas baseadas nos fundamentos do jogo? A maioria sequer considera a possibilidade, dando absoluta preferência aos movimentos táticos e as jogadas pré-estabelecidas, esquecendo o preceito básico de que sem o pleno conhecimento e domínio dos fundamentos, nada do que treinarem surtirá efeitos decisivos naqueles momentos em que o “saber fazer” definirá o rumo de qualquer jogo.

E como colaboração desinteressada àqueles dois jogadores que falharam bisonhamente, aqui vão duas orientações de quem por muitos e muitos anos preparou jovens e adultos no mister de jogar basquetebol, a não tentarem  ganhar jogos no impulso e no instinto, pois só improvisa quem sabe e domina a tarefa que se predispôs a realizar.

Sempre que dominar a bola, esteja de frente, de lado ou de costas para a cesta, mantenha-a SEMPRE abaixo da cintura, preferencialmente abaixo dos joelhos, pois dessa forma seu marcador, se quiser tentar roubá-la, terá de sair de seu equilíbrio estável pela projeção do corpo em direção à mesma, tornando-se, inclusive, suscetível a um corte ou uma finta veloz e de difícil, senão impossível, recuperação.

No ato de progressão à cesta, principalmente sob pressão e de encontro ao âmago da defesa contrária, e se tiver mesmo que fazê-lo, faça-o driblando com sua mão mais precisa, que se não for nenhuma das duas, passe a bola para quem tem a devida competência de executar a ação com mais eficiência que você, pois afinal, o reconhecimento dessa, que poderá ser uma corrigível deficiência através treinamento árduo, somente beneficiará a equipe da qual você faz parte, cujo sucesso dependerá de atitudes de auto-reconhecimento e renuncia, de todos em função dos que dominam os fundamentos. No momento decisivo a precisão é que define um jogo.

Enfim, por mais uma vez, a deficiência no conhecimento e domínio dos fundamentos “entregam” um jogo praticamente ganho, repetindo situações às dezenas que testemunhamos ano após ano, inclusive em jogos de nossas seleções nacionais. O que nos falta para corrigirmos essa, que na minha humilde opinião, é a mais nefasta e constrangedora deficiência? O que nos falta? Respondam, luminares do basquete nacional.

Amém.

NCAA X FIBA…

Teremos no próximo fim de semana a decisão do Final Four, onde as quatro melhores equipes universitárias da NCAA mostrarão porque são finalistas, num torneio que movimenta milhões de dólares na mídia, e sedimenta a tradição esportiva do mundo escolar norte-americano. É na escola que a juventude americana trava conhecimento e se insere nos princípios éticos e de cidadania, conjuntamente com as artes e as disciplinas curriculares, que garantirão seu futuro e o de seu grande país. Dos milhares de participantes, somente 48 jogadores atingiram o ápice da competição, dentre os quais somente uns poucos darão continuidade em suas carreiras desportivas em competições profissionais, mas de posse de um diploma valioso para a inserção no mercado de trabalho, assim como os demais que não chegaram as finais.

UCLA, Kansas, North Carolina e Memphis, são as equipes classificadas, as mais fortes, técnica e fisicamente, sem, no entanto se constituírem em massas disformes e inchadas. Ao contrário, são fortes e atléticos, com grande mobilidade e flexibilidade, haja vista as defesas impactantes e pressionadas, todas num ritmo de intensidade muito acima das demais concorrentes. Sem dúvida nenhuma, foram as equipes com maior poder defensivo na competição, principalmente nos bloqueios dos arremessos curtos e na presteza em que diminuíam os arremessos de três dos atacantes.

Por outro lado, apresentaram uma plêiade de armadores de enorme potencial, tanto em assistências, como nas finalizações, sem contar o enorme controle de bola nos dribles e nas fintas, por um tempo acima dos 30 seg. , já que não seguem a regra dos 24 seg. da NBA e da FIBA. Nota-se perfeitamente o enorme esforço que essas equipes, assim como as demais 64 finalistas, em cadenciarem o jogo, em confronto com a tendência do jovem americano de acelerarem as manobras de ataque, principalmente nos contra-ataques, tendência de larga e histórica tradição do basquete universitário.

Mas existe a necessidade vital do basquete americano de voltar à primazia no campo internacional, pressionados pelos resultados negativos nas grandes competições da FIBA, e para tanto necessitam assimilar o quanto possam da maneira européia de jogar, cadenciado e com altíssima seleção de arremessos, principalmente os de três pontos. E foi o que se viu nessa grande competição, ataques pausados, estudados à exaustão, fortíssima defesa, e grande presteza nos arremessos de três.

Mas algo de especial ainda se mantém inalterado, a combatividade viril embaixo das cestas, numa movimentação corpo a corpo jamais permitida pelas regras internacionais, e que se tornaram o terror dos grandes pivôs americanos em torneios com a aplicação das mesmas. Outro fator restritivo é o completo domínio técnico-tático dos treinadores sobre qualquer movimentação de ataque, onde a exigência de atuação é garantida pelo tempo de 35 seg. que as equipes tem para suas ações ofensivas, ao contrário das equipes mundiais que tem de se ajustar aos parcos 24 seg.a que têm direito.

