O FORMALISMO, A CRIATIVIDADE, E O KURTZ…

Fui ao Tijuca, numa tarde ensolarada e abrasadora, principalmente no interior do ginásio, que nunca deveria ser palco de uma partida de basquete sob tão alta temperatura, umidade e ventilação inexistente. Foi duro e desgastante assistir ao jogo, imaginem dentro da quadra…

Mas, apesar da fornalha valeu muito a pena o sacrifício, pois testemunhei um excelente jogo, e o mais importante, excitantes e instigantes novidades, e que novidades…

Antes de qualquer análise, e como de hábito, fui às diversas páginas que comentam os jogos, que variaram do heroísmo ao histórico, tecendo loas à jovem equipe francana, ao seu técnico, ao trabalho renovador que implantaram naquela mítica cidade paulista. Os comentários dos leitores então, bem ao modo de uma torcida nem um pouco humilde, o que é de praxe, já vaticina um arrebatador futuro para a equipe da auto declarada capital do basquete brasileiro.

Até ai, nada de novo, nada que não possamos subentender como algo natural e torcedor, mas em nenhuma midia visitada o verdadeiro teor, a verdadeira marca deixada por esse jogo foi sequer e minimamente cogitada, analisada, questionada…

Qual a marca então, prezado Paulo, qual?

Esta marca tem um nome, Kurtz, que pouco tinha visto jogar, mas sei que é gaúcho, dos muitos bons gaúchos que atuam em nossas quadras, e que por isso mesmo deixam sempre uma indagação no ar – Se o Ceará, sem nenhum cearense em sua equipe disputa uma liga sênior nacional, por que mistérios insondáveis uma equipe gaúcha não o faz, frente a tantos talentos que produz?

Mas voltemos ao Kurtz, com seus 2 metros e mais alguns e generosos centímetros, forte, muito forte, porém esguio e muito veloz, provando dentro da quadra que marcar um pivô oponente rigorosamente pela frente, nada de ½ ou ¾ à frente, e sim 100% à frente, não só é possível em nosso basquete, como se torna fundamental na constituição de uma eficiente e pressionada defesa linha da bola, pois as entradas e saídas de bolas ofensivas no pivô ao se tornarem impossíveis, obriga o adversário ao jogo de contorno, à individualidade de seus alas pivôs, como o Marcos ao centralizar as jogadas driblando compulsivamente, na impossibilidade de um diálogo com seu pivô, encoberto e guardado ao passe pelo inteligente e estratégico Kurtz no perímetro interno, deixou a equipe carioca órfã do coletivismo que tanto a embasou na sua irrepreensível campanha na liga.

Com a defesa estruturada e resolvida no seu interior, os espaços externos puderam ser ocupados, principalmente nas contestações aos longos arremessos da trinca Benite, Marcos e Alexandre, baixando seus coeficientes de acerto em muito, e exatamente nesse ponto é que a ausência do Kojo, que em dupla armação com o Benite ou o Gegê, conseguiam as penetrações tão necessárias quando o seu pivô pouco atuava pela dura marcação.

Somemos a tudo isso a presença de três experientes e bons jogadores, como o Figueroa, o Jonathan e o Teichmann, todos eles muito velozes e hábeis, para em conjunto com uma plêiade de jovens e futurosos jogadores, para termos uma equipe que tende a implantar uma forma diferente de jogar o grande jogo, em dupla e coerente armação, e velocidade tática no perímetro interno, assim como, empregando essas qualidades ao setor defensivo, veloz, e por isso pressionado, e acima de tudo antecipativo, à partir da marcação dianteira do pivô, ou mesmo pivôs adversários.

Mas nada do que foi visto e apreciado significaria muita coisa se não tivesse sido consentida aquela parcela fundamental de criatividade posta a serviço de uma coletividade, consentimento este dado por seu técnico, que mesmo sendo seguidor de um formalismo tático sempre presente, viu seu armador argentino, que perante o desesperado bloqueio rubro negro ao final de um jogo ainda indefinido, cortando as linhas de passe ao Jonathan e ao Teichmann, se meter ele mesmo, pequenino  que é, no meio da gigantada, para em dois curtos e precisos DPJ’s definir a fatura, assinada e protocolada pelos quatro lances livres do Jonathan convertidos, compensando um pouco os onze perdidos por sua equipe.

