A EQUIVOCADA ESTÉTICA…

“Patético, horripilante, inacreditável, uma vergonha, que venham os culpados, etc, etc “ , são comentários na internet sobre o jogo de hoje contra a Espanha, externados pelas mesmíssimas pessoas que até bem pouco teciam loas ao regresso triunfal de jogadoras consagradas, campeãs mundiais repaginadas, e até jogadora que condicionou sua volta à dispensa de um técnico, que por sua vez a aceitava de volta desde que pedisse  desculpas públicas por ter se negado a retornar à quadra em uma competição olímpica. Não só teve recusada as desculpas, como perdeu seu cargo para um estrangeiro não comprometido com detalhes ínfimos, como as desculpas em questão, afinal, é problema nosso, não dele.

Isso posto, deu-se inicio a um trabalho absolutamente equivocado, já que de saída pecava pela ausência do respeito à disciplina, às tradições, ao exemplo às novas gerações, à renovação estratégica visando as competições olímpicas de 2012 e 2016, priorizando uma competição a qual se apresentava com uma equipe cuja media de idade ultrapassava os 28 anos, assim como entregava a um técnico absolutamente desinformado sobre a nossa realidade técnica e de formação básica os destinos de uma seleção balizadora de futuros projetos que rumariam para aquelas competições maiores.

E este balizamento deveria ser estruturado numa sólida preparação técnico tática, com realce nas condições de técnica individual, futuro lastro para situações táticas relevantes e inovadoras.

Mas a dura realidade, agora exposta, foi a antítese do que deveria ter sido implementado, tanto no aspecto técnico, como no fator humano, onde a ausência lamentável de um verdadeiro projeto de intenções, culminou com o desastre que ora testemunhamos.

Simplificando o debate que se estabelecerá daqui por diante, um detalhe salta aos olhos mal ou bem treinados nas minúcias do grande jogo, o fato inconteste de ser absolutamente inaceitável uma seleção de elite brasileira cometer 17 erros de fundamentos em dois quartos iniciais de uma partida de mundial, principalmente nos passes e nos dribles, um absurdo indesculpável.

A seleção espanhola, que jogava rigorosamente igual a nossa no sentido tático, simplesmente decodificou nossas ações ( acessem o artigo Engenharia Reversa aqui publicado em 15/01/07) ofensivas, antecipando seu sistema defensivo às nossas jogadas, destruindo-o, além de se utilizarem seguidamente seu jogo interior com pivôs rápidas e ágeis, contra defensoras lentas e obesas, que vem sendo nossa marca registrada nos últimos anos. Jogadoras muito jovens e talentosas como Damiris e Franciele têm de ser afastadas desse processo de engorda absurdo e despropositado, advindos de uma estética deturpada e equivocada que teimamos em desenvolver em nossa formação de base.

Enfim, dentro de uma realidade irrefutável e indiscutível que ora nos deparamos, urge de forma radical e definitiva o reprocessamento de nossos objetivos e competentes planejamentos, e não só no feminino, no masculino também, para que não nos arrependamos um pouco mais adiante pela omissão e pelas desculpas, não tanto esfarrapadas, mas acima de tudo, trágicas.

Chegou a hora, inadiável, de repensarmos o grande jogo.

Amém.

CORPANZIS…

“…Elas são muito atléticas, deram muito trabalho nos rebotes, e nós precisamos nos focar mais nos jogos…”

São declarações da Alessandra após o jogo de ontem contra Mali.

A grande ironia é que tais afirmativas advêm de uma jogadora que fez da forma atlética seu apanágio de vitórias, principalmente em seu inicio consagrador no mundial da Austrália onde se sagrou campeã, quando com sua mobilidade e esguia figura, em conjunto com sua companheira Cintia, dominaram os rebotes e exerceram a marcação frontal contra as corpulentas gigantes dos Estados Unidos e China, que foram os fatores cruciais que permitiram as magníficas exibições da seleção lideradas pelas grandes jogadoras Paula, Hortência e Janeth.

Por conta desse domínio defensivo e reboteiro, as nações derrotadas viram chegar ao fim as grandes pivôs de massa, substituindo-as pelo exemplo brasileiro, onde a flexibilidade, elasticidade e velocidade demonstraram ser o caminho a seguir.

