UM ALENTADOR (E INTELIGENTE) CAMINHO…

Em um dos comentários feitos durante o jogo da seleção contra a França, o ex jogador Marcelo mencionou o fato do Benite está se reencontrando com a armação, atuando na posição 2, complementando seu poder pontuador de fora, além da habilidade com a bola, como sempre se caracterizou antes de ser considerado um ala, posição que nunca ocupou de fato, como sempre me manifestei desde sua presença no NBB e no exterior, quando tal indefinição postural o prejudicou bastante em sua carreira profissional, deixando-o a meio caminho de uma definição entre ser um armador competente e criativo, ou um ala vinculado a um arremesso poderoso de três.  Com a correta opção do Petrovic em atuar com dupla armação, convocando três especialistas de ofício, o Huertas, o Yago e o Rafael, viu na ligeira contusão deste último, a oportunidade de relançar o Benite em sua posição de origem, com bons resultados, dinamizando a armação brasileira através a grande oportunidade rotativa e de variadas composições propiciadas por duas duplas de armadores, em n combinações de possibilidades rítmicas infinitas, num campeonato de tiro curto como esse Mundial. Também definiu, como vimos neste torneio de jogos amistosos, um sistema de jogo alguns degraus acima do inefável sistema único, optando pelo intenso jogo interior com alas e pivôs de grande mobilidade como o Varejão, o Augusto e o Felicio, (quando somente o Hettsheimeir destoava pela teimosa, midiática e incensada fuga do garrafão para seus tiros de três) em conjunção a alas tão ou mais velozes nas penetrações e nas conclusões curtas (aquelas que vencem jogos de 2 em 2 e 1 em 1), com o Alex, o Leandro, o Caboclo, o Didi e o Marcos, tornando a equipe mais fluida e brigadora nos rebotes ofensivos, tão ou mais intensos como nos defensivos, chave maior para os contra ataques, além de dotar o grupo de uma atitude defensiva mais dinâmica e presente nos dois perímetros, mesmo sem as técnicas básicas da mesma pouco ou nada valorizadas em suas formações de base…

Acredito que o corte do Hettsheimeir tenha sido pelas causas acima mencionadas, com a prioridade voltada ao jogo envolvente, veloz, e contundente através ações interiores, onde os altos jogadores visem sistematicamente a posse dos rebotes, postergando a chutação de fora àquelas oportunidades de passes de dentro para fora do perímetro, na direção dos verdadeiros especialistas, como mandam as corretas ações de uma equipe bem liderada por armadores com boa leitura de jogo, e alas e pivôs atuando na cozinha adversária, obrigando defensores a se deslocarem permanentemente, originando os espaços necessários a passes mais precisos, forçando-os a cometer mais faltas do que as usuais. Além do mais, uma equipe mais dinâmica melhora em muito seu sistema defensivo, onde a velocidade de anteposição e antecipação aos passes adversários se tornam mais viáveis e resolutos, exigindo discernimento nas interceptações, ocasionadas quando todos defendem a linha da bola sobre um sistema universal de jogo largamente conhecido por todos (afinal o praticam desde a formação de base), no que sempre considerei como o “sistema único” adotado por quase todos os países a imagem e semelhança da NBA…

Espero estar prestes a assistir uma mudança radical em nossa forma de atuar, de jogar o grande jogo, onde uma competente e criativa dupla armação abasteça em grande os três homens altos ” dentro”, no “âmago” das defesas adversárias, individuais ou mesmo zonais, pois o excesso de passes em torno e ao longo do perímetro externo somente atrasa e expõe os mesmos ao corte defensivo, assim como adiciona preciosos segundos aos muitos perdidos em jogadas pré estabelecidas, pranchetadas, repletas de retóricos bloqueios, demasiados dribles, fintas desnecessárias,  e atalhos emanados de fora para dentro da quadra por cabeças muitas vezes equivocadas de seus estrategistas, quando a realidade do jogo transcorre dentro da mesma, onde as verdades verdadeiras acontecem, jamais repetidas igualmente, e deverão ser equacionadas em frações de segundos através uma leitura posicional de jogo, onde a improvisação e a criatividade se impõe decisivamente, como fruto de um preciso e minucioso treinamento dentro da equipe, com duros embates em meia quadra, onde a defesa tenta anular o próprio e proprietário sistema de jogo da equipe, da forma que for preciso, inclusive faltosa, a fim de dotar a todos seus componentes do fator mais importante a ser alcançado, ou seja – um bom sistema de jogo não é aquele que dá certo a cada ofensiva, e sim aquele que desencadeia comportamentos técnicos e táticos nos adversários, que quanto mais previsíveis forem, maior será a eficiência do sistema adotado -…

