UMA OPORTUNA LEMBRANÇA…

É muito raro aqui no Basquete Brasil a republicação de um artigo, quando muito, inserções de links de artigos publicados são feitas para ilustrar melhor o assunto proposto, no entanto, um artigo publicado em setembro de 2013 insiste em ser reproduzido, por ser tratar, no meu humilde ponto de vista, da teimosa fronteira divisória do que professamos de forma quase que dogmática, através a mesmice endêmica de um sistema único de jogo, em confronto direto com as imensas possibilidades de utilização de sistemas diferenciados, que permitam que as mais importantes metas sejam alcançadas pelos jogadores, o livre pensar e a criatividade que emana do mesmo, propiciadas por técnicos mais voltados a evolução de seus jogadores dentro da quadra, do que sua quase sempre artificial importâncias fora dela, numa volta aos primórdios das ciências da educação, onde o grande mestre americano  John Dewey    rompeu com o centrismo do professor no processo educativo, focando-o nos alunos, numa reviravolta didático pedagógica que revolucionou o ensino americano em todos os níveis…

Então, vamos lá ao artigo:

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Acabo de ver na TV um entrecortado jogo França e Letônia pelo Eurobasket, já que não resisti ao sono em pelo menos dois dos quartos, mesmo com um insinuante e técnico Tony Parker em quadra. O porquê do sono em plena tarde? Tenho trabalhado muito madrugadas adentro, ultimando o já bem tardio livro, tão reclamado pelo meu filho André, além de que a mesmice técnico tática das equipes participantes daquele magno certame comparece em grande, numa enervante utilização do sistema único, porém razoavelmente  temperado por uma eficiente dupla armação, e uma trinca de homens altos, mais para pivôs do que alas, jogando enfiados, lá, bem dentro da cozinha de adversários que encontram sérias dificuldades para contê-los, além, e ai está o paradoxo, da presença de uma artilharia de três nem sempre bem azeitada, utilizada principalmente pela turma do ex leste europeu, quando poderiam maximizar seus enormes e rápidos pivôs na luta próxima e mais segura da cesta, aspecto esse que levará às finais aquelas equipes que melhor souberem distribuir sua eficiência nos arremessos, curtos e longos, além de manterem estáveis as performances nos lances livres.

É engraçado ouvir durante o jogo, um narrador comentar sobre a escolha do quinteto ideal da Copa America (foto), num pontual intervalo, subentendendo que as posições de 1 a 5 não são muito levadas em conta na escolha dos melhores para fins de premiação, assim como encontra dificuldades em rotular as funções de dois armadores em quadra, oscilando entre armador principal, secundário, finalizador, escolta, ala armador,etc. quando na realidade são dois armadores, simples assim, nas funções de alimentarem os três homens altos que compõem a equipe, numa bem vinda mudança de atitudes ofensivas, cada vez mais utilizadas no mundo, menos por aqui, ainda presos que somos aos cincões  e alas de arremesso.

Voltando um pouco, muito pouco, no tempo, quando a dupla armação sofria forte contestação por aqui, exemplos americanos e europeus, balizaram novos tempos, que mesmo antecipados por mim no NBB2, foram esnobados e varridos para debaixo do tapete da história, mas que ainda encontravam algum reconhecimento pela própria LNB, quando em algumas ocasiões escalava suas seleções das rodadas na formação de dois armadores e três alas pivôs, que foi uma tentativa do técnico Magnano para a Copa America, adaptando-a ao sistema único, mas de triste memória pela formação equivocada da equipe numa convocação para lá de discutível.

Então, ao testemunharmos a escolha das seleções de melhores do Eurobasket e da recém terminada Copa America, o que lá vemos senão a formação de dois armadores de ofício e três homens altos, velozes, atléticos e muito ágeis dentro do perímetro, numa constrangedora confrontação ao que ainda utilizamos, por exemplo, no campeonato paulista, jogando um basquete estratificado, colonizado e preso a dogmas que são reflexos do corporativismo existente, dolorosamente existente, como resultante de equipes formadas por agentes e dirigentes que se consideram experts no grande jogo, mas que o apequenam sob a capa protetora de uma classe profissional que deveria exercer tal função, mas que se contenta com o que recebe à sombra do status técnico e tático existente.

Falar e tentar algo de novo, instigante e proprietário por essas bandas só  leva a um desfecho, o exílio puro, duro, definitivo e covarde.

Quem sabe um dia, uma associação de técnicos séria e competente, faça reverter tão humilhante realidade, frente a países que as possuem à décadas?

Anseio que sim, precisamos visceralmente de uma…

Amém.

Foto – Divulgação LNB. Clique na mesma para ampliá-la.

 

6 comentários

  • Rodolpho14.09.2013·

  • Professor, permita-me, mais uma vez, a discórdia.

