O PESCOÇO HELÊNICO…

“Majestade, o povo tem fome!”

“Dê brioches a eles!”

E zás, uma cabeça rolou dias depois. E Maria Antonieta nada mais pode dizer.

Infelizmente, por aqui, cabeças jamais sofrerão qualquer ameaça de rolarem, mesmo perpetrando as mais desatinadas ações, por estarem à sombra e ao (dês) serviço de quem detém o poder na marra. Nunca na história desse país, plagiando o guru mestre, a CBB se encontrou mais forte, já que num passe de magia (seria negra?) defenestrou o único poder com força, tradição e histórico de lutas, que liderava sua oposição, a FEBERJ, condenando o futuro do basquetebol brasileiro à sua absurda e inexplicável perpetuação no poder, se analisada pela lógica do bem comum e do progresso da modalidade.

E no rastro pegajoso da nova ordem, temos de engolir uma declaração do preposto presidente da Feberj, Alvaro Leonides, de quem jamais ouvi falar nos 50 anos que vivo o basquete, feita ao O Globo de hoje : “(…) O Estadual está sendo um êxito como espetáculo. Das 12 equipes que jogaram o Brasileiro, seis estão no Estadual. Voltaram a falar de basquete no Rio”.

Que me desculpe tão formidável administrador e gerente de espetáculos, mas jamais, em tempo algum, se deixou de falar em basquete por estas bandas, território de boa gente, de grandes desportistas, de técnicos e professores maravilhosos, celeiro de jogadores em todas as divisões, de torcedores históricos, de jogos inesquecíveis, de imprensa independente na grande rede, de tradições inatacáveis. E não, como agora se insinuam, em campo minado por uma confederação daninha e de políticas rasteiras e covardes, impondo através maquiavélicas maquinações, um pastiche de campeonato, que tem como piéce de resistance o enxovalhamento e humilhação do basquete carioca, e do também basquete fluminense.

O que o desavisado torcedor profissional de torcidas de clubes de futebol vem assistindo, reforçando a imagem de um fantasioso sucesso popular, alimentado por uma imprensa conivente e oportunista, é o enterro definitivo, se continuar por esse caminho, das equipes aqui estabelecidas, com algumas poucas exceções, como o CR Flamengo, utilizadas como hospedeiras, a fim de treinamento e preparação de equipes, que qual ervas daninhas, aqui aportam para sugarem a seiva do prestígio e visibilidade de mídia, ainda presentes nas camisas históricas dos clubes regionais, vestindo-as como camisetas de treino para o Campeonato Nacional.

E essa é a mensagem de sucesso trombeteada pelo digníssimo presidente da Feberj, atendendo e incorporando os desejos do grego melhor que um presente, para o qual, tradição e história somente têm valor na medida em que o mantenham ad perpetuam na direção e controle das abundantes gorduras a serem gostosamente queimadas entre benesses e mordomias, no grande banquete do desporto nacional. Nunca na história desse país, e olha a menção ao guru outra vez, as chaves dos cofres estiveram tão seguras em torno do pescoço helênico, onde guilhotina nenhuma jamais testará seu fio. Que os deuses tenham pena de nós. Amém.

SPRING CAMP…

Numa pequena nota em sua coluna de 4/9/07 no O Globo, Renato Mauricio Prado publicou : Sabe a quem o presidente da Confederação Brasileira de Basquete, Gerasime “Grego” Bozikis, se aliou, para exterminar a oposição e tomar, na marra, o poder na Federação do Rio? Ao ex-deputado que preside o Vasco e ao ex-superintendente da Suderj, Chiquinho da Mangueira. Precisa dizer algo mais?

E o grego melhor que um presente e seus acólitos, com um dos nove votos que o opuseram na reeleição passada no bolso, investiu em sua lógica dominante, para ir de encontro às federações capixaba, mineira e brasiliense, garantindo de antemão o pleito de 2009, já que os paulistas, sedimentados no comando técnico da confederação garantem o restante dos votos sob sua liderança. E nada mais genial do que transformar o outrora poderoso e brilhante Rio de Janeiro, em um pomposo Spring Camp de treinamento e preparação das equipes daqueles estados, para o campeonato nacional. Com a desculpa do soerguimento do basquete carioca, e conseqüente apoio popular, esse tenebroso crime é perpetrado à sombra de uma federação historicamente combativa e oposicionista, agora dominada e reduzida às mesmas proporções de política rasteira e infame, que sua mentora e patroa, a CBB.

Vemos incrédulos, uniformes que vestiram formidáveis e inesquecíveis jogadores transformados em jaquetas de treinamento, por equipes que nada têm a ver com nossas tradições, e que terminado tão lastimável estágio, nada deixarão de produtivo junto aos coniventes clubes cariocas e fluminenses, a não ser a enorme frustração de terem comungado com tão pusilânime jogo de interesses da mais baixa e abjeta política desportiva, mas que aufere grandes ganhos em benesses e trocas de favores, mafiosamente corretos.

Debater, estudar, planejar, e procurar soerguer o basquete carioca e fluminense através a mobilização de nossa gente, nossos clubes, nossos técnicos e professores, nem pensar, não dá votos, não promove comendas e regalias. Muito mais fácil é a importação pura e simples do produto pronto e acabado, técnica e administrativamente falando, para disputar um torneio descartável e na dimensão política desejável. Simplesmente genial, antológico, digno de raposa felpuda da mais alta estirpe, e por isso mesmo merecedora de permanecer no comando do basquete brasileiro, ante a submissão daqueles que deveriam lutar, mas não o fazem, preferindo a sombra determinante da mais profunda e terrível omissão, da qual um dia se arrependerão, ou simplesmente, não.

Com a denominação dada pela imprensa candanga, de “Torneio barriga de aluguel”, o basquete do Rio de Janeiro passa agora a integrar a curriola que assaltou o grande jogo no país, negando definitivamente seu histórico e venerado passado de lutas, inovações, liderança e grandes, grandíssimos vultos do esporte nacional. Mais uma, e talvez última vez, consumatus est.

Amém.

EM DEBATE-O EQUILÍBRIO

Atendendo a algumas sugestões de jovens técnicos, inicio hoje um debate e troca de idéias sobre os fundamentos do jogo. A cada quinzena um fundamento será proposto, discutido, exemplificado, comentado em seus detalhes, e, principalmente, será tema de uma compilação de experiências práticas vividas pelos técnicos e professores envolvidos nos debates.

Inicio propondo o fundamento do equilíbrio, republicando o artigo “O que todo jogador deveria saber 1/10” de 20/4/2006.

12 Abril 2006

O QUE TODO JOGADOR DEVERIA SABER 1/10.

