O QUE DIZER HELENO?…

CLIPPING DO BASQUETE

 

———- Mensagem encaminhada ———-
De: heleno lima <helenolima@hotmail.com>
Data: 19 de maio de 2012 13:57
Assunto: RE: BASQUETE ARGENTINO DA UM SACODE NA SELEÇÃO BRASILEIRA SUB-15 MASCULINA
Para: clippingdobasquete02@gmail.com

 

Trabalhei muito nestas categorias. A diferença de um ou dois anos é muito grande. Diferenças que desaparecem com o tempo à medida que ficam mais velhos. Nós levamos uma equipe com quatro jogadores de 15 anos, sete jogadores de 14 anos e um de 13 anos.
Podem ter certeza isto explica tudo. Se foi estratégia foi errada. Não é possível que tenhamos somente quatro jogadores de 15 anos em condições de defender nossa seleção da categoria. Tem que haver uma explicação coerente a respeito disto. Levar uma diferença dos portenhos (Uruguai e Argentina) de 64 pontos não tem cabimento. Existe algo errado nisto. Gostaria de ouvir o Prof. Paulo Murilo que entende disto mais do que eu.  Prof. Heleno Lima

 

 

 

O Clipping do Basquete do Alcir Magalhães veiculou a matéria acima, que culmina com o pedido do técnico Heleno Lima para ouvir minha opinião à respeito. Trabalhamos juntos no vencedor projeto do Olaria AC nos anos oitenta, com praticamente todas as categorias, do infantil à primeira divisão, com muita seriedade e competência, num tempo em que a formação de base, não só no Rio, como em muitos estados brasileiros, fluía e se desenvolvia, abastecendo as divisões superiores com jogadores bem treinados nos fundamentos e nos sistemas de jogo, com ótimos técnicos e professores, até o momento em que a modalidade se viu afastada dos clubes pela falta de incentivos e investimentos, até alcançar o estado de penúria em se encontra.

 

Some-se a esta realidade, outra mais perversa ainda, a decadência do ensino do basquete nas escolas superiores de educação física, que deixaram de oferecer três semestres da modalidade, assim como em outras, como o vôlei, o handebol, o futebol, a natação, o atletismo, passando-as a um mínimo insignificante, substituído-as por disciplinas voltadas às áreas médicas, como as fisiologias, biomecânicas, psicologias, etc., que passaram a ocupar as grades horárias prioritariamente, numa formação voltada à saúde, como resultado das anexações das escolas aos centros de ciências da saúde, em vez dos centros de formação de professores, onde estavam historicamente sediadas. A realidade é que hoje a maioria destas escolas formam paramédicos de terceira categoria, fornecendo pessoal a academias e consultórios, como força de trabalho explorada pelas holdings do culto ao corpo que se espalham velozmente por todo o país, e com uma agravante a mais, com uma formação mais voltada aos cursos de bacharelato do que os de licenciatura, numa inversão absoluta de valores voltados ao processo educacional do país, com o abandono das escolas para a educação física e os desportos.

 

Claro que a formação de base se ressente profundamente dessa formação nas universidades, refletindo tal despreparo didático pedagógica nas formações de base de todas as modalidades, que não encontram na maioria dos clubes os subsídios mínimos para suprirem tão vasta deficiência de ensino.

 

Por conta de tal situação, ex-jogadores e até leigos são transformados em técnicos formadores, deficientes em tudo o que se refere ao processo educacional de jovens, mas sempre prontos ao sucesso rápido que os catapultem às divisões superiores e melhores salários, situações estas que os poucos convenientemente bem formados não conseguem equiparar, não só por serem minoria, como, e principalmente, por se tornarem onerosos por suas qualificações legais. Por conta desta distorção, a maior parte dos jovens iniciantes ficam pelo caminho, e aqueles poucos que conseguem prosseguir o fazem eivados de defeitos e limitações, basicamente no instrumental mais precioso para a pratica e o domínio do grande jogo, seus fundamentos.

