MUNDIAL- O DÉCIMO PRIMEIRO DIA: O ÉDEN DOS TRÊS…
A curva ascendente do sistema único universalizado de jogo, o grande modelo NBA, finalmente chegou ao seu ápice, quando, mesmo antecedendo a adoção da nova linha de três, acrescida em 50cm além dos atuais 6,25m, tornou os arremessos além desta distância o fator de desequilíbrio nos jogos deste Mundial, vide o arremesso do jogador Teodosic da Servia, frente a um defensor de 2,07m à sua frente, e faltando 3seg para o término da posse da bola no seu derradeiro ataque, levando de vencida a equipe campeã mundial, a Espanha, e a enxurrada de acertos turcos em seus longos arremessos frente a uma Eslovênia indefesa ante tamanha performance.
A grande maioria dos jogos têm sido definidos desta forma, mesmo ante equipes com sólidas defesas, mas que ficam a meio caminho de dobras interiores, a fim de evitar altas pontuações dos pivôs adversários, ou deixando espaços para os arremessos exteriores advindos dos passes de dentro para fora do perímetro.
E cada vez mais especialistas nestes longos arremessos se fazem presentes em todas as equipes, beneficiando claramente aquelas que os possuem em maior número, ficando evidenciado, mesmo em equipes de países culturalmente mais evoluídos, que o fator primal de defesa de sua área mais intima, no caso do basquetebol, a zona restritiva e a cesta, é aquela que deve ser protegida e defendida a todo custo, pois emula o bastião final de seu domínio, unificando a defesa em torno do mesmo.
E por conta desse legado primal, origem das Battles under Basket, desenvolveram-se as técnicas mais sofisticadas dos arremessos de longa distância, reino absoluto dos grandes especialistas, artistas na difícil e precisa arte dos arremessos de três pontos.
Então, o que fazer para equilibrar tal desproporção entre ataque e defesa? Como agir para, que ao menos, possamos diminuir a incidência de tamanho poder de pontuação? Como tentar fazer valer a evidência histórica de que sucedendo a um domínio ofensivo sempre advirá um progresso e conseqüente domínio defensivo que o anulará, gerando um rodízio de influências, que são os reais valores de toda uma evolução técnico tática?
Acredito firmemente que duas imposições se façam necessárias, a fim de que possamos enfrentar com algumas vantagens este ciclo de domínio ofensivo, tentando revertê-lo, originando mais adiante um novo, e quem sabe, mais letal ciclo, numa busca ininterrupta de novas vertentes técnico táticas.
A primeira, seria voltada ao preparo mais acurado possível de uma sistema defensivo, onde as dobras pudessem ser substituídas por coberturas mais eficientes e dinâmicas, onde a marcação dos pivôs permanentemente à frente os obrigariam a fugir do interior da zona restritiva, posicionando-os sagitalmente à cesta, num posicionamento mais vantajoso para ser obstado e marcado. Esse posicionamento defensivo liberaria a equipe das dobras, fazendo com que os jogadores abertos, aqueles especialistas nos longos arremessos pudessem ser marcados bem mais próximos, alterando em muito suas eficiências anotadoras.
A segunda, é que tão preciso e sofisticado sistema defensivo, fosse baseado na linha da bola com flutuação lateralizada, cujos detalhes técnicos e posicionais podem ser perfeitamente compreendidos nesta matéria.
No entanto, tal mudança de caráter defensivo tem de vir acompanhada de uma preparação localizada na base do processo de ensino do grande jogo, pois defesa, saber defender, treinar e aperfeiçoar defesa, é um dos fundamentos mais importantes do jogo, senão, o mais importante.
Defesas sólidas e precisas só são bem sucedidas se os jogadores as souberem praticar com pleno conhecimento de suas especificidades, e de suas fundamentações técnicas. Nenhuma defesa é mais difícil de ser praticada do que a defesa por zona, que somente se torna eficiente se cada jogador envolvido com a mesma seja um excelente defensor individual. A somatória de cinco bons defensores individuais é que a caracteriza em eficiência e confiabilidade.