Independendo se armador, ala ou pivô, publico à partir de agora uma série de 10 artigos sobre alguns aspectos dos fundamentos, aqueles detalhes que passam muitas vezes desapercebidos, tanto por iniciantes, como muitos dos considerados craques, que erram muitas vezes mais do que aqueles. E inicio com um tema que a maioria minimiza, ou simplesmente desconhece- O EQUILÍBRIO- Para que fique claro e bem visualizado o que proponho, sugiro inicialmente que tentem o seguinte: amarre na ponta de um barbante, ou algo similar (um dos cadarços do tênis já serve) um pequeno peso, uma pedrinha por exemplo, tal como um fio de prumo daqueles utilizados pelos mestres de obras para aferir o alinhamento dos tijolos. Na outra ponta do fio, que deverá ter aproximadamente uns 60cm, fixe um pregador de roupa, ou um alfinete de segurança daqueles usados em fraldas. Fixe o fio no cós entre as pernas do calção ou de um short curto (os calções tipo fraldões utilizados por muitos jogadores não se prestam, pois têm o seu cós próximo ao meio das coxas). Feito isso, coloque-se em posição defensiva e com um giz desenhe a área que está ocupando no solo, marcando duas linhas retas que unirão as pontas dos pés e seus calcanhares. Terá então um retângulo desenhado no solo, tendo como limite os próprios pés. Agora, tente movimentar os quadris de tal forma que o peso do fio de prumo percorra toda a área delimitada pelas linhas de giz e pelos pés. Enquanto o peso se mantiver dentro da área você estará em equilíbrio estável, já que o fio de prumo projeta seu centro de gravidade, que se situa na zona pubiana, para dentro daquela. Aos poucos você compreenderá o porque de se manter em equilíbrio estável, e que este será tanto maior, quanto maior for a área da base que venha a ocupar. A seguir, tente colocar o fio de prumo sobre qualquer ponto que limite a área da base, e constatará o que vem a ser estar em equilíbrio instável. Exercite-se transferindo os equilíbrios, ao mesmo tempo que altera a área da base, preparando-se para passar ao terceiro estágio, ou seja, transferindo o prumo para fora da área que ocupa, entrando em desequilíbrio. Todo jogador tem a obrigação de conhecer os princípios que regem o equilíbrio, pois a compreensão e o conseqüente domínio do mesmo pautará sua performance na utilização de todos os fundamentos do jogo, à começar pelas partidas e paradas, ou seja, as ações mais comuns ao jogador de basquete: ir de encontro à bola; parar equilibrado seja qual for a velocidade que esteja exercendo na quadra; as mudanças de direção, tanto no ataque, e principalmente no ato defensivo; nas fintas com e sem a bola; no drible progressivo ou regressivo; nos arremessos; nos saltos e basicamente na preparação dos rebotes. Vejamos no caso das paradas. Todo iniciante tende ao desequilíbrio no ato de parar em velocidade de deslocamento. Se tiver conhecimento dos princípios que regem seu centro de gravidade, ele saberá manter o mesmo projetado dentro da área que ocupa mantendo-o em equilíbrio estável, assim como saberá deslocá-lo para equilíbrio instável e conseqüente desequilíbrio quando quiser partir em maior velocidade que seu oponente. Todo bom fintador levará maior vantagem sobre o defensor se souber se manter em equilíbrio instável no momento da finta, pois sempre sairá em maior velocidade, tanto sem a bola, como, e principalmente se estiver no ato do drible. O manejo do corpo sofrerá menor desgaste se for acionado dentro destes princípios, pois o fator inercial poupa energia e necessita de menor força para desencadeá-lo. Defendendo-se de um driblador, ou de um atacante sem a bola, entenderá o porque da importância de estar sobre uma ampla e equilibrada base, e como ganhará em eficiência nas anteposições ao saber deslocar com eficiência e presteza seu centro de gravidade. Voltando ao exercício inicial, perca-se por uns momentos nos deslocamentos do CG, para os lados, para frente, em bases amplas ou menores, entrando e saindo dos estados de equilíbrio, com os olhos abertos e fechados, para aos poucos, sem pressa, entender, sentir e empregar toda uma gama de possibilidades que um bom jogador, independendo de sua posição poderá utilizar para a melhoria de sua performance nos fundamentos, já que o equilíbrio é a base de todos eles.Vamos ao trabalho!

E como complemento, um belo exemplo de equilíbrio dinâmico, onde o seu final nos leva à compreensão do quanto se torna importante a manutenção do centro de gravidade dentro da área ocupada pelo corpo, mesmo sob a forte influência de uma força centrípeda, após saltos e giros no ar, movimentos tão peculiares aos jogadores de basquetebol.

https://www.nytimes.com/video/arts/1194817094693/in-slow-motion.html

TODA UNANIMIDADE É BURRA…

Terminado o Pré-Olímpico Feminino, afora a esmagadora superioridade da equipe americana e a pálida participação brasileira, três aspectos podem ser considerados : 1 – Como o desenho tático de todas as equipes envolvidas na competição eram idênticos, ou seja, seguiam a norma convencionada como “o conceito moderno do basquetebol”, que nada mais é do que o sistema criado, empregado e difundido pelas ligas profissionais americanas, NBA e WNBA, copiado e globalizado pela maioria dos países, numa aceitação cega e servil de um conceito hegemônico, prevaleceu aquela equipe que detinha nas posições características do mesmo as jogadoras mais bem preparadas nos fundamentos do jogo, aliados a uma viril atuação defensiva, e extrema velocidade na ação ofensiva. Num confronto entre sistemas similares, venceu aquela equipe mais bem preparada nos fundamentos, o diferencial decisivo e divisor entre as equipes participantes.

2 – Essa constatação de caráter primário torna o enfrentamento competitivo indissociável ao maior ou menor domínio que toda e qualquer equipe possua sobre os fundamentos básicos, que quanto mais se aproximarem da excelência e fina execução das americanas, maiores serão as chances de emulá-las, e eventualmente vencê-las. É claro, se estabelecido que o sistema de jogo seja o mesmo empregue por elas, o que de saída as deixam como eternas favoritas, pelo que expusemos até o momento. Essa aceitação suicida de conceito coloca suas potenciais adversárias perante uma única evidência, a necessidade de um preparo minucioso e profundo nos fundamentos, único ponto em comum que pode ser diferenciado nas ações individuais e coletivas. Por dominar esses pormenores técnicos individuais e coletivos, é que o sistema defensivo norte-americano se impõe às demais equipes, numa aplicação contínua e agressiva de engenharia reversa, na desconstrução de um sistema que dominam por hábito e tradição, fatores que as antepõem aos movimentos ofensivos das adversárias, ou seja, atuando de forma antecipativa ante a previsibilidade de movimentos e ações que dominam como nenhuma outra equipe.

