O “CORNER PLAYER”…

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Chego cedo ao Tijuca, afinal o jogo com o Pinheiros apontava para casa cheia (o que não ocorreu), encontro o José Geraldo com quem trabalhei três anos na base do  Barra da Tijuca, e fomos nos sentar no ginásio, exatamente quando começava o aquecimento dos jogadores cariocas. Observo a movimentação, quando algo me chamou a atenção, um rotundo americano que simplesmente não conseguia flexibilizar qualquer articulação de seu corpo, “embromando” os movimentos em super câmera lenta, atitude que nem a temperatura elevada no local poderia justificar. Fiquei atento ao cara, imaginando como seria e agiria na tocada de um jogo que se anunciava frenético, apesar de considerar para comigo mesmo, ser um jogo para se colocar a bola embaixo do braço, cadenciá-lo e valorizar ao extremo a posse de bola, dada as circunstâncias de desgaste das duas equipes mergulhadas numa infernal temperatura ambiente.

Mas qual nada, o jogo transcorreu numa velocidade absurda frente à realidade de um calor insuportável para quem assistia, imagino para quem jogava, num duelo suicida para ver quem abriria o bico primeiro, os cariocas amantes do sol, ou os paulistas irmãos da garoa, que por conta disso tudo fizeram somar a elevada cifra de 29 erros de fundamentos, entremeados pela contumaz chuva de bolinhas (18/45), e uma correria simplesmente infantil, jamais adulta, profissional, e mais, assistindo a sacralização de mais uma posição nesse sistema absurdo de jogo que praticamos, o “corner player”, aquele que passa todo o seu tempo em quadra na esquina da mesma para efetuar sua única habilidade(?) e função, a bolinha de três…

E o americano rotundo? Não deu outra, simplesmente não conseguia acompanhar o ritmo do duelo, a barriga não deixava…

No universo de tanta fragilidade técnica, correria desenfreada, erros fundamentais indesculpáveis (o discurso de que as equipes estavam desgastadas pelos compromissos fora do NBB perdiam sua razão frente à tão evidente realidade…) vimos o jogo caminhar para o quarto final, quando… O Pinheiros resolveu colocar a bola embaixo do braço, jogar dentro do garrafão, utilizar seus pivôs e as penetrações, e ganhou o jogo, numa ação tática premeditada, ou fruto do cansaço, antecipando um diminuição de ritmo que os cariocas negligenciaram?

Sei não, prefiro me eximir de comentar algo tão óbvio naquelas circunstâncias de jogo, quando a minutos de seu final um dos duelantes abre mão (por cansaço?…) da velocidade burra, pausa para pensar, joga onde deveria ter jogado desde o inicio (ambas deveriam assim ter pensado e agido), ou seja, “lá dentro”, no âmago do adversário, demonstrando quem realmente teria capacidade técnica e tática somadas a uma estratégia de jogo condizente às condições existentes, e não somente uma, a minutos do final, carimbando o resultado.

Mas, a dura realidade é a de que nossos jogadores aos poucos vão transcendendo a liderança de seus técnicos, insistindo e perpetuando o “dribla e chuta”, a correria utópica, o abandono do jogo interno, a ausência defensiva, onde praticamente todos sedimentam o reinado das bolinhas, podemos projetar o que nos espera nas competições internacionais mais adiante, não essas que participamos contra muitas equipes formadas nos aeroportos (e fazendo jogos duríssimos), mas aquelas que agora, trágica e infelizmente, participaremos por convites, a continuar a insânia firmemente imposta e instalada em nosso basquetebol.

Saindo do ginásio, segui pensando o que nos espera num futuro breve, 2016, principalmente ao constatar o quanto de prejuízo incidirá sobre o futuro de jovens talentos, como o Bruno Caboclo, jogando da forma desvairada como atuou, com muitos fundamentos ainda por adquirir, dentro de um carrossel desgovernado pela velocidade sem sentido, sendo lançado ao rachão tradicional de nossas equipes de elite, na marra, correndo os mesmos perigos que já fizeram sucumbir outros jovens estigmatizados pela quimera de uma NBA, fazendo com que suas carreiras passem ao largo de uma possível NCAA, com seus diplomas importantes para aqueles que ao encerrarem suas curtas carreiras possam dar continuidade digna as suas vidas, mesmo aqui, em nossas universidades, ou simplesmente concluindo o ensino médio, ou técnico, fatores estes abjurados e negados por falsos agentes, empresários, dirigentes, alguns jornalistas, e por que não, técnicos também, que somente os veem como mercadoria a render valores no menor espaço de tempo que for possível.