Acredito que em muito pouco tempo, as equipes universitárias se voltem para as regras internacionais, com seus critérios de marcação de faltas, e suas regras aceitas e reconhecidas pela comunidade internacional, se quiserem encurtar o grande espaço existente pela busca de vitorias no concerto das demais nações. Mesmo os grandes profissionais da NBA encontram grandes dificuldades nos embates sob as regras da FIBA, principalmente pela existência das defesas zonais e coberturas permanentes às penetrações, aspecto este omitido em suas próprias e particulares regras.

Mas pelo visto até agora, grandes modificações de comportamento técnico-tático puderam ser observadas nessa temporada universitária, como um consenso de técnicos, voltados às necessárias adaptações de seus jogadores às exigências de um tipo de atitude individual, e por que não, coletiva, que os capacitem positivamente para o confronto internacional, cujas repetidas derrotas não foram digeridas pelos grandes técnicos locais.

Mas enquanto permanecerem com suas regras particulares, mesmo adaptando e restringindo certas características de velocidade em seus jogadores, somente uma mudança definitiva nas regras os farão novamente competitivos e presentes nas grandes competições mundiais, pois a base na qual se apóiam e onde são imbatíveis continua intocada em sua qualidade e precisão, o ensino dos fundamentos do jogo, respaldo de suas tradições e conceitos educacionais.

Vale a pena acompanhar essas finais, assim como o grande esforço que fazem para retroalimentarem um sistema poderoso e extremamente bem organizado,apesar de defasado perante o “resto” das nações, que enquanto forem assim consideradas pela sua tradicional arrogância, encontrarão cada vez mais obstáculos às vitorias, deixados em seus caminhos por aqueles representantes do…”resto”.

Amém.

LIÇÕES DO NORTE…

Com o término da fase classificatória para o torneio dos dezesseis finalistas da Loucura de Março da NCAA, podemos tirar algumas oportunas conclusões, pois com as facilidades das transmissões via internet, praticamente pude observar todas as 64 equipes que dela participaram.

Após tantos e tantos jogos, em quatro dias de intensa atividade, com belos e grandes ginásios permanentemente cheios, disciplinadamente irretocáveis, público e jogadores, de saída algo ficou claro e cristalinamente exposto, a uniformidade técnico-tática de todas as equipes participantes, jogando rigorosamente iguais em seus sistemas de jogo. Com o tempo de posse de bola de 35 seg. essa similitude ficou ainda mais patente, pois o jogo de armadores, de posse de bola driblada, e de construção de jogadas visando basicamente os arremessos de três pontos, foram comuns a todas as equipes, tanto as de pequena tradição, como as grandes e ranqueadas. Uma ou outra se diferenciava somente no aspecto dinâmico, com o incremento da alta velocidade nos contra-ataques, ao contrário da grande maioria que preferencialmente cadenciava o jogo. O tradicional jogo de pivôs não encontrou nessas finais o mesmo apelo e preferência de temporadas anteriores, numa tentativa de aproximação da forma de jogar e atuar das equipes européias. As declarações do Coach K, após o fracassado campeonato mundial, quando afirmou que os Estados Unidos precisava aprender a jogar como os europeus, por que dessa forma poderia vencê-los no futuro pela força de sua base de formação de grandes valores, bastando somente se adaptar ao jogo cadenciado do velho mundo.

E então o que vimos e constatamos, foi uma atitude de consenso por parte dos técnicos dessas universidades, fazendo suas equipes atuarem da forma mais cadenciada possível, onde a ação dos armadores nunca foi tão decisiva como nesses novos tempos de adaptabilidade e aprendizado, como uma aposta num futuro, no qual a reconhecida capacitação nos fundamentos do jogo tornarão as futuras equipes americanas plenamente igualadas às da Europa, com um diferencial a mais a seu favor, a inquetionável supremacia nesse campo.

No aspecto defensivo, nunca se viu tanta variação entre defesas individuais e zonais, assim como sua tradicional tendência às pressionadas quadra inteira, por parte de todos, como um bem orquestrado projeto visando a retomada da supremacia histórica de seu basquete no mundo, e que foi perdida pelo isolacionismo espontâneo e a arrogância de muitos que se escudaram na supremacia da era NBA, com seus astros milionários, imbatíveis e míticos. Com as perdas irreparáveis nas últimas grandes competições internacionais, uma luz de alerta foi acionada, deflagrando um movimento de soerguimento, que só poderia ser exequibilizado pela estrutura que fundamenta todo o basquete americano, inclusive a NBA, o desporto de base, tanto o escolar, como o universitário.

Nesses primeiros dias de competição classificatória, sobressaíram os armadores, responsáveis pelo apelo da cadencia tática, os arremessadores de três pontos, e a ressucitação da jogada clássica, drible, parada e jump de dois pontos, jogada essa quase extinta pelo advento dos pivôs de força com seu jogo interior, além do já mencionado jogo visando basicamente os três pontos. Em tudo e por tudo o mais próximo possível da forma de jogar européia, com uma e definitiva diferença, motivada pela posse de bola de 35 seg., a capacitação técnico – pratica dos armadores, que são a alma do basquete europeu, onde atuam em duplas, quando, ante ao prolongado tempo de posse de bola, se vêm forçados a uma concentração mental bem superior se estivessem sob o regime de 24 seg. de posse da mesma. Trata-se de uma atitude inteligente e perspicaz, pois forçando os armadores a um exercício de domínio mental, torna-os mais efetivos quando da mudança aos padrões da regra internacional, iguais aos da NBA quanto ao tempo de posse de bola. Paralelamente a essa tendência, nota-se um aumento significativo na qualidade dos arremessadores de três pontos, largamente empregados nessa fase de classificação.