3 – Torna-se óbvio que somente sistemas opostos ao granítico e bem sedimentado modelo americano, respaldados em uma minuciosa preparação nos fundamentos básicos, tanto individuais , como coletivos, poderão mudar o padrão vigente, o que já vem sendo tentado por algumas equipes européias no rastro das experiências masculinas, que já provaram a possibilidade de derrotarem os americanos. Infelizmente, não é esse o caminho adotado pelas seleções brasileiras, totalmente voltado ao modelo americano, sem no entanto, contarem com o domínio dos fundamentos daquele. Pecamos drasticamente nas ações individuais, no drible, na finta, no posicionamento defensivo, nos arremessos. Nos mantemos fieis e escravos das jogadas advindas daquele modelo, sem a qualificação fundamental para exercê-lo. Confundimos velocidade com pressa, coreografia com ação instintiva e improvisada. Trocamos sistematicamente a progressão vertical e incisiva pela lateralidade inócua. Nos prendemos a uma prancheta em vez da busca pelas pequenas, porém decisivas falhas nas ações ofensivas e defensivas das adversárias, em sua performance física, e nas atitudes comportamentais.

O novo e inusitado, a coragem de trilhar novas concepções técnico-táticas, como, por exemplo, a utilização de um sistema baseado em dupla armação e a utilização de três jogadoras altas, móveis e velozes, treinadas exaustivamente nos fundamentos, numa anteposição ao hoje implantado e aceito pela grande maioria, o conceito americano de jogar, poderia ser desenvolvido e criado com boas possibilidades de sucesso, pois confrontaria a mesmice, até mesmo internacional, desmistificando um padrão , que a magistral definição do imortal Nelson Rodrigues, esclarece “ser toda unanimidade burra”.

No entanto, tais mudanças necessitam de um aporte fundamentado na fulcral necessidade de um salto qualitativo e superlativo, na busca de algo realmente novo, instigante e audacioso, elementos inspiradores aos grandes projetos, antítese da aceitação passiva e covarde do que nos impuseram criminosamente como a única verdade a ser seguida, o abominável e unilateral “conceito moderno do basquetebol”, aquele que somente beneficiou, e beneficia quem o criou, graças às bases escolares e universitárias que o alimentam. Retiremos deles o exemplo marcante pela prática sistemática dos fundamentos do jogo, aplicando-os aos nossos conceitos técnicos e táticos, que beneficiem, enriqueçam e embasem uma nova forma de jogar, nossa forma de jogar. Com estudo, muito trabalho, desprendimento e coragem poderemos galgar algo mais do que tentarmos ser o que não somos, mas fomos um dia.

Amém.

OLHO NO OLHO…

Houve um tenebroso inverno, envolto em brumas, silêncios constrangedores, exposições reveladoras e sucedâneos desmentidos, ofensas, quebras de comando e ética, e mais silêncios, terríveis e dramáticos, como se quisessem enterrar a verdade no mais profundo dos charcos, deixando e condenando-a ao esquecimento, ao apagão da história. Mas aos poucos, ela emerge, lenta e desconcertante de sua não suficientemente profunda cova, em busca da luz e do ar puro de que tanto necessita para se fazer digna e transparente, pois podem enterrá-la, matá-la, nunca.

“O Marquinhos foi infeliz em dizer que o clima não estava bom entre os atletas. O atrito foi entre os jogadores e a comissão técnica, e ele foi resolvido como tem que ser: olho no olho”. Foram essas as declarações do jogador Marcelo ao Globoesporte.com em 27/9/07.

Mas, e as imagens veiculadas pela TV, nas quais ficaram bem claras as profundas divergências entre esse mesmo Marcelo e o Nenê e o Técnico, onde palavras de baixo calão foram proferidas aos borbotões, fazendo o desarmado telespectador de testemunha de um triste espetáculo, onde a falta de comando ficou demonstrada pela permissividade a uma atitude de desequilibrada agressividade por parte desse mesmo jogador? Que técnico, dono e senhor de uma real e patente condição de comando, permitiria que tal atitude pudesse sequer ser ensaiada, e muito mais concretizada em sua presença, numa quadra de jogo, e na presença do público e de uma audiência de TV? E na consecução da mesma, porque não foi o jogador retirado do recinto, não somente pelo técnico e seus companheiros de comissão, que seria a única atitude a ser tomada naquele momento e naquela situação? Por acaso aquela divergência se fez somar a outras, que foram resolvidas olho no olho no hermetismo de um vestiário? E que papo é esse de olho no olho entre uma liderança de jogadores e os técnicos? Duvido, que uma situação desse quilate ocorresse comigo, ou com qualquer técnico que exercesse um comando de verdade, na acepção do termo, e não lastreado em concessões e bajulações àqueles que tem como única e decisiva obrigação jogar o jogo, dedicar-se e sacrificar-se ao mesmo, e não posarem de líderes de coisa nenhuma, a não ser pelo apoio interesseiro e comercialmente lucrativo de uma certa imprensa e de agentes e agiotas do falso esporte.

“Houve atrito entre a comissão técnica e os jogadores, mas isso é comum. Foi resolvido olho no olho”. (O Globo, 28/9/07), confirmou o jogador.

Isso é comum? Como é comum, em que galáxia? Desde quando jogador toma satisfações com técnicos olho no olho? Ou será que chegamos tão fundo nesse mal cheiroso poço que tal situação entrou no rol da coisa comum? Onde pensam que estão e chegarão com essa quebra de hierarquia? Há, esqueci, chegaram e conseguiram algo de inusitado, pularam fora do Pré-Olímpico, não entreolhando-se, olho no olho como afirmaram, e sim com um pé no traseiro, vergonhosa e pusilanimemente, pleno e justo castigo a quem não sabe comandar de um lado, e não está preparado a ser consciente e responsavelmente comandado pelo outro. Ambas as partes erraram profundamente, provando quão falho, omisso e irresponsável é o comando central desse manicômio esportivo, a CBB, através um dirigente que jamais se verá diante de uma interlocução olho no olho com quem quer que seja, muito mais com comandantes e comandados, quando muito piscando matreiramente com um dos olhos para uma platéia federativa, que é a única garantia de sua efetiva e ainda muito futurosa presença no doce cenário das benesses e das vantagens auferidas por tão desejado ” cargo de sacrifício”. E tudo de soslaio, deixando o olho no olho para os … Bem sabemos quem.

Amém.