Este fator é que sempre me levou a não conotar importância aos tão amados e cobrados jogos e torneios amistosos que precedem as grandes competições, e também as ansiadas pré temporadas, principalmente pelos analistas, jornalistas e comentaristas abalizados da modalidade, completamente neófitos sobre as etapas e fatores realmente importantes na montagem de uma equipe, de seleções, onde seus componentes compõe a elite da modalidade, logo municiados dos fundamentos mais exigidos pelo grande jogo, capacitando-os ao embate inter pares, cujo conhecimento dos sistemas e táticas os tornam ideais para o confronto onde o fator mais importante é a anulação dos mesmos, pois essa sempre será a mais temida prioridade dos adversários que enfrentarão…

Sempre em minha vida profissional de técnico de basquetebol, foi dessa maneira que preparei as equipes que ensinei, treinei e dirigi, da base ao adulto, a elite, estimulando a prática sistemática dos fundamentos individuais e coletivos (ferramentas que exequibilizarão os sistemas propostos), os embates permanentes meia quadra entre atacantes e defensores, a permanente leitura de jogo, e acima de tudo, a seletividade consciente e responsável nos arremessos curtos, médios e distantes, dentro e fora dos perímetros, onde técnicas avançadas de pesquisa individualizada, direcionamento e precisão, em muito ultrapassa a corriqueira e usual idéia de que os mesmos atingem sua eficiência máxima através “milhares” de repetições, contestada por mim desde sempre, como comprovada cientificamente em minha tese de doutorado – Estudo sobre um efetivo controle de direção do arremesso com uma das mãos no basquetebol – defendida na FMH/UTL em Lisboa em 1992…

Se alguma dúvida ainda pairar na conceituação de como ensinar, treinar e dirigir uma equipe com dupla armação e três alas pivôs, interagindo coletiva e solidariamente, sugiro que revisem um jogo ímpar em sua importância técnico tática, aquele em que equipe do Saldanha da Gama, treinada e dirigida por mim, venceu a equipe do Brasília que se sagrou campeã naquele NBB2, estando na ocasião na última colocação daquela competição, e com somente 49 dias de preparo ( descrevi todos os 49 dias em artigos diários nesse humilde blog, sendo o primeiro publicado em      6/2/2010), e também o primeiro blog da internet brasileira a veicular jogos integrais, hoje corriqueiros na grande rede…

Nove anos depois este vídeo mantém algo que nenhuma equipe da LNB, e mesmo das seleções nacionais conseguiu emular, sequer copiar, a não ser fatores pontuais, como a dupla armação e pivôs mais ágeis e velozes, nunca porém a maneira de jogar que somente de quatro anos para cá algumas franquias da NBA começaram a inovar. Quem sabe agora o Petrovic consiga romper essa mesmice endêmica técnico tática, e da autofágica enxurrada de arremessos de três,  que nos fez perder muitos anos e gerações de bons e talentosos jogadores, órfãos e reféns do terrível corporativismo que nos tem esmagado e humilhado no cenário internacional de peso, e não aquele de competições menores onde os realmente grandes não põe seus pés, e suas mãos também…

Assistam o JOGO e tirem suas conclusões.

Amém.

Foto – Divulgação CBB.

Vídeo – Arquivo pessoal.



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