Mas qual nada, estamos no Mundial, gloriosamente classificados, não no suado piso de uma quadra, dentro de uma penosa competição, mas no tapetão internacional do escambo, da troca política, através indivíduos que odeiam o grande jogo, porque jamais o entenderão, jamais serão aceitos por ele, mas que o dirigem à sombra de sua mesquinhez e pusilanimidade, e o horror, pela nossa omissão em permitir tal descalabro.

Amém.

Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.



13 comentários

  1. Henrique 03.02.2014

    E era pra ser dos grandes jogos do campeonato.

    Apenas mais uma pelada interminavel entre dois times treinados de forma deprirmente.

    Ah … um e auxiliar da selecao faz anos … coincidencia.

    Abraco Professor.

  2. Henrique Lima 04.02.2014

    Li o texto e não tem o que acrescentar.

    Hoje temos jogadores que jogam parados em quadra ! Isso diz tudo ! rs

    Mas, tem sido assim na NBA, na Europa e aqui. O pensamento único realmente não faz bem.

    Espero que o Mundial seja bom para vir ideias novas, algo que está faltando no cenário mundial, nos torneios mundiais vamos dizer, faz um tempo.

  3. Basquete Brasil 05.02.2014

    Sim, Henrique, um pensamento único jamais faz bem, pois é o caminho mais curto para o absolutismo, para o poder ditatorial.
    Há uns anos atrás, num comentário sobre artigo em que mencionava formas diferenciadas de atuar, um leitor lembrava que nem na NBA, Euroliga, NCAA, tinha visto alguma das equipes participantes daquelas ligas atuarem como o Saldanha no NBB2, exceto no Mundial com a equipe americana do Coach K, num depoimento mais atual do que nunca. Imagine como estaríamos jogando hoje se aquele projeto tivesse prosseguimento, mas que foi ceifado criminosamente pelo corporativismo que administra a mesmice em que nos encontramos. Mas a grande maldade foi cortar minha possibilidade de trabalho profissional, em nome dessa ignomínia calcada na estupidez e desamor ao grande jogo.
    Mas ainda mantenho a fé em dias melhores, Henrique, ainda…
    Um abraço, Paulo.

  4. Rodolpho 11.02.2014

    O Real Madrid “joga diferente”.

    Pra quem não gosta de mesmice fica a dica.

    Um abraço!

  5. Basquete Brasil 11.02.2014

    Claro, prezado Rodolpho, em se tratando de uma equipe estelar, num campeonato mais estelar ainda, e advindo de uma Europa primeiromundista, tudo a ver pela “diferença” como atua, que obviamente obscurece e esmaga tentativas de um outro mundo, o terceiro…
    O válido por lá, é o negado aqui, verdade inquestionável, lamentavelmente…
    Quem sabe, um dia, reconheçamos que também existe “luz” por aqui…
    Um abraço, Paulo Murilo.

  6. Rodolpho 12.02.2014

    Não só te entendo como concordo em parte, professor.

    Mas são 37 vitórias em 38 jogos essa temporada. A média de placar é de 88 a 69. Média.

    Usam o banco inteiro, por isso conseguem uma intensidade absurda. A estrela do time dificilmente joga mais do que 25 minutos num jogo.

    Estrangeiro lá não joga com fama, nem nacionalidade. Eles completam o time. E tem ex-NBA no banco, jogando 20 minutos por jogo e feliz da vida.

    Defendem, defendem, defendem. Jogam dentro e fora do garrafão.

    E aposto que é um time melhor do que algums da NBA. Talvez um time de playoff nos USA. Acho que time assim nunca houve.

    Pra quem não aguenta o individualismo da NBA ou o baixíssimo nível do NBB o Real Madrid é uma aula de basketball.

  7. Basquete Brasil 12.02.2014

    Olha, prezado Rodolpho, essa especial equipe do Real simplesmente joga como uma equipe, e não um plantel de estrelas voltadas aos seus egos e picos estatísticos, hoje em moda, quando a produção individual é mais incensada do que a vitória da equipe, por uma mídia cada vez mais comprometida com o “star system” a que querem transformar o grande jogo, onde os lucros beneficiam a todos, indistintamente. Exatamente por causa dessa tendência é que cada vez mais se solidifica o corporativismo vigente, sem no entanto evitar que algumas resistências ocorram, como essa equipe do Real, ou o sistema de jogo do Coach K, e mesmo a simplicidade objetiva de um olvidado Saldanha.
    Vida que segue Rodolpho. Um abraço, Paulo Murilo.