O TRISTE DESERTO…

Num sábado calorento e seco, lá fui eu e o filho mais velho, renitente leitor, enfrentar as agruras da longa caminhada pelos corredores da Bienal do Livro, na ânsia de bons títulos e boa leitura, e a esperança de encontrar, no meio de milhares de lançamentos, alguma literatura desportiva, de técnica desportiva, que fugisse um pouco dos chavões oportunistas das autobiografias, das campanhas vitoriosas de algumas equipes, e das familiares ajudas psicológicas aos atletas de alta performance. Para minha surpresa, somente encontrei dois títulos sobre equipes vitoriosas no volibol, e três biografias, duas de personalidades do vôlei e uma do judô. Perdido num estande universitário encontrei uma publicação sobre ciclismo, e mais adiante uma sobre natação. Já me considerava órfão de qualquer livreto que abordasse o basquetebol, quando, numa editora especializada em saúde, encontrei um livro do Prof.De Rose da USP, que abordava alguns aspectos técnicos da modalidade, e, creiam-me, absolutamente mais nada. E olhem, que andei e perambulei por todos os estandes da Bienal, exaurindo-me na busca do impossível, na busca de alguma literatura que abordasse técnica desportiva, que àquela altura, não importava de que modalidade fosse.

Mas, eis que de repente me vejo diante de um estande chamativo e iluminado com três maiúsculas que reacenderam minhas esperanças. Lá estavam, bem a frente as iniciais COB, Comitê Olímpico Brasileiro, o cultor do olimpismo pátrio, o solo da cultura desportiva, o cerne do estudo e da pesquisa voltada a alta performance atlética, filiado ao COI, Comitê Olímpico Internacional, sede da Academia Olímpica de Atenas, onde altos e profundos estudos desportivos e sociais são desenvolvidos, e claro, deveriam ali, naquele feérico estande, estarem representados através farta literatura e profusos relatórios dos estudos e pesquisas realizadas. Atravesso o espaço que me separa do éden prometido pela majestosa apresentação, penetro no recinto com respeitosa reverência, e, e…engolindo em seco, me vejo ante uma estante com pequenos livretos de vários esportes, contendo um breve histórico e algumas regras , e nada mais. Viro-me em 360° e o nada permanece inalterado, e neste momento, reparo que além do que me pareceu um funcionário junto a um terminal de computador, somente eu estava no recinto. Incrédulo, decepcionado e interiormente revoltado, me afastei daquele deserto local, deserto de idéias, deserto de literatura, deserto de esperança. E ao me afastar ainda lanço um olhar inquisidor, como se perguntasse, num grito surdo e inaudível aos circundantes barulhentos e suados, mas que somente ressoou dentro e do alto da minha mais profunda indignação- “Dos três bilhões de reais gastos na cornucópia do Pan-Americano, não sobrou pelo menos algum trocado que financiasse publicações de técnicas desportivas? Ou ao povo brasileiro somente é dado o supremo prazer e honra de assistir aqueles enfatiotados personagens da mais alta política desportiva do país pendurando medalhas e corbeilles em atletas laureados, todos posando para jornais, revistas e TV, inchando seus avultados e desmesurados egos, e que nem estão aí para reles literaturas, ingredientes menores e insignificantes perante suas vaidades e sucessos pessoais”?

Lá, naquele desértico estande, não vi nenhum daqueles personagens que deveriam lá estar, explicando e esclarecendo dúvidas, distribuindo, ou até vendendo a preços módicos um pouco de cultura desportiva, através publicações que atendessem e melhorassem o miserável panorama do esporte brasileiro, ajudando decisivamente a professores e técnicos tornarem realidade seus desejos de atualização cultural e técnica, pois verba é que não tem faltado por aquelas bandas, e que por infelicidade, pouca ou nenhuma importância dá a bibliografias de apoio, que deveria ser prioridade mais do que absoluta para um órgão de tal magnitude.

Na volta, sentado ao lado do filho que dirigia, senti-me triste e diminuído, quando num soslaio li no crachá que ainda ostentava a denominação “professor”, que gostaria que também grafasse “técnico de basquetebol”, por ter constatado mais uma vez, como foi sacrificada a minha missão de instruir e preparar professores e jogadores, mas que nunca neguei a qualquer um dos dois segmentos, novas técnicas, estudos e pesquisas, adquiridas a qualquer preço, indo aonde se encontravam, aqui e no exterior, pagando muitas vezes o preço além das minhas possibilidades. E fiquei triste muito mais ainda pela percepção, não tardia, de que o deserto cultural e informativo ainda perdurará por um bom tempo entre nós, pelo menos enquanto persistirem estandes iluminados e feéricos como aquele, com que me deparei na Bienal.

E o nosso abandonado basquetebol, ainda penará pelas ausências de boa literatura técnica, tão pequena e tão mal distribuída. Ao juntar algumas economias, farei chegar até o fim do ano, através a internet, por este humilde blog, o primeiro livro de uma trilogia, e que será minha última estocada no plexo do maior dos inimigos do progresso desportivo, a ausência e o desestímulo proposital e criminoso de uma bem estudada e embasada bibliografia técnica , inimiga mortal da politicagem e do atraso técnico-cultural desportivo entre nós.

Que os deuses ajudem a todos nós. Amém.

PINÇANDO POR AÍ…

Pinçando aqui, pinçando acolá, algumas declarações em blogs e jornais nos fazem pensar que seriedade e responsabilidade decididamente não fazem mais parte do vocabulário desportivo, sem mencionar a arrogância e o desprezo pelo bom senso e pelo público interessado pelo basquetebol.

1 – Declarações gregorianas : “Há a possibilidade dele ser um estrangeiro, mas nada foi decidido. Tenho mais de 30 técnicos que enviaram currículos, telefonaram, assim como agentes de outros. O planejamento está feito, independentemente do treinador(…)”. ( O Globo. 19/9/07, assim como as demais que se seguem).

Ou seja, mesmo com um planejamento previamente estabelecido, 30 técnicos e seus agentes buscam a boca rica (dólares em profusão…) bancada com o dinheiro público que nunca é auditado..

“ Com certeza um europeu, mas não sei se espanhol. Acho que temos bons técnicos brasileiros, sempre valorizei os técnicos nacionais, mas precisamos de alguém para complementar o trabalho. Toda a comissão técnica será brasileira. O técnico que vier será para passar o bastão aos técnicos brasileiros, e não para ficar para sempre. Ele vai trabalhar bastante, dar clinicas. Nós escolheremos o treinador estrangeiro até dezembro, para que em janeiro ele já trabalhe.”

Para entender melhor vamos ao dicionário- Complementar, adj2g. Que serve de complemento. Complemento SM 1. O que complementa. 2. Acabamento, remate.