E mais ironicamente ainda, foi a atitude brasileira pós mundial ao adotar o modelo que acabaram de sepultar, encaminhando suas ágeis pivôs, e as que as sucederam a um processo de musculação desenfreado, que afastou de vez o modelo vencedor. Lisa Leslie e as grandes e esguias européias foram a contrapartida de nossa negação técnico formativa, que vem se destacando na elaboração de pivôs, e até alas, com acentuado grau de obesidade e conseqüente limitação de velocidade e potencia saltadora, como se fosse o correto a ocupação linear de espaços, e não o domínio aéreo do mesmo. E ai estão os resultados originados pela equivocada escolha, pela mais equivocada ainda formação de base.

As ágeis e elásticas jogadoras de Mali que quase nos venceram, vieram provar nossa maior deficiência atlética, o excesso de peso, que deveria ter sido arraigado de nós desde a grande conquista, quando exemplificamos ao mundo o valor da agilidade, da elasticidade e da velocidade inteligente.

Deslocamento permanente no ataque, principalmente dentro do perímetro, defesa em velocidade antecipativa, e reações explosivas visando os contra ataques, é a cartilha básica do moderno basquetebol, e não o arrastar sonolento de corpanzis travados pela obesidade nada…atlética.

Esse aspecto é uma de nossas deficiências na formação de base, que agregado ao insipiente ensino nos fundamentos, retrata a nossa realidade, onde a ingerência de pseudos preparadores físicos influem decisivamente na formação de novos valores, contando com a omissa conivência de treinadores nada compromissados com o futuro, e sim agarrados aos resultados imediatos, que são aqueles que auferem a seus currículos enganosas conquistas, já que fruto de uma falsa condição de supremacia técnica, quando deveriam se orientar em direção ao verdadeiro objetivo, aquele focado no futuro do grande jogo, responsável pelas grandes conquistas, como aquela, esquecida e mediocrizada pela obtusidade, a conquista de um mundial na longínqua Austrália.

Amém.

PS- Fico imaginando o que teria ocorrido não fossem os 6/7 arremessos de 3 da Helen…

DIBUJOS…

Como ai em cima está exposto, a ENTB/CBB debutou em um Mundial, e em grande estilo( clique na imagem), apresentando a construção e elaboração, e a obra em si, clara, didática e de imediata compreensão. Seria até engraçado, senão fosse trágico, exatamente isto, uma incompreensível tragicomédia.

Absolutamente incrível como um pedaçinho de plástico se situa entre um técnico e suas jogadoras, como um biombo divisório, onde o olhar critico e orientador se desvia para uma inverossímil e impessoal prancheta,  quando o deveria orientar diretamente aos olhos ansiosos e indagativos de suas comandadas, que naqueles momentos cruciais de uma difícil partida, mais precisariam de orientações sobre técnicas individuais e posturais, do que hieróglifos rabiscados em sua superficie.

Mas o sistema(?) tem de ser desenvolvido coreograficamente, na marra, através os tortuosos e caóticos garranchos, nervosa e inseguramente rabiscados na onipresente…prancheta.

E o jogo foi perdido, por 1 ponto, mas o foi, muito mais por erros de técnicas individuais, do que táticos.

-Fulana, atenção aos passes paralelos à linha final que você está empregando em demasia, ainda mais sendo uma armadora. Evite-os sempre, pois é uma regra primaria do jogo. Treinamos muito, lembra-se? Interceptações defensivas sempre ocorrem nesse tipo de passe, que se picado, com a conseqüente diminuição de sua velocidade, mais perigoso ainda, cuidado moça, perdem-se jogos dessa forma.

-Beltrana, ao receber um passe interior, tente se situar em movimento constante, já que sua compleição física é avantajada e pesada. Deslocando-se você percebe com mais clareza possíveis dobras, duplas e até as perigosíssimas triplas, pois em movimento, além de suas três opções se manterem intactas, no drible, no arremesso e no passe, tanto interior, como exterior, sempre estará um tempo à frente de sua(s) marcadora(s), não esquecendo nunca que uma atacante age pela iniciativa, e uma defensora reage motivada pela mesma.

– Priorizem os arremessos de 2 pontos, já que mais precisos e eficientes, otimizando cada ataque que executarem. Deixem os de 3 pontos para aquelas situações de pleno equilíbrio e liberdade para executá-los. Primem pela eficiência, em vez das aventuras. Vocês são jogadoras de elite, e como tal têm de ser comportar.

– Contestem, como exaustivamente treinamos, os longos arremessos das coreanas, que os utilizam em velocidade como compensação de sua inferioridade biotipológica, evitando dobras desnecessárias para evitar arremessos de 2 pontos. Se tiverem de optar permitam que elas os tentem , e não os mortais de 3.

– Levemos o jogo, como treinamos bastante, para dentro do perímetro, com paciência e frieza, pois além de ser bastante efetivo, trava a correria delas, a segunda arma que possuem.