Enfim, mais uma vez os técnicos universitários americanos dão um exemplo de uniformidade técnico-tática, atendendo às necessidades de modificações na forma de preparar e fazer jogar os jovens que serão os responsáveis pelo futuro daquele tradicional e brilhante basquetebol.

Enquanto isso, aqui na terra de Macunaíma, mantemos a forma de jogar, copiada ao extremo do conceito NBA, e que nem mais os mesmos aceitam jogá-lo, e que aguardam as novas gerações de universitários para definitivamente se equipararem, e possivelmente vencerem os europeus e argentinos. Assim pensam e assim agem, uniformemente em torno de um objetivo comum, baseado na formação de novos valores, através o único dos sistemas válidos, o domínio integral e decisivo dos fundamentos.

Quanto a nós, nos perdemos em testes de exaustão “yoyo”, aplicados em púberes de 13-14 anos. Que os deuses nos ajudem.

Amém.

CONCEITOS X FUNDAMENTOS II

A Loucura de Março do basquete universitário americano realmente transcende a nossa percepção do que venha a ser basquete organizado em todos os sentidos. Mais agora, que pela internet podemos acessar todos os jogos, ao vivo e à cores. Dá gosto ouvir comentários de quem realmente entende do riscado, enxutos e objetivos, feitos por quem convive com uma realidade muitos furos acima da nossa. E por conta desse espetáculo anual imperdível, por pouco deixei passar uma notícia dada no Databasket intitulada “Testes físicos ajudam comissão técnica da sub-15 masculina”, publicada no dia 19 desse mês.

Custei a acreditar no que estava lendo, incrédulo e profundamente preocupado. Por longos e longos anos me dediquei à categoria Infanto-Juvenil, hoje chamada de cadetes, e que sucedia a de Infantís, com idades entre 13 e 14 anos, exatamente na faixa da atual Sub-15. Se no Infanto, a minha preocupação maior era a de ensinar e treinar jovens em uma fase decisiva em sua maturação como indivíduo, situado a meio caminho da puberdade, com suas drásticas modificações morfológicas e psicológicas, e sua propensão ao confronto com as gerações mais adultas, maior ainda eram minhas preocupações quanto àqueles jovens infantis, principalmente perante uma realidade competitiva, para a qual sua constituição física e nervosa ainda se encontrava em plena maturação. Por estes motivos, sempre me coloquei contra a competições de caráter nacional para as mesmas, aceitando com ressalvas as de caráter regional e estadual, assim como, sempre defendi a adaptação de algumas regras do jogo, a fim de adequá-las às características daquelas fases de maturação. Posse de bola mais extensa e participação obrigatória de todos os jogadores das equipes nos jogos, eram algumas das propostas que sempre defendi.

Em suma, sempre propugnei pelo ajuste de algumas regras no intuito de proteger e desenvolver a evolução técnica dos jovens, guardando os princípios de sua maturação e ritmo orgânico e mental.

Pois bem, está lá na matéria publicada : “Fizemos alguns testes para identificar o tipo físico, ossatura, envergadura, velocidade e impulsão dos atletas(?) e ver quem tem o perfil ideal para o basquete. Na verdade, nos dias de hoje, não é o atleta que escolhe o esporte, é o esporte que escolhe o atleta. Os resultados apontam as características morfológicas e motoras, dando subsídio para identificar talentos e aprimorar determinados aspectos. Vamos fazer um relatório, que será entregue aos atletas e seus clubes para que possam trabalhar os detalhes necessários”, explicou o preparador físico Fábio Ganime.

Ou seja, tenta-se voltar ao tempo da DDR, República Democrática da Alemanha, da República Popular da China, e mesmo da URSS, com seus testes em massa de jovens escolares, em busca de “talentos” que foram reduzidos a pequenas máquinas voltadas à propaganda de suas políticas, onde até a menarca de suas meninas era retardada em função de um pseudo desenvolvimento técnico nas quadras, piscinas e pistas do mundo, comprovando a excelência de seus projetos políticos e de educação. E todos sabemos no que deu tão estúpida e selvagem aventura. Muitos daqueles “atletas” ainda hoje padecem daquele “tratamento científico”. E como afirmei , não acreditei no que estava lendo, ainda mais por se tratar de uma seleção púbere. Revolta-me em particular a afirmativa de que nos dias de hoje não é o atleta que escolhe o esporte, é o esporte que escolhe o atleta. Esqueceram-se de um detalhe fundamental ao definir tal absurdo, o de que não se trata de atletas, e sim adolescentes, com seus sonhos e ídolos.

E foram mais sofisticados : “Realizamos o teste de velocidade com dispositivo de fotocélula para ver o tempo de deslocamento do atleta em cinco e 20 metros. Isso serve para identificar aqueles que podem puxar os contra-ataques, por exemplo(…)”.

Meus deuses, segundo eles, ser velocista caracteriza o puxador de contra-ataques, e não aqueles que dominam o drible e os passes velozes, fatores que independem de velocidade física, e sim percepção espacial em particular.

“(…)Os saltos verticais com plataforma verificam a impulsão dos atletas e nos mostram os que têm mais chances de garantir os rebotes(…)”.