  • O Magnano não tentou 2 armadores e 3 alas-pivôs na Copa América. Não assisti todos os minutos da seleção dele, mas não creio que isso tenha acontecido nos minutos em que dormi.

  • O que aconteceu, quase sempre, foi 1 armador, 1 armador confuso entre ser armador ou escolta, um escolta ocupando a posição 3 e 2 pivôs lentos.

  • A ausência do Splitter acabou com a infiltração do Huertas, já que o entrosamento deles é fora de série. Sem Marquinhos a infiltração ficaria quase nula, a não ser pela presença do Alex, que o próprio Magnano tratou de matar, ao colocá-lo na posição 3, marcado por jogadores de 10 a 15 cm mais altos, que o inibiram de infiltrar também.

  • Esse erro (o de acabar com opções de infiltrações), ao meu ver, foi o maior erro tático do argentino. O de convocação todos sabemos.

  • Mas, com aquele grupo, poderia muito bem utilizar o Alex como o outro armador, ganhando na agressividade à cesta. E o Guilherme com mais 2 pivôs. Não consigo entender ele de pivô em jogos internacionais. No NBB é mais simples, já que ele sobra tecnicamente, mas num jogo mais elevado, o físico dele contra pivôs o prejudica muito.

  • Apesar de meio maluco, as vezes irresponsável, esse Renaldo Balkman deve ser o ala-pivô dos seus sonhos. Joga muito. Agressivo e rápido nos rebotes e sempre surpreende o adversário.

  • Um abraço!

  • Basquete Brasil14.09.2013·

  • O erro tático cometido, foi o de optar pelos três homens mais altos se movimentando permanentemente dentro do perímetro, mas com a lentidão dos pivôs, e o desconhecimento dos mesmos do que venha a ser estar ativo e em deslocamento permanente naquela restrita área, originou a consequente descoordenação com os armadores, levando aquela opção ofensiva ao descalabro. Restaram as raras infiltrações do Alex, do Arthur e algumas do Benite, a maioria rechaçada pela discrepância de estatura mencionada por você, assim como as varias tentativas dos armadores na busca infrutífera pelo apoio veloz dos grandões visando os corta luzes. Enfim, a equipe não foi preparada nos exercícios específicos e repetitivos de meia quadra, a fim de obter a coordenação necessária ao sucesso do sistema, e mais claro ainda, pela não convocação de jogadores mais indicados para aquelas situações de jogo, onde a velocidade e as técnicas de ataque de frente para a cesta se tornam imprescindíveis.

  • Quanto ao Balkman, Rodolpho, já imaginou o sistema que proponho realizado pelo quinteto escolhido como a seleção da Copa, com ele, o Scola, Ayon, Campazzo e Barea? Brigaria com qualquer das seleções desse Eurobasket linear…

  • Um abraço, Paulo Murilo.

  • Henrique Lima15.09.2013·

  • Professor, mencionei exatamente isso quando assistia ao jogo !

  • Impressionante como posições 1,2,10,105,40 viraram mais importantes do que:

  • Armador – Ala – Pivô.

  • O simples nunca é contemplado.

  • E o pior, tínhamos na transmissão um professor universitário né ?

  • Um forte abraço !

  • Obs:

  • Apenas corrigindo e fazendo jus ao porto riquenho !

  • O nome do ala de Porto Rico é RENALDO BALKMAN.

  • Blackman foi outro jogador, armador excepcional em seus tempos de NBA, em especial Dallas Mavericks.

  • Panamenho e chamava Rolando Blackman, considerado por muitos, um dos melhores jogadores da história do Mavs.

  • Basquete Brasil15.09.2013·

  • Já corrigi o nome do jogador, Henrique, obrigado.Quanto aos comentaristas, aqui para nós, deve ser muito difícil para eles reconhecer que o disco arranhado já está causando constrangimento…

  • Um abraço, Paulo.

  • Flávio16.09.2013·

  • Sempre aprendendo com os Posts do grande mestre Paulo Murilo, aqui fico no aguardo do livro que com certeza será de grande valia para o grande jogo, e ajudará muito os professores que atuam com aquelas crianças que não conhecem o basquetebol, mas estão sedentas por conhecimento!

  • Basquete Brasil17.09.2013·

  • Bem Flavio, se vai ajudar aos professores e técnicos só o futuro dirá, já que será um livro clone do que aqui sempre postei, orientado ao estudo, e principalmente, ao pensar séria e profundamente o grande jogo.

  • Um abraço, Paulo Murilo.