Parabenizo a equipe de Franca pelo belo e produtivo trabalho, principalmente pela reformulação técnico tática que desenvolve com competência, na ofensiva e basicamente na defensiva, e fico torcendo para que seu experiente técnico quebre um pouco mais o seu tradicional formalismo tático, e aprofunde o preparo dos fundamentos do grande jogo, pois sua equipe bem mesclada só terá a evoluir, inclusive taticamente.

Amém.

Foto – Final do jogo. Clique na mesma para ampliá-la.

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2 comentários

  1. Josue Filho 17.02.2013

    Caro professor

    Boa noite!

    Em todos os textos que leio pontualmente aqui site, pude perceber, analisar e agora posso dizer que, para melhorar e ou modificar nosso modo de jogar, único, unilateral e previsível (fato provado), deveremos olhar atenta e carinhosamente para o passado.

    Inspirado por um vídeo postado por Cadum (alguém da nova safra o conhece ou faz questão de conhecer?) numa final de um campeonato paulista jogado no Ibirapuera com ginásio lotado (hoje em dia…), pelo pouco tempo de vídeo 30 segs foi o suficiente para despertar em mim essa nova fase de aprendizado que é de se estudar os jogos passados para solucionar problemas presentes e criar novos conceitos para o futuro, creio que tal proposta seja possível, pois o foco do estudo que realizarei, será baseado na questão técnico tática e principalmente de fundamentos.

    Quero minuciosamente entender como eram desempenhados os fundamentos por parte dos atletas principalmente na posição tão bem comentada pelo texto acima que foi a do pivô que teve como protagonista o jovem Kurtz que teve uma passagem discreta por Jacarei sob o comando de Deco.

    Na época do referido estudo que farei, não existia linha de três pontos, os atletas eram forçados a criar situações e jogo onde a participação dos verdadeiros pivôs (especialistas em jogo na tabua e arremessos perimetrais), revelaram nomes como Josuel, Rolando, Israel, Pipoka, Janjão, Coloneze (ainda em atividade), Vargas, dentre outros pivos de tempos mais antigos, que tinham a capacidade de resolver problemas que nossos pivôs (?) modernos e chutadores, penam para sequer entender.

    Recursos como ganchos por exemplo estão extintos e nos dias atuais são executados de maneira errada, isso quando há jogo interno que ausente, está fazendo com que a posição deixe de formar grandes atletas principalmente na base. Temos Splitter, Varejão, Nene, Paulão dentre outros, que hoje beiram o último ciclo olímpico, os únicos atletas na posição com idade inferior a 22 anos que temos destaque é Lucas Bebe e Lucas Mariano que apesar de necessitar de aprimoramento em suas ações, destacam-se por sua maturidade e desenvoltura nos jogos.

    Fazendo uma linha com o jogo Franca x Flamengo, tal vitória somente foi possível, pois Franca através de seus jovens atletas, imprimiu uma defesa contestadora tipica e alusiva a frase de Coach Oveja do Penarol que citou que para vencer equipes brasileiras, basta contestar-lhes os arremessos de 3 pontos e tem vencido jogos atrás de jogos revertendo em titulos.

    Espero e desejo que jogos assim sejam constantes não só no NBB, mas também em todos os campeonatos de basquetebol. Mas para tanto, creio que devermos olhar com mais carinho para o passado onde pode estar as respostas para as problemáticas atuais como a sanha por arremessos de três pontos, armações cada vez mais individualistas, ausencia de jogo interno com pivos principalmente em situações de 1×1 e principalmente as defesas que tem como passividade sua grande falha acobertando suas principais e naturais fraquezas.

    Abs

    Josue

  2. Basquete Brasil 18.02.2013

    Conhecendo e respeitando os classicos mestres, trazendo-os como referenciais para o nosso presente, poderemos nos lançar com segurança e firmesa para o futuro, e disso tenho a mais absoluta certeza. Siga estudando, prezado Josue, que é o maior investimento possivel para o seu pleno e sustentado projeto profissional.
    Um abraço, Paulo Murilo.

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