E eu que sempre pensei que capacidade reboteira é uma qualidade fundamentada principalmente no domínio do binômio tempo-espaço, que em muitos casos transforma jogadores não muito altos em excelentes reboteiros, que ai sim, no caso de os reconhecermos, uma atividade de incremento de impulsão, na medida que a mesma não estabeleça uma quebra do binômio, sempre será admissível, mas nunca perante a ótica inversa como a proposta pelos testes mencionados, ainda mais em se tratando, repito, de jovens de 13 a 14 anos.

“ (…) Utilizamos o teste do “yoyo”(?) para verificar a resistência cardiovascular do atleta. Ele consiste em correr de um determinado ponto a outro, conforme o som emitido pelo aparelho. O intervalo entre um “bip” e outro vai diminuindo, levando o atleta a exaustão(…)”.

Exaustão? É isso mesmo que li, exaustão? Então está tudo errado no mundo da preparação física em nosso país, já que levamos jovens de 13 a 14 anos a estados de exaustão, numa fase em que seu corpo se encontra em evolução em todos, todos os sentidos, físico, estrutural, nervoso e psicológico, não tendo maturidade para enfrentar intromissões que violentem o ritmo evolutivo de seu organismo, o que poderá ocasionar sérios danos no futuro.

E concluindo, para o técnico Christiano Pereira, essa avaliação é um dos pontos fundamentais para o trabalho da equipe técnica. “Esse feedback é importante para a comissão técnica na hora de selecionar os doze jogadores para defender a seleção brasileira nos campeonatos internacionais. Com os testes, temos conhecimento do que cada um pode render em quadra e como podem ser úteis ao nosso esquema tático. Às vezes ficamos com dúvida em relação a dois atletas e nessa hora, o conceito físico nos ajuda a tomar a melhor decisão”, comentou Christiano.

Como vemos, para a seleção dos futuros jogadores do país, o que importa é o fato de serem úteis ou não ao esquema tático da comissão, que para o caso de dúvida sobre quem deverá ou não prosseguir na equipe, os testes dirimirão as dúvidas. Inaceitável, absurdo, comprometedor já seria se estivessem preparando equipes sub-19, e até sub-16, e não uma sub-15! No artigo anterior que publiquei, Conceitos x Fundamentos, em 3 de março desse ano, conclamei e desafiei a comissão técnica a transformar seus treinamentos numa inovadora clinica de fundamentos, que são os elementos básicos do jogo, e que qualifica os jogadores para os sistemas ofensivos e defensivos , dos mais simples aos mais complexos, onde aprenderiam as verdadeiras finalidades do jogo, e onde aprenderiam a amá-lo, por conhecê-lo no que apresenta de mais belo, o domínio do mesmo.

Quanta pretensão a minha, que por muito mais de 40 anos ensinei , não só os jovens jogadores, mais também jovens professores e técnicos a observarem o preceito mais primário do esporte, o respeito permanente e rígido aos limites de cada faixa etária, preparando-as para os degraus da evolução, que devem ser galgados com a calma e a precisão dos vencedores, não só nas quadras, como também na vida.

Estamos colhendo os efeitos nefastos da transferência das licenciaturas de Educação Física da área das Ciências Humanas para a da Saúde, com seu pragmatismo exacerbado e desconhecimento quase absoluto do humanismo, elemento fulcral das políticas educacionais de um país. Em 1972, quando essa mudança foi estabelecida, fui um dos pouquíssimos professores que se insurgiram contra a medida, prevendo exatamente o que vem ocorrendo nos dias de hoje. Vai ser difícil, mas não impossível, reverter tal quadro, ainda mais quando se trata de uma indústria, a do corpo, que segundo o Atlas da Ed.Física do Comte.Lamartine , movimenta 12 bilhões por ano no país.

No entanto, e por enquanto, sugiro aos pais de todos os jovens abaixo dos 15 anos que exerçam uma vigilância enérgica quanto à preparação técnica de seus filhos, seja em que modalidade for , exigindo que a mesma obedeça e respeite faixas etárias e princípios educacionais, principalmente quando se tratar de seleções representativas, municipais, estaduais e nacionais, pois somente dessa forma evitarão despropósitos e aventuras, nem sempre estéreis.

E que os Deuses protejam nossos sub-15 remanescentes.

Amém.

ARTIGO 400 – UM PREITO AOS QUE MERECEM…

Na semana passada recebi um régio presente com o envio de Portugal da única cópia existente do documentário que fiz sobre o Campeonato Mundial Feminino de 1971 em São Paulo, com sedes em Brasília e Niterói. Foi um filme em 16mm co-patrocinado pela ENEFD/UB (atual EEFD/UB), e a CBB. Filmei, editei, editorei e narrei-o numa aventura impensável nos dias de hoje. Mas foi feito e correu mundo, até que seus originais foram se deteriorando num canto de um lugar qualquer. Encontrei-os e corri para um laboratório profissional na tentativa de salvá-los. O orçamento foi de 6,500 reais em 2002, e por conta dessa quantia vultosa para meus padrões pedi ajuda da EEFD e da CBB, não encontrando disponibilidade financeira na primeira, e qualquer receptividade na segunda. Deixei os originais no laboratório e praticamente desisti de salvá-los. Com a copia recebida, voltei no laboratório e encomendei uma telecinagem pelo bom estado da mesma, e terei salvo o único documentário de técnica de basquetebol até hoje realizado no país. Soube que os originais foram enviados para a cinemateca do MAM, onde irei para a semana tentar, mais uma vez, salvar a obra.

