O NEGADO COLETIVISMO…

P1030105P1030112P1030116P1030117

São três horas da madrugada, e acabo de rever alguns trechos gravados do jogo com o Uruguai, não como provação masoquista, mas sim para aferir com alguma precisão, ou mesmo, tentar descerrar algum diáfano véu que possa estar encobrindo algo aparentemente inexplicável às minhas cansadas retinas, mais do que acostumadas com as nuances de um jogo complexo e apaixonante como o basquetebol.

Nada percebo que não tenha analisado e julgado anteriormente, com uma única ressalva, o abandono geral e irrestrito do caráter coletivista treinado e posto em pratica nos dois meses de preparação, por toda a equipe nos jogos antecedentes a catástrofe de ontem, numa insidiosa e progressiva escalada, que atingiu seu ápice contra os uruguaios, e que catástrofe…

Anexei acima algumas reproduções da TV que fiz seletivamente, como sempre faço, e o que vemos é de certa forma preocupante, pois custo a crer que uma equipe, melhor, uma seleção nacional de grandes e imorredouras tradições, depois de tanto e exaustivo trabalho feito na busca de um planejado coletivismo, se poste numa quadra de jogo, na busca da classificação a um Mundial,  atacando em amplo “leque”, quando um só jogador, num pivô ou na armação, se define como executor e definidor solitário em ações ofensivas, tendo seus outros quatro companheiros como torcedores privilegiados e estáticos na cena, faltando somente os aplausos quando bem sucedidos, numa claríssima atitude de abandono, repulsa mesmo, a um processo a que foram submetidos na busca do jogo associativo, coletivo e de movimentação contínua e homogênea, para o qual algumas qualidades de personalidade são necessárias, como o irrestrito comprometimento e o básico compromisso em torno e no âmago dos conceitos de jogo emanados pelo técnico da equipe,

Ausentes essas qualidades, temos como resultante o que assistimos nas três últimas partidas, um alheamento às propostas de jogo, canalizando definições para o foro e vontade intima inerente a cada jogador, principalmente pela clara opção ao jogo externo, onde o reinado das bolinhas mais do que nunca se mantêm íntegro, principalmente através seus mais usuais utentes, o Guilherme, Arthur, Benite e Alex, com eventuais e pontuais participantes, como o Huertas, o Larry e o Raul, e bissextos como o Rafael e o Caio. Ou seja, é a única seleção da competição em que nove de seus integrantes se consideram especialistas nos três pontos, sem dúvida um recorde mundial, e um erro colossal, bem aferido ontem quando contestados pelos uruguaios, levando-os a um constrangedor e pífio 2/18 nas tentativas de fora.

Mas a cereja desse mofado bolo veio através elucidativas entrevistas concedidas pelos já conhecidos e encanecidos cardeais da seleção, nas quais muito se pode avaliar sobre o que de real acontece no seio de uma equipe que está sendo minuciosamente desmantelada pelos vícios vitalícios de uma geração que confia essencialmente em “seus tacos”, como compensação de sua fragilidade defensiva (evidenciada mais do que nunca nesta Copa), e do principio de “grupo fechado” garantidor de suas capitanias hereditárias, onde mudanças de conceitos de treinamento e de jogo sofrem resistência ostensiva, perfeitamente visualizadas nas competições e jogos, só que nessa, de transcendental importância para o soerguimento do grande jogo no país, se deram mal, muito mal, escancarando a dura realidade de uma modalidade que se nega a evoluir, a buscar a renovação através o trabalho na base, na valorização incondicional dos fundamentos, e na visualização objetiva do que venham a ser jogadores com reais e consistentes bases para se lançarem a excelência em suas carreiras, e não esse enxame de falsos prospectos precocemente queimados por inescrupulosos e aventureiros agentes de absolutamente nada.