Entendido, o nababescamente bem pago, e melhor assessorado técnico estrangeiro, aqui aportará para complementar um planejamento previamente estabelecido por um departamento ou comissão técnica, dará conselhos ou alguns pitacos, algumas estéreis clinicas, passando o bastão a seguir, saindo com muitos dólares no bolso, fruto de uma bem urdida “estratégia de cala a boca”, para uma platéia de basbaques permanentemente iludidos pela supremacia exógena, e que não percebem, nem de longe, o poder de voto e conseqüente continuísmo, emanado do controle técnico de nossas seleções.A FPB agradece penhorada por tal domínio e controle. Pena que adote o continuísmo do que ai persiste, pois em caso contrário o grego melhor que um presente baixaria em outro terreiro.

“ (…) Assisti o Eurobasket e não vejo nada de muito diferente, embora Rússia, Lituânia e Espanha sejam muito fortes. Também não vi nada de mais na Grécia, na Alemanha, na Eslovênia e na Croácia (adversários do Brasil no Pré-Olímpico Mundial)(…)”.

Tudo bem, se nada de mais o nosso diligente e bem informado dirigente observou na Europa, porque razões quer importar um técnico desse continente, que custará, por baixo, algumas centenas de milhares de dólares? Os 30, ou mais currículos de técnicos, mais os agentes interessados, numa transação que via de regra envolve comissões e propinas, não explicariam os prazos até dezembro, quando um rentável leilão poderia ser estabelecido à margem dos verdadeiros interesses , por serem eminentemente técnicos, que beneficiariam a seleção brasileira? No caso de uma nova comissão de brasileiros, como reagiriam e se comportariam perante um técnico complementar pago à peso de ouro? Como hierarquizar tal mixórdia?

“ (…) Vamos a Pequim com as duas seleções. Já reservei 40 bilhetes para lá, 20 para a seleção masculina e 20 para a feminina. Disse ao Paulinho Villas-Boas ( ex-jogador da seleção e atualmente no Comitê Olímpico Brasileiro) para reservar essas passagens. Temos história, ganhamos várias Copas Américas, Pan-Americanos, mas temos esse peso da (ausência do masculino) nas Olimpíadas.”

Convenhamos, quem reservou os bilhetes, a CBB ou o COB? Se a quantia a ser despendida é originaria das verbas federais do COB, o que o impede de, como dono da chave desse cofre em particular, exigir, e até intervir nesse caudal de insensatez e desvario, resultante de tanta incompetência e falta de transparência? Mistérios da natureza… já explicado pelo cancioneiro popular.

Ainda não levantamos os custos. O Eurobasket, com 16 equipes, custou US$ 3,8 milhões. Foi o que a Espanha pagou à Fiba para promover o evento.O Pré-Olímpico das Américas custou US$ 3 milhões. Sobre o Pré-Olímpico Mundial, não temos valores (…)”.

E nesse momento decisivo da grande novela, milhões de dólares para promover o Pré-Olímpico Mundial entre nós, é que, todas as raposas, felpudas ou menos felpudas, algumas inclusive meio carecas, mas todas raposas de DNA indiscutível, esfregam as mãos na antevisão de mais uma festança a fundo perdido, como é de praxe nesse meio, com as verbas emanadas de nossos suados e injustos impostos, na cristalização definitiva de que vale qualquer coisa, qualquer tramóia, qualquer golpe baixo, qualquer política de rastejante nível, para a perpetuação da espécie junto aos galinheiros do poder.

2 – Declaração do técnico responsável pela seleção brasileira cadete masculina para o 20º Campeonato Sul-Americano, que acontece de 1º a 7 de outubro na Argentina.

Vamos começar introduzindo a parte tática para que os atletas se familiarizem com os conceitos internacionais, já que é a primeira competição no exterior para a maioria. O trabalho técnico também vai ser feito em cima do tático. Nesse inicio os jogadores vão adquirir os conceitos e o padrão do sistema de jogo. Como é a primeira seleção, não conheço as outras equipes.Pela tradição acredito que a Argentina, Uruguai e Venezuela são nossos adversários diretos na briga pelo título. Argentinos e Uruguaios fazem um trabalho de médio e longo prazo, assim como estamos fazendo. O objetivo é ganhar bagagem internacional, conhecer outras equipes e estilos de jogo já visando a Copa América e o Mundial da categoria acima, comentou o técnico José Neto”. ( Databasket em 19/09/07).

Inacreditável, que um projeto de formação de uma seleção de jovens entre 14 e 16 anos se inicie com a introdução da parte tática, para adquirirem os conceitos e o padrão do sistema de jogo e que “também” o trabalho técnico irá ser feito em cima do tático. Se coordenador fosse hoje, de um setor técnico de clube, federação ou confederação, não só desqualificaria tal projeto, como despediria seu, ou seus autores, com a justa causa de incompetência, despreparo e imposição anti-natural no ensino para jovens , de uma modalidade desportiva que, em qualquer e responsável sociedade voltada aos princípios básicos educacionais, se iniciaria com o enfoque complementar e aprimoramento dos fundamentos do jogo, condições básicas para a elaboração de sistemas de jogo que se coadunassem com as qualidades adquiridas e observadas no preparo e treinamento iniciais, jamais o contrário, como declaradamente expõe o entrevistado, que hoje é apontado como o futuro candidato a técnico da seleção principal, só não sendo bem esclarecido se seu papel oscilará entre complemento, ou suplemento do estrangeirismo que se avizinha.

Pinçamentos tristes e constrangedores estes, mas que espelham a nossa mais triste ainda realidade, que os deuses em suas infinitas paciências vêem esgotar. Amém.

CLAMORES E CONFORMISMO.

Clamores se elevam na busca frenética de um técnico possuidor de três qualidades: Ter um sistema de jogo definido. Saber implantá-lo com energia e determinação. Ter personalidade forte e disciplinadora. E claro,ser estrangeiro.

Mas, será que essas qualidades serão suficientes para enfrentar o tremendo desafio que terá pela frente, de treinar e preparar uma seleção brasileira profundamente ferida em seus brios e estrutura? E que bastará estar munido de uma serie de jogadas pré-estabelecidas em torno do que chamam sistema de jogo? É absolutamente certo que por aqui aportará um condigno representante do chamado “sistema do basquete internacional” , seguido e adotado pela grande maioria das seleções internacionais, vide os recentes terminados Pré-Olímpicos americano e europeu, quando, com a exceção de argentinos, espanhóis e lituanos, todas as demais equipes atuaram em imagem e semelhança entre si, numa visão bem estabelecida do que e como serão os jogos na Olimpíada do próximo ano. A ditadura da prancheta praticamente cegou e restringiu técnicos e jogadores ao improviso e a autodeterminação, robotizando o jogo, tornando-o previsível e insosso.