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PREZADO MONCHO…

“Prezado Moncho, quero em nome de todos os técnicos brasileiros recepcioná-lo em nosso país, desejando sucesso em seu trabalho” – Foi com essa declaração que o técnico-comentarista, ou comentarista –técnico interrompeu o apresentador do programa Bola na Área da Sportv, no limiar das apresentações de praxe, deixando-o desconcertado. Com o pseudo aval da desunida comunidade técnica nacional, bem que poderia ter desejado os votos no seu nome em particular, antes de expor como auto denominado líder, uma opinião que não é unânime, e muito menos sua, apesar de reinvidicá-la sempre que de posse de um microfone. Logo a seguir imprensa por longos minutos o entrevistado, colocando-o ante suas concepções técnico-táticas no afã de vê-las referendadas e aceitas pelo espanhol, no que foi delicadamente contestado por posicionamentos sutilmente contrários ao que advogava, principalmente quanto à formula granítica de denominação de jogadores em 1,2,3,4 e 5. Foi nesse momento que o apresentador, didáticamente, explicou à massa ignara que aquela classificação numérica atendia a uma escala de altura dos jogadores, do mais baixo, o 1, ao mais alto, o 5 ! Realmente trágico, senão definitivamente constrangedor, e em rede nacional e à cores. Defendeu o técnico entrevistado, quase em tom inaudível, com uma tradução simultânea em off perfeitamente dispensável ante a afirmativa do mesmo que poderia se exprimir em português, que uma de suas concepções preferidas é a de atuar com três homens não muito altos, porém hábeis e velozes, e dois homens altos enfiados no garrafão, dando inclusive seus nomes preferidos, encabeçados pelo armador Huertas que se sobressai em sua terra natal. Nesse exato momento, o outro técnico-comentarista intervêm com uma colocação de transcendentalimportância para o futuro do nosso basquetebol – “Para você Moncho, qual a posição do Leandro, 1 ou 2 ?” – Com um sorriso de Gioconda, mal escondendo sua decepção faz o sinal da paz com os dedos, 2! Substituindo a palavra pelo gesto dimensionou a profundidade da pergunta, respondendo-a com o silêncio, através o sinal dos surdos.

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TRISTE,PORÉM PREVISTO,DESTINO.

Quantos de nós técnicos, pelo menos uma vez na vida, gostaríamos de treinar e fazer jogar uma equipe num ginásio condigno, tecnicamente adequado, com um piso, senão flutuante, pelo menos uniforme e aplainado, dando aos jogadores a firmeza e a certeza de que contusões poderiam ser minimizadas ante as exigências da intensa e brutal movimentação nas paradas bruscas, nos saltos sucessivos, nas intensas rotações, no arrastar antiderrapante de seus tênis, nas corridas com permanentes mudanças de direção, enfim, evoluírem num piso estudado e construído com esmero para eles? Pois é, por um pequeno lapso de tempo, numa arena gigantesca, nosso mal amado basquetebol pode privar de um solo em tais condições, ali num cantinho do autódromo do Rio, como se escondendo de sua destinação preconcebida por aqueles que o destinaram, não ao desporto, ao basquete em particular, mas aos shows, romarias, cultos de diversas religiões, e sabe-se lá quantas outras atividades que lá serão perpetradas.

Que técnico permitiria que uma senhora, do alto de seus abundantes quilos, calçando estiletes nos pés, distribuísse mossas pelo piso flutuante e macio, pelo simples fato de lá comparecer para idealizar formas de espetáculos nada desportivos, conforme atesta uma reportagem no suplemento Barra de O Globo, em 24 de fevereiro desse ano, num espaço que cálculos estimam em 2000 pessoas, que equipadas com estiletes iguais aos seus, o destruiriam numa única apresentação? E como avant-premiére da hecatombe que advirá, nem mais as demarcações de quadra subsistem, emoldurado pelos 15000 lugares em torno, como, não mais uma quadra de jogo, e sim um picadeiro de circo romano, para o Panis et Circenses que lá se instalará.

E já foi instalado, e continuará a sê-lo, pois em momento algum esse monumento ao desperdício, construído à sombra de verbas super faturadas, num total de 260 milhões, quantia essa suficiente para equipar todas as escolas públicas da cidade com um pequeno espaço coberto, uma piscina de 25 metros e uma mini pista de atletismo, equipamentos mínimos necessários em um país que se diz comprometido com a educação de qualidade, e projetos de força desportiva para o futuro.

Mas isso não interessa a elite de megalômanos que se apossou do esporte brasileiro, unindo suas vaidades aos interesses de construtoras, empresários do culto ao corpo e especuladores dos bens públicos, que são repassados aos mesmos por ninharias, gerando lucros que jamais reverterão ao interesse da população carente.

Onde estão as melhorias de transporte prometidas e que fundamentaram os projetos do Pan, e que voltam descaradamente à baila nos projetos do Mundial de futebol em 2014 e Olimpíada em 2016? A quem mais querem enganar, sentados nos refrigerados espaços do verdadeiro palácio em que se instalaram na Avenida das Américas, em meio ao estrangulado e caótico transito daqueles que tentam chegar ao trabalho todas as manhãs, órfãos dos transportes de massa prometidos e convenientemente esquecidos? Quando serão freados, antes que desencadeiem mais um crime contra a população, em nome de um absurdo progresso que passa a léguas de distância das mais básicas necessidades de nossos jovens em suas precárias e abandonadas escolas? Quando?