Analisem com isenção e profunda atenção o que dizem os cardeais, porta vozes de uma equipe que nem de longe merece compor na representação do que temos de melhor, a começar pelo não engajamento junto à honesta e competente proposta de um técnico bem intencionado, mas que cometeu dois erros brutais, que agora se desnudam como praticamente irreparáveis, o de selecionar equivocadamente jogadores que lá no fundo de suas experiências de vida e de jogo, simplesmente não aceitam suas concepções, mesmo olímpicas, de jogo, e na admissão do reinado das bolinhas,  numa matéria do jornalista Marcello Pires do Basketeria de 3/9/2013 – (…) Contra Porto Rico mantivemos o time deles com um aproveitamento de apenas 32% em arremessos e não conseguimos vencer. Nesta segunda-feira, contra o Uruguai, tivemos 11% de aproveitamento na bola de três e perdemos. É simples, a bola não está caindo. (…)

(…) “É difícil dizer alguma coisa numa situação como a que estamos vivendo agora. Quando você entra numa inércia da derrota o moral começa a cair. Precisamos levantar a cabeça para ganhar o próximo jogo e tentar reverter essa situação. Temos que continuar acreditando. Chegamos num momento que não adianta mais treinar. Tem que ser na base da conversa para levantar o moral de cada um”, destacou Giovannoni.

” A gente sabe que pode brigar pelo quinto lugar para conseguir a classificação para o Mundial de Basquete. Temos que fazer o que der para vencer a Jamaica amanhã e os próximos quatro jogos da próxima fase. Depois vamos ver o que acontece”, disse o ala/armador Alex Garcia.(…)

( Trechos da matéria publicada no blog  Databasket em 2/9/2013).

 

Realmente dá seriamente no que pensar…

Amém.

 

Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.



8 comentários

  1. Henrique Lima 03.09.2013

    Professor Paulo, fui fuçar um pouco por aí, porque nem dormir direito, eu consegui com esta derrota.

    Veja bem.

    Corri um pouco atrás, muito pouco e, leia abaixo !

    ” O que ocorreu ontem, tem acontecido nos torneios de base, com uma frequência cada vez maior:

    .2010 – Sulamericano Sub-15

    Bra 72 x 59 Uru

    .2011 – Sulamericano Sub-15

    Bra 53 x 50 Uru

    .2012 – Sulamericano Sub-15

    Bra 49 x 67 Uru

    2009 – Sulamericano Sub-17

    Bra 77 x 81 Uru

    .2011 – Sulamericano Sub-17

    Bra 54 x 45 Uru

    .2013 – Sulamericano Sub-17

    Bra 71 x 84 Uru

    .2010 – Copa América Sub-18

    Bra 71 x 64 Uru

    .2010 – Sulamericano Adulto

    Bra 89 x 63 Uru

    .2012 – Sulamericano Adulto

    Bra 68 x 80 Uru

    .2009 – Copa América Adulto

    Bra 82 x 62 Uru

    .2011 – Copa América Adulto

    Bra 93 x 66 Uru

    .2013 – Copa América Adulto

    Bra 73 x 79 Uru

    Total: 12 jogos

    Brasil: 7 vitórias

    Uruguai: 5 vitórias ”

  2. Basquete Brasil 03.09.2013

    Conclusão mais do que óbvia, e vinda de um país com pouco mais de 3 milhões de habitantes, é que estamos anos luz de uma real e consistente política voltada ao desporto de base, Henrique, configurando o cenário que ai está, as exceções, caso do vôlei, não contam, pois justificam a nossa dolorosa realidade, somente bem recebida e alimentada pela enorme trupe de oportunistas e apaniguados que usufruem da mesma. Talvez um dia, quem sabe um dia, emergiremos dessa fossa mal cheirosa e abjeta.
    Bom trabalho Henrique. Um abraço, Paulo.

  3. Henrique Lima 03.09.2013

    Professor Paulo,

    além de não nos cansarmos de falar em todos os locais de militância entre os que clamam por um basquetebol melhor, ainda vejo algumas coisas:

    I – perdemos do Chile no Sulamericano Sub-15 !!! CHILE !!!!!