3 comentários

  1. Diego Felipe 03.12.2014

    Caro Professor… Não sei se lembra de mim, um jovem armador que pediu conselhos e humildemente fez algumas perguntas nesse espaço há alguns anos…
    Os conselhos dados (e posts lidos) foram de grande valor, me aperfeiçoaram técnica e mentalmente de uma maneira única, onde sempre passei a treinar e buscar, do zero, do básico, o exercício dos fundamentos.
    Desculpe a história e pergunta longas, mas acho que se faz necessário para minha pergunta…
    Passei por alguns times locais semi-profissionais (semi pois não recebíamos dinheiro, mas profissionais porque disputamos o estadual) em Fortaleza-CE, e fiquei impressionado como os técnicos não trabalham a técnica, mas praticamente só o físico e o tático…
    Mas minha pergunta hoje se baseia em um fato que aconteceu mais de uma vez comigo, e que cito aqui somente um exemplo.
    Certa feita, o técnico estava montando um sistema defensivo por zona, iniciando pelo trabalho de 3 contra 3. Eu, vendo os princípios que ele tentava implantar (algo como ‘os dois de cima pegam daqui (diagonal da cesta) até aqui (diagonal do lado oposto), e o centro sobe pra cobrir, blablabla.’, não lembro exatamente.) e ele falava para o armador do ‘ataque de mentira’ passar a bola para a direita e cortar pelo meio da defesa para a zona morta do lado oposto ao passe, pra ensinar os princípios de movimento para os defensores.
    Então eu, que estava exercendo a função de ataque, perguntei, com todo respeito: ‘Treinador, posso fazer uma pergunta? (ele respondeu afirmativamente) E se, numa situação de 5 contra 5, eu passar para a direita e correr para a zona morta da direita? Nós teríamos 1 pivô perto do ‘cotovelo’, 1 no ‘low post’ (que teria feito o corta-luz em cima do defensor do fundo que iria me acompanhar) e o jogador com a bola, sobrecarregando os 3 defensores (2 do lado direito do ataque + 1 central) com 4 jogadores.’
    Ele falou que não tinha entendido, pedi para que ele me permitisse puxar os 5 jogadores de defesa e de ataque para dentro da quadra e tentar mostrar (em vez de pedir a prancheta que ele insistia em manter debaixo do braço). Permissão concedida, fui mostrar. Ele disse que não funcionaria (antes mesmo de eu começar a demonstrar). O resultado: os 3 defensores ficaram perdidos (algo que não é de se admirar, devido à defesa zona + baixa qualidade defensiva + treinamento muito inicial), e o ataque passou a pontuar, especialmente em passes rápidos voltados aos 2 pivôs, inclusive entre eles mesmos.
    Quando confrontado com os resultados, o técnico negou que houvesse tal problema tático, e a notei que anpartir desse dia passou a reclamar comigo cada vez que eu fazia o bendito corte (passe para a direita, corte pelo meio para zona morta na direita) nos treinos.
    Minha(s) pergunta(s) é(são): professor, eu errei em educadamente apresentar minha visão? Em confrontar minha idéia com a do técnico? Teoricamente, essas leituras não deveriam ser estimuladas? Um adversário de nível minimamente razoável não faria o mesmo?

    Professor, eu particularmente gosto de estudar o basquete (ainda que minha área de formação seja Medicina, que estou cursando) e de prática-lo e treinar a fundo a cada dia. Acho que é um jogo mais jogado com a inteligência do que propriamente com seus músculos ou velocidade, que a beleza de uma decisão rápida para um passe ‘simples’ para uma assistência supera em muito a ”vibração” em uma enterrada. Que manipular uma defesa (ou simplesmente puni-la nos seus pontos mais frágeis) é infinitamente superior aos ‘chutes de 3 caindo’. A dica do vestibular que sempre me passaram…. ‘se você sabe, não chuta.’ No basquete, podemos adaptar para ‘se você sabe, não chuta de 3.’, como o senhor tem tanto defendido.

    Grato pelo espaço e paciência, e espero poder aos poucos influenciar mais gente ao meu redor, pelo exemplo e aprendendo com essas pessoas também,
    Diego

  2. Diego Felipe 03.12.2014

    *profissionais também pelo tempo e nível de dedicação que colocávamos em quadra, 3, 4, às vezes 5 vezes por semana.

  3. Basquete Brasil 04.12.2014

    Prezado Diego, é claro que lembro de você, de seus comentários, perguntas, e a grande vontade de evoluir na modalidade, que hoje, cobra de você um posicionamento inquisidor, curioso e, acima de tudo, comprometido com a qualidade de quem o pratica com interesse e amor.
    De forma alguma você errou ao questionar o técnico, somente o fez num momento inadequado, dentro da área de influência direta dele, a quadra, que para muitos se torna um feudo, e para muito poucos, uma sala de aula. Se o fizesse num outro momento, após o treino, em particular, ou através um texto, a receptividade poderia ter sido outra, mesmo que ele pertencesse ao primeiro tipo acima descrito. De qualquer forma, não dispense jamais esse seu espirito inquisidor, principalmente na área profissional onde está se graduando, tendo o basquetebol como um bom suporte de experiências reais de vida, de companheirismo e de ações integradoras e sociais. Fico na torcida por você. Um abraço. Paulo Murilo.

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