 

Outro e incisivo fator define tal situação com grande precisão, a padronização formatada de cima para baixo no preparo daqueles poucos egressos de uma formação altamente deficiente, por parte de federações alinhadas com uma confederação mentora de um único sistema de jogo, cuja maciça divulgação se faz através de clinicas e de cursos patrocinados por uma ENTB totalmente voltada ao mesmo, onde o planejamento, a aprendizagem e fixação do sistema suplanta em muito o ensino, que deveria ser maciço, dos fundamentos,  no que deveria ser o objetivo central a ser alcançado, pois nivelaria todos os jovens jogadores, independendo de funções, estaturas e posições, no pleno conhecimento das técnicas individuais e coletivas que os tornariam aptos aos sistemas de jogo que mais adiante conheceriam e treinariam, sempre respeitando suas individualidades e amadurecimento físico e emocional, variantes que oscilam de individuo para individuo.

 

Por tudo isso caro Heleno, é que sempre me insurgi contra esta situação altamente irresponsável, e muitas vezes criminosa, por parte daqueles que ousam querer implantar formatações e padronizações em crianças e adolescentes, da forma mais absurda e, torno a afirmar, irresponsável possível.

 

Os 64 pontos acumulados por nuestros hermanos, refletem esssa catástrofe, com a mais séria das conseqüências, por se tratar do futuro do grande jogo, da categoria competitiva inicial, e que não merece ser tratada de forma tão abjeta. Se mudanças têm de ser feitas, é por ai que deverão começar, pela entrega da formação a pessoas qualificadas, altamente qualificadas, as mais qualificadas que possamos recrutar, de uma comunidade que pertencemos, eu e você num passado não tão distante assim, a comunidade daqueles que real e responsavelmente conhecem, estudam, pesquisam, divulgam e ensinam o basquete como deve ser ensinado. E você, como eu, sabemos que existem esses profissionais, só que nunca lembrados, sequer consultados, por quem deveria fazê-lo.

 

Heleno, frente a esta realidade, o que mais dizer?

 

Amém.

Fotos- Divulgação CBB. Clique nas mesmas para ampliá-las.

 



11 comentários

  1. Bom dia Paulo.
    Foi bom demais ler seu texto. Me senti altamente estimulado a prosseguir. Acredito exatamente nas mesmas coisas q o amigo citou.
    Estamos, após 2 anos, retomando o trabalho em CF, e infelizmente, de novo saindo do zero. Esse zero na iniciação é consequência de erros parecidos com os descritos em seu texto. Nosso basquete, q vc Paulo, conheceu muito bem, ficou abandonado, e o q conseguimos salvar são cerca de 10 meninos q estão por aí jogando em alguns clubes, no Rio, SP e Acre.
    Se vc autorizar, pretendo linkar seu texto no meu blog. Reforçará muito as teses q venho defendendo e agora aplicando, nessa tentativa de retomar o bom caminho por aqui.
    Derrotas como essa, assustam e mostram nitidamente a falta de rumo. Se a ideia for afundar para pegar impulso no fundo do poço, danou-se tudo. Esse poço não tem fundo, e se tiver é de lodo, ao invés de empurrar, segura.
    Aguardando sua autorização, te agradeço. Pensei q fosse maluco, e saber q não sou o único é ótimo. rsrsr
    Um grande abraço desse amigo de longa data,
    Sergio Macarrão

  2. Basquete Brasil 20.05.2012

    Sergio, mais do que bom, é ótimo tê-lo por aqui, valorizando o espaço deste humilde blog. E de maluco para maluco, anexe quantos links quiser, sempre que achar algum merecedor para fazê-lo. O Basquete Brasil é sua casa também. Um abração, Paulo.

  3. João 21.05.2012

    … Um profundo desrespeito…estão colocando pessoas incapazes de treinar corretamente as categorias de base aqui no Brasil, e quando uma seleção é formada e leva um sacode destes é que podemos atestar este fato.

    Totalmente contrário ao que ocorre na Argentina e Uruguai(já que estamos citando o confronto), onde o conhecimento técnico/tático da gurizada evoluíu e vem evoluindo uma barbaridade. De nada adianta fazerem clínicas por aqui pregando formulas antigas de basquete em modelos ultrapassados.O Basquete é muito dinâmico para ficar atrelado nesse sistema único de jogo implantado pela NBA, que é o querem fazer.

    Só não vê quem não quer,…é facil de verificar, infelizmente tá cheio de atletas na faixa de 10 a 17 anos muito mal preparados, sem nenhuma possibilidade de encarar qualquer tipo de competição a nível nacional por falta de um desenvolvimento correto de suas capacidades,o que dizer então a nível internacional.

