O TRISTE DESERTO…
Num sábado calorento e seco, lá fui eu e o filho mais velho, renitente leitor, enfrentar as agruras da longa caminhada pelos corredores da Bienal do Livro, na ânsia de bons títulos e boa leitura, e a esperança de encontrar, no meio de milhares de lançamentos, alguma literatura desportiva, de técnica desportiva, que fugisse um pouco dos chavões oportunistas das autobiografias, das campanhas vitoriosas de algumas equipes, e das familiares ajudas psicológicas aos atletas de alta performance. Para minha surpresa, somente encontrei dois títulos sobre equipes vitoriosas no volibol, e três biografias, duas de personalidades do vôlei e uma do judô. Perdido num estande universitário encontrei uma publicação sobre ciclismo, e mais adiante uma sobre natação. Já me considerava órfão de qualquer livreto que abordasse o basquetebol, quando, numa editora especializada em saúde, encontrei um livro do Prof.De Rose da USP, que abordava alguns aspectos técnicos da modalidade, e, creiam-me, absolutamente mais nada. E olhem, que andei e perambulei por todos os estandes da Bienal, exaurindo-me na busca do impossível, na busca de alguma literatura que abordasse técnica desportiva, que àquela altura, não importava de que modalidade fosse.
Mas, eis que de repente me vejo diante de um estande chamativo e iluminado com três maiúsculas que reacenderam minhas esperanças. Lá estavam, bem a frente as iniciais COB, Comitê Olímpico Brasileiro, o cultor do olimpismo pátrio, o solo da cultura desportiva, o cerne do estudo e da pesquisa voltada a alta performance atlética, filiado ao COI, Comitê Olímpico Internacional, sede da Academia Olímpica de Atenas, onde altos e profundos estudos desportivos e sociais são desenvolvidos, e claro, deveriam ali, naquele feérico estande, estarem representados através farta literatura e profusos relatórios dos estudos e pesquisas realizadas. Atravesso o espaço que me separa do éden prometido pela majestosa apresentação, penetro no recinto com respeitosa reverência, e, e…engolindo em seco, me vejo ante uma estante com pequenos livretos de vários esportes, contendo um breve histórico e algumas regras , e nada mais. Viro-me em 360° e o nada permanece inalterado, e neste momento, reparo que além do que me pareceu um funcionário junto a um terminal de computador, somente eu estava no recinto. Incrédulo, decepcionado e interiormente revoltado, me afastei daquele deserto local, deserto de idéias, deserto de literatura, deserto de esperança. E ao me afastar ainda lanço um olhar inquisidor, como se perguntasse, num grito surdo e inaudível aos circundantes barulhentos e suados, mas que somente ressoou dentro e do alto da minha mais profunda indignação- “Dos três bilhões de reais gastos na cornucópia do Pan-Americano, não sobrou pelo menos algum trocado que financiasse publicações de técnicas desportivas? Ou ao povo brasileiro somente é dado o supremo prazer e honra de assistir aqueles enfatiotados personagens da mais alta política desportiva do país pendurando medalhas e corbeilles em atletas laureados, todos posando para jornais, revistas e TV, inchando seus avultados e desmesurados egos, e que nem estão aí para reles literaturas, ingredientes menores e insignificantes perante suas vaidades e sucessos pessoais”?
Lá, naquele desértico estande, não vi nenhum daqueles personagens que deveriam lá estar, explicando e esclarecendo dúvidas, distribuindo, ou até vendendo a preços módicos um pouco de cultura desportiva, através publicações que atendessem e melhorassem o miserável panorama do esporte brasileiro, ajudando decisivamente a professores e técnicos tornarem realidade seus desejos de atualização cultural e técnica, pois verba é que não tem faltado por aquelas bandas, e que por infelicidade, pouca ou nenhuma importância dá a bibliografias de apoio, que deveria ser prioridade mais do que absoluta para um órgão de tal magnitude.
Na volta, sentado ao lado do filho que dirigia, senti-me triste e diminuído, quando num soslaio li no crachá que ainda ostentava a denominação “professor”, que gostaria que também grafasse “técnico de basquetebol”, por ter constatado mais uma vez, como foi sacrificada a minha missão de instruir e preparar professores e jogadores, mas que nunca neguei a qualquer um dos dois segmentos, novas técnicas, estudos e pesquisas, adquiridas a qualquer preço, indo aonde se encontravam, aqui e no exterior, pagando muitas vezes o preço além das minhas possibilidades. E fiquei triste muito mais ainda pela percepção, não tardia, de que o deserto cultural e informativo ainda perdurará por um bom tempo entre nós, pelo menos enquanto persistirem estandes iluminados e feéricos como aquele, com que me deparei na Bienal.
E o nosso abandonado basquetebol, ainda penará pelas ausências de boa literatura técnica, tão pequena e tão mal distribuída. Ao juntar algumas economias, farei chegar até o fim do ano, através a internet, por este humilde blog, o primeiro livro de uma trilogia, e que será minha última estocada no plexo do maior dos inimigos do progresso desportivo, a ausência e o desestímulo proposital e criminoso de uma bem estudada e embasada bibliografia técnica , inimiga mortal da politicagem e do atraso técnico-cultural desportivo entre nós.
Que os deuses ajudem a todos nós. Amém.