SEM-VERGONHAS ? OU SERÁ QUE…
Foi uma cena para Kafka nenhum botar defeito. Num inglês agressivo e desrespeitoso um técnico argentino desanca seu jogador americano, praticamente culpando-o do fracasso da equipe àquela altura do jogo, meio de um segundo quarto, quando toda a equipe falhava bisonhamente na defesa e no ataque. A equipe de Uberlândia simplesmente não se deu conta de que, ao utilizar o mesmo sistema de jogo do Flamengo (Ufa! Não mudam nunca…), sem contar, no entanto, com jogadores da mesma qualidade técnica, se viu pressionada e inferiorizada na quadra, já que não abdicava do enfrentamento desproporcional. A única chance de tentar equilibrar as ações, seria a quebra de ritmo, ou seja, frear o ímpeto rubro-negro cadenciando ao máximo o ritmo de jogo, aproveitando, também ao máximo, os 24 segundos de cada posse de bola. Mas o que se via e notava era a tentativa de acompanhar a velocidade ofensiva do Flamengo, aspecto que, à partir do segundo quarto, aniquilou toda e qualquer possibilidade de equilíbrio das ações. E quase ao final deste mesmo quarto, outro tempo é pedido pelo argentino, e ai a cacetada é geral, pois o mínimo que se ouviu foi a de que tivessem vergonha na cara, e que não abdicassem das faltas pessoais, que tinham sido “somente” duas até aquele momento.
Legal e altamente didático, pois a prioridade àquela altura inicial do jogo era a de conter o adversário com faltas pessoais, e não com técnica defensiva, que era o que deveria estar sendo exigida em continuidade ao treinamento apurado a que sujeitou a equipe na preparação para um campeonato nacional, a não ser que, esse tipo de treinamento não tenha sido exaustivamente praticado. Mas mesmo que não o tenha sido, nada justificaria a enxurrada de bílis lançada contra os intimidados jogadores. Daí para frente, com as responsabilidades derrotistas lançadas às costas dos jogadores, foi só um passar de tempo até o encerramento humilhante e desproporcional. Quanto ao técnico, que deve ser visitante assíduo de nossa terra, já que domina razoavelmente o português, ganhou, em sua opinião, pontos favoráveis perante os que o contrataram, já que definidos ficaram, também em sua opinião, os reais fatores de tão elástica derrota, trombeteados em rede nacional e à cores, quão sem-vergonhas e ineptos são os jogadores que dirige. Lamentável e comprometedor, e logo vindo de um representante do melhor basquetebol jogado e praticado na America do Sul, provando mais uma vez que, mais sem-vergonhas do que foram tachados os jogadores de Uberlândia, são os nossos técnicos que, com sua desunião e omissão, permitem que situações vexaminosas e pusilânimes como essa ocorram em nossa terra, exatamente pela ausência de um movimento associativo, como o existente na pátria do irado técnico, que seria, sem dúvida alguma, enquadrado pelo código de ética existente e atuante ao sul do Prata, se tal situação lá ocorresse.
Mas algo de altamente positivo aconteceu ao final da partida. Ao ser entrevistado pelo SPORTV, o armador Alexandre do Uberlândia deu um testemunho inteligente, elucidativo, calmo, coerente e profundamente humano ao julgar a participação de sua equipe no jogo. Concordou pela existência de falhas, até de atitudes, mas garantiu que após o estudo dos tapes da partida, tudo fariam para melhorar, para caminhar de encontro a dias e atuações melhores. Foi um testemunho de alguém que pode ser criticado de algumas formas, mas nunca tachado de sem-vergonha, como aduziu genericamente seu técnico e líder.
Preocupa-me sobremaneira os rumos que estão sendo orientados unilateralmente de nosso futuro técnico-tático, da nossa preparação de base, totalmente fora da influência de nossos técnicos, mais preocupados em advogarem uma falsa indignação à crescente influência estrangeira, mas movimentando-se em torno das futuras comissões técnicas das seleções, num jogo de características interesseiras e muralistas, onde desde sempre encontramos a maioria dita e auto-proclamada como de elite, sem um mínimo de comprometimento classista, o que garante a curto prazo empregos e colocações no restrito campo de trabalho, mas que, a médio e longo prazo lançará a todos, e infelizmente arrastando uma nova geração órfã de lideranças, para o fosso comum do fracasso e do descrédito perene, para jubilo da quadrilha que assaltou o desporto brasileiro, basquetebol incluso.
Com a tomada da FEBERJ pela situação cebebiana, e as vitorias continuistas e situacionistas nas federações paulista e capixaba, muito em breve dos nove votos contrários ao grego melhor que um presente, restarão dois ou três, se tanto, dando continuidade ao desastre mais do que implantado no âmago do basquetebol brasileiro. E a reboque dessa catástrofe, o cordão desunido e oportunista dos técnicos nacionais somente aguarda a distribuição das parcas migalhas que sobrarão do banquete dos mochos da vida.
Não, de jeito nenhum, sem-vergonhas jamais serão os esforçados jogadores de Uberlândia, mas sim aqueles que permitem que um estrangeiro desqualificado venha a eles e na posse de um de seus empregos esfregue em suas caras quão sem-vergonhas são, pela desunião e pela ausência criminosa de liderança aos jovens que se iniciam e amor ao grande jogo.
Amém.