    Mas, quando um treinador de seleção reclama da falta de qualificação a nível nacional dos atletas de uma categoria importantíssima para o futuro do nosso basquete, significa afirmar de vez que a coisa esta muito errada e urge que uma atitude inovadora e positiva seja tomada para que este temeroso quadro seja mudado.Grande abraço Professor.

  4. Prezado Prof. Paulo

    Apesar de não ser mais o Coordenador Pedagógico da ENTB gostaria de fazer um reparo em suas observações, já que a ENTB foi citada como um instituição voltada para a difusão de um único sistema de jogo “onde o planejamento, a aprendizagem e fixação do sistema suplanta em muito o ensino, que deveria ser maciço, dos fundamentos”. Isto não condiz com a realidade dos cursos de Nível 1 por mim coordenados, pois neles sempre difundimos a ideia da formação global dos jovens, sem especificidade de posições e/ou funções, além de oferecer aos treinadores participantes desses cursos variadas formas de ensino dos fundamentos e situações básicas de jogo, coerentes com a proposta desta formação global.

    No mais, quero concordar com sua opinião, principalmente no que tange aos currículos das Escolas de Educação Física que hoje, praticamente, ignoram a formação pedagógica daqueles que trabalharão na iniciação esportiva.

    Atenciosamente,

    Prof. Dante De Rose Junior

  5. Douglas 21.05.2012

    Olá, professor.

    Os textos refletem bem tudo que, também, penso sobre formação, tanto de base, quanto desta seleção. Realmente o Heleno Lima tem mais do que razão em observar a diferença de idade. Com toda certeza, 1 ano faz muita diferença, física, psicologica e emocionalmente falando, além de termos jovens bons na idade correta da categoria (15 anos). Já tive a oportunidade de ver diversos jogos da sub15 paulista, em São Paulo, onde resido, e vi diversos meninos capazes de compor uma seleção, apesar de problemas existentes em seus fundamentos, leitura de jogo, etc (mas no profissional brasileiro tem isso mais do que tudo, também. Não podemos exigir tanto dos garotos, se nem os nossos melhores jogadores adultos possuem tais atributos bem desenvolvidos). O ponto da escravização que o sistema único impõe sobre os garotos, onde se tornam especialistas sem, sequer, conhecer o todo também “ajuda” a termos esses resultados pífios. A má formação dos que deveriam formar também é um dos maiores absurdos, e como disse o professor Paulo Murilo, é um problema sistêmico, onde um educador físico se forma tendo estudado mais disciplinas médicas e da área das exatas do que pedagógicas e voltadas ao ramo da educação (ele está se formando um EDUCADOR, isso nunca deve ser esquecido). Esses tipos de especializações deveriam vir em cursos de pós-graduação, já que é onde se formam os especialistas.

    O que tenho a acrescentar é que, com toda certeza, os garotos que estavam lá não são os melhores, nem de longe, que temos no país. Infelizmente, principalmente na base, onde tudo fica mais escondido na névoa dos interesses “extra-basquetebol”, a prática do nepotismo, troca de favores e privilégios, entre outras atitudes de corrupção, beneficiam os mais bem indicados em detrimento dos, realmente, melhores.

    Abraços, professor!

  6. João 21.05.2012

    Pois é Douglas,..realmente não vamos colocar todo mundo no “mesmo saco”..acredito que exista uma gurizada que esteja, de fato, melhor preparada de que os atletas convocados…e aí vamos entrar num assunto muito sério tambem,o qual você cita no comentário, que é a politicagem , a falta de vergonha e a pilantragem extra-quadra dos dirigentes…tá demais!!Abraço João

  7. Basquete Brasil 21.05.2012

    Então como vemos, prezado João, trata-se de um situação insolvente, terminal, e que exige uma pronta e enérgica atitude reparadora, uma retomada a um objetivo de formação de base perdido duas décadas atrás. E para tanto, urge uma reformulação programática da CBB visando um projeto condizente às nossas reais necessidades e anseios, somente possivel com o engajamento dos mais autênticos e capazes profissionais na área da formação de base. Fora isso, nada alcançaremos, principalmente em 2016.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  8. Basquete Brasil 21.05.2012

