DUAS VISÕES DE UM PROBLEMA (OU O SINGELO JOGO)…

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Num recente comentário sobre o Encontro NBA em São Paulo, o jornalista Fabio Balassiano emitiu a opinião abaixo, e que de certa forma engloba uma quase unânime opinião de torcedores, dirigentes e mídia sobre o enfoque que deve ser dado ao NBB, mais agora com sua parceria com a grande liga do norte

(…) Quem viu as palestras e sabe da exigência da NBA com isso viu que o recado foi claro: é absolutamente imperativo que a LNB e os clubes comecem, para ontem, a tratar do basquete de forma profissional, de forma que faça o torcedor querer ir ao basquete como um “programa” e não apenas como um singelo “jogo”.(…)

Isto quer dizer, e se bem entendo, que a finalidade da ida do torcedor a um ginásio, tem como prioridade tomar parte de um programa, de um pacote de atrações, onde o basquete singelamente faz parte, mas onde, aqui em terra tupiniquim, ou acima do equador, acompanhado de hamburgueres, refrigerantes, pipocas, mascotes e insossas e rebolativas ladies?…

Ah, em tempo, esqueci os bazares de bugingangas, joguinhos de computadores, selfies com jogadores, e todo uma realidade consumista a disposição de quem pode e gosta de gastar pelo padrão de vida que levam, mas será essa a realidade por aqui?…

No entanto, será mesmo esse o retrato da realidade do basquete americano? Acredito que absolutamente não, e fortaleci esse ponto de vista desde a primeira vez que lá estive em 1966, quando me classifiquei a um estágio em universidades e escolas secundárias num concurso público patrocinado pela CBB e o Departamento de Estado norte americano. Foram três meses percorrendo instituições estudantis de Washington ao Novo México, de ônibus em pleno inverno, mas fotografando e filmando tudo que podia, com uma verba ínfima da CBB, material esse que divulguei em alguns estados brasileiros como contrapartida da viagem, que na ida, foi em avião cargueiro da FAB, junto ao Raimundo Nonato, outro classificado, e depois diretor técnico da CBB por muitos anos…

O que lá testemunhei foi um amor incontido pela modalidade, quase sagrado nas escolas secundárias, e mais ainda nas universidades, numa época em que a NBA e a ABA ensaiavam a mega indústria que se desenvolveria anos mais adiante, mas tendo, como até hoje, a estrutura estudantil como alicerce de suas conquistas…

E que público era aquele que enchia os ginásios, o de programa, ou de um singelo jogo de basquete? Sem dúvida alguma um público que admirava e venerava a técnica individual e coletiva de suas equipes, muitos deles ex praticantes, com fotos e troféus expostos nas entradas dos ginásios, demonstrando seu amor à tradição de suas escolas, logo, entendedores do grande jogo, ávidos e sempre prontos a testemunharem novas técnicas e avanços táticos, assim como a criação e desenvolvimento de estratégias administrativas, participativas e do jogo em si, mantenedores da grandeza que ostentam até os dias de hoje, ampliada pela enorme divulgação midiática da liga maior pelo mundo…

Então, pudemos nos conscientizar de que o grande vetor, a amalgama que unia toda aquela grandeza, foi, é e sempre será o domínio da técnica, dos fundamentos, da tática e da estratégia, todos esses predicados de domínio de um profissional, daquele que os dominam, pelo estudo, pela pesquisa, pela experimentação, pelo ensino, pela divulgação do grande jogo em sua terra, e hoje pelo mundo, o professor, o técnico, o head coach…

Singelo jogo? Sim, se considerarmos que investimos quase tudo em dirigentes, agentes, próceres, políticos, managers, marqueteiros, e muitos, muitos aspones, relegando o técnico, que é o mais importante elo da corrente de desenvolvimento do jogo, aquele que promove as técnicas, as táticas, ensinando-as desde sempre, mas que por aqui sofreu desvios consideráveis, através um terrível mecanismo, aquele de trocar deliberadamente o mérito pelo carreirismo político, pelo protecionismo com contrapartidas óbvias, pelo econômico no provisionamento de leigos distanciados do fator didático pedagógico, fundamental no preparo dos mais jovens, pelo drástico corte nos conteúdos teórico práticos desportivos dos currículos dos cursos de educação física, substituindo-os pelas disciplinas da área médica, originando a falência dos primeiros, e a ascensão dos segundos na “preparação” de atletas, em vez de jogadores…

