OS ABSURDOS PADRÕES…

Não escrevo já a um bom tempo por aqui, e confesso que, honestamente, pouco, muito pouco teria a acrescentar sobre a atualidade do basquetebol brasileiro, me orientando para uma possível repaginação deste humilde blog, retornando, quem sabe, ao seu formato original, onde artigos técnicos em profusão aqui foram publicados, e celeremente buscados por todos aqueles que se interessavam em aprender princípios técnicos, táticos, estratégicos, científicos, didáticos  e pedagógicos sobre o grande jogo, discutidos e replicados neste imenso, injusto e desigual país, fator que fez valer a pena todo os esforços e sacrifícios para publicá-los, referenciando-os como um verdadeiro Instituto Basquete Brasil, e não esse anunciado com pompas e circunstâncias pela CBB, que, provavelmente, pelo histórico usual e repetitivo da entidade, fará companhia a ENTB de triste memória…

Mas antes de tal mudança de rota (será a primeira em 17 anos de existência ininterrupta do blog), vou me dando ao luxo de exercer a crítica técnica e fundamentada em mais de meio século de participação junto ao grande jogo, como professor, técnico, pesquisador e jornalista, graduado e pós graduado academicamente, e nas quadras daqui e de outras plagas…

Vamos em frente então:

O Padrão – Sem duvida alguma, um padrão de jogo foi implantado solidamente em nossa forma de jogar, seguindo, segundo seus defensores, a tendência internacional, padrão NBA, que de uns vinte e cinco anos para cá copiamos ávida e colonizadamente na ânsia de nos alçarmos a matriz, sem, no entanto, termos a mais remota possibilidade de sucesso, pois a forja que os abastece, escolas, colégios e universidades, são fontes desconhecidas entre nós, ainda arraigados aos poucos clubes que teimam em formar jogadores, cada vez mais desinformados e afastados dos princípios técnicos, táticos e didáticos básicos a uma prática que os qualifique aos grandes embates internacionais, como testemunhamos recentemente ao vencermos um torneio quadrangular. contra uma equipe universitária americana, com uma seleção de jogadores profissionais a mais de quatro anos, e com um placar para lá de apertado, deixando no ar uma questão –  Quantos deles seguirão em alta produção dentro de alguns anos, quando atingirem a plenitude da forma? Uma equipe que enfrenta jogadores cinco anos mais velhos em igualdade de condições não deixa dúvidas quanto a resposta, infelizmente bem mais realista do que pensamos…

O padrao gera outros padrões, como a definitiva formatação e implantação dos arremessos de três pontos na preferência generalizada das equipes brasileiras, em todas as faixas etárias, como objetivo prioritário de jogo, sabendo ou não os jogadores exercerem esse modus operandi com pleno conhecimento e domínio de sua exigente e precisa técnica, desencadeando essa autofagia destrutiva que corroe a modalidade desde a formação de base, indiscriminadamente, incentivada pela mais absoluta ausência efetiva de postura defensiva que, se existente, em muito restringiria tal descalabro. Somemos a essa triste realidade o fator, constrangedor e demolidor, da ausência consensual no ensino dos fundamentos básicos do jogo, como devem ser ensinados desde muito cedo, e mantidos atuantes por todo o percurso dos jogadores, como instrumental absolutamente necessário as suas trajetórias enquanto ativos e atuantes…

Um tenta jogar, os demais, inclusive dois pivôs abrem para o chute de três. Armadores inoperantes…

A prova inconteste dessas afirmações podem ser observadas nos incríveis números de erros de fundamentos nos primeiros 30 jogos dessa equivocada LNB, que deveria ser um amplo espaço para jovens jogadores, e não uma capitânia de jogadores que atuam no NBB, visando títulos e não formação, e que mesmo com esses jogadores mais rodados, apresentaram na temporada anterior a marca de 28,6 erros de fundamentos por jogo, e que nessa atual atinge 34,5 até o momento,  com nove deles acima dos 40 erros, marcas indesculpáveis em equipes sub 23, onde muitos participam do NBB, e até de seleções nacionais. Difícil entender e aceitar o conceito de que um sistema único de jogo com suas invenções realçadas em pranchetas manipulem jogadores de fora para dentro do campo de jogo, encordoando-os como marionetes descerebrados em vez de ensiná-los e treiná-los nos fundamentos individuais e coletivos básicos, suficientes à boa prática criativa e inteligente do jogo, fatores que antecedem o desenvolvimento da improvisação consciente no âmbito coletivista, mas que desde muito cedo são trocados por movimentações tático mecânicas, que só se tornarão factíveis através o domínio consciente dos princípios fundamentais, transformando as partidas em peladas monumentais, para o gáudio saltitante e verborrágico de estrategistas ao lado das quadras, e de narradores ensandecidos, crentes de que estão bem servindo a causa do basquetebol, noves fora comentaristas que analisam jogos que somente eles veem, enaltecendo velocidades alucinantes, tocos monumentais, enterradas geniais, diametralmente oposto dos que assistimos incrédulos, na triste e constrangedora realidade dos jogos, digo, peladões inacreditáveis. Claro que bons e talentosos jovens jogadores se apresentam, porém muito distantes das exigências mínimas que se espera deles, manipulados e manietados pela incutida crença de que são craques prospectados a NBA, quando mal se iniciam num NBB, onde quatro estrangeiros permitidos por equipe canalizam-se em mútuas ajudas, sob a cumplicidade de técnicos que perpetuam o sistema único e suas pranchetas, ano após ano, trocando peças (nova e pejorativa designação de jogadores) que não se adequam aos seus arroubos pretensamente criativos, geniais, porém restritos a alguns ininteligíveis rabiscos em suas midiáticas pranchetas…