E com defesas bem postadas, e presentes dentro e fora do perímetro, é que poderemos obstar com algum sucesso o caudal de arremessos de três que nos afogam presentemente, situação esta que temos urgência em enfrentar, começando nas divisões de base, onde as defesas zonais deveriam ser proibidas até os 15 anos, e o tempo de posse de bola deveria ser estendido até os 35 seg, a fim de que o desenvolvimento físico e mental natural dos jovens seja respeitado em seus ritmos peculiares, orientando sua formação direcionada aos fundamentos, onde saber defender é um deles, repito, talvez, o mais importante.
Enquanto essa reversão não acontece, apreciemos a quanto chegou o desenvolvimento das técnicas de arremesso em todo o mundo, e a incapacitação em detê-los no presente, originados que são do sistema único de jogo, cuja curva ascendente, mencionada no inicio do artigo, tenderá, historicamente, a descender, na medida que defesas evoluam nesse sentido.
Que tal iniciarmos este novo ciclo? Temos competência para, ao menos, tentar?
Tive coragem de iniciá-lo no Saldanha, mas não me deixaram continuar… Vida que segue.
Amém.
Profesor Paulo Murilo,
Em relacao a marcacao dos pivos, dobras e cobertura dos arremessos de tres pontos, gostaria de somar o seguinte:
1. O marcador do pivo, com o corpo, deve sempre tentar bloquear e impedir que o pivot adversario consiga se posicionar com equilibrio especialmente na posicao de pivo de baixo. Enquanto isto o marcador do passador, ou seja do homem que esta com a bola visando passar a bola para o pivot tem que ser apertado agressivamente. E se o pivo conseguir chegar a posicao desejada, ou seja a de pivo de baixo este entao deve ser marcado pela frente. Os objetivos sao – quebra do ritmo de ataque e do passe para o pivo e pressao na bola para dificultar o passe para o pivo.
2. Em relacao a dobra – geralmente na posicao de pivo de baixo – eu treino duas opcoes – uma dobrando com um armador ou seja dobrando com o marcador/ala que defende o ala adversario que tenha o menor indice de aproveitamento de 3 pontos. Se todos forem bons arremessadores da linha de tres – eu prefiro executar a dobra com o pivo oposto e rodando com o meu ala para a cobertura do outro pivot – ou seja – 2-em-1 alto e agressivo – nao deixando o pivot girar para o lado oposto ou para a cesta – os marcadores dos arremessadores do lado da bola – nao devem flutuar e sim marcar os arremessadores bem apertado negando e dificultando o recebimento do passe. Desta forma – nos conseguimos marcar o pivot sem deixar ele girar para a cesta – a altura dos homens na dobra dificulta o passe – kick out – para o lado oposto da quadra e os marcadores do lado da bola sao proibidos de flutuar para nao deixar a linha do passe livre para o arremessador do lado da bola. Acredito que esta situacao poderia ser utilizada pelo Brasil pois em varios jogos do Cleveland eu vi o Varejao fazendo isso com o armador da equipe dele. Porem em nenhum momento do jogo isto foi tentado.
3. Em relacao a marcacao do pick and roll – eu tenho como regra nunca trocar – isto tem que ser treinado e antecipado – pois o marcador do homen da bola – tem que passar por cima do corta luz e nao por baixo – para isso tambem e necessario nos analisarmos as caracteristicas do homem que tem a bola – ou seja – se ele utiliza o bloqueio para penetrar a cesta, se ele estanca e sobe para o arremesso (e quantos dribles ele necessita para conseguir o equilibrio necessario para o arremesso. Nesta situacao analisamos tambem se o homem, ous eja o pivot, apos o pick ou seja o bloqueio, e este gira e corre em direcao a cesta ou se ele gira para recebimento do passe fora do garrafao ao estilo Karl Malone. O importante na marcacao do pick an roll e saber para onde o atacante quer ir e o que o ataque objetiva… se e o passe no pick and roll ou se e forcar a troca para que o pivot possa depois de um ou dois passes receber a bola contra um baixinho explorando assim o mismatch. esta e a razao pela qual eu geralmente nao troco em pick and roll.
