APARANDO ARESTAS…
Assisto ao jogo com meu filho basqueteiro, anoto jogadas, detalhes, e bato fotos, muitas fotos, que com sua crueza de imagens estáticas revelam muito mais do que sequências animadas, onde se perdem as entrelinhas dos sistemas, das ações individuais e coletivas, do comportamento atemporal dentro de uma competição de alto nível. Bem mais tarde, madrugada adentra, revejo o replay, com mais calma, e sob uma visão muito mais abrangente, depois de ter ido à minúcias na transmissão ao vivo, num exercício de captação e observação às avessas que muito tem me ajudado como técnico vida afora (a sempre bem vinda Engenharia Reversa).
Se foi um jogo levado a valer pelos contendores, muito esconderam, principalmente nosso astuto técnico, que somente se irritou de verdade quando no segundo quarto os americanos impuseram um 13 x 2 (vide foto) forçando uma marcação extremamente agressiva em cima da nossa armação, principalmente através o Raul, que aos 19 anos não possui maturidade e técnica desenvolvida para competições do quilate que querem que ele enfrente, e tem mais, se não corrigirem, melhor dizendo, ensinarem o menino como deve se comportar e agir tecnicamente na armação, nem em 2016 ele chega na condição de dono da posição como anunciam os marqueteiros de plantão.
E o básico que deve ser ensinado se resume a um detalhe, que se não corrigido agora, tolherá sua atuação pelo resto da vida, o de jogar no drible e na finta o mais próximo possível de seu marcador, jamais recuando para obter espaços, e sim avançando para criá-los onde não existem, fazendo com que seu marcador, ao tê-lo colado a seu corpo não aja em antecipações, e sim reaja a uma ação ou atitude ofensiva, mantendo-o sempre um tempo atrás em suas reações. Um bom armador agride, recua, e torna a agredir concomitante à troca de mãos, criando pequenos espaços por onde se infiltra, ou revertendo junto ao corpo do defensor, sempre em equilíbrio instável, provocando o desequilíbrio defensivo, tanto corporal, como espacial, e o mais importante, ambidestralmente.
Mas numa seleção como a nossa, onde até dirigente compõe o banco (com que função?), um detalhe destes de fundamentos deveria ser avaliado, pois contar somente com estrategistas de prancheta em punho jamais resolverá problemas e situações como esta, ou outros, como por exemplo, a equivocada empunhadura do Spliter nos arremessos livres, onde correções podem ser feitas por quem entende de fundamentos. De estrategistas bastam dois, como os temos argentinos, e dos bons.
Exatamente em cima dessa lamentável deficiência foi que os americanos retomaram as rédeas do jogo, pressionando, dobrando, e incentivando o jovem armador a recuar, recuar e lateralizar, para enfim, sucumbir. Maldade essa queimação de filme, mas não muito menor que o aperto que deram no Leandro e de passagem no Huertas, dois macacos velhos das quadras.
Acesos os faróis de alerta, vimos daí para diante um Huertas armando e conduzindo de verdade, a bola, os passes, as fintas os arremessos e as explendidas assistências, jogando como deve jogar um armador, “dentro do marcador” fungando ele mesmo, e não o oponente, no cangote do outro.
Mas algo de instigante ocorreu, e desde o começo do jogo, quando os americanos ao se espalharem aleatoriamente (?) pela quadra de ataque, provocaram situações aonde nossos pivôs vinham marcar fora do perímetro, e os armadores ou alas, dentro, criando impasses onde nossos rebotes defensivos se tornavam ineficientes, provocando trocas sucessivas, nem sempre nos beneficiando, mas sim a eles, que agindo dessa forma equilibravam sua carência de pivôs de oficio, bem aos moldes de sua campanha no último mundial.
Conseguimos, no entanto, equilibrar um pouco essa movimentação ofensiva dos americanos, obrigando-os aos longos arremessos, no que foram ineficientes por um largo período de tempo, quebrado no quarto final pelo LeBron, com seus arremessos da linha NBA.
Nosso ataque, propositalmente (desconfio que sim pela tranqüilidade do Magnano…) não aproximava os pivôs, mesmo jogando com eles, como que testando suas ações técnico individuais, e não o jogo entre eles mesmos, acrescido do apoio do ala, que deverá ser fundamental em Londres se quisermos ir mais além do quem a simples classificação, e nesse ponto fica uma preocupação, a forma do Marcos, pois dos alas convocados é aquele que reúne as melhores características para interagir com os pivôs, não só por sua elevada estatura, mas pela precisão de seus arremessos médios. O Guilherme e o Marcelo poderão compor no apoio em determinados jogos, não os de maior impacto e exigência física, assim como o Alex na marcação de um jogador mais atuante fora do perímetro.
Finalmente, a grande interrogação que se delineia na possível estratégia do Magnano de vir a jogar com dois armadores, que nesse caso se restringiria ao Huertas e o Larry, com um possível, porém temerário Leandro na rotação, e nunca o Raul, principalmente contra europeus e americanos com sua sufocante pressão defensiva, já que uma armação solitária desgastaria o Huertas de forma cruel, o que nenhum adversário descartará, pois reduziria o potencial ofensivo brasileiro em praticamente 50%.
Se atuarmos em dupla armação, como em alguns ensaios feitos nos últimos jogos de ações de pivôs qualificados como os nossos, ai sim, apresentaremos algo de realmente novo neste cenário monocórdio do basquete internacional, somente quebrado pela atitude fragmentária no modo de jogar da equipe americana, não como muitos pensam pela falta de pivôs, e sim pela retomada das habilidades, da grande arte do domínio dos fundamentos, independendo de alturas, pesos, idades, e mesmo, posições.
Ficam alguns questionamentos, tais como: – Se é real e comprovadamente verdade de que um armador somente atinge sua plenitude perto dos 30 anos, porque forçarmos a barra em cima de um de 19?
– Se aceitarmos a evidência palpável de que o jogo de pivôs nos beneficiará nas grandes competições, porque levar um que sequer atua num jogo preparatório?
– Porque ainda pecamos tanto na convocação de “nomes”, esquecendo aqueles que se destacaram no NBB?
Terminemos dando uma passagem pelas fotos apresentadas, comparando-as com o que aqui foi exposto, e também no que pudemos observar no transcurso do jogo, num exercício de conhecimento e descoberta das entrelinhas do grande jogo. Divirtam-se.
Amém.
Fotos – Reproduções da TV. Clique nas mesmas para ampliá-las.