    II – Otávio Battaglia (técnico atuante na Espanha, não conheço o trabalho) vai ministrar clínicas em Barueri para o ENTB.

    Com certeza, ele tem o que dizer e tem conhecimento.

    Porém,de quatro dias de clínica (PRO NÍVEL II), o ilustre treinador terá disponível 4 horas a seu dispor, sobre temas que dariam dias de clínicas.

    14h20 / 15h40 – Fundamentos Individuais de Ataque (Otavio)
    09h00 / 10h20 – Desenvolvimento da sessão de treino (Otavio Battaglia)
    11h40 / 13h00 – Jogo por Conceito I (Otavio Battaglia)

    Muito pouco tempo para quem poderia ajudar, não ?!

    André Germano, auxiliar da Sel. Sub-19, deste desastre que atuou na Letônia, também ministrará.

    O técnico da seleção de surdos e mudos do Canadá e também, o onipresente Flávio Davis.

    300,00 a inscrição para os quatro dias.

    O basquetebol está com o pires na mãos mesmo.

    Um forte abraço

  4. Basquete Brasil 03.09.2013

    Bem, esta é a ENTB que merecemos pela omissão e desprezo pelo mérito e intensa vivência experimental e acadêmica por parte de uma CBB ligada ao corporativismo vigente.Para o que propalam e divulgam está bem de acordo. Agora, quanto a formação séria de técnicos, é outra história.
    Um abraço, Henrique.
    Paulo Murilo.

  5. Josue Lima Guerra Filho 03.09.2013

    Srs

    Boa Tarde!

    Irei participar da Clinica da ENTB a qual em comentários anteriores aqui mesmo nesse site onde temos liberdade para debater e ainda aprender o basquete numa visão muito mais que técnica, acadêmica também embasado por um professor que em seu currículo mostra o porque tem liberdade e coragem de militar da forma que milita no basquete.

    Com essa história de que deve-se credenciar até 2015 os treinadores para que esses possam atuar isso é legitimo? E para os novos treinadores como faz?

    Eu farei o curso amanha e terei um ano para pegar minha carteira, porém me formo no fim de 2014 como faço?

  6. Basquete Brasil 04.09.2013

    Honestamente, prezado Josué, creio ser impossível a imposição dessas credenciais frente as exigências legais para impô-las, nada que uma liminar judicial a conteste. A ENTB não tem fundamentação jurídica defensável para tanto.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  7. walter carvalho 05.09.2013

    Ola Professor Paulo,

    O que aconteceu na Venezuela e o crime que estao cometendo na formacao de base do basquetebol brasileiro tem sido exaustivamente exposto em suas colunas ha muitos anos. Nada do que aconteceu e esta acontecendo com o basquetebol brasileiro me surpreende!
    Infelizmente, o perder de pouco durante as ultimos jogos olimpicos mascararam muita coisa mas nao por muito tempo!

    Infelizmente plantamos – plantamos mal! – e estamos colhendo os frutos!

  8. Basquete Brasil 05.09.2013

    E nos preparemos Walter, para outra e mais insidiosa investida que já se desenha no horizonte, o confronto propositalmente articulado entre o que venha ser treinador e técnico (que espero seja definitivamente esclarecido), como forma de dicotomizar tarefas e ações concomitantes, na tentativa de ser mantida a perniciosa dominância dos “estrategistas” , utentes que se impõem e usufruem, na maioria das vezes politicamente, do trabalho altamente especializado na formação de jogadores, por parte daqueles que realmente entendem, dominam e desenvolvem o grande jogo.
    Creio já se tornar tardia uma definição de valores, pois treinador e técnico se fundem na composição definitiva do que venha a ser um professor, um verdadeiro professor de basquetebol.
    Vamos a luta então Walter, a boa luta.
    Um abraço, Paulo.

Deixe seu comentário