A prevalência do talento restringiu-se a uns poucos e corajosos jogadores, em atitudes e decisões, como bem convêm a líderes, apesar das pressões extra-quadra a que foram submetidos. A confirmação do sistema único no basquete dito moderno, situa a maioria dos técnicos, estrangeiros , no patamar dos inalcançáveis, ainda mais quando precedidos da fama de rígidos e disciplinadores, colocando-os na faixa dos mega salários, garantidos e sacramentados pelo conformismo da mídia e do pouco informado público torcedor.

Exatamente por esse despropositado e conivente conformismo, é que republico um artigo escrito em 15/02/2005, Mestres do Olhar e do Movimento, quando confronto e discuto a rigidez dos sistemas de jogo pré-estabelecidos, e que para variar, não recebeu um único comentário, nem que fosse para negá-lo. Pena, pois teria sido estabelecida uma bela e esclarecedora discussão, em um bom e patriótico português.

MESTRES DO OLHAR E DO MOVIMENTO.

Este foi o título de uma reportagem sobre a exposição que explora as afinidades entre o escultor Alberto Giacometti e o fotógrafo Henri Cartier-Bresson publicada no O Globo no dia 17 deste mês. O texto menciona, entre várias coincidências, a vontade de ambos de congelar um momento em movimento. Disse Giacometti- “Toda a ação dos artistas modernos está nessa vontade de captar, de possuir alguma coisa que foge constantemente”. Já Bresson assim se manifestou-“Jogamos com coisas que desaparecem… e, quando elas desaparecem, é impossível fazer com que elas revivam”. Eis duas afirmativas que caem como um diáfano véu sobre as cabeças da maioria de nossos técnicos. Sonham de olhos abertos com a perpetuação dos movimentos que extrapolam de suas pranchetas mágicas, como se fosse possível a perenização das jogadas estabelecidas pelo sistema de jogo que empregam. Sempre que estabelecem contato com os jogadores repetem, e repetem, até a exaustão os mesmos movimentos, as mesmas soluções, clamam pela obediência à jogada, á rotatividade da bola, com uma intransigência que beira ao fanatismo. É como se fosse uma grande coreografia, onde a repetição das jogadas mortais é o supremo objetivo a ser alcançado. Mas, como mencionaram Giacometti e Bresson, os movimentos acontecem na mesma proporção em que desaparecem, e nunca são iguais, por isso viviam em busca de sua captação, a qual Bresson definiu como o “decisive moment”, o momento decisivo, único, fugaz e precioso se captado.Essa foi sua grandeza, pois foi o fotógrafo que mais o registrou no século XX.Nossos técnicos precisam, com urgência, entender que se uma jogada se repetir,com alto grau de freqüência, pode-se afirmar que o sistema defensivo do adversário inexiste pela extrema fraqueza de seus integrantes. Um sistema ofensivo é de alta qualidade, não se der certo seguidamente, e sim se estabelecer situações que desequilibrem, pela imprevisibilidade de suas ações, o esquema defensivo do adversário. A repetição sistemática de jogadas produz situações com alto grau de previsibilidade, e retiram dos jogadores a espontaneidade de suas ações, colocando-os numa situação de meros repetidores de movimentos pré-estabelecidos por seus técnicos. E se os defensores forem de boa qualidade, rapidamente se antepõem aos movimentos ofensivos, anulando sua eficiência. São nesses momentos que se estabelecem as diferenças entre uma equipe bem treinada de outra não tão bem preparada. Quantos são os técnicos que nos coletivos de preparação para os jogos, os interrompem para orientar sua defesa em função de seu próprio ataque pré-estabelecido? Que sempre orienta seus atletas na busca do inusitado, e não do conhecido? Que mesmo tendo um sistema fechado de jogo, propugna por rompê-lo sempre que possível, pois essa sempre será a ação desencadeada pelo adversário? Enfim, que reconhece ser a busca, não de um, mas de vários “momentos decisivos”, o fator a ser alcançado com afinco e dissociado do círculo vicioso coreografia-prancheta. Por praticar fotografia por longos anos, e de ter tido em Henri Cartier-Bresson um exemplo a ser seguido é que desde muito cedo procurei entender e praticar o “decisive moment” com algum sucesso, mas que pela compreensão de seu significado, pude levar a meus atletas um vasto leque de opções que visassem o encontro dos mesmos. “Jogamos com coisas que desaparecem… e,quando elas desaparecem, é impossível fazer com que elas revivam”. Cada jogada constitui um princípio e um fim em si mesmo, e são irrepetíveis. Precisamos entender esse mecanismo para nos libertar das jogadas mágicas e das pranchetas milagrosas. Meus queridos colegas precisamos encontrar novos caminhos, pois esse que aí está sendo trilhado por vocês não levará a lugar nenhum, perdão, sabemos onde ele vai dar…

posted by Basquete Brasil @ 2/15/2005 02:02:00 AM 0 comments

A ILUSÃO SISTÊMICA.

Muito se tem escrito sobre sistemas de jogo, de como jogam os europeus, como agem os americanos, como criam os eslavos, indo da velocidade de “transição” ( ninguém explica o que seja, talvez pela inexistência de tal definição se confrontada com o simplório ritmo de jogo…), até os intrincados termos americanos definidores de jogadas básicas como o dá e segue, os corta-luzes interiores e exteriores, as penetrações por trás da cesta, o jogo de pivôs, os bloqueios, etc.etc., tão ao gosto de narradores e comentaristas, com a desculpa de que se tratam de termos internacionais, argumentação que se dilui ao manusearmos livros de técnica e fundamentos nos mais diversos idiomas, inclusive o nosso. Mas soam bem e aparentam cultura superior, esquecendo os preclaros cronistas que a maioria da população brasileira não conhece o idioma saxão, principalmente os mais jovens.

E páginas e mais páginas são escritas sobre sistemas de jogo, que pela preocupação que despertam parecem existir às dezenas, com particularidades que variam de país para país, até de continentes. No entanto, não se vêem os mesmos descritos e exemplificados em suas nuances e detalhes técnicos, como deveriam fazê-lo, já que os discutem com apaixonada veemência, deixando a audiência basbaque ante tanta sapiência e conhecimento. Um velho e inesquecível professor sempre lembrava que a erudição e o prolixidade era a arma dos enroladores, principalmente quando externada em outro idioma que não o nosso. Entendamos como o popular “se colar, colou…”. Então, que mágicos sistemas são estes que gabaritam técnicos, principalmente estrangeiros, a serem seus fieis depositários? Um deles, já candidato à direção de nossa seleção para o próximo e derradeiro Pré-Olímpico? Afinal, quantos são e como são constituídos esses sistemas? Quais suas decisivas influências? Americanas ou européias? Ocidentais ou orientais?