– Contra os corta luzes freqüentes delas efetuem as trocas com um passo atrás, já que pouca, ou quase nenhuma diferença se fará sentir  pela superioridade de estatura a nosso favor, anulando as investidas.

Mas como incluir tais ponderações, pequenas ajudas olho no olho, ao pé do ouvido, inspirando confiança e fé, se a existência de um biombo se faz onipresente de forma avassaladora?  Porque, raios, um sistema fajuto, mal treinado e assimilado, inclusive pelas duas jogadoras da WNBA que chegaram na véspera da competição, se faz absoluto e pétreo?

Respondam-me com fatos e certezas se orientações sobre comportamentos técnicos individuais, teriam sido mais eficientes do que cobranças sobre um sistema de má qualidade, num jogo que perdemos por 1 ponto?

Mas, e ai situaremos uma dolorosa constatação, de longa, longuíssima data, a de que somos carentes de bons e estabelecidos fundamentos do jogo, pouco ou nunca corrigidos, e que claro, não o seriam no treinamento de uma seleção, ainda mais quando um sistema moderno vem na contrapartida de um técnico estrangeiro, egresso de uma escola de grande tradição européia, cuja propriedade tem de ser estabelecida, e permanentemente lembrada através  dibujos pranchetados, O resultado? Vimos qual foi…

Amém.

PARA BOM ENTENDEDOR…

UMA PALAVRA (ORDEM?) BASTA…

UM EMAIL DO FELIPE…

Recebi ontem (17/9/10) este email enviado pelo Felipe Modesto, sugerindo um debate sobre alguns aspectos dos fundamentos postos em pratica pelas jogadoras brasileiras, confrontado-os com os praticados por jogadoras de outros países, analisando diferenças e técnicas consoantes aos mesmos. Aí está uma excelente oportunidade de discutirmos um dos  fatores mais negligenciados em nosso basquete, o ensino, pratica e aplicação dos fundamentos básicos do jogo. Ao final teço algumas opiniões à respeito do tema, e abro o espaço para o discutirmos.

Professor.
Por favor, perdoe uma eventual presunção de minha parte em tentar entrar em
um debate que possa estar ligado ao meio academico, mas penso que o assunto
pode ser aberto em blogs e sites especializados
Estou enviando a mesma analise que foi enviada ao Balassiano para que possa
ser iniciado esse debate.
Estamos às vésperas do Mundial Feminino. EUA e Austrália dominam a
modalidade.Além de diferenças técnicas entre australianas e  americanas em
relação ao resto do mundo, tenho notado uma diferença na mecânica dessas
jogadoras.
 Penso em abordar especificamente os casos das jogadoras brasileiras  e seus
déficits mecânicos.São peculiaridades em movimentos de execução de
fundamentos do jogo que começam na formação das atletas e culminam em certos
"vícios de movimento" nas atletas brasileiras.
A análise é rererente a três fundamentos do jogo.
*1 - Arremesso*
Exclua Hortencia, Janeth, Iziane e talvez Micaela.Repare como as jogadoras
arremessam.O movimento de arremesso começa como uma espécie de passe de
peito.As meninas seguram com as duas mão na "orelha" da bola que está
próxima ao tórax.Aí sim começam os movimentos de pernas bem sutil que termina
com a extensão dos braços e um chute que sai no máximo na altura dos olhos,
sem jump.
Conclusão: arremesso lento, baixo e fácil de marcar.A jogadora só arremessa
de estiver livre, bem livre.
Ex:Bethania, Fernanda Beiling, Helen, Adrianinha, Chuca, Taiara e uma
infinidade de jogadoras.
Aí é só notar o arremesso das "gringas". Taurasi, Catchings, Penny Taylor
e
TODAS as outras "gringas" arremessam como "homens".Jump alto,
acima da
cabeça e muito rápido.Difícil de ser marcado.
*2 - Drible*
Aqui só dá para excluir a Paula.A meninas batem bola de um jeito muito
lento.Quando a bola toca no chão e volta para a mão delas repare no tempo
que ela fica suspensa no ar, apoiada na palma da mão virada pra cima,
naquela "quase condução".Se alguém contar quantas batidas de bola a Helen
para atravessar a quadra e comparar com a Sue Bird, arrisco que a Bird bateu
umas 10 a 15 vezes mais.
Bater mais vezes a bola possibilita uma maior velocidade com o controle dela
e mais facilidade na hora de executar dribles rápidos.Você já viu uma
brasileira dando um crossover?
Todas as brasileiras dão essa cadencia no movimento e isso torna o 1 contra
1 muito falho.Até Iziane e Janeth batiam bola assim.Aí você olha para a
Taurasi e vê porque mesmo com uma mão esquerda não muito boa ela tem
facilidade em fazer bandeja.A condução de bola e o drible são rápidos graças
a essa mecânica.
*3 - Parada Brusca*
Só me lembro da Lígia (ex-Ourinhos) fazendo esse tipo de jogada no
Brasil.Sabe aquela batida forte com uma espécie de salto e a parada para
subir para a cesta, típica de pivô?Todas as norte americansa fazem
isso.Todas as universitárias americanas fazem.
Se uma pivô brasileira for fazer dá impressão que elas vão tropeçar.
Ninguém pegava essa jogada da Lígia e é uma outra baita diferença mecânica
entre as nossas e as "gringas" australianas e americanas.
Podem argumentar que o potencial de força e torque de algumas jogadoras é
maior, mas a Hortencia que jumpeava e a Paula que batia bola com o tronco
ereto e sem a "quase conduzida" não eram exemplos de porte atlético. Por
isso que eu acho que é uma questão de mecânica, de base.
Bom, é isso professor. Escrevi no trabalho, bem corrido e na informalidade
porque é uma sugestão mesmo.
Obrigado pela atenção.
Abraço.