    Me perdoe, prezado Prof. Dante De Rose Junior, mas em cursos de formação nivel I com a duração de 4 dias, muito pouco pode ser agregado ao conhecimento dos futuros jovens técnicos, fator suficiente para se manterem atrelados a um sistema que conhecem desde sempre, como praticantes, ouvintes ou mesmo curiosos.Sistemas variados exigem tempo de estudo e pratica, que um apressado curso não pode prover, tornando-o inócuo e impreciso.
    Quanto aos cursos superiores de Educação Física, espero vê-lo na vanguarda das urgentes modificações curriculares de que necessitam para que possamos retomar a excelência didático pedagógica usurpada dos mesmos. Essa é uma luta que travo a muito tempo. Seja benvindo.
    Atenciosamente,
    Prof. Paulo Murilo Alves Iracema

  9. Basquete Brasil 21.05.2012

    Prezado Douglas, como podemos todos atestar, a Educação Física, ou mesmo, a Educação de forma geral está algumas décadas na retaguarda das grandes nações, fator definitivo do nosso subdesenvolvimento, precaria mão de obra qualificada, ausência de uma política desportiva, e abandono criminoso de nossas futuras gerações. Enquanto este fosso cruel e desumano não for transposto, pouco poderemos aspirar de verdadeiro progresso, de verdeira democracia, de plena liberdade cidadã. Esta é a verdadeira luta a ser travada.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  10. Giancarlo 23.05.2012

    Olá, professor,

    demorei horrores para responder no meu quintal, então pergunto aqui também: em que momento as mentes criativas, competentes e qualificadas de nosso basquete passaram a ser desinteressantes para os “projetos edificantes” do basquete nacional? Quando optaram por trocar a guarda e valorizar a mediocridade?

    Abraço,
    Giancarlo

  11. Basquete Brasil 23.05.2012

    Dois foram os momentos Giancarlo, e ambos nas dissoluções da ANATEBA (Associação Nacional de Técnicos de Basquetebol)em 1973 (tinha sido fundada em 71 por minha sugestão durante o Campeonato Mundial Feminino em São Paulo), e da BRASTEBA (Associação Brasileira de Técnicos de Basquetebol)em, se não me falha a memoria, 1988 (foi fundada em 1976, também por minha sugestão num dos encontros de basquetebol organizado pelo Prof.José Medalha,com mais de 120 técnicos paulistas e de outros estados presentes, quando ambos, eu e ele, cursavamos o primeiro mestrado de Educação Física realizado no Brasil pela USP, sendo ele o titular da disciplina na EEF/USP). Na ANATEBA fui eleito como Secretário, na BRASTEBA como Vice-Presidente. A ANATEBA foi levada ao fechamento pela retirada do apoio da CBB quando reinvidicou para si a tutela do Mini-Basket que a associação havia lançado com enorme sucesso no país. A BRASTEBA declinou com a morte de seu eterno Presidente, Prof.Moacyr Daiuto, e a não continuidade dada pelo seu sucessor Prof.Guilerme Kroll, também pelo claro desinteresse da CBB no prosseguimento do projeto.
    Foram as duas únicas manifestações de carater nacional a tentar a unificação dos técnicos numa associação de classe, que por isso até hoje se mantêm fora das grandes resoluções e projetos voltados ao grande jogo no país, na contra mão das grandes potências da modalidade, onde suas associações de técnicos criam e gerem os grandes projetos técnicos, principalmente na formação de base e nas escolas para técnicos. Cinco anos atrás houve uma tentativa em São Paulo para uma associação de técnicos, quando fui o único não paulista presente à fundação da entidade presidida pelo Prof, Tácito, técnico do Palmeiras na ocasião, mas que não prosperou em caráter nacional, por motivos que desconheço em sua extensão.
    Enfim Giancarlo, sempre acreditei, e mais do que nunca, agora tenho a mais absoluta certeza, de que a inexistência de uma associação nacional, e mesmo regionais, de técnicos de basquete seja um dos, senão o maior motivo, de nossa desagregação técnico tática e descompasso educacional e competitivo, frente às demais nações que as possuem, vide a Argentina bem ao nosso lado. Falar em ética sem o associativismo necessário à existência e exequibilização da mesma torna-se impossivel, basicamente ao expor a fragmentação educativa, desportiva e cultural que se tem manifestada desde sempre no âmago da modalidade, para a infelicidade e frustração de todos aqueles direta ou indiretamente envolvidos no soerguimento do grande jogo no país.
    Um abraço, Paulo.

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