Sugiro fortemente que se munam de um simples e prosaico lápis, e algumas folhas de papel, e tentem grafar as disposições dos diversos jogadores, das diversas equipes, e dos mais diversos ainda países, ao iniciarem toda e qualquer jogadas de ataque, e mais ainda, com algum esforço, o desenrolar de alguns movimentos das mesmas, num exercício de progressivo encadeamento entre deslocamentos de caráter coletivo, e algumas ações de caráter individual, para chegarem a uma conclusão de assombrosa obviedade, a de que todos, sem exceção jogam rigorosamente iguais. De repente, se darão conta de que o modelo NBA se tornou universal, e que o maior e único beneficiário desse sistema de jogar é a liga mais rica, mais difundida, e por isso mesmo aquela que deve ser preservada em sua dominância político-econômica, mesmo que tenha de “aparentar disfarçadamente” uma aceitação da realidade internacional em torno da FIBA, num exercício estratégico que esconde e camufla sua luta hegemônica e globalizante. Porque o basquete americano é o único, seja amador ou profissional que se nega a seguir as normas, regulamentos e regras aceitas e difundidas no restante do mundo do basquetebol FIBA ? Agora mesmo, varias personalidades americanas foram introduzidas no Hall da Fama da FIBA, como os lendários Dean Smith e Bill Russel, numa prova de suas importâncias para o grande jogo, mesmo que praticado de uma forma diferente, mas que deveria sê-lo da forma como é praticado internacionalmente.

A conclusão a que chegarão após o exercício proposto, é a de que na constatação da existência de um único sistema universal de jogo, o que é lastimável e preocupante, somente duas variáveis ainda podem incidir sobre o mesmo, para sua aplicabilidade com algum caráter personalista, a velocidade e o domínio pleno dos fundamentos. E é exatamente nestes dois pormenores, nestas duas variáveis, é que se encaixam as formas de jogar de muitos países europeus quanto à velocidade, bem menor para os mesmos, como os universitários americanos, os fundamentos para todos, e a variação de velocidades e excelência nos fundamentos para uns poucos, ações estas bem aproveitadas por argentinos, espanhóis, lituanos e croatas, eslovenos e um pouco menos dos gregos. Nosso basquetebol, optou simplesmente pelo modelo cru NBA, sem a base fundamental do mesmo, ou seja, aproveitou o desenho da jogada inicial e seu desenvolvimento, mas sem o suporte exeqüibilizador do mesmo, o pleno, responsável e determinante domínio dos fundamentos do jogo.

Então, como os analistas de plantão, que pouco ou quase nada buscam na origem dos sistemas, alguns dos quais septuagenários, mas que lá estão perpetuados na maior bibliografia existente entre todos os desportos, como, para exemplificar um, que alguns técnicos, inclusive americanos, teimam maliciosamente em requerer autoria, o sistema dos triângulos, que nada mais é do que a aplicação de três dos movimentos básicos do basquete, magistralmente descritos pela geração de um Clair Bee, Dean Smith, Nat Holman, John Wooden , Forrest Allen, e muitos outros que se dignaram doar a seus pósteros livros e estudos magníficos, então, repito, como explicam a existência dos sistemas de jogo? Mas como explicá-los se não definem nem reconhecem a base comum do atual existente? Sim senhores, atualmente só um sistema se mantêm em foco, variando tão somente em ritmo e na excelência de seus praticantes na utilização dos fundamentos do grande jogo. E um outro detalhe de fundamental importância reforça esse conhecimento, o de que a existência do atual e monopolizante sistema sucedeu a outros, bem definidos e largamente utilizados, inclusive e basicamente por nós, em um passado não tão distante assim, quando inovávamos e arriscávamos no novo e no audacioso, sem medos e ressalvas, e que nos levou a muitas e inesquecíveis vitórias. Mas era um tempo de verdadeiros técnicos, de grandes e destemidos jogadores, de formidáveis analistas e colunistas, de dirigentes menos interessados em suas contas bancárias e enganosos prestígios políticos, ao contrário de hoje, onde somente persistem os dirigentes mais politizados e muito mais interessados nas benesses inerentes aos cargos, já que técnicos e jogadores mergulharam de cabeça no modelo NBA, tão à gosto dos mais globalizados e pasteurizados ainda cronistas e analistas de hoje, para os quais os ensinamentos do passado, brilhantes ou não, são relegados a um estorvo que deve ser guardado e esquecido no fundo dos baús da história.

E é em nome desse esquecimento, da negação da história e de seus participantes, daqueles que teimaram estudar, não só os sistemas, mas o teor e a fundamentação dos mesmos, que devemos aceitar e engolir a seco a definitiva implantação do que deveria ser substituído por algo de novo, inédito, audacioso e corajoso, mas que virá, na forma de um eslavo, espanhol ou americano para nos impingir a formula única, e de resultados imprevisíveis, à peso de muitos e muitos dólares, pagos com nossos impostos, sem que possamos sequer argumentar que tantos e sacrificados valores poderiam ser alocados em programas de desenvolvimento e preparação de futuras gerações de técnicos e jogadores, liderados por aqueles que realmente conhecem e dominam a arte de ensinar, treinar e dirigir equipes, que existem, sim senhores, entre nós, faltando somente que os reconheçam e reverenciem, em português mesmo, sem a prepotência daqueles que os negam por ignorância, espírito colonizado, ou mesmo, má fé.

Que os deuses, com o bom senso que os inspiram, nos ajudem a enxergar o óbvio, e que nos faça merecedores de um futuro menos doloroso, ou mais uma vez decepcionante. Amém.

BAIXO E FEIO…

Nesta data, 11 de setembro, três anos atrás, iniciei este blog na intenção de discutir os problemas do basquete brasileiro e seu possível soerguimento técnico. Após 344 artigos ininterruptamente publicados, constato que um universo de decisões terá de ser tomado, se é que será, por todos os envolvidos direta e indiretamente no basquetebol, para que retornemos a um razoável patamar de excelência produtiva, alcançada no passado, hoje esquecido e até discutido em sua veracidade, por uma geração totalmente voltada ao “basquete internacional”, ao basquete NBA, com sua avassaladora dominância econômica, e por que não, política e ideológica. Nem o organizado e poderoso basquete europeu pode oferecer resistência a tamanho poder, lastreado em muitos milhões de dólares, mesmo que títulos internacionais o confrontem e desafiem. E é em nome destes títulos fugidios que o poderoso basquete americano se une em torno de uma composição, reunindo jogadores profissionais e técnicos universitários, mais próximos taticamente do basquetebol FIBA, a fim de, juntos, retomarem a liderança perdida e contestada nas últimas competições internacionais.