Com vemos, é um assunto ícone deste espaço, os fundamentos do grande jogo. O que teria a dizer a mais do que venho publicando nestes seis anos de blog?

Vejamos:

Arremessos- A grande maioria das meninas desenvolvem ambivalência  de forças nos braços, ao contrário dos meninos que desenvolvem quase sempre uma dominância em um deles. Como desde cedo a inexistência de materiais e espaços adaptados aos mais jovens é norma geral em nosso país, elevar uma bola oficial à cesta, se torna mais efetiva com uma aplicação de força dupla do que única. A ambivalência mencionada, direciona a bola com mais precisão pelo  menor esforço em fazê-lo. Pouco a pouco o habito de assim arremessar vai se solidificando, tornando sua correção posterior bastante improvável. Some-se a esta constatação o fato da presença quase institucional das defesas zonais nas divisões de base, e temos reportado o quadro que ora discutimos. Pequenas, porém efetivas, adaptações em materiais e regras no preparo das divisões de base, sem que títulos e medalhas sejam os objetivos a serem alcançados nessa fase, corrigiriam tais falhas de formação, e produziriam melhores e mais eficientes jogadoras.

Drible- É um grave engano considerar-se a parada de bola na mão como condução, quando na realidade a infração cometida é a de andar com a bola no ato de driblá-la, pois a regra coíbe a interrupção das trajetórias descendentes e ascendentes no ato do drible, interrompendo o binômio ritmo-passada deste fundamento. É uma artimanha muito ensinada e praticada a fim de que fintas, mudanças de direção e reversões sejam efetuadas ao largo do domínio do corpo em torno de seu centro de gravidade concomitantes às ações acima descritas. Com a permissividade das arbitragens e de técnicos não muito compromissados com os fundamentos, já que orientados aos sistemas de jogo, a deficiência se avoluma com os anos de prática, num erro cumulativo e comprometedor.

Parada brusca- ou o DPJ (Drible, parada e jump), que mesmo nos Estados Unidos nos campeonatos universitários, somente foi resgatado de dois anos para cá, e jamais no nosso caso. Treinei muito este fundamento no Saldanha da Gama, com enormes vantagens. Jogo preferencial no perímetro externo e contra ataques a qualquer custo mataram a pratica do DPJ, mas aos poucos ele está sendo resgatado pela reintrodução de sistemas de jogo que não o único até agora empregado.

Como vemos, um prato cheio para discussões e posicionamentos. O espaço está aberto. Obrigado Felipe pelo email.

Amém.

UM ARTIGO IRRETOCÁVEL…

Acabo de ler um artigo exemplar do Henrique Lima publicado no DraftBrasil em 13/9/10, com o sugestivo título –30 anos sem culhão? – numa clara referência às recentes declarações do agora entronizado no Hall da Fama da FIBA Oscar Schimidt, sobre a participação brasileira nesse e em anteriores mundiais e olimpíadas.

O Henrique disseca toda a trajetória das seleções brasileiras masculinas nos mundiais e olimpíadas a partir da conquista do campeonato mundial de 1963 no Rio de Janeiro, com argumentações e fatos irretocáveis, que põe em cheque as extemporâneas afirmações do grande jogador.

Não comentarei o artigo, que como afirmei, é irretocável, e aconselho fortemente a todos aqueles que conhecem, e aqueles que pensam conhecer as verdades do nosso basquete, a lê-lo com atenção e acima de tudo, isenção.

