CORRENDO MAIS DO QUE DEVE…
Chego a Gávea com meu filho André Luis, e logo à entrada me encontro com a Alzira Brandão, talvez a mais antiga mesária ainda em atividade no país, formada em educação física e competente ao extremo. Foram alguns minutos de reminiscências pelos anos de sadia convivência nas quadras do Rio, e muitas saudades também, imorredouras, eternas.
Entramos no ginásio, não aquele embaixo da enorme arquibancada do futebol, onde trabalhei as divisões de base do Flamengo numa época que rivalizávamos com São Paulo em qualquer daquelas categorias de formação. Agora é outro ginásio, pequeno e calorento, com insuficientes vias de acesso do ar vindo da lagoa ali do lado, o que explica a grande concentração de umidade ao final de um dia ensolarado de verão intenso. Pior, os assentos plásticos desconfortáveis oferecidos ao publico que se lá se encontrava, apesar de tanto sacrifício, é porque realmente ama o grande jogo, sob quaisquer circunstâncias.
Bem, consegui assistir os dois jogos semifinais em meio a grandes papos com o Byra Bello, o Michila, o Renê Machado, o Marcio, técnico do Goiânia, o Paulo, técnico do Flamengo, e até receber um amistoso cumprimento do prof. Flavio Davies, supervisor do Minas, surpreendente pelo precedente mal estar entre nós durante o primeiro congresso de técnicos no NBB2 em Campinas, e que parece estar superado pelo bem do grande jogo que tanto amamos.
Fora os papos e agradáveis reencontros, pudemos constatar in loco as quantas andam os prospectos que se lançarão à divisão de elite, além daqueles que já lá se encontram, e que na minha humilde opinião não deveriam estar participando dessa LDB, pois já conquistaram seus lugares nas equipes do NBB. Mas, infelizmente os responsáveis pela competição não pensaram dessa forma, porém, acredito que para a próxima poderiam repensar essas participações, que visam mais o titulo em disputa, do que a oportunidade de melhoria técnica dos jovens participantes.
Se nos ativermos um pouco sobre os números das duas partidas veremos que os percentuais nos arremessos continuam na faixa do inaceitável (64/158 – 40.5% nos de dois pontos, e 12/73 – 16.4% nos de três), melhorando um pouco nos lances livres (58/79 – 73.4%), mas que complica muito quando nos deparamos com 55 erros de fundamentos no jogo entre Minas e Pinheiros, e 37 entre Flamengo e Brasília, e que nem mesmo alguns escorregões motivados pela umidade na quadra, justificam tanta imprecisão nos fundamentos básicos do jogo.
E é justamente neste aspecto, imprecisão nos fundamentos (arremessos inclusos…) que reside a grande falha, regida e patrocinada por um conceito errôneo de velocidade, que chega às raias do inverossímil, quando a mesma antecede o raciocínio sobre as situações de jogo colocadas sob o julgamento sensato, pensado e materializado nos ritmos corretos a cada uma delas por parte dos jovens jogadores, e não pasteurizada como atitude unificada a todas elas, gerando uma realidade caótica e absolutamente imprevisível em seus mais do que previsíveis resultados. Em outras palavras, corre-se muito e desvairadamente, e pensa-se pouco, muito pouco, as ações a serem tomadas.
Olhando de perto tanta sofreguidão em ser veloz, que sem querer podemos definir com clareza o que venha a ser uma “jogada chifre”, pois não foram poucas as oportunidades em que vimos jogadores se enfiarem em extrema velocidade defesa adentro, praticamente “chifrando” quem se antepusesse a ele, gerando cenas realmente inusitadas e até cômicas…
E no entorno de tanta falta de controle físico, espacial e mental, constata-se, talvez, o maior de todos os equívocos, unificados através um sistema padrão de jogo, que busca com sofreguidão os embates de 1 x 1, e os espaços para as finalizações dos três pontos, que na maioria das vezes descambam para as atitudes aventureiras de muitos jogadores que, na ausência de um convincente preparo na leitura de jogo, partem para o confronto, forçando-o na maioria das vezes, e o pior, sem o devido conhecimento, preparo e treinamento daqueles fundamentos mais básicos, o drible, a finta, o passe e o arremesso sob situações de proximidade defensiva, e mesmo quando livres e soltos.
E neste ponto da análise mais primaria que se possa fazer, salta aos olhos o poder do grande vilão dessa odisseia às avessas que nos inflige perdas incalculáveis, a mais completa ignorância do que venha a ser defesa nesse apaixonante e difícil jogo. Simplesmente confunde-se agressividade com energia e técnica defensiva, tanto individual, como, e mais precisamente, coletiva. Ao não utilizarmos como regra geral a defesa linha da bola (aquela de flutuação lateralizada, aqui vista, e não a longitudinal à cesta que usamos a granel), e a marcação frontal do(s) pivô(s), permitindo ações automáticas de coberturas, e obrigando o adversário aos passes em elipse ou para trás, e que se mentalize a idéia de que uma defesa zonal tem de ser igual ou até mais agressivamente técnica que uma individual, principalmente nas contestações ao homem de posse da bola e aos arremessadores de longa distância, honestamente considero ser impossível um salto de qualidade ofensiva de nossas equipes, pois sucedendo a uma predominante realidade defensiva de boa qualidade, naturalmente se materializa uma ofensiva, e vice versa, num caudal evolutivo para o progresso técnico de qualquer modalidade de jogo coletivo, onde o contato físico seja permitido.
Porém, todo essa dinâmica evolutiva de jogo, somente será factível com um trabalho muito bem planejado, estudado, orientado e dirigido por técnicos corretamente qualificados, através bem estabelecidos cursos de longa duração e acompanhamento permanente por parte de experientes e muito bem vividos professores (todos eles marginalizados do processo desde sempre), que os qualificarão, não pelos “títulos” conquistados nas divisões iniciais de base (quando currículos são falseados) , onde um ou dois jogadores altos fazem a enganosa diferença na conquista dos mesmos, do que venha a ser um criterioso e muito bem planejado trabalho de equipe, e sim, quando consigam sua ascensão a níveis superiores, pela quantidade de jogadores que conseguirem promover às divisões acima, e mesmo às seleções regionais, provando na prática a qualidade de seu trabalho, geralmente encoberto pelas “peneiras” da vida, e que premiaria um trabalho que é a base dos demais, na garimpagem e no ensino qualitativo dos jovens, todos advindos da massificação fundamental. Essa foi uma ideia que tentei passar a ENTB/CBB, e que muito discuti ontem com um de seus professores, o prof. Byra Bello.
Finalmente, com as simples políticas acima descritas (simples porque óbvias…) poderemos no prazo de duas ou três gerações nos ombrear com as grandes equipes internacionais, apresentando uma forma diferenciada de jogar, com a já consolidada dupla armação, e utilizando três homens altos, rápidos e flexíveis no trabalho próximo a cesta, porém em constante e ininterrupto movimento, com velocidade ofensiva controlada e utilizada quando necessária, e não esse sistema trator e peladeiro que assistimos no calorento, abafado, mas tradicional ginásio rubro negro.
Infelizmente não estarei na decisão, que acompanharei pela TV, torcendo para que tudo corra bem, apesar da indescritível e não muito inteligente velocidade…
Amém.
Foto – Divulgação LNB.