Mas, à sombra do que já foi feito, maquiavelicamente bem planejado, e magnificamente realizado, subsistem alguns detalhes que passam ao largo da compreensão do jovem desportista comum, aquele para o qual praticar, na medida do possível, uma atividade esportiva, nem sempre, ou quase sempre, im possível, principalmente dentro de suas carentes escolas, e que perenemente se torna vitima inocente da gangue do culto ao corpo. Já adulto, torna-se cliente de um sem número de academias, algumas tão gigantescas que se tornaram holdings no mega negocio, que seria inviabilizado em sua dimensão se existisse orientação de qualidade nas escolas, aspecto fundamental à cidadania, direito constitucional de todo jovem brasileiro.

Quanto ao basquetebol, do qual foi retirado o direito de ostentar o orgulho de ter o Ginásio Gilberto Cardoso, o Maracanãnzinho, como seu palco original e principal, por força de ter sido construído para o Mundial de 1953, e onde, dez anos mais tarde se sagrou Campeão Mundial, e que ostenta o nome do grande presidente do Flamengo, morto ao assistir uma final de basquete do campeonato carioca, que de conformidade com a declaração de um prócer do COB, ligado ao voleibol, passou a ser o palco de sua modalidade à partir do Pan-Americano, numa apropriação despropositada e provocativa, além de imerecida.

Não foi à toa que a Arena do Autódromo não recebeu um nome ligado ao basquete, como o complexo aquático ao lado, batizado de Maria Lenk, assim como em tempo algum, e de forma nenhuma, o COB jamais intervirá na auditoria das contas da CBB, que somente este ano alcançou a quinta cifra do montante destinado a todas as confederações, mais de 1 milhão de reais. Interessante, que por força de alguns de seus mandatários, ligados à natação, o complexo Maria Lenk passará a ser administrado pelo COB, legando a grande arena aos interesses empresariais. Ou será que, nenhuma chance deverá ser dada ao basquete, que por longos anos foi o segundo esporte no gosto do brasileiro, relegando o voleibol a uma posição secundaria, o que explicaria a bem vinda permanência do grego melhor que um presente à frente ad perpetuam da CBB?

Em verdade, quanto mais se estender o domínio da atual direção da CBB, mais amplo se constituirá o monopólio do vôlei entre nós, pois a par de sua inegável qualidade técnica, e de seus dirigentes e técnicos de ponta, a ausência de uma concorrência de peso, como foi outrora o basquetebol, sedimentará seu domínio, não só desportivo, como político-econômico. Logo, a declaração do grego melhor que um presente de que ainda mandaria no basquete por longos anos, se tornou conveniente a muitos olímpicos, não desejosos de riscos econômicos, políticos e de projeção de mídia, garantidos pela inépcia e irresponsabilidade do mesmo.E o pior, mesmo sabedor dessa conveniência, se mantêm, a qualquer custo no poder, pouco importando a qualificação da outrora brilhante modalidade, até o momento em que se tornar irreversível seu soerguimento, para tranqüilidade daqueles que já detêm o mando da maioria dos ginásios brasileiros, forrados com piso sintético, que senhora nenhuma calçada com estiletes ousaria pisotear. C’est La vie.

Amém.

DEBATES – OS CORTA-LUZES.

Encerrando essa serie Debates, abordaremos os corta-luzes, tendão de Aquiles da maioria dos jogadores brasileiros que o executam da forma mais primaria que se possa admitir, e que constitui quase uma unanimidade na forma mais primaria ainda de ensiná-lo. Sempre afirmei que no nosso país os corta-luzes são treinados, e jamais ensinados, originando nessa inversão de aprendizagem, uma situação híbrida, constituída de ignorância somada a arrogância daqueles que se imaginam dominadores de suas sutis técnicas, tanto por jogadores, como, e é lamentável, por muitos técnicos .

Seria interessante um debate profundo sobre essa técnica, responsável pelo sucesso, ou insucesso, da maioria dos sistemas táticos existentes.

E dando o tapinha inicial, republico o artigo que escrevi em 24 de junho de 2006:

O QUE TODO JOGADOR DEVERIA SABER 10/10

Que executar um corta-luz ou um bloqueio requer bons conhecimentos de mecânica corporal, sentido espacial,e principalmente atitude tática.Se deslocar com os braços juntos ou cruzados ao corpo, sugerindo ausência de intenções à faltas pessoais, mas deslocando o corpo no sentido do adversário visando cortar seu caminho, caracteriza não somente o ato faltoso, como anula qualquer vantagem conseguida por seu companheiro de jogada, pois a supremacia numérica no desenlace do movimento deixa de existir. A atitude mais comum em nosso basquete, e já bastante generalizada em todas as categorias, é a saída rápida de um dos pivôs para a além da linha dos três pontos, ao mesmo tempo em que o armador ou ala de posse da bola cruza com o mesmo em um movimento também muito rápido, no momento em que o pivô exerce um movimento blocante quase sempre em movimento, sobre o marcador do companheiro que dribla. Dois são os erros cometidos, o da movimentação do pivô se caracterizar em falta pessoal, e o armador seguir em frente marcado após a troca. O corta-luz corretamente executado propicia o bloqueio duplo dos dois defensores envolvidos na jogada, originando o escape livre do driblador, ou a fuga do bloqueador para a recepção do passe, e muito aquém do que se tornou lugar-comum, os movimentos podem, e muitas vezes devem ser lentos na construção do corta-luz, e rápido em sua finalização. Em outras palavras, o driblador deve encaminhar seu marcador lenta e pacientemente numa direção, ou local, em que ocorrerá o encontro com seu companheiro, de tal forma que o mesmo numa movimentação de pés em compasso, tanto prenda o marcador de seu companheiro, como junte ao mesmo o seu próprio marcador. Para tanto, o driblador ato antecedendo ao bloqueio mudará de direção, de tal forma que passe rente ao seu companheiro, originando dessa ação duas variáveis.A primeira, quando em velocidade de explosão mantiver os dois defensores atrás de si, permitindo sua livre investida à cesta. A segunda, raramente utilizada entre nos, quando o bloqueador ao se situar entre os dois defensores investir ele mesmo em direção à cesta concomitante ao passe executado por seu companheiro por cima daqueles. O primeiro corta-luz denomina-se “por fora”, o segundo, obviamente “por dentro”. São movimentos que não necessitam velocidade inicial, e sim em seu desfecho. O domínio espacial nesses sutís movimentos constitui o cerne do corta-luz bem executado, pois não são todos os jogadores que o possui, e quase nenhum sequer sabe utilizá-lo e desenvolvê-lo. O posicionamento futuro dos defensores em um trecho da quadra de jogo é o fator predominante para o sucesso de um eficiente corta-luz, e cabe em grande parte aos dois atacantes envolvidos no mesmo o direcionamento dos defensores no sentido da ação pretendida. O ponto futuro tão importante nos passes encontra na construção de um corta-luz sua dimensão maior, pois envolve destreza no drible, na finta, no bloqueio e no passe. O movimento em forma de compasso exercido pelo responsável nos bloqueios será sempre antecedente à movimentação do driblador, e nunca concomitante, pois dessa forma estará se movimentando no momento do bloqueio, o que caracteriza a falta pessoal. Por essa razão, o domínio espacial se torna fundamental, pois antecede a jogada que está sendo conduzida pelo driblador. Outrossim, essas movimentações podem e devem ser estabelecidas quando o corta-luz for realizado por dois jogadores sem a posse de bola. Jogadas do lado contrário a posição da bola deveriam SEMPRE obedecer a mecânica dos corta-luzes, sejam por dentro, ou por fora. Uma equipe bem organizada e treinada executará com eficiência, e muitas vezes ao mesmo tempo corta-luzes em situações antagônicas, dando a mesma um poder de ataque em que os marcadores dificilmente possam flutuar defensivamente, preocupados pela constante movimentação à sua volta. O bloqueio simples difere num ponto dos corta-luzes, ele é sempre realizado por dois jogadores sem a bola, geralmente no âmago do garrafão, e quase sempre em movimentação sagital à cesta. A função do bloqueio é a de retardar por uns momentos a ação defensiva, e não a anulação da mesma. Esse retardo pode propiciar um bom passe de fora para dentro do garrafão, e muitas vezes um bom atacante pode se utilizar de um outro marcador desvinculado visualmente de si para, num breve,porém rápido deslocamento lançar seu próprio marcador nas costas do mesmo, obtendo dessa forma de bloqueio espaço para sua jogada. O principal elemento técnico para quem exerce o corta-luz é o amplo posicionamento, o maior possível, de seu corpo e pernas, no intuito de oferecer um maior obstáculo aos marcadores, assim como, a maior qualidade que se exige ao driblador, ou não, envolvido na ação, é o de aproveitar ao máximo as possibilidades que em frações de segundo se apresentam em sua consecução. A atitude tática envolve basicamente o perfeito controle que possa ser exercido por sobre as variações nas velocidades de deslocamento, antes, durante e após o corta-luz, que se aproximará da perfeição quando construído com lentidão, desenvolvido com inteligência e concluído em velocidade. Mas, a maior qualidade dos corta-luzes para uma equipe, é grande possibilidade que os técnicos têm de desenvolver bons e efetivos exercícios aproveitando suas particularidades técnicas, as quais representam o ápice dos conhecimentos fundamentais do jogo, sem os quais nenhum jogador pode se considerar efetivo para sua equipe. Com esse artigo encerro essa série sobre fundamentos básicos. Oxalá tenham um bom proveito em seus treinamentos.

posted by Basquete Brasil @ 6/24/2006 10:47:00 PM

CONCEITOS X FUNDAMENTOS…

“Estamos iniciando uma nova geração nas categorias de base. O Sul-Americano Sub-15 classifica para a Copa América Sub-16 de 2009 que, por sua vez, garante vaga para o Mundial Sub-17 em 2010. Assim, temos que trabalhar essa geração com cuidado e antecedência, pois são muito jovens e inexperientes. Esta será a primeira de três etapas de treinamento, e os objetivos dessa fase inicial são desenvolver a parte física e introduzir os conceitos ofensivos e defensivos, para que assimilem bem o conteúdo. Além disso, convocamos um número bastante amplo de atletas para observarmos o potencial de cada um e desenvolver um trabalho a médio e longo prazo – explicou o técnico Christiano Pereira”.