Mas para não perder o jeito, a mania de sempre acrescentar um toque a mais de informação, e com as devidas desculpas ao Henrique pela intromissão, sugeriria um sub titulo agregado ao seu magnífico artigo, também escrito após declarações do mesmo Oscar – Detalhes

Acredito que ambos reflitam e forcem reflexões sobre as “verdades” do grande jogo entre nós.

Parabéns Henrique, jornalismo de primeira.

Amém.

Adendo – Ao clicar no artigo- 30 anos sem culhão- espere pacientemente pela veiculação do mesmo, pelo fato do blog original ter saído do ar. PM.

MUNDIAL- O DÉCIMO QUARTO DIA: A PROVA DEFINITIVA…

Numa entrevista reportada pelo jornalista Murilo Garavello, no site UOL Esporte de 12/9/2010, em Instambul, o técnico campeão mundial Mike Krzyzewski, o coach K, afirmou:

“Me tornei um técnico muito melhor depois que comecei a aprender com grandes técnicos que há no basquete internacional. Com os grandes jogadores, com as grandes equipes. O mundo é grande demais, há muitas pessoas boas”.

E para este campeonato mundial, que acabou de vencer, o que realmente o coach K aprendeu, a fim de levar sua jovem equipe ao lugar mais alto do pódio?

Antes de aprender algo, descobriu admirado que existia vida basquetebolistica além das fronteiras de seu país, e que a diferença das regras alteravam em muito as concepções do jogo, o que explicava a perda da hegemonia americana no cenário mundial, sem nunca ter perdido sua grandeza no cenário interno de sua grande nação.

Também descobriu que a modalidade de jogo praticada na NBA em nada se parecia com a praticada na FIBA, ou seja, pelo restante do mundo, e que tal diferenciação colocava em perda acentuada o prestigio e a liderança americana no jogo que inventaram e difundiram mundo afora.

Foi sensível ao fato de que jogadores estelares da NBA, face a extenuante rotina de seus campeonatos e contratos milionários, que a maioria deles se sentiam na obrigatoriedade de priorizar, estava limitando em muito a constituição de equipes de qualidade para os enfrentamentos internacionais, em mundiais, pré olímpicos e olimpíadas, com um mínimo de treinamento e preparação para aquelas competições, e que urgia um planejamento razoável a fim de que o país pudesse ser representado com uma boa margem de sucesso nas mesmas.

O comprometimento dos jogadores à causa da representatividade condigna aos princípios qualitativos da tradição do basquete americano, passou a ser a senha de todo o trabalho, que se iniciou na olimpíada de Pequim, e se viu confirmado no mundial ontem encerrado, e que terá continuidade para a olimpíada de Londres.

No entanto, algo ocorreu ao coach K que consubstanciou todo o seu trabalho, principalmente para este mundial, a ausência dos grandes astros, principalmente os grandes pivôs. E neste estágio de seu conhecimento sobre o basquete internacional, que confessa ter descoberto através os grandes técnicos e equipes de outros países, principalmente os europeus, é que formulou uma estratégia técnico tática antítese do que desde sempre floresceu em seu próprio país, e sendo implantado no resto do mundo, o sistema único de jogo, com suas normas técnicas e sua setorização e especialização de jogadores de 1 a 5.

Este sistema, nascido e divulgado pela NBA, através sua gigantesca influência universal, dada às carências da equipe em seu comando nas posições onde as grandes equipes mundiais eram fortíssimas, principalmente no jogo armado, cadenciado e coletivo, fez com que mudasse radicalmente a forma de jogar e atuar taticamente de sua equipe.

E a mudança foi radical no sentido formal da constituição de uma equipe americana, principalmente universitária, que é o segmento a que pertence dirigindo a longos anos a Duke University. Simplesmente aboliu os sistemas, as jogadas e as posições de 1 a 5. Convocou jogadores que em suas equipes profissionais eram setorizados nas posições 1, 2 e alguns 3 e 4, e montou uma estrutura em campo formada por jogadores armando fora do perímetro, e outros transitando em velocidade por dentro do mesmo, na maioria das vezes iniciando as ações ofensivas com todos abertos, obrigando os pivôs adversários a tentar acompanhá-los em velocidade e longos deslocamentos afastados da cesta, provocando um verdadeiro caos nos sistemas defensivos, desmontando-os pela imparável força de seus fundamentos irretocáveis, e dos arremessos mais irretocáveis ainda de seu grande jogador, Kevin Durant.