Esse mesmo técnico, que em sua maioria que se transmudou em estrategista (as poucas exceções não contam…), dissociado do preparo nos fundamentos, mas especializado (?) em sistemas de jogo, em rebuscados esquemas em pranchetas, e acima de tudo frasista brilhante nas justificativas de derrotas, onde “foram os detalhes”, “a emotividade os derrotou”, “faltaram as pernas”, “as bolas não caíram”, “marcaram muito mal”, “perderam o ritmo de jogo”, e todo um corolário de desculpas pontuais, sem que em nenhum momento reconhecesse que simplesmente “falhara”…

Também, jamais admitiu um princípio elementar para o seu trabalho, o fato de que seus sistemas, simples ou complexos, em hipótese alguma funcionarão com jogadores falhos nos fundamentos, que são incapazes de corrigir, daí as trocas sistemáticas e repetitivas de jogadores de mesmas posições ao fim de cada temporada, num movimento monocórdio, repetitivo a todos, e a todas as franquias…

A mídia menciona sistemas de ataque e defesa, mas não esquematiza nem explica os mesmos à luz de um fundamentado conhecimento, a fim de esclarecer a todos aqueles que buscam um “programa”, o que deveriam entender e ajudar o grande jogo a ser mais do que um “singelo jogo de fim de noite”…

Sou de um tempo que tínhamos dezesseis clubes trabalhando a base, além de muitas escolas, nos infantís, infanto juvenís, juvenís, aspirantes e adultos, sempre com ginásios cheios, onde em uma partida infanto juvenil, num sábado à tarde, podíamos ver técnicos dos adultos assistindo juntos a um sistema de dois armadores e três alas pivôs que eu já aplicava nos anos setenta no Fluminense, para depois do jogo irmos discutir a novidade numa rodada de cerveja, lá mesmo na Gávea, assim como ia quando possível assistir o Guilherme no Mackenzie dar aulas de defesa com seus juvenís, ou o Gleck no Fluminense se quiséssemos aprender como se contra atacava com eficiência, além de um Tude Sobrinho, Heleno Lima, Geraldo da Conceição (ainda hoje aos 90 anos ensinando em Brasília), Ary Vidal, Marcelo Cocada, Chocolate, Waldir Bocardo, Helinho, Valtinho, e muitos outros excelentes técnicos, cada um com seus sistemas de jogo, inéditos e criativos, e não essa pasteurização formatada e padronizada que nos impingem goela abaixo, numa mesmice endêmica e apavorante, e que se regala quando um argentino “inova” na defesa e no ataque, fatores que nos eram comuns num passado não tão distante assim, quando os hermanos jamais nos venciam em divisão alguma, e cujos últimos remanescentes foram afastados pelo absurdo corporativismo que nos implantaram. Nesse exato momento que escrevo o artigo vejo o técnico da seleção feminina ser excluído da partida com o Canada por reclamação da arbitragem, dando ao mesmo mais uma desculpa para a contundente derrota – “Foi a arbitragem”…

Enfim, ainda anseio ver o nosso torcedor ir aos jogos para apreciar seu produto final, o jogo, de boa qualidade técnica e tática, que é o que realmente deveria interessar, e sobrando tempo curtir o programão, regado a duvidosas promoções e dançarinas provocantes como as argentinas no jogo de hoje entre os hermanos e nossa seleção masculina pelo desafio internacional…

Com singeleza eu deixaria para comentar um dia em que o grande jogo se libertasse das amarras que o tolhem pela mediocridade institucionalizada, pelo corporativismo exacerbado, e pela negativa do novo, do insólito, do contraditório, na contra mão do que aí está, e bem sei, e muito, do que estou falando, mesmo…

Amém.

Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.

Em tempo, a seleção feminina tomou um passeio do Canada, e a masculina perdeu feio para a Argentina, desculpada pela mídia especializada por ser uma etapa da preparação para um pré olímpico, já estando classificado para as olimpíadas.

 



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