4. Na Marcacao do pick and roll – gostamos tambem de mudar a nossa pegada defensiva – ou seja algumas vezes a gente dobra agressivamente o homem da bola – fazendo dois em um na bola ( com o marcador do homem da bola e o marcador do pivo) e os outros flutuam para dentro do garrafao de uma forma que o passe para o meio do garrafao fique protegido – a dobra agressiva ira tambem dificultar o passa para um arremessador o que facilitara a cobertura do arremesso.
5. O Scola terminou o jogo com uma falta e a Argentina marcando individual quase que o jogo inteiro – e incrivel que em nenhum momento do jogo nos tentamos isolar ele contra os nossos pivos mais rapidos e moveis em situacoes de 1-contra-1 com os nossos jogadores pegando a bola de frente para a cesta e nao de costas.
Por estas e por outras razoes acho que faltou um plano de jogo especifico para a Argentina nao so para o ataque mas tambem para a defesa e isto neste nivel e imperdoavel. E nao temos a desculpa de que nao conheciamos o adversario!
No mais – professor – e tudo balela!!! Quem sabe na proxima competicao…..faltou sorte – nao sabemos fechar o jogo – as desculpas de sempre…
Walter, espero que a turma jovem que se inicia na formação e direção de equipes saiba aproveitar esse ótimo debate, e suas aulas em particular. A Escola Carioca de Basquete promete, com certeza.
Sabe Walter, até acredito que houvesse um plano de jogo para enfrentar os argentinos, seria um contrasenso total se não existisse. Mas, se considerarmos que todo planejamento técnico tático, dependa diretamente da qualidade individual, e dominio dos fundamentos dos jogadores envolvidos no mesmo, podemos concluir que a falibilidade do plano já estaria decretada a priori, pelas graves falhas nos fundamentos de nossos jogadores, ai sim, imperdoável neste nivel de competição.
É exatamente neste aspecto, os funadamentos, que temos de focar na formação de base, sem desculpas e protelações.
Vamos em frente Walter. Um abração, Paulo.
Excelente tópico (e debate), Professor! Não tinha visto a matéria sobre a marcação com flutuação lateralizada. Trata-se de um material didático bastante esclarecedor! Lembro de ter feito um jogo em que fui instruído a marcar o pivô adversário pela frente, mas em uma defesa mista “box-and-one”. Fiquei surpreso com o sucesso obtido.
Quanto ao “Éden dos 3”, a sua inquietação produtiva demonstrada com uma busca por uma defesa que suplante esses especialistas me lembrou de um episódio em 1984. Foi a minha primeira temporada em categorias de base e a última sem a linha de três pontos, que em 1985 seria incorporada ao Jogo. Lembro naquele final de ano de uma conversa com Paulo Abicalil – um que faz falta nessa trincheira pelo nosso basquete – em que ele, mostrando excitação com o desafio iminente, dizia que ninguém seria louco de continuar marcando zona com a linha de 3. Àquela época, a distância parecia enorme para jogadores de 12, 13, 14 anos, mas no meio do campeonato de 85 já tinha muito moleque acertando arremessos.
A transição não foi tão abrupta como ele previra e o Jogo encontrou suas saídas, mesmo utilizando a zona. Outro dia mesmo vi a Turquia executar uma marcação 1-3-1 bem eficiente contra a França, cobrindo uma área bem maior do que a tradicional marcação no garrafão e evitando o trabalho no perímetro dos arremessadores. De qualquer forma, vinte e cinco anos depois, sua crônica confirma a preocupação demonstrada com os possíveis efeitos devastadores desses tiros.
Abraços!
Mas acredite se quiser prezado Luiz Felipe, depois de vinte e cinco anos, talvez estejamos no limiar de um novo conceito defensivo, aquele que reduzirá bastante a louca incidência dos arremessos de três, ainda mais pelo aumento da dificuldade de sua execução com o acréscimo de 50cm na linha do perimetro, já autorizada pela FIBA para vigorar depois deste mundial.E um novo ciclo evolutivo do grande jogo se fará presente, com a dominância defensiva, até que um outro ciclo ofensivo venha a surgir, ciclos estes que conotam a permanente evolução deste grande jogo. Um abraço, Paulo Murilo.