Provou o coach K durante todo o campeonato que, uma equipe proprietária de sólidos fundamentos, ágil, rápida e firmemente atuante na defesa, supera outra mais bem armada e cadenciada, mas sem o domínio completo dos fundamentos do jogo.

A única arma com alguma possibilidade de equilibrar o jogo contra uma equipe com tais características, é a cadenciação proposital e sistemática, tentando não permitir que a velocidade americana se imponha, fazendo valer todo o seu arsenal de fundamentos regiamente praticados.  E somente uma equipe o conseguiu em parte, quase vencendo-a, a brasileira, que perdeu o jogo exatamente por não ter a mesma base de fundamentos da mesma, principalmente nos momentos finais da partida.

E ao final da competição, algumas questões se sobrepõem à realidade dos fatos desencadeados pelo grande técnico.

Primeiro, o que poderemos esperar de mudanças técnico táticas depois de assistirmos a pulverização de sistemas complexos, codificados e comandados de fora da quadra por técnicos coercitivos, pela simplificação e sintetização das formas de jogar, através a simplória proposta de jogar única e exclusivamente ao amparo dos fundamentos de defesa e ataque em seu estado puro?

Segundo, ao constatarmos de que a grande farsa setorial e especializada de jogadores, como compartimentos estanques dentro das equipes, originou um basquete voltado à mecanização, quase uma coreografia, que encontra e reflete nas pranchetas sua máxima expressão, frente à simplicidade sofisticada de uma equipe mestra e maestra na pratica e utilização letal dos fundamentos do grande jogo, praticamente revertendo às origens do mesmo?

Terceiro, como reformular conceitos arraigados a princípios técnico táticos que se sobrepõem ao ensino primal dos fundamentos do jogo na base de nossa formação, após exemplo tão significativo dado e apresentado por uma equipe campeã mundial?

Finalmente, como conciliar tão necessárias mudanças no ensino do grande jogo, que são partes integrantes de conceitos didáticos pedagógicos de alguns dos grandes mestres existentes no país, esquecidos e minimizados pela CBB e pela novel ENTB/CBB, trocados pelos que professam  padronizações e formatações, firmemente alinhados ao sistema único, agora desmontado e desmistificado pela pequena revolução desencadeada pelo coach K e sua equipe mestra nos fundamentos e de livre criação, campeã mundial?

São todas questões que teremos de equacionar com planejamento, dedicação e extremo bom senso, caso contrário corremos o sério risco de, por mais uma vez, perdermos o bonde da história, com uma diferença, a de que desta vez será definitivo, tendo como um triste começo a palidez cadavérica do  outrora sagrado uniforme verde e amarelo de nossas seleções.

Amém.

MUNDIAL- O DÉCIMO TERCEIRO DIA: ENCENAÇÃO E MALANDRAGEM…

Minuto final, ou quase, os turcos vencem por um ponto, e numa bola disputada no rebote ofensivo, o pivosão (são 2,14 m  de massa bruta) turco leva uma bofetada de raspão ( o VT mostra claramente), e cai com as mãos no rosto e lá fica ajoelhado estertorando como se um tiro o tivesse atingido. Minutos antes dessa “tragédia” ele mesmo, o pivosão,  havia perdido dois lances livres pessimamente cobrados a La Shaquille, e… por não passar a responsabilidade dos novos lances livres a um substituto mais competente ( no caso um armador com a metade da sua altura), já que aleijado para continuar na quadra? O técnico sérvio, macaco velho de outros carnavais ri de soslaio, e nem reclama, sabedor, pela experiência e malandragem ( que não é prerrogativa só de latinos…) que naquela situação bem que proporia a um seu jogador fazer o mesmo, afinal era uma semi final de mundial, onde nem sempre a desportividade é preservada.

O substituto converte um dos lances, e ao final do jogo os turcos vencem por um ponto numa bandeja providencial. Valeu a encenação? Claro, um lance livre foi convertido e a diferença final foi de um ponto. Ponto final.

E porque contabilizo essa passagem do jogo? Porque sem a ocorrência dela a equipe mais técnica e mais completa teria vencido, a equipe sérvia, sem dúvida alguma a única que poderia enfrentar a equipe americana com boas chances, pelo seu alto grau técnico tático, sua excelente defesa, e seus jogadores muito bem treinados nos fundamentos do jogo.

A equipe turca, apesar de ser muito forte defensivamente, não tem uma estrutura ofensiva tão uniforme como a da Sérvia, fator básico para enfrentar a fortíssima defesa americana, que a utiliza como plataforma de disparo de seus formidáveis contra ataques. E mais um detalhe, o fato do sistema ofensivo sérvio ser incomensuravelmente mais efetivo que o turco.

