O (IMPERDOÁVEL) DESPERDÍCIO…
Eventualmente tenho noticias dos jogadores que dirigi no Saldanha da Gama no NBB2, uns diretamente pelo MSN, outros pelo acompanhamento de suas atuações nas diversas competições de que fazem parte pelo país afora, como num preito de amizade que foi estabelecida naqueles dois meses e meio que convivemos intensamente nos duros treinamentos e nos jogos disputados sob a égide do compromisso e do comprometimento em torno de algo inovador, corajosa e ousadamente tentado no campo de luta, onde as verdades foram duramente ditas e comprovadas.
Amiel, Roberto, Rafael, Muñoz, André, João Gabriel, De Jesus, Casé, Matheus, formavam o núcleo daquela equipe, hoje fragmentada e espalhada em diversas equipes do país, sem que tivéssemos a oportunidade de dar seguimento àquele trabalho, que certamente teria ajudado o grande jogo a sair da mesmice endêmica que o vem sufocando à décadas.
Ontem, assisti pela TV ao jogo Pinheiros e Metodista, muito mais pela presença do Muñoz e do André do que o previsível jogo em si, totalmente jogado no sistema único por ambas as equipes, num enfadonho replay do dia a dia do nosso basquete. Me fez mal ver aqueles dois bons jogadores entregues a uma mediocridade tática de dar medo, mais do que preocupante, terminal.
Mesmo assim gostei de revê-los, jogando muito aquém de suas reais possibilidades, muito ao contrario do que jogaram naqueles inesquecíveis meses de 2010, mas sobrevivendo através seus honestos trabalhos e suas atitudes de bons desportistas que são.
Mas algo me chocou profundamente lá pelo meio da segunda etapa do jogo, quando num dos tempos pedidos pelo técnico da Metodista, este aos gritos dirigidos ao Muñoz acusava-o de ser o culpado de uma falha defensiva, das muitas que ocorriam naquela equipe equivocada defensivamente, desencadeando uma inesperada reação do excelente armador panamenho, que tomando a prancheta de suas mãos fez ver ao vociferante técnico que, se erro ocorreu não foi por sua culpa, e sim pela disposição defensiva da equipe frente aos corta luzes do adversário, provocando um recuo do mesmo, num lamentável espetáculo de desencontro entre comandante e comandados em torno de exigências pontuais não previstas no plano tático.
A cena em si, profundamente comprometedora, me fez lembrar o quanto de entendimento tínhamos dentro da realidade daquela equipe de Vitoria, coesa em sua simplicidade, cúmplice que era de sistemas proprietários somente praticados por ela em toda a liga, e quanto os mesmos representavam para a coesão de todos em torno da mais simples das realidades, o crédito e a confiança que emanava e irmanava a todos, comandante e comandados, sem indisciplinas, cobranças, ameaças e coerções, onde todos remavam numa mesma direção, e onde os erros eram reconhecidos não por um, e sim por todos, assim como os acertos, as derrotas e as vitorias, fatores que a solidificavam como uma verdadeira equipe, e não um bando, dos muitos que vemos hoje em dia.
O Muñoz é muito mais do que vem apresentando nessa equipe paulista, já que armador brilhante, e pontuador dos mais competentes que conheci (vejam aqui uma de suas brilhantes apresentações), além de ser um tático criativo e altamente competitivo, muito além do que um passador de bola e corredor de maratona em que transformaram nossos armadores desde que implantaram o trágico sistema único entre nós.
E no frigir dos ovos, fico imaginando o que teria acontecido se aquele núcleo de jogadores tivesse permanecido junto, unido aos sistemas que desenvolveram, ou mesmo, se alguém de bom senso nesse país, que no comando administrativo de uma equipe da liga tornasse a reuní-los, dando continuidade àquele trabalho iniciado e interrompido no Saldanha, o quanto de impulso provocaria no seio da liga pela continuidade do mesmo, assim como outra concepção proposta pelo Marcel, a dos triângulos que ele tanto defende e entende, provocando os contraditórios, que são os fatores mais importantes e estratégicos para o pleno desenvolvimento de um segmento, seja de vida, político, cultural, educacional, desportivo. Mas para tanto, algo teria de ser plenamente contornado, o forte e até agora inexpugnável corporativismo técnico que cerceia e esmaga o progresso do grande jogo em nosso imenso e desigual país.
Assim vejo o nosso basquete de elite, urgentemente necessitado de novas concepções de jogo, que inspirem novos sistemas, novos adeptos, novas gerações, e que sejam lastreados pela pratica indistinta e maciça dos fundamentos do jogo, como devem ser desenvolvidos e praticados desde a formação de base.
Acredito que possamos evoluir com segurança à partir do momento em que ousemos novas formas de jogar, que adotemos outras concepções no processo evolutivo do grande jogo, além do único que percorremos nos últimos 25 anos de dolorosa e espinhosa caminhada.
Amém.
Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.
Foto 1 – O batalhador pivô André.
Foto 2 – Muñoz em sua solitaria armação no sistema único.
Foto 3 – Muñoz é ademoestado por suposto erro defensivo…
Foto 4 – … e demonstra na prancheta o erro da injusta admoestação.