  8. Henrique Lima 12.02.2014

    Rodolpho,

    até o final de 2013, dois times me saltavam aos olhos com tanta qualidade:

    Real na Europa.

    SA Spurs nos EUA.

    Ambos são extremamente coletivos.

    No Spurs, para 48 minutos de jogos, ninguém atua mais de 31 por partida, ou seja, similar 25.8 se fossem 40 minutos.

    Ambos tem um basquetebol que acho maravilhoso.

    O Real desta temporada é dos melhores times de basquetebol que eu já vi.

    É anos luz melhor que a maioria da NBA facilmente.

    Hoje, temos pelo menos 20 times na NBA que dificilmente voce suporta ver 1 tempo inteiro.

    Abraço !

  9. Rodolpho 16.02.2014

    Henrique,

    Tenho a impressão de que os Spurs rodam mais o time devido a idade e condição física do Duncan, Parker e Ginobili. Fora que a maratona da NBA é mais cansativa. Mais jogos e 8 minutos por jogo a mais, além de viagens muito longas.

    Obviamente se os outros jogadores não dessem conta isso não ocorreria. O Popovich consegue tirar o máximo de cada jogador e ganha mts jogos com atuações de gala de jogadores medianos.

    Por esses motivos acho o feito do Real Madrid mais louvável. Mas me impressiona muito a longevidade e sucesso do estilo Popovich.

    Duvido muito que cinco treinadores do NBB tenham assistido três jogos do Real essa temporada. E duvido que metade deles saiba sequer o canal onde passam os jogos.

    Abraço!

  10. Fernando 27.02.2014

    Professor e um grande prazer voltar a escrever ao senhor, saindo do assunto gostaria de saber se um rapaz aqui de Santo André, de nome Wesley Andrada, ainda está no Tijuca, e se está se desenvolvendo bem, ele tinha um talento fisico muito bom e era grande amigo meu e de meu filho, com quem ele jogou em Santo André e nas seleções Paulista e Brasileira.
    Quanto a meu filho, este parou de jogar para se dedicar a universidade, faz engenharia na Universidade Federal do ABC, está entre as maiores notas da instituição, mas confesso que adoraria que ele tivesse dedicado sua inteligencia acima da media no basquete.
    Mas como já comentei um dia, a falta de perspectiva no nosso meio afugenta os que tem maior potencial intelectual.
    Um grande abraço, e espero que o garoto Wesley Andrada, agora com 20 anos esteja bem e se desenvolvendo.

  11. Basquete Brasil 03.03.2014

    Prezado Fernando, sua vinda ao blog é sempre um fator alegre e positivo para mim, obrigado. Compreendo a opção de seu filho, mas sugeriria que ele não abandonasse de vez o grande jogo, que ainda poderá contribuir bastante para sua educação de vida, ainda mais se o pratica com técnica e competência. Com jeito e vontade a conciliação sempre será possível. Infelizmente não poderei informar sobre o Wesley, desculpe.
    Um abraço, Paulo Murilo.

  12. Diego Felipe 08.03.2014

    Professor, fantástica entrevista do treinador Gregg Poppovich. Chegou a lê-la? http://setevintecinco.blogspot.com.br/2014/03/o-ataque-segundo-popovich.html

    “Às vezes, nos descontos de tempo, digo-lhes ‘não tenho nada para vos dizer. Que querem que eu faça? Acabámos de perder a bola seis vezes. Toda a gente está a agarrar-se à bola. Que mais querem que eu faça? Resolvam vocês.'”

    Lembro-me que o sr. tanto falava, não adiantava sentar e ficar desenhando jogadas… Fantástico! 😀

  13. Basquete Brasil 14.03.2014

    Sim, prezado Diego, é uma excelente entrevista, e agradeço o seu envio. Mas o fato que mais me tocou foi o de reconhecer no depoimento do grande técnico, muito do que defendo e desenvolvo desde sempre, principalmente na relação com os jogadores, principalmente no treino, na formação e organização da equipe, onde o jogo em si é somente decorrência da mesma, simples assim, mas completamente cifrada e hermética para a maioria de nossos “estrategistas”.
    Obrigado pelo envio Diego. Um abraço, Paulo Murilo.

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