Posso até me enganar, já que o apoio fanático da torcida turca possa influenciar no espírito de sua equipe, mas, bastando que os americanos mantenham sua estrutura defensiva uniforme e pressionada, para que essa vantagem exógena seja bastante reduzida, alavancando-os para o jogo franco, e aberto baseado na pura velocidade de ações e certeiros arremessos de três.

Deverá ser um jogo muito disputado, mas claramente favorável à equipe americana, mais bem preparada nos fundamentos, que os utilizam de forma absoluta e precisa, e sua velocidade natural, espontânea e letal.

Única chance turca? Frear ao máximo a velocidade ofensiva americana, e o mais difícil, ultrapassar sua potente defesa no jogo armado de meia quadra ( que muitos erroneamente chamam de 5 x 5, pois na maioria das vezes no sistema único somente dois jogadores, e às vezes três, participam de jogadas, e os restantes, assistem…).

Um detalhe significativo do jogo Estados Unidos x Lituânia, onde a anteposição defensiva aos arremessos de três lituanos, praticamente tiraram sua chances de vitória, confirmando o que previ nos artigos e comentários anteriores, de que o estancamento da hemorragia dos arremessos de três está prestes a se concretizar, através fortíssimas defesas e o aumento na distância da linha de três, que entrará em vigor após o mundial, fator este que já se fará sentir entre nós no NBB3.

Apesar do favoritismo americano, torçamos para que seja uma final condigna de um mundial, e sem estertores fajutos de qualquer espécie.

Amém.

O ENTER – SEIS ANOS DE BASQUETE BRASIL…

Seis anos atrás, 11 de setembro de 2004, às 4hs da madrugada, hesitei em dar um Enter, iniciando a saga do Basquete Brasil. Não por receio de não ser compreendido, ou mal compreendido, haja vista meus sempre contestados posicionamentos e pontos de vista, mas pelo forçado afastamento das quadras, pelo distanciamento movido pelas decepções e pelas injustiças cometidas com o basquete pátrio, pelo avesso sentimento ao que de pior vinha se apossando do comando do grande jogo nesse imenso e pobre país. Pensei muito, e considerei ser profundamente injusto guardar só para mim o pouco que sei e  amealhei pelas andanças da vida, sempre estudando, pesquisando, e trabalhando muito, dentro e fora das quadras, nas salas de aula, do primário à universidade, nos clubes, nas seleções, aqui e lá fora.

A primeira matéria ali estava, na brilhante tela já a algum tempo, como me enfrentando, mais um dos incontáveis desafios que enfrentei por toda a vida, ganhando e perdendo, mas sempre aprendendo, sempre transferindo o saber, sempre buscando novos rumos, novos desafios.

Fui a cozinha e peguei uma xícara de café, voltei ao escritório, e lá estava a página incólume, brilhando, e uma imagem me desafiando com um sorriso no canto da boca, olhando bem dentro de meus próprios olhos.

Não vacilei, e com firmeza e determinação dei o ENTER, e graças aos deuses nunca me arrependi de tê-lo feito.

Amém.

MUNDIAL- O DÉCIMO SEGUNDO DIA: MARCANDO O SCOLA…

Quando da publicação do artigo do dia 3 deste mês, respondi um comentário do Giancarlo Gianpietro sobre como imaginaria uma defesa sobre a equipe argentina, especialmente sobre o Scola, que vinha fazendo um campeonato extraordinário, antes do encontro com o Brasil, onde o Scola contabilizou 37 pontos decisivos para a vitoria argentina, e que foi exatamente a estratégia utilizada pela equipe da Lituânia na vitoria maiúscula de hoje.

Recordemos a resposta ao Giancarlo:

  • Basquete Brasil 03.09.2010 (6 days ago) ·

Pronto Giancarlo, mais uma bananosa que você coloca em minhas mãos! Não sou o técnico da seleção( jamais o serei…), mas, o que faria se o fosse? Dê uma boa olhada em três jogos que postei no blog, principalmente os contra Brasilia e Joinville, e fique observando a ação defensiva( em alguns momentos de passe para o pivô, pois não tive tempo suficiente para estabelecer a ação de forma permanente…)à frente do pivô adversário.Nessa situação, a primeira reação do oponente é o desestimulo do passe, já que a camisa visada não é a de sua equipe, a segunda é a do passe retroativo, ótimo para quem defende, pois são mais segundos que perdem em seu ataque, a terceira é o passe por cobertura, que se bem coberto oferece ótimas opções defensivas, e finalmente, se o atacante de posse da bola não tiver ainda driblado, a penetração, que encontrará de saída a anteposição do defensor de seu próprio pivô. Como vemos, a simples postura de uma marcação frontal, desencadeia quatro possibilidades ofensivas, num caudal de decisões em frações de segundos, induzindo enormes possibilidades ao erro, pela multiplicidade de opções.
Seria o que treinaria, enfatizaria, exigiria execução, permanente e incisivamente, exatamente porque incluiria no adversário a necessidade de pensar mais, analisar mais, originando um novo fator, a escolha correta de uma ação em uma única tentativa,em uma fração de segundos, aspecto que exporia ao atacante, consciente ou inconscientemente o fatal medo de errar.
Marcar à frente, com um Spliter forte e rápido, como a Alessandra e a Tuiú no mundial da Australia, marcando as grandes pivôs da China e dos Estados Unidos, tirando-as de suas rotinas de arrietes mortais quando de posse da bola. Era o que faria, mas não sou o Magnano, logo…
Audacioso? Não prezado Giancarlo, simplesmente convicto de que desde sempre devemos fugir das rotinas e das mesmices se quisermos realmente evoluir, e consequentemente, vencer. Um abraço,
Paulo.

Somemos à resposta o fato de que a utilização desta ação defensiva afastaria em muito as tão perigosas dobras, permitindo que os jogadores especialistas nos arremessos de três (Delfino, Herman, Gutierrez, Quinteros) fossem vigiados de muito perto, e temos decodificada a arma defensiva que os lituanos empregaram decisivamente contra os argentinos, e de tal forma, que praticamente eliminaram os seus certeiros arremessos de três, assim como anularam o grande pivô Scola. Resultado? Chegaram a colocar 34 pontos de vantagem.

Um outro pormenor também deve ser ressaltado, a incrível eficiência de seus próprios arremessos de três, principalmente nos dois quartos iniciais, onde praticamente decidiram a partida. E porque e como os conseguiram com tanta liberdade? Isso mesmo, acertou, pela enorme condição psicológica adquirida e fundamentada numa defesa monolítica e feroz, sem tréguas e fraturas, embasando seu ataque sobre uma equipe acuada e em célere perda de sua lendária auto confiança ofensiva. O principio básico de toda estratégia vencedora do grande jogo foi hoje referendado, a de que toda vitória se estrutura sob a égide de uma grande defesa, e o exemplo deste jogo não deixa qualquer margem de dúvidas a esse conceito.

Mas algo ainda deve ser referendado, o fato inconteste do alto preparo nos fundamentos do jogo dos jogadores lituanos, os de defesa em especial, onde os posicionamentos de pernas, braços e tronco seguem normas e princípios excelentemente bem treinados, capacitando-os aos deslocamentos laterais em equilíbrio, e às anteposições aos arremessos, nas coberturas e recuperações de espaços, culminando no perfeito e coletivo posicionamento para os rebotes.

E neste ponto vem a pergunta- Possuem nossos jogadores este mesmo embasamento, este mesmo domínio dos fundamentos?
Enfim, uma grande aula de defesa, e por que não, de ataque também.

Com essa exibição de técnica e estratégia, os lituanos se candidatam a sérios pretendentes a uma medalha, que faria justiça a uma excelente e surpreendente equipe.

No outro jogo das quartas de final, a equipe americana, com seu “espalhamento” na quadra venceu os russos com alguma facilidade, mas não antes de encontrar a costumeira dificuldade ante uma defesa zonal, onde aos poucos foi encontrando uma solução peculiar, ao atacá-la através o emprego de duplas envolvendo a linha final defensiva, ação essa facilitada pelo enorme domínio que têm dos fundamentos de drible, fintas e passes curtos em altíssima velocidade. Nunca o give and go ( o nosso dá e segue…) foi tão empregado, e de que forma, contra uma defesa por zona! E deu certo.

As semifinais de sábado prometem bastante, principalmente agora que os lituanos mostraram como se marcam os longos arremessos que vem imperando neste mundial, e a grande ironia, contra uma equipe americana que também marca com rigidez e por todo o campo. Prevejo uma das famosas battles under basket, tão ao gosto da NBA, só que agora sob as regras da FIBA, fator que colocam os americanos em cheque, e por que não, a perigo.

Turquia e Sérvia será outro grande jogo, e com uma característica em comum, suas grandes defesas, principalmente a turca.

Será que começaremos a testemunhar as efetivas contestações aos arremessos de três neste mundial, pelas características defensivas de alto nível de todos estes semifinalistas? Acredito que sim, mas…

Amém.