Dá  no que pensar como treinam suas equipes dentro de um padrão que se repete anos após anos, década após década, mas que de vez em quando adotam uma dupla armação, luta a que me dediquei por mais de quarenta anos, mas que somente agora é levada tenuamente a sério, com a presença dos bons armadores argentinos e um ou outro americano, cada vez mais presentes nessas plagas, mas dentro do sistema único, formatado e padronizado por todos, numa aceitação corporativa, como mandam e definem as herméticas reservas de mercado. O resultado final fatalmente deságua nas seleções nacionais, espelho fiel da realidade nacional, mas que já começa a sentir o brutal peso das péssimas opções acolhidas como as soluções definitivas ao encontro do basquete moderno, como definem o grande jogo, começando com resultado nada abonador contra a seleção colombiana pela janela classificatória ao mundial, cujos números, em tudo e por tudo, escancaram a escalada regressiva que tanto venho comentando nos últimos dez anos, cujos números definem tão lamentável opção :

Colômbia     106 x 98    Brasil

   27 52             2pt          23 47

   12 38             3pt          10 36

   14 18              LL           22 33

         47             Rb           61

         11              E            17   

Foi um jogo em que 10 de nossos jogadores arremessaram de 3 pontos, contra 9 dos colombianos, demonstrando tacitamente qual o enfoque determinado por seu técnico, exatamente em concordância como age em seu clube, e agora na coordenação das seleções de base. Tratando-se de um arremesso altamente especializado e de precisão crítica, torna-se irreal que toda uma equipe seja autorizada nos longos arremessos (neste jogo o pivô Renan não arremessou de três, que é um comportamento usual dele no NBB). Na próxima janela, Croacia, e Rússia por certo contestarão os longos arremessos, assim como exercerão forte bloqueio defensivo dentro do perímetro. complicando uma seleção que joga de passo marcado e chuta de três a qualquer preço e risco, e com uma armação mais voltada as finalizações do que “o fazer jogar” seus bons alas pivôs, tornando muito difícil sua classificação ao mundial, a não ser que mude sua forma de jogar atuando incisivamente no perímetro interno, continua e metodicamente, deixando o arremesso de três como recurso oportunista, e somente nas mãos de especialistas de verdade, e não ocasionais como defendem seus líderes, ao afirmarem – se estiver livre chuta…

A cultura dos três pontos se impõe, absoluta.

Acabo de assistir, pacientemente, o jogo Paulistano e Corinthians pelo LDB, os números estão aí embaixo, em que nenhuma das equipes atinge os índices mínimos de eficiência nos arremessos, exigência em equipes na porta de entrada da liga maior tupiniquim, e que cometeram 39 erros de fundamentos, sem maiores comentários…

Com estes resultados e prospectos super valorizados, assim como a inexistência de sistemas eficientes de jogo, e a teimosa insistência em negligenciar o ensino competente dos fundamentos básicos do grande jogo, prioritariamente os de defesa, continuaremos a patinar entre a insânia, e a negação de uma evidência que nos pune desde sempre, a de negarmos ao nossos jovens um preparo responsável, criterioso e evolutivo na arte de bem jogá-lo, respeitando seus ciclos evolutivos, sua educação, sua saúde, ensinando-os a amar o jogo coletivo aprimorando suas habilidades, e não lançando-os a drafts antes de seu amadurecimento pessoal, cultural, profissional e técnico, condenando sua maioria ao fracasso, pois as pouquissimas exceções pouco contam…

Precisamos com certa urgência cuidar com mais precisão, competência e responsabilidade nossos jovens, respeitando sua particular evolução, seus rítmos psicomotores diferenciados, sua maturação arrítmica intelectual e psicológica que divergem de indivíduo para indivíduo, enfim, respeitando profundamente sua individualidade divergente. Professores, técnicos, dirigentes, jornalistas, médicos terapeutas e preparadores físicos têm a obrigação de não serem omissos a tais e básicas necessidades, a fim de orientar, ensinar e desenvolver os jovens carentes, relegados e esquecidos deste imenso, desigual e injusto país, onde o desporto, por que não o basquetebol, tem papel fundamental nesse prioritário e  estratégico processo educacional.

Amém.