Com este relato e posicionamento, o novo técnico das seleções de base da CBB inicia seu ciclo de influência na mais importante das categorias, aquela que definirá ao longo dos próximos anos o futuro da modalidade em termos nacionais e internacionais. E do alto de sua larga experiência, estudos e pesquisas, lastreado que está pela outorga que lhe foi designada pelo alinhamento político da FEBERJ com a CBB, delineado nas últimas eleições, quando o histórico estado opositor da situação confederativa, foi defenestrado, passando para a esfera de influência continuista da mesma. Como prêmio pelo bom e condescendente desempenho, é premiada com o comando da seleção Sub-15 masculina, a pedra de toque fundamental ao soerguimento do basquete no país.

E nosso experiente técnico inicia bem sua caminhada, que aliás, em seus primeiros passos, se alinha aos princípios técnico-táticos impostos de cima para baixo pela comissão sênior, como se fez corriqueiro nos últimos anos. Uma frase define esse propósito: “(…) Esta será a primeira de três etapas de treinamento, e os objetivos dessa fase inicial são desenvolver a parte física e introduzir os conceitos ofensivos e defensivos, para que assimilem bem o conteúdo (…)”. Ou seja, tudo aquilo que se pretende incutir de sistemas ofensivos e defensivos, disfarçados de conceitos, que se tornou marca registrada de todos os técnicos que assumiram nossas seleções nos últimos vinte anos, colocando-as dentro de amarras a serviço de concepções de propriedade absoluta dos mesmos, no auto-proclamado “princípios do basquetebol moderno” ( leia-se sistema NBA…), e que retira e afasta de saída aqueles jovens jogadores que não se adequarem a esse terrível critério. Anunciou-se a convocação de 39 jovens de vários estados, alguns deles de pouquíssima tradição em convocações, mas que contarão bons votos em futuras eleições e um ou outro convite para mudarem de estado. E o mais emblemático é que nenhum convocado pertence a equipe e ao clube do novo técnico.

Claro, que no decorrer da fase inicial de assimilação dos conceitos ofensivos e defensivos, somente aqueles egressos dos melhores centros, nos quais os fundamentos são levados um pouco mais à sério, continuarão na liça, sem maiores implicações de ordem técnica e ética para o corte dos demais, cumpridores de suas funções técnico-políticas.

Meus Deuses, mais uma vez se repete o que vem ocorrendo em outras convocações de divisões de base, onde a prioridade absoluta é a manutenção e imposição dos conceitos ofensivos e defensivos do jogo, e não a massiva prática dos fundamentos, formativos e corretivos, independendo de posições, estaturas e estados de origem, dados por competentíssimos mestres na arte de lidar com a bola, com o corpo, com a mente, para depois das fases planejadas, construir-se sistemas de jogo, sistemas de defesa, em concordância e adequação às características dos selecionados finais, e dos preteridos também. Nada mais absurdo do que sistemas apriorísticos, propriedade sufocante de uma geração de técnicos descompromissados com a dureza irreconhecida do ensino lento e gradual dos fundamentos, mas adeptos incondicionais dos resultados advindos de sistemas padronizados e pseudamente testados pela esmagadora maioria deles, e que mais do que claro, postos em prática em jogadores “peneirados”, fruto do trabalho dos trouxas da formação (parece inverossímil, mas existem…), exatamente dentro dos critérios que vem sendo adotado pela CBB e suas comissões de cunho político.

Desafio a novel comissão a adiar seus conceitos ofensivos e defensivos, trocando-os por uma histórica clínica, de preferência com a presença dos técnicos daqueles convocados, na qual ensinariam como se treinam os fundamentos, individuais e coletivos, suas minúcias, suas aplicabilidades genéricas e setoriais, dando aos jovens jogadores e seus técnicos a suprema oportunidade de aprenderem e apreenderem a arte dos fundamentos, deixando para a parte final o ensino dos sistemas, obviamente criados e adequados à luz da evolução técnica dos convocados em sua formação final. O contrário disso cheira a queima oportuna e descompromissada dos menos dotados tecnicamente, e a exposição pré-profissional dos mais talentosos, numa repetição tediosa e repetitiva do que vem ocorrendo sistematicamente por anos a fio. Os resultados desalentadores das divisões de base brasileiras é a prova mais do que cabal do fracasso dessa política protecionista e de nepotismo político, que substitui criminosamente o mérito pelo Q.I.

Lembro que, independendo de categorias e faixas etárias, seleções nacionais é tarefa para os melhores, os mais experientes, os mais reconhecidos pelos seus pares, principalmente nas de base. É a norma vigente naqueles países que lideram as modalidades esportivas no mundo.

E se vierem afirmar que treinarão conceitos ofensivos e defensivos num horário e fundamentos em outro, ainda assim mantenho o critério extensamente aplicado, estudado e pesquisado de que em categorias de base essa dualidade é didático-pedagogicamente inaplicável, pois denota aquisição de hábitos e rotinas díspares, e pré-dependentes, ou seja, só pratica com razoável precisão conceitos de jogo, aqueles com embasamento alicerçado nos fundamentos, e nunca o contrário. O resto é conversa fiada de quem sempre afirma que não tem tempo a perder com detalhes. É o campo fértil e onipresente das pranchetas de plantão, com seus inefáveis conceitos e soluções prét a porter.

Amém.