Enquanto isso nos perdemos em duvidosas e pouco embasadas discussões sobre que caminho pautar daqui para diante, após as desastrosas participações em mundiais e pré-olímpicos, quando nos afastamos celeremente do grupamento de que sempre fizemos parte, o dos vencedores e titulados. O fator mais determinante nesse retrocesso foi exatamente o processo dicotômico que se instaurou entre as gerações de grandes jogadores e técnicos de um passado não tão distante assim, com as mais recentes, largamente influenciadas pelo inédito progresso das mídias, onde a sigla NBA se instalou e frutificou mundialmente, e que desventuradamente, não contou com uma liderança técnica-administrativa que mantivesse ambas interligadas, num constante diálogo de experiências e ações, para manter acesa a chama das conquistas passadas iluminado as futuras, num transbordo de vivências e exemplos dignos e preciosos de serem seguidos e continuados. Interesses vis e da mais precária e rasteira política continuista, se sobrepôs ao interesse maior, a grandeza do nosso basquetebol, a ser mantido pela permanente lembrança do que fomos, unindo a experiência de seus heróis aos esforços dos mais novos visando um futuro, que mesmo sob a brutal influência vinda do norte, poderia, a exemplo de nossos irmãos argentinos, manter suas tradições de inovadores que sempre ostentou naquele glorioso passado.

Vivemos, após derrotas contundentes, a possível realidade de vermos nosso destino técnico-tático entregue ao domínio internacional, se é que essa tendência possa resultar possível num espaço de um ano até o próximo pré-olímpico, dentro da realidade técnica de nossos jogadores, frágeis que são no domínio dos fundamentos básicos do jogo. Uma realidade que pune grandes técnicos nacionais, a maioria dos quais jamais teve a oportunidade de sequer serem lembrados para seleções de base, escolas experimentais para futuros sistemas de jogo, e não serem, como o foram até os dias de hoje, repositórias de uma “filosofia padronizada” para todas, engessando-as a um principio uno e indissociável do modelo escolhido pela facilidade prêt-à-porter de uso, sem maiores implicações voltadas a desnecessários estudos e pesquisas, o bem elaborado, inteligente e escravizador modelo NBA.

E essa fatal dicotomia, incentivada por sucessivas e mal sucedidas administrações, que em tempo algum procurou a união do ontem com o amanhã, justificando o hoje de suas ações, descartando um universo de estudos, experiências e excelentes resultados, nos levou ao beco sem saída em que nos encontramos, onde uma só solução é antevista por tal liderança, em nome de sua continuidade política, e ao largo de qualquer obstáculo que ensaie a mais tênue desconfiança à perda de tal posição, a pura e simples possibilidade de entrega técnica da seleção a uma liderança estrangeira, mesmo que existam entre nós técnicos capazes e competentes para exercê-la, quase todos pertencentes à geração esquecida e marcada pela desunião provocada pelo ostensivo desapoio às suas honestas tentativas de união classista, duas vezes tentadas através a ANATEBA e a BRASTEBA, levadas à extinção por se anteporem ao interesseiro isolacionismo politico da CBB.

Uma substancial mudança em nosso destino basquetebolistico, fatalmente terá de passar por três estágios:

1 – Um forte e bem elaborado projeto de convencimento técnico-político no âmbito das federações estaduais, a fim de que seus votos espelhem as reais necessidades do basquetebol brasileiro, conduzindo à direção da CBB nas eleições de 2009 uma diretoria representativa e compromissada com a evolução e o progresso do grande jogo entre nós. Sem essa mudança, nada, ou pouquíssima coisa será possível de ser alcançada.

2 – Organização de associações estaduais de técnicos, com a participação de pessoas físicas e jurídicas comunitárias, assim como representação de jogadores, a fim de que juntos possam contribuir com projetos, estudos e soluções de casos inerentes às suas realidades regionais, colaborando e complementando as políticas emanadas e implementadas pelas federações, visando num futuro próximo a criação da associação nacional, que englobaria e divulgaria todas essas experiências em caráter nacional, autonomicamente colaborando com a entidade mater, a CBB.

3 – E emergindo dessa nova realidade, a implantação de uma autêntica escola de técnicos, qualificando-os em níveis progressivos, através cursos diretos e à longa distância com acompanhamento e aferições semestrais de corpo presente por parte dos professores, implantando de uma vez por todas o primado do mérito, desde o nível voltado à iniciação, até a direção de seleções, quando teremos afastado o primado da escolha política, e da troca de favores pessoais.

Estes são os pontos fundamentais para o real soerguimento do basquetebol entre nós, e que são soluções com duas ou mais décadas de atraso se relacionadas aos países que hoje ocupam o espaço que um dia também foi nosso. E afirmo tudo isso, no dia em que esse humilde blog completa três anos, por ter de certa forma percorrido todas as etapas que aqui relacionei, como professor nos três níveis de escolaridade, como técnico de todas as categorias masculinas e duas femininas, como professor de futuros professores de Educação Física, de Pedagogia e de Técnicos de Basquetebol, como fundador e dirigente de associações de técnicos, como pesquisador e doutorado em Ciências do Desporto, com tese em basquetebol, e só não dirigindo uma seleção brasileira, na época em que era considerado entre os melhores, na idade de 25 anos, porque numa escolha para dirigir a seleção feminina que se apresentaria em Paris em 1967 em jogos com a seleção tcheca perante o COI, a fim de decidirem pela inclusão, ou não, do basquete feminino nas Olimpíadas, fui preterido pela direção técnica da CBB, que queria enviar uma seleção que rivalizasse em beleza à seleção tcheca, e que destoaria por ser eu baixo e feio, sendo na ocasião trocado por um técnico alto e bonito, o que foi realmente perpetrado. Não acreditei quando o velho e amigo Chico, roupeiro das seleções nacionais e funcionário dedicado da EEFD/UFRJ me contou constrangido, depois de ter testemunhado a escolha quando servia o café na sede da CBB. Desta data em diante, promet lutar para que um dia, por mais distante que fosse, visse estabelecido no âmbito desportivo, no basquetebol em particular, o primado da excelência, da competência, do mérito enfim.

Em tempo – O técnico escolhido foi o Ary Vidal, tijucano, alto e bonito, e bom técnico também, mas não melhor.